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Hemorragia e tipos de choque

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1. Conceituar hemorragia, em traumatismos corporais abertos e fechados.
Hemorragia é a saída aguda de sangue do seu circuito normal para dentro das cavidades ou tecidos do próprio organismo ou para fora dele, normalmente devido ao rompimento de um vaso (artéria, veia ou capilar). A hemorragia nas primeiras horas após o trauma é o fator mais relacionado a óbito e, nesse contexto, os traumas abdominais são muito comuns pelas proporções do abdome e pelos órgãos e vasos que abriga. 
· Externa: presente em trauma abdominal penetrante, ou seja, com solução de continuidade, há sangramento de estruturas superficiais com exteriorização do sangramento. A hemorragia externa é identificada e controlada durante a pesquisa primária.
· Interna: presente em trauma abdominal fechado, ou seja, quando não ocorre solução de continuidade na pele. As principais áreas de hemorragia interna são o tórax, abdome, retroperitônio, pelve e ossos longos. No abdome, o sangramento na cavidade peritoneal pode não provocar inicialmente irritação peritoneal nem dor, o que dificulta o reconhecimento da lesão abdominal. O diagnóstico da hemorragia abdominal ou pélvica é muito importante para a identificação rápida do local do sangramento e para aplicação do melhor tratamento ao choque hemorrágico, que é a interrupção imediata do sangramento. (1,2)
2. Descrever os mecanismos fisiopatológicos de sua ocorrência e os padrões
morfológicos.
As respostas circulatórias precoces à perda sanguínea constituem-se em mecanismo de compensação: progressiva vasoconstrição da circulação cutânea, muscular e visceral para preservar o fluxo sanguíneo aos rins, coração e cérebro. Quando ocorre um traumatismo, a resposta à perda aguda de volume circulante dá-se por meio de um aumento da frequência
cardíaca na tentativa de preservar o débito cardíaco. Na maioria das vezes, a taquicardia representa o sinal circulatório mensurável mais precoce do choque. A liberação de catecolaminas endógenas aumenta a resistência vascular periférica. Como decorrência, a pressão sanguínea diastólica aumenta e a pressão de pulso se reduz, embora tais alterações não resultem em aumentos significativos da perfusão orgânica. Outros hormônios com propriedades vasoativas são liberados na circulação durante os estados de choque, dentre os quais a histamina, a bradicinina, as beta-endorfinas e uma cascata de prostanoides e de outras citocinas. Essas substâncias têm efeito profundo na microcirculação e na permeabilidade vascular. O retorno venoso na fase inicial do choque hemorrágico é preservado em algum grau pelo mecanismo de compensação pela redistribuição do volume sanguíneo no sistema venoso, fato este que não contribui para modificar a pressão venosa sistêmica média. Contudo, esse mecanismo de compensação é limitado. A maneira mais efetiva de restaurar o débito cardíaco e a perfusão a órgãos-chave é o restabelecimento do retorno venoso ao normal, através da localização e interrupção do foco de sangramento e de reposição volêmica apropriada. No nível celular, as células que são perfundidas e oxigenadas inadequadamente ficam privadas de substratos essenciais para o metabolismo aeróbico e para a produção de energia. Inicialmente, a compen-
sação é realizada pela mudança para o metabolismo anaeróbico, que leva à formação de ácido lático e ao desenvolvimento de acidose metabólica. Se o choque for prolongado e a oferta de substrato para a produção de adenosina-trifosfato (ATP) for inadequada, a membrana celular perde a capacidade de manter a sua integridade e o gradiente elétrico normal desaparece. Os mediadores pró-inflamatórios como óxido nítrico sintetase (iNOS), fator de necrose tumoral (TNF) e outras citocinas são liberados, propiciando um cenário de dano orgânico final e subsequente disfunção de múltiplos órgãos e sistemas. Se o processo não for revertido, o dano celular progride, podendo ocorrer alterações na permeabilidade endotelial, edema tecidual adicional e morte celular. Esse processo constitui o impacto da hemorragia e hipoperfusão, aumentando potencialmente o volume de fluido necessário para a reanimação. (2)
Fonte: MEDCURSO. Trauma.
Esta tabela acima descreve a classificação da hemorragia tendo como referência a quantidade de sangue perdido. Além desta classificação, há também outras classificações: Quanto à origem:
venosa, arterial, capilar, cardíaca. Quanto à relação com o organismo: externas ou superficiais,
internas com fluxo externo: exemplos: gastrorragia com hematêmese, gastrorragia e/ou enterorragia com melena, otorragia, epistaxe ou rinorragia, pneumorragia com hemoptise, nefrorragia com hematúria; e ocultas (i.e., sem fluxo externo): viscerais (superficiais, parenquimatosas ou intersticiais) e ainda as cavitárias. Quanto ao mecanismo de formação: Por rexe ou ruptura de vasos: mais frequentes, geralmente de origem traumática. Por diabrose ou digestão/erosão de vasos: por necrose (exemplo: cavernas pulmonares na tuberculose) ou digestão enzimática (exemplo: úlceras pépticas). Por diapedese ou diátese hemorrágica: sem lesão evidente nos vasos, geralmente a nível capilar e frequentemente do tipo petequial ou púrpura. As hemácias fluem através da parede vascular intacta. Visto comumente nas coagulopatias (diáteses hemorrágicas) e nas congestões prolongadas em vênulas e capilares.
Quanto à idade do processo: Recente: Hemácias íntegras nos cortes histológicos. Antiga: Hemólise e hemossiderose presentes. Quanto sua classificação morfológica: - Petéquias: São manchas vermelhas que aparecem na pele, os pontos são inicialmente vermelhos, puntiformes (entre 1 a 2mm) e múltiplos. – Equimose: Infiltração de sangue na malha de tecidos do organismo, devido à ruptura de vaso. São planas, difusas e irregulares. – Hematomas: Caracterizam-se por manchas escuras, podem ser castanhas ou azul-negro, localizadas sob a pele, unhas, órgãos e tecidos. Formam uma elevação devido ao acúmulo de sangue no tecido – Púrpura: Medem cerca de 1 cm são pontos hemorrágicos normalmente como uma reunião de petéquias mais densamente. Quanto à etiologia: Traumática - acidentes e cirurgias; de origem hemática – Intoxicações; Hipovitaminoses (principalmente K / importante na Cascata de coagulação, e C/ integridade das junções interendoteliais); Hepatopatias; Trombocitopenias; Hemofilias. De origem vascular - Hipertensão intravascular (hipertensão arterial, varizes, formação e ruptura de aneurismas, obstrução venosa); Toxinas e agentes infecciosos endoteliotrópicos. Quanto à intensidade: Fatores: local, volume; velocidade de perda. Grave: quando afeta órgão essencial ou importante e/ou com perda rápida de grandes volumes sanguíneos (ultrapassando 1/3 da volemia, i.e. 3 a 4 % do peso corporal). Risco de vida evidente. Choque hemorrágico. Moderada: quando inspira cuidados, mas em si só não indica ainda risco de vida. Leve: quando não interfere significativamente na vida do indivíduo. (4,5) 
3. Conceituar choque e discutir a sua classificação.
Choque corresponde a um estado fisiológico caracterizado por redução significativa da perfusão tecidual sistémica, que resulta numa diminuição da oferta de oxigénio aos tecidos. Isto cria um desequilíbrio entre a oferta e o consumo de oxigénio. Uma privação prolongada de oxigénio leva a hipóxia celular e alteração dos processos bioquímicos a nível celular, que podem progredir a nível sistémico. 
1.Choque hipovolêmico: O choque hipovolêmico é causado por uma redução do volume sanguíneo (hipovolemia). É o tipo mais frequente de choque. Essa redução do volume pode ser devida a uma hemorragia em que há perda tanto de eritrócitos quanto de plasma, ou há uma perda isolada de plasma, que ocorre em casos mais específicos. De uma forma ou de outra, o que ocorre é uma queda na pressão de enchimento capilar (PEC) ou pressão hidrostática. A fim de recuperar a perfusão tecidual o organismo lança mão de estratégias fisiológicas como a ativação simpática. Essa ativação desencadeia três respostas principais. A primeira é a contração das arteríolas, que aumenta a resistênciavascular periférica (RVP). A segunda é a contração das veias, que aumenta o retorno venoso e, consequentemente a pré-carga. E a terceira são os efeitos cardíacos diretos: o aumento da frequência cardíaca (efeito cronotrópico positivo) e o aumento da força de contração do coração (efeito inotrópico positivo). Tais efeitos atuam em conjunto contribuindo para o aumento da pressão arterial (PA). O débito sistólico, por sua vez, sofre influência tanto da contratilidade cardíaca (efeito inotrópico positivo, resultado da ativação simpática) quanto do retorno venoso (aumentado pela vasoconstrição venosa). 
2.Choque cardiogênico: O choque cardiogênico é aquele em que a má perfusão tecidual é resultado do baixo débito cardíaco oriundo de uma patologia cardíaca propriamente dita. A causa mais comum é o infarto agudo do miocárdio (IAM). No entanto, há causas mecânicas, como doenças valvares (orovalvopatias), que também podem comprometer de forma significativa o débito cardíaco, levando ao choque cardiogênico. Assim como ocorre no choque hipovolêmico, no choque cardiogênico também haverá ativação simpática desencadeada pelos barorreceptores e quimiorreceptores. No entanto, é importante ressaltar que neste tipo de choque, a bomba de propulsão (coração) está comprometida. Isso porque, o IAM, por exemplo, se desenvolve exatamente por uma diminuição da oferta de oxigênio pelas artérias coronárias, que nutrem o músculo cardíaco. Com os efeitos simpáticos sobre o coração, este quadro se agrava. Além de a oferta estar diminuída, a demanda metabólica do miocárdio aumentará, já que a contração e a frequência cardíaca aumentadas consumirão ainda mais oxigênio.
3.Choque distributivo: No choque distributivo, a má perfusão é resultado de uma vasodilatação periférica global que ocasiona drástica redução da PEC, comprometendo o fornecimento de oxigênio pelos capilares e a captura de oxigênio pelos tecidos. Nesse caso, o débito cardíaco encontra-se preservado, dado que não há qualquer problema nem com a bomba cardíaca, nem com o volume circulante de sangue. É importante observar que o choque distributivo é a única modalidade de choque em que ocorre vasodilatação. Em todos os outros tipos de choque vai ocorrer uma vasoconstrição reflexa, que ocorre como mecanismo compensatório determinado pela ativação simpática. No choque distributivo esse mecanismo compensatório não consegue atuar, já que a musculatura lisa arteriolar se encontra seriamente lesada, não respondendo ao estímulo simpático. Por esse motivo, o choque distributivo é o tipo de choque mais grave, apresentando pior prognóstico e maiores índices de mortalidade. A vasodilatação periférica que ocasiona o choque distributivo tem quatro causas distintas, as quais dão nome aos quatro principais subtipos de choque distributivo: o séptico, o anafilático, o neurogênico e o decorrente de crise adrenal. 
3.1-Choque séptico: O choque séptico é decorrente de uma infecção grave, disseminada para todo o organismo. Ocorre normalmente em ambiente hospitalar e acomete indivíduos com o sistema imune comprometido ou aqueles que realizaram procedimentos invasivos. Neste tipo de choque, uma infecção local é transmitida a outros tecidos pela corrente sanguínea, adquirindo assim caráter sistêmico (sepse). Os agentes causadores da infecção são produtores de toxinas que induzem à produção de mediadores inflamatórios como interleucinas, bem como a síntese de óxido nítrico. Essas substâncias têm uma potente ação vasodilatadora. Essa resposta inflamatória é crucial para o combate a infecções locais, e a vasodilatação local não causa grandes prejuízos. No entanto, em uma infecção acometendo todo o organismo, uma vasodilatação generalizada diminui a RVP e, consequentemente a PA e a PEC. Além disso, a venodilatação causa a diminuição da pré-carga e do retorno venoso, diminuindo o débito cardíaco. Os mediadores inflamatórios liberados durante a sepse condicionam também um aumento da permeabilidade vascular. Isso resulta numa perda de plasma para os espaços intersticiais, além de uma perda concomitante de proteínas. Essa última diminui a pressão coloidosmótica nos capilares e induz a uma perda ainda maior de plasma, agravando o choque. Além disso, as endotoxinas podem atuar como um veneno metabólico, intoxicando a musculatura lisa das arteríolas e produzindo uma vasodilatação generalizada e refratária a qualquer mecanismo compensatório e tratamento. Isso faz do choque séptico uma das principais causas de óbito nas unidades de terapia intensiva.
3.2-Choque anafilático: A má perfusão tecidual no choque anafilático também é resultado de uma vasodilatação generalizada e tem hemodinâmica semelhante ao choque séptico. No entanto, a causa é distinta, pois no choque séptico a causa é infecção, enquanto no choque anafilático a causa é alergia. De fato, no choque anafilático, o paciente sofre uma reação alérgica ao ser exposto a um antígeno, a que é previamente sensível. A interação antígeno-anticorpo, mediada pela imunoglobulina E, é extremamente significativa e provoca a degranulação de mastócitos com consequente liberação de histamina (dentre outros mediadores). A histamina produz venodilatação, diminuindo o retorno venoso; vasodilatação arteriolar, diminuindo a resistência vascular periférica; e aumento da permeabilidade vascular, causando extravasamento de plasma e proteínas dos capilares para os espaços intersticiais. O grande aumento da permeabilidade pode produzir o edema de glote, que muitas vezes leva ao óbito antes mesmo que o choque circulatório se instale.
3.3-Choque neurogênico: O choque neurogênico culmina na má perfusão tecidual pela perda súbita do tônus vascular. Tônus vascular é um estado de ligeira contração mantido nos vasos sanguíneos pelo sistema nervoso autônomo, e é crucial para a manutenção da PA e da PEC. A perda desse tônus de forma sistêmica causa dilatação das arteríolas - diminuição da RVP -, e das vênulas - diminuindo o retorno venoso. O choque neurogênico ocorre devido à injúria no centro vasomotor no sistema nervoso central. 
3.4-Crise adrenal: O cortisol é o hormônio mais importante para a manutenção do tônus vascular. Além disso, a presença de níveis adequados de cortisol é indispensável para que a adrenalina (hormônio de estresse) consiga atuar. Assim, se houver uma insuficiência dos níveis de cortisol, ocorrerá uma vasodilatação generalizada com consequente redução da PEC. Tal situação acontece, principalmente, em pacientes usuários crônicos de corticosteroides, pois nestes pacientes ocorre uma inibição crônica do ACTH que acaba por levar a uma atrofia da zona fasciculada do córtex adrenal. Outras causas de crise adrenal seriam a hemorragia global das adrenais (que ocorre eventualmente na sepse) e os defeitos congênitos que afetam a síntese de esteróides adrenais (a chamada hiperplasia adrenal congênita, que pode acometer recém-nascidos). Nesses casos a situação é ainda mais grave, pois a zona glomerular também é acometida, levando a um déficit de aldosterona com consequente redução da reabsorção de sódio e água, podendo produzir um choque hipovolêmico, somado ao choque distributivo já instalado pela falta do cortisol.
4. Choque obstrutivo: O choque obstrutivo é ocasionado por uma obstrução ou uma compressão dos grandes vasos ou do próprio coração. Pode ocorrer por diversas causas, porém três merecem destaque. O pneumotórax hipertensivo pode levar ao choque obstrutivo por ser uma situação aguda de aumento da pressão intratorácica. Neste caso as grandes veias podem sofrer pressão em sua superfície externa diminuindo seu calibre em trechos sensíveis. No entanto, há casos em que o calibre é extremamente diminuído ou o vaso é até mesmo colapsado. A passagem da veia cava inferior pelo diafragma, na parte direita do centro tendíneo, é um bom exemplo. Um pneumotórax poderia desviar todas as estruturas torácicas lateralmente, inclusive a veia cava. No entanto, como ela encontra-se fixa no forame da veia cava inferior, ao desviar-se, ela sofre estrangulamento. Neste caso o retornovenoso estaria seriamente comprometido, diminuindo, por conseguinte o débito cardíaco, ocasionando o choque. O tamponamento cardíaco é outra causa de choque obstrutivo. Neste caso, por algum motivo, ocorre um acúmulo de líquido entre as lâminas parietal e visceral do pericárdio seroso do coração. Como o pericárdio fibroso – externo ao seroso – tem uma consistência firme (formado por esqueleto de fibras elásticas entrelaçado com uma camada densa de fibras colágenas), este impede que esse acúmulo de líquido no pericárdio seroso se faça de forma a aumentar o volume do pericárdio como um todo. Logo, ocorre um aumento concêntrico do pericárdio, comprimindo o coração. A compressão do coração compromete sua dilatação na diástole, comprometendo o volume diastólico final (que consiste no volume de sangue que se encontra no ventrículo esquerdo ao final da diástole). Com um volume diastólico baixo, o débito sistólico também se comprometerá, diminuindo o débito cardíaco e levando ao choque. O tromboembolismo pulmonar também causa choque obstrutivo. A existência de um trombo na circulação venosa, normalmente em membros inferiores, pode ser o ponto de partida para a ocorrência deste choque. O atrito entre o trombo e o fluxo sanguíneo acaba por destacar pequenos êmbolos. Esses êmbolos seguem para o coração direito, ganham as artérias pulmonares e chegam aos capilares pulmonares. O pequeno calibre destes vasos faz com que os êmbolos fiquem estacionados, formando microtrombos e obstruindo os capilares pulmonares. Caso esse fenômeno ocorresse com poucos capilares pulmonares, não haveria maiores repercussões. No entanto, isso ocorre com milhares deles. Com a rede capilar significativamente obstruída, não há quantidade considerável de sangue para retornar ao coração. Como pouco sangue chega ao átrio esquerdo, pouco sangue será entregue ao ventrículo esquerdo e, por conseguinte, pouco sangue será bombeado para o organismo (baixo débito cardíaco). (6)
4. Caracterizar e classificar o choque hemorrágico quanto a sua epidemiologia e fisiopatologia, dando ênfase às manifestações decorrentes de fenômenos circulatórios compensatórios.
Epidemiologia: Atualmente, a hemorragia é a causa mais comum de choque em doentes de trauma. A maioria das mortes por hemorragia ocorre nas primeiras 6 horas após. Hemorragia é a causa major de mortalidade após ferimento e é responsável por 30 – 40% das mortes em trauma. Mais de metade dessas mortes ocorrem durante o período pré-hospitalar. O choque hemorrágico e exsanguinação são responsáveis por um grande número dessas mortes, que representam mais de 80% das mortes no bloco operatório e cerca de 50% das mortes nas primeiras 24 horas. Na assistência tardia, a hemorragia ativa é complicada pela conhecida “tríade letal” de coagulopatia, hipotermia e acidose que aumenta significativamente a mortalidade e morbilidade. O choque é uma das principais causas de mortalidade e morbilidade encontrada atualmente em unidades de cuidados intensivos polivalentes.
A perda de volume circulante leva a uma diminuição do retorno venoso, reduzindo o volume diastólico final (pré-carga). Esta redução da pré-carga diminui o comprimento das fibras musculares do miocárdio, o que reduz a sua contractilidade e diminui o débito cardíaco. Uma perda aguda de sangue desencadeia mecanismos compensatórios que envolvem todos os órgãos. A primeira resposta à hemorragia é a formação de um coágulo no local de sangramento. Segue-se a redistribuição do fluxo sanguíneo, com diminuição da circulação em órgãos menos vitais como os rins, intestino e pele, preservando a circulação em órgãos prioritários como o coração, cérebro, pulmões e o músculo esquelético. Embora muitos doentes possam tolerar este mecanismo por tempo prolongado, se não corrigido pode levar a respiração anaeróbia e acumulação de lactato. Este shunt para os órgãos vitais é desencadeado pela diminuição do débito cardíaco e posteriormente, da pressão de pulso. A diminuição do volume intravascular é reconhecida pelos barorreceptores do arco aórtico, aurícula esquerda e corpo carotídeo. A ativação dos barorreceptores estimula o SNS aferente e o centro vasomotor da medula. Catecolaminas libertadas pelo SNS eferente vão estimular os receptores adrenérgicos. Estes receptores desencadeiam estímulos simpáticos para o coração e outros órgãos, que respondem por vasoconstrição, aumento da resistência vascular periférica e do cronotropismo e ionotropismo cardíaco, com o objetivo de aumentar a pressão de perfusão. Com o agravamento da hipovolemia, a taxa de filtração glomerular diminui e as células do aparelho justa-glomerular da arteríola aferente libertam renina. A renina ativa o sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) cuja função principal é produzir angiotensina II, um potente vasoconstritor que atua diretamente no músculo liso vascular, promovendo a retenção de sódio e água. Indiretamente, a angiotensina II aumenta a libertação de neurotransmissores do SNS. Aldosterona, hormona anti-diurética e peptídeo natriurético auricular (ANP) são libertados para aumentar a reabsorção de fluidos. Todos estes mecanismos compensatórios aumentam o débito cardíaco e mantêm uma
pressão de perfusão adequada. O débito urinário diminui ligeiramente e a sede aumenta, mantendo assim o volume circulante. Durante a hemorragia ativa é frequente o aparecimento
de taquipneia e hipotensão. No entanto, jovens saudáveis podem manter a tensão arterial dentro dos valores normais apesar de perda significativa de sangue. A medula adrenal e hipófise anterior libertam hormona adrenocorticotrófica, epinefrina e norepinefrina que melhoram os mecanismos compensatórios. A libertação destas hormonas neuro-endócrinas ocorre como resposta a estímulos simpáticos. Este é um processo tempo-dependente e em alguns casos demora mais de 24 horas a ocorrer. Em todos os órgãos, com possível excepção do coração e sistema nervoso central, há diminuição do fluxo sanguíneo durante a hipovolemia grave. 
Com o agravar da hipovolemia, começa a surgir hipóxia e o aumento da ventilação é fundamental para compensar a acidose metabólica. Dificuldade respiratória surge pelo aumento da permeabilidade da membrana dos capilares pulmonares, formação de microembolias e vasoconstrição pulmonar. O baixo fluxo sanguíneo na veia porta reduz o fluxo hepático e a isquemia ocorre da zona periportal para a zona centrolobular, levando a necrose centrolobular quando o choque se torna irreversível. A disfunção hepática reduz a desintoxicação hepática de amónia por uma descoordenação entre a síntese de glutamina nos hepatócitos pericentrais e de ureia nos hepatócitos periportais, aumentando os níveis de amónia no plasma. O fluxo sanguíneo para os vasos renais e esplâncnicos diminui e a tensão arterial sistólica desce. Vasoconstrição renal e hipoperfusão podem causar necrose tubular aguda e eventualmente, insuficiência renal.
A disfunção renal diminui a excreção de ureia e aumenta a concentração plasmática de amónia na veia renal. Órgãos gastrointestinais também começam a falhar por hipoperfusão e vasoconstrição. A ansiedade pode estar relacionada com a libertação de catecolaminas e diminui
ligeiramente o fluxo sanguíneo cerebral. A diminuição da pressão de perfusão coronária afeta negativamente a contractilidade do miocárdio e conduz à disfunção cardíaca, que por sua vez diminui a circulação cerebral. A hipoperfusão cerebral agrava a disfunção cardíaca e causa depressão respiratória e insuficiência do SNS, originando vasodilatação e aumento da permeabilidade capilar. Coagulação intravascular disseminada surge por disfunção hematológica. Os distúrbios circulatórios causados por choque hemorrágico estão também associados a disfunção imunológica. O trauma/hemorragia desencadeia a ativação do processo
inflamatório com libertação de mediadores químicos que incluem catecolaminas, cininas, ativação de monócitos, produção de radicais livres de oxigénio, formação de fator ativador das plaquetas (PAF, platelets activating factor). As consequências imunológicase inflamatórias da hemorragia agravam o compromisso hemodinâmico. Durante a síndrome de resposta inflamatória sistémica induzida por hemorragia, a ausência do papel protetor da resposta imune do hospedeiro permite que a disfunção imunológica se instale. Esta disfunção está associada ao desenvolvimento da resposta inflamatória sistémica que leva à síndrome da disfunção múltipla de órgãos pós-traumática e é responsável pelas mortes tardias após trauma. Todas estas respostas sistémicas vão culminar na perda de consciência, coma e finalmente a morte. (7) 
Fonte (8)
5. Citar os parâmetros clínicos que auxiliam na identificação da gravidade do
choque hemorrágico e sua relação com a reposição volêmica.
Fonte (8)
Fonte (9)
-Hemorragia Classe I Perda de até 15% do Volume Sanguíneo: Os sintomas clínicos da perda volêmica na classe I de hemorragia são mínimos. Em situações não complicadas, ocorre taquicardia leve. Não ocorrem alterações mensuráveis na pressão arterial, na pressão de pulso ou na frequência respiratória. Desse modo, em doentes saudáveis, essa perda volêmica não exige reposição, porque o reenchimento capilar e outros mecanismos de compensação restabelecem o volume circulatório em 24 horas, geralmente sem a necessidade de transfusão sanguínea.
-Hemorragia Classe II Perda de 15% a 30% do Volume Sanguíneo: Em um homem de 70 kg, a perda volêmica representa de 750 a 1.500 mL de sangue. Os sintomas clínicos incluem taquicardia (frequência cardíaca acima de 100 no adulto), taquipneia e diminuição da pressão; esse último sinal está primariamente relacionado à elevação do componente diastólico decorrente do aumento de nível de catecolaminas circulantes. Esses agentes produzem um aumento no tônus e na resistência vascular periférica. A pressão sistólica muda pouco no início do choque hemorrágico; portanto, é mais importante avaliar a pressão de pulso que a pressão sistólica. Outros achados clínicos pertinentes a esse grau de perda sanguínea incluem alterações sutis do sistema nervoso central, como ansiedade, medo ou hostilidade. Apesar das significativas alterações cardiovasculares e da perda significativa de sangue, a diurese está pouco alterada. O débito urinário é usualmente de 20 a 30 mL/h no adulto. Perdas hidroeletrolíticas concomitantes podem agravar a manifestação clínica da hemorragia classe II. Alguns desses doentes acabam necessitando de transfusão sanguínea, mas podem ser estabilizados inicialmente pela reposição de soluções cristaloides.
-Hemorragia Classe III Perda de 30% a 40% do Volume Sanguíneo: A perda de sangue na hemorragia classe III (aproximadamente 1 .500 a 2.000 mL no adulto) pode ser devastadora. Os doentes quase sempre apresentam os sinais clássicos de perfusão inadequada, incluindo taquicardia acentuada, taquipneia, alterações significativas do estado mental e queda mensurável da pressão sistólica. Em casos não complicados, esse é o menor volume de perda sanguínea que provoca queda consistente da pressão sistólica. Doentes com esse grau de perda sanguínea quase sempre requerem transfusão. Entretanto, a prioridade no tratamento inicial é interromper a hemorragia por meio da realização de cirurgia de emergência ou embolização se
necessário. Muitos doentes nessa categoria vão requerer concentrado de hemácias e produtos sanguíneos para a reanimação no intuito de reverter o estado de choque. A decisão de transfusão de sangue é baseada na resposta do doente à reposição líquida inicial.
-Hemorragia Classe IV Perda de mais de 40% do Volume Sanguíneo: Esse grau de exsanguinação nas hemorragias grau IV é uma ameaça imediata à vida. Os sintomas incluem
taquicardia acentuada, diminuição significativa da pressão sistólica e presença de pressão do pulso muito pinçada (ou de pressão diastólica não mensurável). O débito urinário é desprezível e o nível de consciência está notadamente deprimido. A pele está fria e pálida. Tais doentes usualmente exigem transfusão rápida e intervenção cirúrgica imediata. Essa decisão é baseada
na resposta do doente às medidas de tratamento inicial descritas neste capítulo. Perdas volêmicas superiores a 50% determinam inconsciência, diminuição da pressão de pulso e da pressão sanguínea. (9)
6. Descrever o tratamento de choque hemorrágico.
O tratamento inicial requer a rápida expansão do volume sanguíneo intravascular circulante juntamente com intervenções para controlar as perdas contínuas. Conforme a lei de Starling o volume sistólico e o débito cardíaco aumentam conforme se eleva a pré-carga. Após a reposição, a complacência dos ventrículos pode continuar reduzida em razão do aumento do líquido intersticial no miocárdio. Assim, pressões de enchimento elevadas costumam ser necessárias para manter um desempenho ventricular adequado.
A reposição volêmica é iniciada com a infusão rápida de soro fisiológico isotônico (embora se deva tomar cuidado para evitar acidose hiperclorêmica devido à perda da capacidade de tamponamento do bicarbonato e reposição com excesso de cloreto) ou soro fisiológico balanceado, como o Ringer lactato (estando ciente da presença de potássio e potencial disfunção renal), por meio de acessos intravenosos de grosso calibre. Dados, principalmente sobre lesão cerebral traumática (LCT) grave, relativos aos benefícios de pequenos volumes de soro fisiológico hipertônico que restauram mais rapidamente a pressão arterial são variáveis, mas tendem a mostrar melhora da sobrevida que é considerada ligada à imunomodulação. Não se demonstrou benefício distinto no uso de soluções coloides, o que, em pacientes traumatizados, foi associado à mortalidade mais alta, particularmente em pacientes com LCT. A infusão de 2 a 3 L de soro fisiológico durante 20 a 30 minutos deve restaurar os parâmetros hemodinâmicos normais. A manutenção da instabilidade hemodinâmica implica que não houve reversão do choque e/ou que existem perdas contínuas significativas de outros volumes ou sangue. A perda de sangue ativa aguda, com concentrações de hemoglobina declinando para 100 g/L (10 g/dL) ou menos, deve indicar transfusão sanguínea, de preferência com sangue estocado há menos de 14 dias, totalmente compatível. Os pacientes ressuscitados costumam ser coagulopáticos devido à deficiência de fatores de coagulação em cristaloides e concentrado de hemácias (CH) estocadas no banco de sangue. A administração precoce de terapia composta durante transfusão maciça (plasma fresco congelado [PFC] e plaquetas) que chega a uma razão de 1:1 de CH/PFC parece melhorar a sobrevida. Em emergências extremas, pode-se transfundir concentrado de hemácias tipo específico ou O negativo. Após hipovolemia grave e/ou prolongada, o suporte inotrópico com norepinefrina, vasopressina ou dopamina pode ser necessário para manter o desempenho ventricular adequado, mas apenas após a reposição do volume sanguíneo. Os aumentos da vasoconstrição periférica com ressuscitação inapropriada causam perda tecidual e falência de órgãos. Quando a hemorragia é controlada e o paciente estabilizado, as transfusões sanguíneas não devem ser continuadas, exceto quando a hemoglobina estiver inferior a 7 g/dL. A diurese horária que indica boa resposta a ressuscitação
volêmica (boa perfusão tissular) é de 0,5 ml/kg/h em adultos, 1 ml/kg/h em menores de 12 anos e 2 ml/kg/h em menores de 1 ano. Um pequeno grupo de pacientes em choque pode necessitar de transfusão maciça (> 10 UI de concentrado de hemácias nas 24 horas); neste caso, o emprego precoce de plasma fresco congelado e plaquetas, e a infusão menos agressiva de cristaloides, são medidas que parecem aumentar a probabilidade de sobrevivência. Nesse momento, esforços concomitantes para o controle da hemorragia, o tratamento da acidose e a reversão da coagulopatia tornam-se fundamentais. Estudos demonstraram um aumento da sobrevida em pacientes tratados com esses protocolos restritos de transfusão sanguínea. O sucesso da ressuscitação também requer suporte da função respiratória. O oxigênio suplementar deve ser sempre fornecido, e a intubação endotraqueal pode ser necessáriapara manter uma adequada oxigenação arterial. Após a ressuscitação por choque hipovolêmico isolado, o dano em órgãos-alvo costuma ser menor do que após choque séptico ou traumático. Isso pode ser causado pela ausência de ativação maciça da resposta imune inata inflamatória e consequente lesão e falência inespecífica de órgãos. (4,8)
7. Definir hemoderivados e como são empregados na prática clínica.
Hemocomponentes e hemoderivados são produtos distintos. Os produtos gerados um a um nos serviços de hemoterapia, a partir do sangue total, por meio de processos físicos (centrifugação, congelamento) são denominados hemocomponentes. Os produtos obtidos em escala industrial, a partir do fracionamento do plasma por processos físico‑químicos são denominados hemoderivados. Hemocomponentes: Concentrado de hemácias lavadas, concentrado de hemácias, concentrado de plaquetas, Crioprecipitado, Plaquetas por aférese, Plasma Expansor, Plasma fresco congelado, Pool de plaquetas, Sangue total.
Hemoderivados: Albumina, complexo protombinico ativado, complexo protombinico, Fator IX da coagulação, Fator VIII da coagulação.
-Os concentrados de fatores de coagulação: são utilizados nos pacientes com insuficiência ou ausência de produção destes fatores, de origem hereditária ou não. As insuficiências ou ausências de produção hereditárias mais conhecidas são as Hemofilias e a Doença de Von Willebrand. Os portadores de déficit de Fator VIII são os hemofílicos do tipo A e representam a grande maioria no nosso país, cerca de 5.500 pacientes (cadastro nacional de hemofílicos/GGSTO/ANVISA). Já os portadores de déficit de Fator IX são os hemofílicos do tipo B e são em torno de 900 (cadastro nacional de hemofílicos/GGSTO/ANVISA). As coagulopatias hereditárias são classificadas em grave, moderada ou leve, dependendo do grau de déficit dos fatores e seus portadores não podem viver sem a reposição destes produtos, por isso são considerados medicamentos essenciais. As doses e o tempo do tratamento para cada paciente dependem do local onde ocorre o evento hemorrágico e da gravidade do déficit de fator. São menos graves as hemorragias da cavidade oral e das articulações, que em geral necessitam manter os fatores em 30% do nível ideal, e a depender da gravidade da hemorragia, o tratamento será apenas de um dia. Estas são consideradas as hemorragias menores. Por outro lado, as hemorragias que ocorrem nos músculos, nas cirurgias de médio porte, como também nas extrações dentárias são consideradas hemorragias maiores e requerem tratamento em geral por três a quatro dias, necessitando manter o nível do fator deficitário em 40-50%. Já as cirurgias de grande porte, as fraturas, as hemorragias gastrointestinais, intra-abdominais e intracranianas requerem um tratamento por um período mínimo de sete dias, podendo estender-se por mais sete dias, com indicação de manter os níveis do fator em 50 a 75% numa primeira fase, a fim de parar a hemorragia e depois manter em 30- 50% para prevenir a reincidência. Os portadores de Hemofilia A podem necessitar manter os níveis de fator VIII em 100%. As demais coagulopatias não têm a mesma gravidade destas Hemofilias e admite-se que há uma sub-notificação dos casos, sobretudo pela dificuldade de diagnóstico. São estes pacientes, os portadores de coagulopatias hereditárias, os maiores beneficiários da produção dos hemoderivados. Sem os concentrados de fatores da coagulação, dependendo do grau de déficit de fator que o paciente apresente, ele pode ir a óbito por hemorragia. Antes de se produzir os hemoderivados, por processo físico-químico industrial, a reposição era feita por meio da transfusão de plasma fresco congelado ou de crioprecipitado. O plasma fresco congelado é o plasma humano extraído do sangue total ou por plasmaférese, congelado até 8 horas após a coleta e armazenado a -20oC ou menos. O crioprecipitado é obtido a partir do esfriamento rápido do plasma fresco, que precipita os fatores da coagulação, transformando-o em plasma isento de fatores da coagulação e gerando o crioprecipitado, rico em fatores da coagulação. Ambos devem ser conservados à ultra baixa temperatura. O plasma isento de fatores da coagulação pode ser utilizado na produção industrial de albumina e imunoglobulinas.
O Complexo Protrombínico é composto por um conjunto de proteínas, incluindo os fatores II, VII, IX e X da coagulação. Por possuir na sua composição o Fator IX da coagulação é também indicado para uso nos portadores de Hemofilia B.
- Imunoglobulinas: As imunoglobulinas são utilizadas nos portadores de deficiências imunológicas primárias ou genéticas, como também nas secundárias ou adquiridas, por exemplo doenças infecciosas graves e vários tipos de câncer. A indicação de uso das imunoglobulinas tem se expandido. Existem as imunoglobulinas - IgG, de uso intramuscular, também conhecidas como imunoglobulinas humanas normais, que são específicas para determinadas doenças: Hepatite A, Rubéola, Varicela, Sarampo e que são usadas na profilaxia ou no tratamento dos portadores destas infecções. As imunoglobulinas - IVIG, de uso intravenoso, são conhecidas também como imunoglobulinas polivalentes e usadas na substituição e na reposição destas proteínas nos portadores de: 1. Imunodeficiências Primárias: Agamaglobulinemia e Hipogamaglobulinemia congênitas; Imunodeficiência comum variável; Imunodeficiência severa combinada; Síndrome de Wiskott-Aldrich. 2. Imunodeficiências Secundárias: AIDS Pediátrica; Transplante de Medula Óssea Alogênico; Leucose Linfocítica Crônica. 3. Púrpura Trombocitopência Idiopática – PTI; 4. Síndrome de Kawasaki; 5. Auto-Ac anti-Fator VIII.
- Albumina: Devido à sua alta afinidade de ligação reversível, a albumina funciona como meio de transporte protéico para drogas, hormônios, enzimas, ácidos graxos, vitaminas e oligoelementos, além de ser eficaz para inativação transitória ou prolongamento da ação de diversas substâncias no plasma. A afinidade pela bilirrubina permite sua utilização no tratamento do Kernicterus e, pelo mesmo mecanismo, pode ser empregada para tratar algumas intoxicações medicamentosas. Considerada como marcador de subnutrição, a hipoalbuminemia pode ser corrigida a médio e longo prazos pela nutrição enteral adequada. Nestes casos, o aumento dos níveis de albumina está associado com melhora do estado nutricional e do prognóstico. A correção da hipoalbuminemia pela administração intravenosa de albumina, entretanto, não afeta a evolução clínica da maioria dos casos. Desde o aparecimento da albumina no mercado farmacêutico, sua utilização tem sido motivo de controvérsias. A literatura médica tem recomendado seu emprego em situações clínicas específicas, respaldado em base científica sólida. As indicações são discutíveis e requerem demonstração inequívoca do benefício do uso da albumina. Quase sempre o seu uso é indicado visando a melhorar a perfusão tecidual e os estados edematosos. Entretanto, a indicação correta do emprego da albumina depende de uma avaliação cuidadosa e integral do paciente e da identificação das causas da hipoalbuminemia. 
Hemocomponentes: -Concentrado de hemácias lavadas: Concentrado de hemácias submetido a lavagem com soro fisiológico através de centrifugação e desprezo do sobrenadante. Tem um volume final aproximado de 250 ml, com perda de cerca de 20% das hemácias. Como é realizado em sistema aberto, o mesmo deverá ser realizado em capela de fluxo laminar. Indicação terapêutica: Reações transfusionais alérgicas e em pacientes com deficiência de IgA.
-Concentrado de hemácias: Hemocomponente obtido através do fracionamento de uma bolsa de sangue total, com remoção de 200 a 250 ml de plasma. O volume final é de cerca de 250 a 300 ml e contém predominantemente hemácias (a bolsa tem hematócrito entre 50-80%, dependendo da solução anticoagulante utilizada) e ainda leucócitos, plaquetas e plasma em pequena quantidade. Indicação terapêutica: A indicação principal é para se melhorar a oxigenação dos tecidos do organismo. -Concentrado de plaquetas: O Concentrado de Plaquetas éum hemocomponentes derivado da centrifugação de uma bolsa de sangue total. Tem um volume final aproximado de 50 ml. Indicação terapêutica: É utilizado para pacientes com sangramentos com contagens de plaquetas inferiores a 50.000 / mm3 ou portadores de disfunção plaquetária. Também poderá ser utilizado como medida preventiva de sangramento em casos de procedimentos invasivos para pacientes com baixa contagem ou disfunção plaquetária.
- Crioprecipitado: Hemocomponente obtido do descongelamento de 1 bolsa de Plasma Fresco Congelado a 4° C, sendo removido o sobrenadante. Contém os fatores de coagulação XIII, VIII, Fator de von Willebrand e fibrinogênio (I). Volume de cada bolsa é cerca de 10 a 20 ml. Indicação terapêutica: Sangramento ativo ou preventivo em caso de procedimentos invasivos em casos de:
- Hipofibrinogenemia ou disfibrinogenemia; - Deficiência de Fator XIII da coagulação (quando não houver o concentrado liofilizado específico); - Doença de von Willebrand quando não responsivo ao DDAVP ou quando não houver disponibilidade do concentrado liofilizado específico; - Sangramento microvascular difuso com fibrinogênio < 100 mg. -Plaquetas por aférese: Tipo de concentrado de plaquetas especial obtido através de coleta por máquina de aférese. A bolsa coletada equivale a 6-8 unidades de concentrado de plaquetas comuns ou 1 bolsa de pool de concentrado de plaquetas. É um concentrado de plaquetas de melhor qualidade, pois na maioria das vezes já vem desleucocitado, é proveniente de 1 único doador (menor risco de eventos adversos transfusionais) e pode ter volume de infusão final menor, em uma transfusão para adulto. Indicação terapêutica: O concentrado de plaquetas por aférese tem indicação idêntica aos demais tipos de concentrados de plaquetas. Devido a oferta limitada deste tipo de hemocomponente deveremos priorizar alguns tipos de pacientes, em caso de baixo estoque, como candidatos a politransfusão (pacientes oncohematológicos), candidatos a transplante de medula óssea, pacientes com sorologia negativa para Citomegalovirus (principalmente gestantes e imunossuprimidos), aqueles com reações alérgicas a transfusão, pacientes politransfundidos e com refratariedade a transfusão de outros tipos de concentrado de plaquetas (se possível transfusão com bolsa de plaquetaférese de doador HLA compatível).
- Plasma Expansor: O Plasma Expansor (ou Plasma Comum), é um plasma que não foi congelado dentro das especificações técnicas recomendadas ou ainda pode ser considerado o plasma fresco congelado cujo prazo de validade expirou. Indicação terapêutica: Atualmente o Plasma Expansor não tem indicação clínica e não deverá ser utilizada para fins transfusionais. É utilizado pela indústria para produção de hemoderivados (como albumina, imunoglobulinas, etc.). - Plasma fresco congelado: Hemocomponente obtido por centrifugação de bolsa de sangue total com posterior congelamento. Consiste na porção líquida do sangue, que contém água, proteínas e íons, dentre outros. Contém todas as proteínas (fatores) da coagulação sanguínea em níveis hemostáticos. O volume médio de uma bolsa de plasma fresco congelado é em torno de 200 ml. Indicação terapêutica: O Plasma Fresco Congelado é utilizado para transfusão em casos de sangramento 2º a deficiência de fatores de coagulação (quando não há disponível concentrado liofilizado específico) ou prevenção de sangramentos antes de procedimentos invasivos nestes pacientes. Além disso pode ser utilizado em alguns procedimentos de plasmaférese terapêutica como para tratamento de PTT, na coagulação intravascular disseminada, reversão de efeito de anticoagulante cumarínico, sangramento por deficiência de fatores vitamina K dependentes no RN e em casos de transfusão maciça. -Pool de plaquetas: Concentrado de plaquetas obtido a partir de 4 a 5 unidades de sangue total ( bolsas tipo “top and bottom”) através de centrifugação e separação da camada leucoplaquetária. Estas bolsas são transferidas para uma única bolsa em forma de pool e equivalem a uma dose de transfusão de plaquetas para um adulto.Indicação terapêutica: As indicações são para pacientes com sangramento e baixa contagem de plaquetas (geralmente <50.000 plaquetas/ mm3) ou naqueles portadores de disfunção plaquetária. Também pode ser indicada profilaticamente em casos de necessidade de realização de procedimentos invasivos também em pacientes com baixa contagem de plaquetas ou disfunção plaquetária. É mais vantajosa em relação a transfusão de bolsas comuns de concentrado de plaquetas em pacientes adultos devido a redução do número de bolsas transfundidas (reduz risco de reações transfusionais) mantendo o mesmo efeito terapêutico. -Sangue total: Sangue total é a bolsa de sangue coletada do doador, antes de ser submetida ao fracionamento. Apresenta todos os componentes sanguíneos, tendo aproximadamente 450 ml. Indicação terapêutica: Não há atualmente indicação para o uso de bolsas de sangue total na terapia transfusional. A transfusão de sangue total deve ser substituída, de forma eficaz, pela transfusão de hemocomponentes específicos, dependendo da necessidade clínica do paciente.(10)
8. Descrever os mecanismos vasculares envolvidos na formação e dissolução de coágulos, bem como sua manifestação clínica.
Formação de coágulos: As proteínas plasmáticas de coagulação (fatores de coagulação) normalmente circulam no plasma nas suas formas inativas. A sequência de reações da proteína de coagulação que culminam na formação da fibrina foi originalmente descrita como uma cachoeira ou cascata. Duas vias de coagulação sanguínea foram descritas no passado: a via extrínseca ou de fator tecidual e a via intrínseca ou de ativação de contato. Hoje se sabe que a coagulação normalmente é iniciada por meio da exposição e ativação do fator tecidual (TF) por meio da via extrínseca clássica, mas com amplificação criticamente importante por meio da via intrínseca clássica. Estas reações ocorrem nas superfícies fosfolipídicas, em geral a superfície plaquetária ativada. O teste de coagulação no laboratório pode refletir outras influências devido à natureza artificial dos sistemas in vitro utilizados. O gatilho imediato para a coagulação é a lesão vascular que expõe o sangue ao TF constitutivamente expresso nas superfícies dos componentes celulares subendoteliais da parede do vaso, como as células musculares lisas e fibroblastos. O TF também está presente nas micropartículas circulantes, presumivelmente derramadas de células como os monócitos e as plaquetas. O TF liga o fator VIIa da serina protease; o complexo ativa o fator X em fator Xa. Alternativamente, o complexo pode ativar indiretamente o fator X convertendo inicialmente o fator IX em fator IXa, que em seguida ativa o fator X. A participação do fator XI na hemostasia não depende de sua ativação pelo fator XIIa, mas sim de sua ativação de feedback positivo pela trombina. Assim, o fator XIa age na propagação e amplificação, e não na iniciação, da cascata de coagulação. O fator Xa pode ser formado por meio de ações do complexo fator tecidual/fator VIIa ou fator IXa (tendo o fator VIIIa como cofator) e converte a protrombina em trombina, a protease essencial do sistema de coagulação. O cofator essencial para esta reação é o fator Va. Assim como o fator VIIIa homólogo, o fator Va é produzido pela proteólise limitada induzida pela trombina do fator V. A trombina é uma enzima multifatorial que converte o fibrinogênio plasmático solúvel em uma matriz de fibrina insolúvel. A polimerização da fibrina envolve um processo ordenado de associações intermoleculares. A trombina também ativa o fator XIII (fator de estabilização da fibrina) em fator XIIIa, que faz ligação cruzada covalente e, portanto, estabiliza o coágulo de fibrina. A montagem dos fatores de coagulação nas superfícies da membrana celular ativada acelera grandemente suas taxas de reação e também serve para localizar a coagulação sanguínea nossítios de lesão vascular. Os componentes cruciais da membrana celular, fosfolipídios ácidos, normalmente não são expostos nas superfícies da membrana celular em repouso. Entretanto, quando plaquetas, monócitos e células endoteliais são ativados pela lesão vascular ou estímulos inflamatórios, os principais grupos pró-coagulantes dos fosfolipídios aniônicos da membrana são translocados para as superfícies destas células ou liberados como parte de micropartículas, tornando-as disponíveis para sustentar e promover as reações de coagulação plasmática.
Dissolução de coágulos: 
Vários mecanismos antitrombóticos fisiológicos agem em consonância para evitar a coagulação sob circunstâncias normais. Estes mecanismos operam para preservar a fluidez do sangue e para limitar a coagulação sanguínea em locais focais específicos da lesão vascular. As células endoteliais, que têm muitos efeitos antitrombóticos, produzem prostaciclina, óxido nítrico e ectoADPase/CD39, os quais agem para inibir a ligação, secreção e agregação plaquetárias. Tais células produzem fatores anticoagulantes que incluem os proteoglica- nos da heparana, antitrombina, inibidor da via TF e trombomodulina. Também ativam mecanismos fibrinolíticos por meio da produção de ativador do plasminogênio tecidual 1, uroquinase, inibidor do ativador do plasminogênio e anexina 2. Os locais de ação das principais vias fisiológicas antitrombóticas. A antitrombina (ou antitrombina III) é o principal inibidor da protease plasmática principal da trombina e outros fatores formadores de coágulos na coagulação. A antitrombina neutraliza a trombina e outros fatores de coagulação ativados formando um complexo entre o local ativo da enzima e o centro reativo da antitrombina. A taxa de formação destes complexos de inativação aumenta em um fator de vários milhares na presença de heparina. A inativação anti- trombina da trombina e outros fatores de coagulação ativados ocorre fisiologicamente nas superfícies vasculares, onde os glicosaminoglicanos, incluindo os sulfatos de heparana, estão presentes para catalisar estas reações. As deficiências quantitativas e qualitativas da antitrombina levam a uma predisposição durante toda a vida a tromboembolismo venoso. A proteína C é uma glicoproteína plasmática que se torna um anticoagulante quando ativada pela trombina. A ativação induzida pela trombina da proteína C ocorre fisiologicamente na trombomodulina, um local de ligação do proteoglicano da transmembrana para trombina nas superfícies da célula endotelial. A ligação da proteína C a seu receptor nas células endoteliais a coloca em proximidade com o complexo de trombina-trombomodulina, aumentando, assim, sua eficiência de ativação. A proteína C ativada age como um anticoagulante clivando e inativando os fatores V e VIII ativados. Esta reação é acelerada por um cofator, proteína S, que, assim como a proteína C, é uma glicoproteína que passa por modificação pós-translacional dependente da vitamina K. As deficiências quantitativas e qualitativas da proteína C ou da S, ou resistência à ação da proteína C ativada por uma mutação específica em seu local de clivagem-alvo no fator Va (fator V de Leiden), levam a estados hipercoaguláveis. O inibidor da via do fator tecidual (TFPI) é um inibidor de protease plasmática que regula a via extrínseca induzida pelo TF da coagulação. O TFPI inibe o complexo TF/FVIIa/FXa, essencialmente desligando a iniciação do complexo TF/FVIIa de coagulação, que então se torna dependente da “alça de amplificação” por meio da ativação de FXI e FVIII pela trombina. TFPI é ligado a lipoproteína e também pode ser liberado pela heparina a partir das células endoteliais, onde é ligado a glicosaminoglicanos, e das plaquetas. A liberação mediada pela heparina de TFPI pode desempenhar um papel nos efeitos anti- coagulantes das heparinas não fracionadas e de baixo peso molecular. 
-Manifestações clínicas: Os sintomas de sangramento que parecem ser mais comuns em pacientes com distúrbios hemorrágicos incluem sangramento prolongado com cirurgia, procedimentos odontológicos e extrações dentárias e/ou traumatismo, menorragia ou hemorragia pós-parto e grandes equimoses (frequentemente descritas como nódulos). Os hematomas de formação fácil e a menorragia constituem queixas comuns em pacientes com e sem distúrbios hemorrágicos. A formação fácil de hematomas também pode ser um sinal de distúrbios clínicos nos quais não há coagulopatia identificável; em vez disso, as condições são causadas por uma anormalidade dos vasos sanguíneos ou de seus tecidos de suporte. Na síndrome de Ehlers-Danlos, pode haver sangramento pós-traumático e história de hiperextensibilidade articular. A síndrome de Cushing, o uso crônico de esteroides e o envelhecimento resultam em mudanças na pele e tecido subcutâneo, ocorrendo sangramento subcutâneo em resposta a traumatismos menores. Este último foi chamado de púrpura senil. 
A epistaxe é um sintoma comum, particularmente em crianças e em climas secos, e pode não refletir um distúrbio hemorrágico subjacente. Entretanto, é o sintoma mais comum na telan- giectasia hemorrágica hereditária e em meninos com DVW. Os indícios de que a epistaxe é um sintoma de distúrbio hemorrágico subjacente são ausência de variação sazonal e sangramento que requer avaliação clínica ou tratamento, como cauterização. O sangramento com erupção de dente primário é observado em crianças com distúrbios hemorrágicos mais graves, como hemofilia moderada a grave, sendo incomum nas crianças com distúrbios hemorrágicos brandos. Os pacientes com distúrbios da hemostasia primária (adesão plaquetária) podem apresentar um aumento do sangramento após higiene dentária e outros procedimentos que envolvem manipulação da gengiva. A hemorragia pós-parto (HPP) é um sintoma comum em mulheres com distúrbios hemorrágicos subjacentes. Nas mulheres com DVW tipo 1 e portadoras sintomáticas de hemofilia, cujos níveis de FVW e FVIII se normalizam habitualmente durante a gravidez, a HPP pode ser tardia. As hemartroses e os hematomas musculares espontâneos são característicos de deficiência congênita moderada ou grave do fator VIII ou do IX. Também podem ser observados em de- ficiências moderadas e graves do fibrinogênio, protrombina bem como dos fatores V, VII e X. As hemartroses espontâneas ocorrem raramente em outros distúrbios hemorrágicos exceto para DVW grave, com níveis de FVIII inferiores a 5%. Os sangramentos de músculo e tecido mole também são comuns na deficiência de FVIII adquirida. O sangramento em uma articulação resulta em dor e edema graves, assim como perda da função, mas raramente está associado a alteração de cor devido à formação de hematoma ao redor da articulação. Os locais de sangramento ameaçadores da vida incluem a orofaringe, onde a hemorragia pode obstruir a via respiratória, o sistema nervoso central e o retroperitônio. O sangramento no sistema nervoso central constitui a principal causa de mortes relacionadas com sangramento em pacientes com deficiências congênitas graves de fator. (11)
9. Caracterizar o politraumatismo secundário a acidentes de trânsito quanto ao protocolo dedicado a guiar o primeiro atendimento na sala de estabilização(ACLS), à sua epidemiologia, aos custos para a sociedade, à faixa etária envolvida, assim como custos familiares, sequelas e responsabilidade no trânsito, de acordo com as normas legais.
Segundo a Organização Mundial da Saúde no ano de 2004 mais de 5 milhões de óbitos se deram por conta de eventos traumáticos, sendo que destas de maneira aproximada um quarto foi decorrente de acidentes de trânsito. Dados do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) demonstram que no Brasil a cada ano 33 mil indivíduos vão a óbito e outros 400 mil ficam inválidos ouferidos em decorrência do acidente de trânsito. Na maioria dos casos o trauma acomete jovens causando incapacidade física e intelectual ou até mesmo óbito, gerando um custo social altíssimo, além de dados irreparáveis para o grupo familiar e comunitário. Tal constatação reafirma o sério problema de saúde pública que são os acidentes de trânsito, incluindo as questões socioeconômicas de perda de renda e capacidade de estar ativo no mercado de trabalho. Acidentes de trânsito são a segunda principal causa de morte de jovens até 29 anos e a terceira causa entre pessoas de 30 a 44 anos de idade. Este quadro ainda deve se agravar nos países de baixa renda até 2020. No Estado do Rio Grande do Sul no ano de 2003 a 2016 foram registrados 41.268 mil óbitos por acidentes de trânsito, sendo que o índice mais elevado ocorreu no ano de 2010, onde se teve um aumento considerável de óbitos. A tabela a seguir traz a idade das vítimas de trauma atendidas na UTI Adulto em 2017 no Rio Grande do Sul. (12)
Os doentes são avaliados e as prioridades de tratamento são estabelecidas de acordo com suas lesões, seus sinais vitais e mecanismo de lesão. Nos doentes com lesões graves, deve ser estabelecida uma sequência lógica de tratamento de acordo com as prioridades, com base na avaliação geral do doente. As funções vitais do doente devem ser avaliadas rápida e eficientemente. O seu tratamento deve consistir em uma avaliação primária rápida, reanimação das funções vitais, uma avaliação secundária mais pormenorizada e, finalmente, o início do tratamento definitivo. Esse processo constitui o ABCDE dos cuidados do doente traumatizado e identifica as condições que implicam risco à vida através da seguinte sequência:
A Via aérea com proteção da coluna cervical
B Ventilação e respiração
C Circulação com controle da hemorragia
D Disfunção, estado neurológico
E Exposição/controle do ambiente: despir completamente o doente, mas prevenindo a hipotermia
Uma rápida avaliação do A, B, C e D no doente traumatizado pode ser obtida quando você se apresenta, perguntando ao doente seu nome e o que aconteceu. Uma resposta apropriada sugere que não há comprometimento grave da via aérea (habilidade para falar claramente), a ventilação não está comprometida gravemente (habilidade para gerar movimento aéreo que permita falar) e não há maior diminuição do nível de consciência (alerta suficientemente para descrever o que aconteceu). A falha na resposta a essas questões sugere anormalidades no A, B ou C, que implicam avaliação e tratamento urgentes. Durante a avaliação primária, as condições que implicam risco à vida devem ser identificadas em uma sequência de prioridades baseadas nos efeitos das lesões sobre a fisiologia do doente, isto porque não infrequentemente não se consegue identificar inicialmente as lesões anatômicas específicas. Por exemplo, a via aérea pode estar comprometida secundariamente a um trauma de crânio, lesões que causam choque ou trauma físico direto da via aérea. Apesar das lesões que comprometem a via aérea, a primeira prioridade é o tratamento da via aérea, incluindo a desobstrução, aspiração, administração de oxigênio e proteção da via aérea. A sequência de prioridades é baseada no grau de ameaça à vida; assim, a maior anormalidade que ameaça a vida é manejada primeiro.
A avaliação priorizada e os procedimentos de tratamento descritos neste capítulo são apresentados como etapas sequenciais em ordem de importância para maior clareza. Entretanto, essas etapas são frequentemente realizadas simultaneamente por uma equipe de profissionais de saúde. Para realizá-las efetivamente, os membros dessa equipe devem comunicar-se constantemente entre si e com o líder da equipe.
-MANUTENÇÃO DA VIA AÉREA COM PROTEÇÃO DA COLUNA CERVICAL: Durante a avaliação inicial do doente traumatizado, a via aérea deve ser avaliada em primeiro lugar para
assegurar a sua permeabilidade. Essa rápida avaliação para identificar sinais de obstrução da via aérea deve incluir aspiração e inspeção para a presença de corpos estranhos e fraturas faciais, mandibulares ou traqueolaríngeas, que podem resultar em obstrução da via aérea. As manobras para estabelecer a permeabilidade da via aérea devem ser feitas com proteção da coluna cervical. Como medida inicial para permeabilizar a via aérea é recomendada a manobra de elevação do mento (chin lift) ou de tração da mandíbula (jaw thrust). Se o doente consegue comunicar-se verbalmente, é pouco provável que a obstrução da via aérea represente um risco imediato; no entanto, é prudente que a permeabilidade da via aérea seja avaliada a curtos intervalos de tempo. Cabe enfatizar que os doentes com trauma craniencefálico grave e rebaixamento do nível de consciência ou portadores de um escore na escala de coma de Glasgow (GCS) igual ou inferior a 8 habitualmente exigem o estabelecimento de uma via aérea definitiva (isto é, tubo com balão insuflado, na traqueia). O achado de respostas motoras descoor-denadas sugere fortemente a necessidade de uma via aérea definitiva. O tratamento da via aérea na criança exige o conhecimento das peculiaridades anatômicas da laringe da criança, tanto no que diz respeito à posição quanto ao tamanho, e implica o uso de equipamento especial. Durante a avaliação e a manipulação da via aérea, deve-se tomar muito cuidado para evitar a movimen-
tação excessiva da coluna cervical. A cabeça e o pescoço do doente não devem ser hiperestendidos, hiperfletidos ou rodados com o intuito de estabelecer ou manter a via aérea. Com base na história do trauma, deve-se presumir a perda de estabilidade da coluna cervical. Um exame neurológico isolado não exclui lesão de coluna cervical. Inicialmente, a proteção da medula do doente deve ser feita e mantida com uso de dispositivos apropriados de imobilização. A avaliação e o diagnóstico de lesão específica de coluna, incluindo métodos de imgem, devem ser realizados posteriormente. Caso se faça necessária a retirada temporária do dispositivo de imobilização cervical, um dos membros da equipe de trauma deve encarregar-se de imobilizar manualmente a cabeça e o pescoço, mantendo-os alinhados. Podem ser feitas radiografias de coluna cervical para confirmar ou excluir a presença da lesão, após o tratamento das lesões com risco imediato ou potencial à vida, embora seja importante lembrar que uma radiografia de perfil identifique somente 85% de todas as lesões. Considere a existência de uma lesão de coluna cervical em todo doente com traumatismos multissistêmicos, especialmente nos doentes que apresentem nível de consciência alterado ou traumatismo fechado acima da clavícula. Todo esforço deve ser feito para identificar sem demora o comprometimento da via aérea e para assegurar uma via aérea definitiva. E importante também a identificação da possibilidade de comprometimento progressivo da permeabilidade da via aérea. A reavaliação frequente é essencial para identificar e tratar os doentes que perdem a capacidade de manter a via aérea permeável.
-VENTILAÇÃO E RESPIRAÇÃO: A permeabilidade da via aérea, por si só, não garante ventilação adequada. Uma troca adequada de gases é necessária para que seja possível a oxigenação e a eliminação de dióxido de carbono num grau máximo. Uma boa ventilação exige um funcionamento adequado dos pulmões, da parede torácica e do diafragma. Cada componente deve ser avaliado e examinado rapidamente. O pescoço e o tórax do doente devem ser expostos para avaliar adequadamente a distensão de veias jugulares, a posição da traqueia e a movimentação da parede torácica. A ausculta deve ser realizada para se confirmar o fluxo de ar nos pulmões. A inspeção visual e a palpação poderão detectar lesões da parede do tórax
capazes de comprometer a ventilação. A percussão do tórax também pode identificar anormalidades, mas no ambiente barulhento da reanimação, isso pode ser difícil ou levar a resultados não confiáveis. As lesões que podem prejudicar gravemente a ventilação num curto prazo são o pneumotórax hipertensivo, o tórax instável (retalho costal móvel)com contusão pulmonar, o hemotórax maciço e o pneumotórax aberto. Tais lesões devem ser identificadas na
avaliação primária e podem exigir atenção imediata para que o esforço ventilatório seja efetivo. O hemotórax ou o pneumotórax simples, as fraturas de arcos costais e a contusão pulmonar podem comprometer a ventilação, mas em grau menor, e são habitualmente identificados na avaliação secundária.
-CIRCULAÇÃO COM CONTROLE DA HEMORRAGIA: O comprometimento da circulação no traumatizado pode resultar de muitas lesões diferentes. Os principais fatores circulatórios a considerar são volume sanguíneo, débito cardíaco e hemorragia.
1-Volume Sanguíneo e Débito Cardíaco: A hemorragia é a principal causa de mortes pós-traumáticas evitáveis. Por isso, a identificação e a parada da hemorragia são passos cruciais na avaliação e tratamento desses doentes. Uma vez descartado o pneumotórax hipertensivo como causa de choque, a hipotensão em doentes traumatizados deve ser considerada hipovolêmica até prova em contrário. É essencial a avaliação rápida e precisa do estado hemodinâmico do doente traumatizado. Os elementos clínicos que oferecem informações importantes dentro de poucos segundos são o nível de consciência, a cor da pele e o pulso.
-Nível de consciência: Quando o volume sanguíneo está diminuído, a perfusão cerebral pode estar criticamente prejudicada, resultando em alteração do nível de consciência. Contudo, um doente consciente também pode ter perdido uma quantidade significativa de sangue.
-Cor da pele: A cor da pele pode ser importante na avaliação de um doente traumatizado hipovolêmico. O doente traumatizado com pele de coloração rósea, especialmente na face e nas extremidades, raramente está criticamente hipovolêmico. Ao contrário, a coloração acinzentada da face e a pele esbranquiçada das extremidades são sinais evidentes de hipovolemia.
-Pulso: Um pulso central de fácil acesso (femoral ou carotídeo) deve ser examinado bilateralmente para se avaliar sua qualidade, frequência e regularidade. Pulsos periféricos cheios, lentos e regulares são, usualmente, sinais de normovolemia relativa em doente que não
esteja em uso de bloqueadores beta-adrenérgicos. Pulso rápido e filiforme é habitualmente um sinal de hipovolemia, embora possa ter outras causas. Uma frequência normal de pulso não é garantia de que o doente esteja normovolêmico. Mas quando irregular, o pulso costuma ser um alerta para uma potencial disfunção cardíaca. A ausência de pulsos centrais, não relacionada a fatores locais, significa a necessidade de uma ação imediata de reanimação para restaurar o défice sanguíneo e um débito cardíaco adequado.
2-Hemorragia: Deve-se identificar se a fonte de hemorragia é externa ou interna. A hemorragia externa deve ser identificada e controlada durante a avaliação primária. A hemorragia externa significativa deve ser tratada por compressão manual direta sobre o ferimento. Os torniquetes são efetivos na exsanguinação nas lesões de extremidades, mas podem causar lesão isquêmica e devem ser utilizados quando a compressão direta não for efetiva. O uso de pinças hemostáticas pode lesar nervos e veias. As principais áreas de hemorragia interna são tórax, abdome, retroperitônio, bacia e ossos longos. A fonte de sangramento geralmente é identificada por exame físico e de imagem (por exemplo, radiografia de tórax, pelve ou avaliação ultrassonográfica direcionada para trauma [FAST]). O tratamento pode incluir descompressão do tórax, compressão da pelve, uso de imobilizadores e intervenção cirúrgica.
-DISFUNÇÃO NEUROLÓGICA: No final da avaliação primária, realiza-se uma avaliação neurológica rápida. Esta avaliação neurológica estabelece o nível de consciência do doente, o tamanho e reatividade das pupilas, sinais de lateralização e o nível de lesão da medula espinhal.
A GCS é um método rápido e simples para determinar o nível de consciência e que permite prever a evolução do doente (particularmente a melhor resposta motora). O rebaixamento do nível de consciência pode representar diminuição da oxigenação e/ou da perfusão cerebral ou ser resultado de um trauma direto ao cérebro. A alteração do nível de consciência implica necessidade imediata de reavaliação de ventilação, oxigenação e perfusão. Hipoglicemia, álcool, narcóticos ou outras drogas também podem alterar o nível de consciência do doente. No entanto, se excluídos os problemas mencionados, toda alteração do nível de consciência deve ser considerada originária de um trauma ao sistema nervoso central até que se prove o contrário. A lesão cerebral primária resulta do efeito estrutural do trauma sobre o cérebro. A prevenção da
lesão cerebral secundária, por meio da manutenção de oxigenação e perfusão adequadas, são os principais objetivos do atendimento inicial.
-EXPOSIÇÃO E CONTROLE DO AMBIENTE: O doente deve ser totalmente despido, usualmente cortando as roupas para facilitar o exame e avaliação completos. Depois de retirar a roupa do doente e completar a avaliação, o doente deve ser coberto com cobertores aquecidos ou algum dispositivo de aquecimento externo para prevenir a ocorrência de hipotermia na sala de trauma. Os fluidos intravenosos devem ser aquecidos antes de administrados e o ambiente deve ser mantido aquecido. O mais importante é garantir a temperatura corporal do doente e não o conforto da equipe de atendimento.
-REANIMAÇÃO: A reanimação e o tratamento das lesões com risco para a vida logo que identificadas são essenciais para maximizar a sobrevivência do doente. A reanimação também segue a sequência ABC e ocorre simultaneamente com a avaliação.
VIA AÉREA: A via aérea deve ser protegida em todos os doentes e garantida quando existe a possibilidade de seu comprometimento. A elevação do mento ou a tração da mandíbula pode ser suficiente como intervenção inicial. Se o doente estiver inconsciente e não tiver o reflexo de vômito, a utilização de um tubo orofaríngeo pode ajudar temporariamente. Se houver qualquer dúvida sobre a capacidade do doente manter a permeabilidade de sua via aérea, deve-se estabelecer uma via aérea definitiva (isto é, intubação). O controle definitivo da via aérea nos doentes com comprometimento desta devido a fatores mecânicos, ou que tenham problemas de ventilação ou que estejam inconscientes, é feito por intubação traqueal. Este procedimento deve ser feito com proteção contínua da coluna cervical. Se a intubação for contraindicada ou não for possível, deve ser obtida uma via aérea cirúrgica.
VENTILAÇÃO, RESPIRAÇÃO E OXIGENAÇÃO: O pneumotórax hipertensivo compromete dramaticamente e de modo agudo a ventilação e a circulação. Quando suspeitado, deve ser tratado imediatamente por descompressão torácica. Todo doente traumatizado deve receber oxigenioterapia suplementar. Se não for intubado, o doente deve receber oxigênio por meio de
uma máscara com reservatório que garanta oxigenação máxima. O oxímetro de pulso deve ser usado para monitorar a adequação da saturação de hemoglobina.
CIRCULAÇÃO E CONTROLE DA HEMORRAGIA: O controle definitivo da hemorragia é essencial em conjunto com a reposição apropriada do volume intravascular. Deve-se inserir um mínimo de dois cateteres endovenosos (EV) calibrosos. A velocidade máxima dos fluidos administrados é determinada pelo diâmetro interno do cateter e é inversamente proporcional ao seu comprimento. Não depende do calibre da veia em que o cateter é colocado. E preferível iniciar por punções venosas periféricas nos membros superiores. O uso de outras veias periféricas, de dissecções e punções de veias centrais deve ser feito de acordo com as necessidades e levando-se em consideração a habilidade do médico responsável pelo doente. Assim que a veia for puncionada ou cateterizada, devem ser retiradas amostras de sangue para tipagem sanguínea e prova cruzada e para os exames laboratoriais de rotina, incluindo teste de gravidez para todas as mulheres em idade fértil. A gasometria e o nível de lactato devem ser obtidos para avaliar a presença e o grau do choque. A reanimação volêmica agressiva econtínua não substitui o controle definitivo da hemorragia. O controle definitivo da hemorragia inclui cirurgia, angioembolização e estabilização pélvica. Deve ser iniciada a administração endovenosa de fluidos com soluções cristaloides. Uma infusão em bolus de 1 a 2 litros de solução isotônica pode ser necessária para alcançar uma resposta apropriada nos adultos. Todas as soluções endovenosas devem ser aquecidas através do armazenamento em ambiente aquecido (37oC a 40°C, ou 98.6°F a 104 o F) ou por meio de dispositivos de aquecimento de líquidos. O choque associado ao trauma é mais frequentemente de origem hipovolêmica. Se o doente não responder à terapia inicial com cristaloides, pode ser necessária a transfusão sanguínea. A hipotermia pode estar presente quando o doente chega ao hospital ou pode ocorrer rapidamente na sala de emergência, desde que o doente permaneça descoberto, sejam administrados rapidamente fluidos à temperatura ambiente ou, ainda, pela administração de sangue refrigerado. A hipotermia é uma complicação potencialmente letal nas vítimas de traumatismo. Medidas agressivas devem ser tomadas para evitar a perda de calor corporal e para restaurar a temperatura do doente a níveis normais. A temperatura da área de reanimação deve ser aumentada para reduzir a perda de calor pelo doente. Recomenda-se a utilização de aquecedores de alto fluxo ou de fornos de micro-ondas para aquecer as soluções cristaloides a uma temperatura de 39°C (102.2°F). No entanto, os hemoderivados não devem ser aquecidos em forno de micro-ondas. (9)
10.Descrever os mecanismos de hemostasia e fibrinólise.
Hemostasia é o processo fisiológico encarregado de parar o sangramento, ao mesmo tempo em que inicia o reparo dos tecidos. Didaticamente, a hemostasia é descrita em duas etapas, mas, na verdade, ambas acontecem ao mesmo tempo no organismo: (1) Hemostasia Primária – aquela que estanca o sangramento, pela formação do trombo ou tampão plaquetário; e (2) Hemostasia Secundária – aquela que evita o ressangramento, pela formação de uma rede adesiva de fibrina que consolida o trombo (a partir daí chamado de coágulo). É preciso um delicado equilíbrio entre estímulos pró-coagulantes, anticoagulantes e fibrinolíticos. Isso quer dizer que o processo hemostático nunca é deflagrado sem oposição, pois ocorreria o fechamento da luz do vaso e isquemia! A própria cascata da coagulação ativa os sistemas anticoagulante e fibrinolítico, garantindo uma verdadeira “poda” do coágulo que limita sua extensão apenas à região de injúria. Desse modo, evita-se a trombose nos segmentos vasculares saudáveis. Tal função é centralizada pela célula endotelial, cuja participação no processo hemostático tem sido cada vez mais compreendida. 
III – HEMOSTASIA PRIMÁRIA: A formação do tampão plaquetário no sítio de injúria vascular requer a integridade de três sistemas: adesão, ativação e agregação.
III.a - Adesão Plaquetária: Quando ocorre uma lesão tecidual o endotélio dos vasos sanguíneos é rompido, expondo a “matriz subendotelial”, uma complexa rede de fibras. Das diversas fibras ali presentes, o colágeno desponta como o principal substrato para a adesão plaquetária. Até bem pouco tempo atrás se acreditava que a glicoproteína Ia/IIa (GP Ia/IIa) fosse a grande responsável pela adesão plaquetária. No entanto, foi descoberto que outra proteína – a GP VI – é muito mais importante que a GP Ia/IIa nesse processo! Além de participar do fenômeno de adesão, garantindo que a plaqueta “role” sobre a área lesada, a ligação colágeno-GP VI também transmite os primeiros sinais de ativação plaquetária (o colágeno é o mais potente agonista plaquetário, graças ao papel de “receptor” exercido pela GP VI). Mas quem faz o tampão plaque-
tário permanecer “agarrado” ao colágeno é o fator de von Willebrand. Se o fvW não existisse (ou seu receptor, a GP Ib), a força da corrente sanguínea arrastaria as plaquetas para longe do colágeno exposto (e o paciente sangraria sem parar). A adesão mediada pela GP Ia/IIa e pela GP VI, apesar de representar o primeiro contato com a matriz subendotelial, não é capaz de “segurar” as plaquetas de maneira duradoura e eficaz...
III.b - Ativação Plaquetária: As plaquetas são estimuladas pelos agonistas plaquetários – inicialmente o próprio colágeno, mas também epinefrina e trombina. O processo é uma verdadeira metamorfose, onde elas “regurgitam” membranas do sistema canalicular aberto ao mesmo tempo em que o conteúdo de seus grânulos é secretado. O consequente aumento na superfície de contato expõe receptores de adesão e agregação que antes estavam “guardados” no interior da célula. A estimulação pelos agonistas também induz a síntese de Tromboxane A2 (TxA2) pela enzima ciclo-oxigenase 1 (COX-1). O TxA2 amplifica a ativação plaquetária, fechando uma alça de retroalimentação positiva. Sua principal função é recrutar plaquetas ainda “em repouso” que estejam passando próximo à área lesada. É como se a plaqueta em repouso fosse um “ovo”, que após ser ativada assumisse a forma de um “ovo quebrado”. O primeiro não “gruda” em ninguém, mas o segundo. Assim, plaquetas circulantes que passam nas proximidades são convocadas para o trabalho! Os mediadores localmente liberados no processo de ativação (ADP, TxA2) “quebram estes ovos”, e eles vão “grudando” no tampão plaquetário em formação! Em relação à degranulação observamos o seguinte: (1) os grânulos densos liberam ADP, contribuindo para a ativação de novas plaquetas. Além disso, a serotonina liberada causa vaso constrição, o que ajuda a reduzir o sangramento; (2) os grânulos alfa secretam proteínas, algumas com o objetivo de aumentar a adesividade plaquetária enquanto outras participam diretamente da cascata de coagulação. Também citamos a secreção de fatores de crescimento, iniciando o reparo tecidual. Para visualizar melhor o complexo processo de ativação. O processo de ativação plaquetária participa diretamente da cascata de coagulação (hemostasia secundária)! Estamos nos referindo à exposição do fosfolipídio plaquetário, ou fator
III, na membrana do trombócito ativado. Esta molécula (fosfatidilserina) funciona como um “gancho” no qual vão se prender as principais enzimas da cascata de coagulação. Isso faz com
que estas reações bioquímicas se desenvolvam próximas à superfície do trombo, garantindo que
a rede de fibrina seja formada em volta dele e aumente sua estabilidade e coesão. 
III.c - Agregação Plaquetária: A formação de um trombo firme, bem aderido, e com várias camadas compactas de plaquetas, consegue “estancar” o sangramento em curto espaço de tempo! Agregação é um fenômeno mediado pela glicoproteína IIb/IIIa (GP IIb/IIIa ou integrinaalfaIIb-beta3) utilizando o fibrinogênio como “ponte” para ligar uma plaqueta à outra. Antes do processo de ativação, a GP IIb/IIIa é incapaz de ligar fibrinogênio. A ativação plaquetária promove uma alteração conformacional desses receptores, que passam a interagir fortemente com o fibrinogênio circulante, permitindo agregação e, consequentemente, a formação de um trombo mais coeso. Só pra você ter uma ideia, a superfície de uma plaqueta em repouso tem cerca de 40.000 cópias da GP IIb/IIIa inativa. Após o processo de ativação plaquetária, além destas moléculas se tornarem funcionais, seu número sobe para 80.000 (aumento de 100%). As moléculas surgem da reserva interna de membranas. Considerando que o trombócito é uma célula pequena, os números citados indicam que no estado “ativo” a superfície plaquetária tem grande poder de agregação! A doença genética está associada à redução ou disfunção da GP IIb/IIIa é a Trombastenia de Glanzmann.
IV – HEMOSTASIA SECUNDÁRIA: O sistema de coagulação é representado por um conjunto de proteínas plasmáticas, inicialmente inativas (zimogênios), as quais ativam umas às outras numa sequência determinada. Tal processo faz com que o número de moléculas ativadas aumente exponencialmente (por exemplo: um fator ativa 10 moléculas de outro fator, e cada uma dessas ativa mais 10, e assim por diante –efeito de “cascata”). Desse modo,

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