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Alice Bastos Cervicalgias É uma síndrome dolorosa que acomete a região cervical Existem várias causas: anormalidades musculoesqueléticas, neurológicas, viscerais e tegumentares e doenças sistêmicas ou em órgãos distante, incluindo os do tórax ou o segmento cefálico de natureza traumática, inflamatória, degenerativa ou neoplásica; Ocorre um aumento do número de casos de cervicalgia em decorrência de situações ocupacionais que incluem a adoção de posturas inadequadas durante períodos prolongados, a permanência em ambientes ergonomicamente insatisfatórios ou a realização de atividades exercidas sob tensão emocional, especialmente aquelas que envolvem vibração ou traumatismo de trânsito. Epidemiologia A cervicalgia ocorre em 55% da população, cerca de 12% das mulheres e 9% dos homens apresentam quadro de cervicalgia crônica; Tem maior prevalência em indivíduos idosos, em portadores de transtornos de ansiedade e nos trabalhadores braçais; Os fatores de risco incluem o trabalho repetitivo longos períodos de flexão cervical, estresse aumentado no trabalho, fumo, e traumatismos prévios do pescoço e ombros. Etiologia A cervicalgia apresenta inúmeros fatores etiológicos já bem definidos, entretanto, parcela considerável da população é diagnosticada como portadora da forma idiopática; As síndromes miofasciais são as mais prevalentes, sendo que somente cerca de 25 a 30% dos pacientes recebem um diagnóstico anatomopatológico fechado; As causas de cervicalgia podem ser: Síndrome dolorosa miofascial (mais comum); Síndrome fibromiálgica; Traumatismos; Disfunções intervertebrais; Tumores; Doenças infecciosas; Doenças endócrinas e metabólicas; Doenças inflamatórias; Neuralgias. Características clínicas As condições de cervicalgia se desenvolvem de forma gradual ou tem aparecimento pós-traumático; Os episódios recorrentes são comuns; Os sintomas clínicos associados com a dor cervical são: Dor e rigidez do pescoço; Dor de cabeça; Tonturas; Dor que se propaga aos ombros e as extremidades superiores; A dor cervical pós-traumática se associa com uma variedade mais ampla de sintomas que incluem sintomas temporomandibulares, distúrbios visuais e auditivos, distúrbios do sono, da cognição e da emoção. Avaliação do paciente com cervicalgia Anamnese Deve incluir a história da doença atual e pregressa, bem como os antecedentes familiares e os hábitos de vida; A dor deve ser avaliada, observando-se suas características, como intensidade, natureza, localização, distribuição, irradiação e fatores de melhora e de piora, entre outras; A ocorrência de febre, a inapetência, o emagrecimento e a anemia sugerem processo infeccioso ou neoplásico; Quando há piora durante a adoção do decúbito horizontal ou no período noturno, deve-se considerar a possibilidade de lesões expansivas intra-raquidianas. Alice Bastos Exame físico Deve incluir a inspeção para avaliar anormalidades neurovegetativas, posturais e tróficas, a palpação das vísceras e dos músculos cervicais para diagnosticar pontos dolorosos ou gatilhos, espasmos musculares e ocorrência de tumores, a percussão dos processos espinhosos, a movimentação ativa e passiva do pescoço para quantificar a amplitude da movimentação articular e a avaliação neurológica (sensibilidade superficial e profunda, motricidade voluntária, automática e reflexa, coordenação motora). Avaliação laboratorial Pode incluir os estudos hematológico e bioquímico para pesquisa de quadros infecciosos, inflamatórios ou neoplásicos, o exame do líquido cerebroespinal, os estudos eletrofisiológicos e os exames de imagem da região cervical (radiografia simples, ultrassom, tomografia computadorizada, ressonância magnética e cintilografia óssea); Os achados dos exames complementares devem ser sempre interpretados e valorizados em conjunto com os achados do exame clínico para se definir seu real valor na elucidação diagnóstica. Tratamento Baseia-se na eliminação da causa e no tratamento da dor, que pode ser feito com medicamentos, fisioterapia, massagens, acupuntura, psicoterapia, infiltrações e, quando necessário, procedimentos cirúrgicos; Para auxiliar no tratamento, deve-se recomendar o uso de travesseiros com altura adequada para acomodar a curvatura cervical, evitar posturas inadequadas, realizar exercícios físicos regularmente e ajustar lentes de correção visual. Referência TEIXEIRA, M. J.; YENG, L. T.; STUMP, P. R. N. A. G. Cervicalgias. In: ALVES NETO, O. et al. Dor: princípios e prática. 1. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. p. 580-588. Alice Bastos Síndrome Dolorosa Miofascial (SDM) É uma das causas mais comuns de dor musculoesquelética; É uma condição dolorosa que comete músculos, fáscias e junções ligamentares; Caracterizada pela presença de pontos de irritabilidade no músculo esquelético denominados pontos-gatilho (PG); Estes pontos se localizam em bandas tensas musculares e podem estar associados a fenômenos autonômicos, sensitivos e motores; A lesão aguda do músculo ou o esforço repetitivo são as causas mais comuns da SDM, porém, está comumente associada a outras condições dolorosas somáticas e neuropáticas; Os PG causam dor espontânea em repouso e, quando estimulados, provocam dor referida; Além da dor, muitas vezes incapacitante, a restrição da amplitude de movimento e a fadiga do músculo envolvido podem caracterizar um grande prejuízo funcional para o indivíduo. Epidemiologia É uma condição comum, particularmente nos centros de dor, em ambulatórios de ortopedia e traumatologia, fisiatria, reumatologia e neurologia; Frequentemente ocasiona dor crônica e incapacidade significantes; Ocorre em 21% a 93% dos indivíduos com queixas de dor regionalizada; A prevalência maior é observada em pessoas de 30 a 49 anos de idade; Ocorre com frequência mais elevada na região cervical, quadril, cintura escapular e na região lombar. Manifestações clínicas A dor é pobremente localizada e percebida como profunda, dolorida e em queimação; Geralmente é restrita a um quadrante do corpo e é caracterizada pela presença de PG miofasciais; A intensidade da dor é muito variável e está diretamente relacionada ao grau de atividade dos PG; Quadros de dor intensa podem levar a uma grande incapacidade funcional; O exercício físico geralmente exacerba os sintomas e nota-se diminuição da amplitude de movimento do músculo afetado; Os PG ativos podem levar ao desenvolvimento de fenômenos autonômicos como lacrimejamento, piloereção, trofoedema e extremidades frias; Além disso, podem afetar a propriocepção, acarretando desequilíbrio; Algumas alterações motoras podem ser observadas: Fraqueza; Diminuição de amplitude de movimento e da coordenação; Espasmos em outros músculos. Diagnóstico Anamnese Para o diagnóstico das SDMs, é fundamental a história detalhada sobre a condição clínica; Destacando a ocorrência ou não de sobrecargas musculoesqueléticas e posturas inadequadas adotadas durante a execução de tarefas (sono, lazer, no lar, no trabalho e em atividades esportivas); Deve-se pesquisar os antecedentes pessoais e familiares, enfatizando afecções traumáticas, inflamatórias, metabólicas, oncológicas, viscerais, neuropáticas ou musculoesqueléticas pregressas; Os fatores ergonômicos e posturais devem ser detalhadamente analisados (hábitos, características dos ambientes de trabalho, modo de dormir); A análise dos eventos biomecânicos geradores dos sintomas auxilia a identificação dos Alice Bastos músculos responsáveis pela SDM, e as assimetrias corporais observadas pelos doentes devem ser valorizadas. Exame físico Consiste, inicialmente, em solicitar ao paciente que aponte a região da dor; Realiza-se a palpaçãodo músculo com a ponta dos dedos, deslizando-os a fim de encontrar a banda tensa muscular; No meio da banda tensa exerce-se pressão com o dedo, em posição perpendicular às fibras musculares, até que o paciente refira a dor que sente normalmente; É comum que haja um movimento de retirada do membro ou região afetada, caracterizando o sinal do pulo; A compressão do ponto ou mesmo a palpação da banda tensa pode provocar a LTR (resposta contrátil local rápida); Não é necessário que se consiga detectá-la, mas quando for visualizada, tem-se a confirmação do local certo para o tratamento. De acordo com a International Association for the Study of Pain (IASP), existem 3 critérios diagnósticos mínimos (1-3) e 6 critérios diagnósticos de confirmação da SDM (4-9); 1. Presença de banda tensa palpável no musculoesquelético; 2. Presença de ponto hipersensível dentro da banda tensa muscular; 3. Reprodução da queixa de dor referida com a estimulação do ponto doloroso; 4. Presença de LTR com a palpação da banda tensa; 5. Presença do sinal do pulo (o paciente tem reação de retirada ao exame dos pontos); 6. O paciente reconhece que a sua queixa dolorosa é a mesma reproduzida no exame da palpação do PG; 7. A dor referida segue padrões de localização previsíveis; 8. Fraqueza e tensão do músculo; 9. Dor à contração ou alongamento do músculo afetado; 10. Os exames laboratoriais podem ser úteis na exclusão de doenças sistêmicas que cursam com a dor miofascial, principalmente as hepatites, o hipotireoidismo e as doenças reumatológicas; Os exames de imagem podem mostrar osteoartrite, discopatias vertebrais, compressões nervosas e outras alterações mecânicas associadas. Referência YENG, L. T. et al. Síndrome dolorosa miofascial. In: ALVES NETO, O. et al. Dor: princípios e prática. 1. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. p. 449-463. Alice Bastos Disfunções intervertebrais Decorrem da degeneração do disco intervertebral, fenômeno associado ao avanço da idade, ou de traumatismos que reduzem a capacidade amortecedora discal e causam sobrecarga do corpo vertebral, uncus vertebral e facetas articulares; Como consequência, instalam-se osteócitos reacionais ou hérnias discais; Essas anormalidades podem resultar em compressão da medula espinal ou das raízes nervosas; Hérnia de disco A hérnia de disco consiste na protrusão do núcleo pulposo através de falhas decorrentes da rotura ou anormalidades do anel fibroso; Localiza-se especialmente entre os segmentos C6-C7 e C5-C6; Raramente as protrusões discais causam sintomas; Além da degeneração, as hérnias discais cervicais podem decorrer de traumatismos. Espondilose cervical Acomete predominantemente os segmentos C4 a T1; Caracteriza-se inicialmente como desidratação do núcleo pulposo, alterações estruturais do anel fibroso e redução da distância entre os corpos vertebrais, resultando em sobrecarga das facetas articulares, rotura, desorganização cartilagínea e formação osteofitária; O material osteoartrósico pode ser constituído de núcleo pulposo com consistência elástica (discos moles) ou calcificado e osteófitos (hérnias duras); Em ambas as condições, após o quadro inicial agudo pode haver resolução completa dos sintomas; Os sintomas decorrentes da discoartrose dependem da localização da anormalidade, das dimensões do compartimento que sofre compressão e da elasticidade do tecido deformado; É muitas vezes responsabilizada pela cervicalgia, mas como é evidenciada com elevada frequência nos indivíduos assintomáticos, na ausência de compressão radicular não deve ser considerada causa de cervicalgia Quadro clínico Os movimentos cervicais, principalmente a hiperextensão, podem agravar a estenose e a compressão radicular que geram congestão e edema da raiz e dos tecidos perirradiculares, resultando em isquemia decorrente da compressão da artéria radicular; A dor geralmente instala-se insidiosamente e exacerba-se com o aumento da pressão do líquido cerebrospinal (manobra de Valsalva), com a compressão das apófises espinhosas, com o movimento brusco do pescoço, adoção de posturas inadequadas e com esforços físicos ou traumatismos; Geralmente melhora com o repouso e frequentemente associa-se a PGs (pontos gatilho) na musculatura cervical; A dor radicular irradia-se para o membro superior ou para o tórax e soma-se a parestesias no mesmo território; As anormalidades motoras são caracterizadas como fraqueza muscular associada ou não à hipoatividade dos reflexos miotáticos mediados pela raiz envolvida; Diagnóstico Os exames utilizados para diagnóstico da hérnia discal e da artrose cervical são a RM, a TC, a perimielografia e a eletroneuromiografia; Os exames devem ter seus achados validados quando compatíveis com a história e o quadro clínico dos pacientes. Tratamento O tratamento da cervicobraquialgia secundária à compressão radicular é fundamentalmente clínico e inclui o manejo da dor com AINHs, miorrelaxantes e psicotrópicos; Alice Bastos O tratamento cirúrgico é indicado quando há progressão ou ausência de melhora do quadro doloroso ou deficitário, a despeito das medidas clínicas; Em casos crônicos, o objetivo do tratamento cirúrgico é evitar a progressão do déficit neurológico e melhorar o déficit já estabelecido. Referência TEIXEIRA, M. J.; YENG, L. T.; STUMP, P. R. N. A. G. Cervicalgias. In: ALVES NETO, O. et al. Dor: princípios e prática. 1. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. p. 580-588.