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55 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Unidade II 5 PERCEPÇÃO E CRIATIVIDADE Criatividade nada mais é que dar forma a alguma coisa nova. Nos estudos teóricos sobre criatividade e percepção, a artista plástica Fayga Ostrower descreve o ato de criar como algo que vai além disso, como “a capacidade de compreender, e por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar” (OSTROWER, 2001, p. 9). Mais que possibilidades adquiridas do homem, criar seriam potencialidades que se convertem em necessidades inerentes ao ser humano, pois ele não cria apenas porque quer ou gosta, mas porque necessita ordenar e dar forma às suas percepções. O ato de criar é uma motivação latente de orientar‑se, avaliando as experiências vividas do ser humano, ou seja, o sentido das formas. A percepção é uma intuição adquirida de experiências cotidianas de nossa vida, como desejos, tristezas, medos, felicidade e uma infinidade de expressões humanas. A partir do momento em que expressamos nossas percepções no ato criativo, esse processo se torna consciente. Entretanto, mesmo que a sua elaboração permaneça em níveis subconscientes, os processos criativos teriam que se referir à consciência dos homens, pois só assim poderiam ser indagados a respeito dos possíveis significados que existem no ato criador. Entende‑se que a própria consciência nunca é algo acabado ou definitivo (OSTROWER, 2001, p. 10). O poder da consciência seria, portanto, maior que aquele dado ao subconsciente pois, apesar de também ser parte fundamental do processo criativo, a percepção consciente nunca se desliga das atividades criadoras. Nossa consciência vive em transformação, formando‑se num processo dinâmico do homem em busca da sobrevivência e na execução de seus atos. Através dessa transformação, alteramos também a natureza, e não só percebemos isso como também as transformações de nós mesmos refletidas na natureza. Lembrete Como vimos, segundo Fayga Ostrower (1920‑2001), artista plástica polonesa radicada no Brasil, a “percepção não envolve apenas um ato fisiológico, mas um processo altamente dinâmico e característico da consciência humana” (OSTROWER, 1998, p. 73). 56 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Figura 65 ‑ Fayga Ostrower Enfim, o que nos distingue como seres humanos é nossa capacidade criativa e de percepção de nós mesmos dentro do agir, ou seja, em nossa herança genética a consciência e a sensibilidade são qualidades inatas do comportamento humano. O potencial de criação do homem é a mola propulsora da evolução. Ele afeta não só o mundo físico ao qual estamos acostumados, mas também a própria condição humana e os contextos culturais. Para tanto, [...] a percepção consciente na ação humana se nos afigura como uma premissa básica da criação, pois, além de resolver situações imediatas, o homem é capaz de a elas se antecipar mentalmente (OSTROWER, 2001, p. 10). Desse modo, a percepção não prevê apenas certas soluções, mas também certos problemas. Denominamos essa situação de intencionalidade da ação humana, ou seja, nos mobilizamos de modo latente diante de uma situação hipotética e propomos uma solução para um problema. Fora da intencionalidade não há como o homem avaliar situações novas ou orientar‑se em busca de novas conexões. Assim mesmo, podemos dizer que existem critérios elaborados pelo indivíduo por meio de alternativas e escolhas em toda a criação humana. 57 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Lembrete A todo momento recolhemos informações que, a partir do nosso sistema nervoso, criam um processo de percepção das coisas visuais através da nossa estrutura interna, que independe totalmente do meio. 5.1 O ser consciente‑sensível‑cultural O indivíduo que é movido pela intencionalidade constitui um ser consciente sensível‑cultural – com os elementos ligados por hífens para chamar a atenção para o fato de que esse é um ser único, parte de elementos de um todo em que se baseia o comportamento criativo do homem. É na relação entre estes três aspectos que se fundamenta o processo criativo do ser humano. Talvez essa fusão de qualidades tenha se dado há milhares de anos, porém o que importa não é quando nem quem, mas que somente a partir dessa interação é que foi possível alcançar o verdadeiro poder criativo do homem. Enquanto muitos realçam a capacidade do inconsciente como fator indispensável à criatividade e enfatizam o consciente como um determinante negativo, repressor e anticriativo, Ostrower (2001) acredita na percepção consciente como prerrogativa do processo criador. Ela crê também que o ápice desse poder encontra‑se na aliança entre saber, conhecer, pensar e imaginar, ordenando suas qualificações. Diferenciar essas qualificações é atributo do ser sensível e consciente, qualidades inatas que fazem parte da herança genética da humanidade. No decorrer da história humanidade, a cultura assumiu as formas variáveis de convívio entre as pessoas, formas estas que alteraram com uma velocidade feroz o desenvolvimento social dos homens – velocidade, aliás, muito maior que a das alterações biológicas dos indivíduos. As alterações às quais a cultura está sujeita passam também pela extinção, pois elas não são herdadas, mas transmitidas. O que, porém, nos importa frisar é o fato de a herança genética, isto é, o potencial consciente e sensível de cada um, se realizar sempre e unicamente dentro de formas culturais. Não há, para o ser humano, um desenvolvimento biológico que possa ocorrer independente do cultural. O comportamento de cada ser humano se molda pelos padrões culturais, históricos, do grupo em que ele, indivíduo, nasce e cresce. Ainda vinculado aos mesmos padrões coletivos, ele se desenvolverá enquanto individualidade, com seu modo pessoal de agir, seus sonhos, suas aspirações e suas eventuais realizações (OSTROWER, 2001, p. 11–12). 5.2 Ser sensível A criatividade se articula potencialmente com a sensibilidade, que é a porta de entrada de nossas sensações. Em graus e áreas diferentes, não podemos afirmar que o homem, independente de ser um artista ou não, seja inerte de sensibilidade. A condição de vida recebe e reconhece estímulos e, consequentemente, reage a eles. 58 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Essa reação é, na verdade, a forma com a qual adentramos, com nossas sensações, em um mundo onde nos conectamos ao meio ambiente por meio de uma troca de energias. A maior parte dessa sensibilidade que nos empurra para dentro desse fenômeno permanece no subconsciente. É aquela parte à qual pertencem as reações involuntárias. A outra parte, por sua vez, é aquela que chega a nosso conhecimento em formato organizado, ou seja: a nossa percepção. Isso acontece a todo momento: recolhemos informações e, dependendo de nossa estrutura interna, as decodificamos através de nosso sistema nervoso. Esse é o processo de percepção das coisas visuais. O resultado, conforme vimos, é a representação. Observação Nossa estrutura interna dá condições de perceber as representações visuais, mas ela é limitada. É um processo que requer pouca energia, pois nossa máquina fisiológica é automática, dando a impressão de que toda informação obtida vem de forma natural e simples, insinuando que não há necessidade de desenvolver nossos conhecimentos de ver e visualizar. Daí a necessidade de conhecer e compreender osvários métodos e teorias da percepção, da representação e de outras áreas relevantes às artes visuais. Portanto, a percepção, que é um processo que o sistema nervoso efetua no curso de uma interação entre o cérebro e uma representação, por abranger o sentido intelectual de se organizar, é a elaboração mental das sensações: A percepção delimita o que somos capazes de sentir e compreender, porquanto corresponde a uma ordenação seletiva dos estímulos e cria uma barreira entre o que percebemos e o que não percebemos. Articula o mundo que nos atinge, o mundo que chegamos a conhecer e dentro do qual nós nos conhecemos. Articula o nosso ser dentro do não‑ser (OSTROWER, 2001, p. 13). Ao organizar esses dados sensíveis, o indivíduo estrutura seus níveis do consciente. Essa organização consciente faz com que o homem tenha compreensão com relação ao mundo, e, consequentemente, de si mesmo. A análise de uma imagem, por exemplo, talvez diga mais sobre a pessoa que a analisa do que sobre a imagem em si, o que torna o processo de análise uma espécie de autorretrato: Muitos achariam insuportável olhar para uma fotografia que retrata um olho sendo cortado em pedaços, mas a mesma imagem poderia fazer parte do dia de um açougueiro e ser pura pornografia para um assassino em potencial. Baseado nesse argumento, precisamos esperar que as imagens nos ensinem o valor de reconhecer nossos segredos e os perigos de escondê‑los (BERGSTRÖM, 2009, p. 11). 59 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Dentro dessa perspectiva, podemos ainda afirmar que, quando escolhemos uma ou outra forma estética, estamos expressando nossa personalidade. Na análise da arte‑personalidade, inconscientemente encontramos conexões entre a arte que apreciamos e as bases de nossa personalidade. Lembrete Vimos que as forças internas visam a estruturar e organizar os estímulos externos de maneira determinada através de relações que os psicólogos da Gestalt definiram como forças constantes (Leis da Gestalt). Essas constantes das forças de organização são o que os gestaltistas chamam de padrões, fatores, princípios básicos ou leis da organização da forma perceptual. São essas forças ou esses princípios que explicam por que vemos as coisas de uma maneira e não de outra (GOMES FILHO, 2004, p. 20). 5.3 Ser cultural Estudos recentes indicam que o homem surgiu na história como um ser cultural. Suas ações são baseadas a partir e/ou dentro de uma cultura. Procuramos definir aqui o que entendemos por cultura: são as formas materiais e espirituais com as quais os indivíduos de um grupo convivem, nas quais atuam e se comunicam e cuja experiência coletiva pode ser transmitida através de vias simbólicas para a geração seguinte (OSTROWER, 2001, p.13). Apesar de as formas de convivência coletiva dos primórdios da vida do homem primata serem desconhecidas, entendemos que seu comportamento era social, como observaram os arqueólogos a partir dos fósseis encontrados: mãos livres, caninos atrofiados, postura ereta, maior capacidade craniana em comparação com a dos outros primatas. Apesar de inconclusivos, vários indícios apontam a hominização do nosso ancestral. Porém, há uma prova irrefutável de que fomos seres de percepção consciente e de vida cultural: a pedra lascada. Os hominídeos pré‑humanos, uma das ramificações evolutivas que conhecemos do Homo, foram assim classificados pela realização de suas obras, ou seja, pela capacidade de manufaturar suas ferramentas (e não somente por saber usá‑las). Essa habilidade, mesmo que a partir de sociedades muito primitivas, baseia‑se no conhecimento da matéria‑prima, bem como em buscar, mesmo diante dos limites tecnológicos, eficiência no manuseio. Outra característica peculiar do ser humano é manter sua cultura utilizando as memórias passadas por meio da tradição oral. 60 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II No mais, entre as inúmeras discordâncias entre os pesquisadores, está incluída a ideia de que o Homo erectus da espécie Pitecanthropus pekinensis, que vivia há cerca de 500.000 anos em um complexo de cavernas de Choukoutien, na China, produzia instrumentos feitos de pedras lascadas e já conhecia o fogo. Figura 66 ‑ Homo erectus pekinensis, que viveu na China há 500 mil anos O H. erectus tinha o cérebro de 850 a 900 ml. O nosso tem em média 1350 ml, entretanto o dos chipanzés não ultrapassa muito 400 ml. Foram encontrados vestígios de fogueira controlada há 1,6 milhões de anos. Isso já revela um aspecto cultural importante, conhecimentos que foram passando de geração em geração, que não eram incorporados geneticamante. A cultura é característica essencialmente humana. O máximo de cultura que podem ter os chipanzés é quebrar cocos com pedras ou cutucar ocos de árvore com pau para retirar vermes. Sabe‑se que isso é cultural e não genético, porque não são todos os agrupamentos de chimpanzés que têm essa habilidade. É um conhecimento que um indivíduo adquiriu com a experiência e passou para outro, que não tinha o conhecimento intuitivamente. Se ninguém ensinar para ninguém, o conhecimento desaparece (ANDRADE, 2012, p. 53–54). 61 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Figura 67 ‑ Reconstituição da fisionomia do Homo erectus As pedras, trabalhadas de forma a não rachar em estilhaços, tinham como propósito a fabricação de armas e ferramentas, como pontas de lança, facas, cunhas, machados, arpões e quaisquer outros utensílios cortantes. Observou‑se nos vários continentes a similaridade técnica de se amarrar a pedra lascada a cabos, até o surgimento do arco e flecha, que parece coincidir com o advento do cachorro domesticado para a caça. Figura 68 ‑ Artefatos de pedra usados pelo Homo erectus O surgimento do hominídeo como ser cultural foi uma clara vantagem biológica na nossa linha evolutiva. A própria seleção natural favoreceu os primatas que souberam utilizar a cultura em proveito próprio. 62 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II 5.4 Ser consciente A partir do momento em que o homem se deu conta de sua existência individual, se conscientizou de seu papel social. O modo de sentir e de pensar os fenômenos, o próprio modo de pensar‑se e sentir‑se, de vivenciar as aspirações, os possíveis êxitos e eventuais insucessos, tudo se molda segundo ideias e hábitos particulares ao contexto social em que se desenvolve o indivíduo. Os valores culturais vigentes constituem o clima mental para o seu agir. Criam as referências, discriminam as propostas, pois, conquanto os objetivos possam ser de caráter estritamente pessoal, neles se elaboram possibilidades culturais. Representando a individualidade subjetiva de cada um, a consciência representa sua cultura (OSTROWER, 2001, p.16). O ser consciente é aquele que percebe e interroga a si mesmo e, consequentemente, é induzido a interpretar todos os fenômenos. Isso significa que o fator cultural vai além do natural, ou seja, a natureza se manifesta filtrando no consciente os valores culturais. Por exemplo: o Sol, venerado como divindade no Egito Antigo, era representado como renascendo todas as manhãs e “percorrendo os céus em seu barco diurno para, no fim do dia, sucumbir às forças da escuridão, num drama da natureza no qual o homem se envolve emocionalmente” (OSTROWER, 2001, p. 16). Na civilização moderna, pudemos afirmar que o Sol é apenas um entre250 bilhões de astros apenas em nossa galáxia, e pudemos dizer também que essa mesma galáxia é apenas uma entre bilhões de outras existentes neste universo. Ainda no contexto moderno, podemos enxergar possibilidades de o Sol nos fornecer energia, mas, no contexto vivido na Idade Média, ele era representado muitas vezes como uma grande coroa faiscante – “essas visões diferentes de um mesmo fenômeno natural [figuras a seguir] são também as diversas formas expressivas por que o fenômeno chega ao consciente dos indivíduos. As formas não ocorrem independentes ou desvinculadas de colocações culturais” (OSTROWER, 2001, p.16). Figura 69 Figura 70 63 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Figura 71 Figura 72 A influência subjetiva que a cultura exerce no processo de conscientização do homem serve de norte aos seus interesses e profundas aspirações, bem como às possíveis necessidades de afirmação como ser social. Podemos, portanto, afirmar que a cultura norteia o ser sensível e o ser consciente. Consequentemente, ela vem estruturar a sensibilidade do indivíduo, guiando‑o em suas ações e em sua imaginação. A sensibilidade orienta o homem quando ele exerce suas considerações para definir metas: ela se vincula ao ser consciente para estabelecer uma intenção, uma ação, e, ao mesmo tempo, se estrutura culturalmente na busca de significados. Esse processo transforma a sensibilidade: Torna‑se ela mesma faculdade criativa, pois incorpora um princípio configurador seletivo. Nessa integração que se dá de potencialidades individuais com possibilidades culturais, a criatividade não seria então senão a própria sensibilidade. O criativo do homem se daria no nível do sensível (OSTROWER, 2001, p. 17). Portanto, a sensibilidade é, inclusive, um fenômeno social, pois, ao juntar‑se intimamente com uma significativa ocupação social, se converte em criatividade. Focando simultaneamente esse processo no âmbito entre o consciente, a cultura e a sensibilidade, todas as atividades adquirem a capacidade de se tornar um “criar”. 6 MEMÓRIA E REPRESENTAÇÃO O desempenho da memória tem papel de destaque em nosso consciente, principalmente por ser responsável por interligar o ontem e o amanhã, algo que não acontece aos animais. Certas memórias podem ser ignoradas, retidas, guardadas ou reformuladas, dependendo de suas intenções presentes e futuras. O homem se estrutura através de lembranças, que o orientam em seu dia a dia. As intenções se estruturam junto com a memória. São importantes para o “criar”. Nem sempre serão conscientes nem, necessariamente, precisam equacionar‑se com objetivos imediatos. Fazem‑se conhecer, no curso das 64 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II ações, como uma espécie de guia aceitando ou rejeitando certas opções e sugestões contidas no ambiente. Às vezes, descobrimos as nossas intenções só depois de realizada a ação (OSTROWER, 2001, p. 18). Evocar o passado e projetando‑o no futuro, a memória é como um instrumento desenvolvido pelo homem a fim de, em vários momentos de sua vida, poder associar experiências vividas às futuras. O espaço mnemônico representa uma extraordinária ampliação de espaço físico e natural, capaz de criar sempre uma nova geografia ambiental multidirecional, ou, por que não dizer, hipertextual. Nessa rede, outros ilimitados nós se incorporarão ainda, pois a característica do poder da imaginação do homem é ilimitada – e nossa mente, hipertextual. Dessa forma, ao associar experiências e informações, o homem desenvolve uma interpretação simultânea de linguagens simbólicas. A consciência se amplia para as mais complexas formas de inteligência associativa, empreendendo seus voos através de espaços em crescente desdobramento, pelos múltiplos e concomitantes passados–presentes–futuros que se mobilizam em cada uma de nossas vivências (OSTROWER, 2001, p. 19). Conjectura‑se que os procedimentos de memória se fundamentam na intensificação de certos argumentos e não em fatos isolados, não obstante os fatos possam ser rememorados, principalmente aqueles que envolvem situações emocionais, como medo, tristeza, alegria etc. A memória é uma reserva de dados interligados de conteúdos experimentais da vida conectados entre si, ordenando nossas ações futuras e vivências do passado. “De fato, se não houvesse essa possibilidade de ordenação, se viessem anarquicamente à tona todos os dados da memória, seria impossível pensarmos ou estabelecermos qualquer tipo de relacionamento. Seria impossível funcionarmos mentalmente” (OSTROWER, 2001, p. 19): Além de renovar um conteúdo anterior, cada instante relembrado constitui uma situação em si nova e específica. Haveria de incorporar‑se ao conteúdo geral da memória e, ao despertá‑lo, cada vez o modificaria, se modificaria em repercussões, redelineando‑lhes novos contornos com nova carga vivencial (OSTROWER, 2001, p. 19). Segundo o filósofo francês Pierre Lévy, em seu estudo sobre a psicologia cognitiva (1993), existem dois tipos de memória: a de curto e a de longo prazo. Enquanto a memória de curto prazo mobiliza a atenção e a repetição, a de longo prazo se utiliza de associações para reter uma nova informação, ou seja, constrói uma representação desta informação como estratégia de codificação para ativar a memória. Observação Estratégia de codificação é a maneira pela qual a pessoa constrói uma representação do fato que deseja lembrar (LÉVY, 1993). 65 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Além da implicação emocional e do conteúdo informacional, o desempenho mnemônico dependerá, principalmente, do número de conexões com outros nós da rede de associações, efeito que causa um maior número de caminhos. O fato é que o cérebro desenvolve um hipertexto como estratégia de memorizar fatos importantes. Observação Tecnicamente, um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos. Os itens de informação não são ligados linearmente, como em uma corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria, estende suas conexões em estrela, de modo reticular (LÉVY, 1993, p. 33). O estudo de Levy (1993) permite entender como sociedades primitivas, que não se utilizam de equipamentos de armazenamento e recuperação (tecnologias cognitivas como a escrita, o cinema, o computador, entre outros exemplos), sobrevivem e codificam seus conhecimentos. Sem técnicas de fixação, essas sociedades compostas apenas por memórias humanas possuem, portanto, a experiência da memória em longo prazo, que se desenvolve a partir de mnemotécnicas como dramatizações, personalizações e artifícios narrativos diversos. Lévy (1993) afirma, sobre o tema, que: As representações que têm mais chances de sobreviver em um ambiente composto quase unicamente por memórias humanas são aquelas que estão codificadas em narrativas dramáticas, agradáveis de serem ouvidas, trazendo uma forte carga emotiva e acompanhadas de música e rituais diversos. Os membros das sociedades sem escrita (e portanto sem escola) não são, portanto, “irracionais” porque creem em mitos. Simplesmente utilizam as melhores estratégias de codificação que estão à sua disposição, exatamente como nós fazemos (LÉVY, 1993, p. 83). Vindo de encontro ao pensamento de Lévy, um dos maiores filósofos da comunicação, o canadense Marshall McLuhan (1911–1980), descreve as sociedades fundadas sobrea palavra oral como aquelas que se expressam a partir de sua experiência subjetiva do mundo, fator que aproxima os homens, principalmente pelo limite espacial da audibilidade da voz e pelo limite temporal causado pela curta distância percorrida pela palavra. Isso significa que a palavra oral permaneceria apenas na memória coletiva, mas, devido a essas características, os ouvintes tenderiam a se manter próximos, geralmente ligados por traços familiares, tribais ou de cidadania. 66 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Figura 73 ‑ Marshall McLuhan Segundo McLuhan (1977), a riqueza de culturas assim poderia vir a ser resgatada somente pelo homem da cultura eletrônica. O autor afirma ainda que, se buscássemos subsídios na atualidade para justificar essa tese, poderíamos sugerir que a perspectiva de Aldeia Global finalmente se concretizaria por meio das novas tecnologias da informação e comunicação, surgindo como o estopim que realmente romperia a uniformidade lógica da racionalidade imposta pelo homem da cultura escrita, ou seja, causando a verdadeira ruptura da Galáxia de Gutenberg. Essa retribalização surgiria como propagadora de aproximação social, permitindo, semelhantemente à cultura oral, a sinestesia entre os sentidos, sem, no entanto, limitar‑se às fronteiras de tempo e espaço – características próprias do ambiente descentralizado e atemporal das redes da internet. Em suma, surgiria como uma nova forma de comunicação social. Saiba mais O livro As Tecnologias da Inteligência, obra do filósofo francês Pierre Lévy, pode propiciar uma inter‑relação com o conteúdo da unidade no que diz respeito à cultura virtual contemporânea e inteligência coletiva: LÉVY, P. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. 67 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO 6.1 Associações e formas simbólicas As associações provenientes de áreas profundas de nosso inconsciente ordenam o mundo de nosso poder imaginativo. Espontâneas, elas convergem com rapidez tão admirável, que são quase imperceptíveis para o consciente avaliar. As experiências vividas, com a carga de todo o sentimento e emoção que existe na complexidade humana, são descontroladas a nossa percepção imediata. Embora as associações nos venham com tanta insistência que talvez possam tender para o difuso, estabelecem‑se determinadas combinações, interligando‑se ideias e sentimentos. De pronto as reconhecemos como nossas, como sendo de ordem pessoal. Sentimos que, por mais inesperadas que sejam, as constelações associativas condizem com o que, individualmente, seria um padrão de comportamento específico nosso face a ocorrências que nos envolvam (OSTROWER, 1998, p. 20). Não há coincidência ao associar, mas coerência. As associações direcionam nossas percepções para um mundo fantástico, não no sentido ilusório, mas na busca de experimentos criativos, imaginativos e hipotéticos, dando amplitude ao nosso poder de imaginação e reação, mesmo que no campo mental. E, a partir dessa potencialização perceptiva, anseios e expectativas são também ampliadas em nossa mente, influenciando nosso desejo de criar. Nossa capacidade de expressar a percepção vem de formas simbólicas de comunicação, como a fala, mas aquela que se encontra na essência da criação é nossa capacidade de expressar por meio de nossas ordenações, ou seja, pelas formas. “Se a fala representa um modo de ordenar, o comportamento também é ordenação. A pintura é ordenação, a arquitetura, a música, a dança, ou qualquer outra prática significante” (OSTROWER, 1998, p. 24). A finalidade das ordenações é, portanto, o conteúdo expressivo, seja ele a pintura, a arquitetura, o diálogo ou qualquer outra forma significativa de expressão. A partir do momento em que toma aspectos de espaço e tempo, a mensagem adquire qualidade de formas simbólicas, como define Ostrower: [Formas simbólicas] são configurações de uma matéria física ou psíquica (configurações artísticas ou não artísticas, científicas, técnicas, comportamentais) em que se encontram articulados aspectos espaciais e temporais (OSTROWER, 1998, p. 25). Perceber as formas simbólicas significa perceber circunstâncias dinâmicas do nosso ser. Encadeamentos rítmicos de forças, desequilíbrios e equilíbrios emocionais, tristeza, marasmo, alegria, placidez, inquietude, ansiedade etc. são movimentos interiores por meio dos quais analisamos nossa percepção sobre nós mesmos. Essa avaliação de nossa experiência de vida é o modo de configurarmos essa percepção e tomarmos consciência dela. Essa movimentação é, portanto, um processo afetivo, a força motriz para concretizar a expressão ordenada da forma simbólica, são as nossas formas psíquicas vinculadas ao ato criativo, junto às ordenações externas. Podemos falar com emoção, mas também sobre nossas emoções. Consequentemente, nos distanciamos de nós mesmos e, imaginativamente, colocamo‑nos no lugar de outros. 68 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II 6.2 O potencial criador e a tensão psíquica do ato Todo ato criativo consolida certas possibilidades, que se tornam reais, e exclui outras (mesmo que sejam apenas supostas possibilidades). “É nesse sentido, mas só e unicamente nesse, que, no formar, todo construir é um destruir” (OSTROWER, 1998, p. 26). O que se ordena se cria, e o resto se exclui. É um processo dinâmico, pois a cada decisão (de ordenar as possibilidades) configura‑se um processo de transformação, recriando o impulso e uma nova abertura de possibilidades. O potencial criador elabora‑se nos múltiplos níveis do ser sensível‑cultural‑consciente do homem, e se faz presente nos múltiplos caminhos em que o homem procura captar e configurar as realidades da vida. Os caminhos podem cristalizar‑se e as vivências podem integrar‑se em formas de comunicação, em ordenações concluídas, mas a criatividade como potência se refaz sempre. A produtividade do homem, em vez de se esgotar, liberando‑se, se amplia (OSTROWER, 1998, p. 27). A criatividade, como a entendemos, implica uma energia que se abastece de seu próprio poder criador. Essa força, como qualquer outra oriunda da ação humana, gera uma tensão, que chamaremos de “tensão psíquica”, tendo em vista a percepção consciente da criatividade ser um fenômeno psicológico. Cada processo criativo motiva um estado de tensão, mas entendemos que esse estado não é excepcional, levando em conta que o ato de criar – ou seja, de ordenar e interpretar – parte de uma motivação interna do homem: A tensão psíquica pode e deve ser elaborada. Assim, nos processos criativos, o essencial será poder concentrar‑se e poder manter a tensão psíquica, não simplesmente descarregá‑la. Criar significa poder sempre recuperar a tensão, renová‑la em níveis que sejam suficientes para garantir a vitalidade tanto da própria ação, como dos fenômenos configurados. Embora exista no ato criador uma descarga emocional, ela representa um momento de libertação de energias – necessário, mas de somenos importância do que certos teóricos talvez acreditem que ele seja (OSTROWER, 1998, p. 28). A potência que se descarrega é menos valiosa do que a gratificação do ato criador ao indivíduo. Ela, todavia, se renova a cada produtividade, como uma recompensa vital em criar uma nova realidade (e não substituí‑la). Esta realidade emana de maior mais complexo estado de consciência e, no cerne de uma busca de realização de crescimento interior. A tensão psíquica pode ser avaliada, portanto, como conflito emocional do homem:“não há crescimento sem conflito – conflito é condição de crescimento” (OSTROWER, 1998, p. 28), mas ela não é regra nem causa do ato criador. 69 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Alguns indivíduos se organizam quase que exclusivamente a partir da tensão psíquica pela inclinação divergente de sua existência afetiva, e o conflito torna‑se determinante do ato de criar, bloqueando sua potencialidade. O conflito pode ser capaz de impedir sua capacidade de criar e talvez até mesmo a de viver. Esse problema foi observado em muitos escritores e artistas famosos, cujo conflito emocional foi determinante na criação de suas obras. Podemos citar Proust, Van Gogh, Gauguin, Munch e Kafka como alguns que constituíram grande parte de sua expressão artística a partir de tensões psíquicas, de maneira mais ou menos velada. Figura 74 ‑ Van Gogh – O quarto (1853–1890). Óleo sobre tela Figura 75 ‑ Van Gogh – Os girassóis (1853–1890). Óleo sobre tela 70 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Figura 76 ‑ Edvard Munch – O grito (1863–1944). Litografia O conflito não pode, portanto, ser o mensageiro do ato de criar. De fato, ele deve indicar ocasionalmente o assunto ou conteúdo significativo da obra ou mesmo influenciar a preferência dos métodos e formas, mesmo que inconscientemente. “O quanto existe de elaboração visível na obra artística nos indica exatamente a medida de controle que o artista ainda pôde exercer sobre seu conflito (em Van Gogh, por exemplo, isso fica patente)” (OSTROWER, 1998, p. 29). Franz Kafka e o horror à burocracia Franz Kafka, falecido aos 40 anos em 3 de junho de 1924, no Sanatório de Keerling, perto de Viena, sem dúvida alguma foi um dos mais enigmáticos escritores do começo do século XX. Sua narrativa – de raiz expressionista – assemelha‑se a um mosaico no qual as partes parecem não se afinar, como se se colocasse um quadro após o outro sem que houvesse uma ligação entre eles. O que os une é um tema oculto que paira impassível e impune sobre tudo: o poder da burocracia. Força anônima que impera. O escritor tcheco de língua alemã consagrou‑se, entre tantas outras coisas, como um dos primeiros literatos denunciadores da poderosa e quase invisível máquina de moer seres humanos que, ao longo do século XX, passou a controlar tanto as sociedades do Ocidente como as do Oriente. [...] Fonte: Schilling (2013). 71 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Saiba mais O livro A Metamorfose, escrito por Franz Kafka em 1912, aos 29 anos, e considerada uma das obras mais importantes da história da literatura, pode propiciar uma inter‑relação com o conteúdo da unidade: KAFKA, F. A metamorfose. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. As relações, as habilidades e os interesses pessoais, inerências do indivíduo, são, portanto, as configurações mais importantes que cada um sente em si para determinar em que limites e campos pode caminhar no desenvolvimento de seu potencial criador. E essa proposta da busca da potencialidade existe dentro de nossa própria motivação! 7 PERCEPÇÃO E COMPLEXIDADE NO FENÔMENO FOTOGRÁFICO O pensamento complexo, responsável por religar os saberes dispersos, pela construção de novas aprendizagens e pela quebra de paradigmas promove as inter‑relações das partes entre si e delas com a totalidade, simultaneamente. O entendimento do pensamento complexo propõe a superação da fragmentação dos saberes. A imagem fotográfica possibilita conhecer os fenômenos que permitem compreender as estruturas do real. É preciso, pois, vivenciar experiências que construam e desconstruam o imaginário, modificando o comportamento e as relações com o meio. Os processos perceptivos são o estopim dessa transformação que é, por sua vez, a ponta do iceberg de um processo mais amplo e complexo: a cognição. É necessário, portanto, que se reconheça a profunda importância da fotografia como elemento deflagrador dos vários processos existentes na produção artística, cultural e científica. Seria relevante um estudo que privilegiasse a complexidade do real pela fotografia do ponto de vista estético‑educacional, para além dos espaços reservados a esse fim, na medida em que se almeja refletir sobre o paradigma vigente, apontando para um campo imagético que revele e esconda a natureza complexa do que é tecido em conjunto. A percepção é componente imprescindível para que se possa reconhecer os componentes do processo fotográfico e suas vertentes. 7.1 Componentes que constituem o processo fotográfico O fenômeno do “ato” do registro fotográfico é analisado por Kossoy (1989) como um processo no qual uma fotografia tem sua origem num determinado momento histórico. 72 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II A análise desse processo encontra subsídios no pensamento complexo ao detectar os componentes que sintetizam esse fenômeno, ou seja, os elementos constitutivos para a realização da fotografia: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia; as coordenadas de situação: espaço e tempo; e o produto final: a fotografia, como aponta Kossoy (1989, p. 24). Assim, definimos da seguinte forma: • Os elementos constitutivos: — assunto: tema escolhido, fragmento do mundo exterior (natural, social etc.); — fotógrafo: autor do registro, agente e personagem do processo; — tecnologia: materiais fotossensíveis, equipamentos e técnicas empregados para a obtenção do registro diretamente pela ação da luz. • As coordenadas de situação: — espaço: geográfico, local onde se deu o registro; — tempo: cronológico, época, data, momento em que se deu o registro. • E o produto final: — fotografia: imagem, registro visual fixo de um fragmento do mundo exterior, conjunto dos elementos icônicos que compõem o conteúdo e seu respectivo suporte. Os componentes analisados por Kossoy (1989), que constituem partes do processo do registro fotográfico, são interligados e unos em sua ocorrência: “sua unicidade será sua condição” (KOSSOY, 1989, p. 24). A individualidade do fenômeno é resultante do sujeito/fotógrafo e sua ação, por sua vez, decorrente de um determinado tempo/espaço e das tecnologias de sua época. A seguir trazemos a análise de uma imagem segundo os elementos constitutivos para a realização da fotografia e as coordenadas de situação: Figura 77 ‑ Basílica do Sagrado Coração de Montmartre, Paris (2010) 73 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Elementos constitutivos: • assunto: fotografia de igreja; • fotógrafo: Nan Huminhick; • tecnologia: câmera digital Sony Cyber Shot 6 mega pixels. Coordenadas de situação: • espaço: Paris, França – Bairro de Montmartre; • tempo: 16 de outubro de 2010, às 12 horas e 34 minutos. Produto final: • fotografia: imagem da Basílica do Sagrado Coração de Montmartre, vista de baixo para cima, com fiéis e turistas na parte inferior da imagem. Interpretar a imagem através das coordenadas de situação tempo/espaço possibilita desacelerar o olhar a fim de perceber, em cada detalhe, o poder narrativo de uma realidade passada, que revela informações e transmite emoções, alimentando a existência humana. Além disso, esse exercício de interpretação possibilita também a contradição de desfocar o olhar do outro para deixar‑se conhecer, acionandomecanismos que vão além das emoções, desejos, técnica ou recomposição. Saiba mais Sugerimos a leitura do livro: PETRAGLIA, I. C. Edgar Morin: a educação e a complexidade do ser e do saber. 10. ed. rev. e ampl. Petrópolis: Vozes, 2008. 7.2 A natureza complexa da fotografia A complexidade do processo fotográfico busca ainda a análise dos aspectos que configuram o todo, ou seja, o resultado que, influenciado pelo autor através de um complexo processo cultural, estético e técnico, exerce o papel de filtro cultural. Como agente e personagem do processo, o autor do registro fotográfico faz parte dessa teia de influências, desenvolvendo infinitos fatores que servirão como alicerces para reflexões interpretativas e para estudos iconográficos. A iconologia, ao absorver mecanismos técnicos que condicionam a interpretação (fotometria, foco, tecnologia etc.), abre espaço para a criação de novas soluções, alicerces para novas reflexões interpretativas que são influenciadas por contextos sociais, econômicos, políticos, religiosos e estéticos do interpretador. 74 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Segundo Morin (2003, p. 14): Existe complexidade, de fato, quando os componentes que constituem um todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico) são inseparáveis e existe um tecido interdependente, interativo e inter‑retroativo entre as partes e o todo, o todo e as partes. Nesse contexto, entendemos que o pensamento complexo cria uma trama comum e que enreda um tecido infindável de significados e sujeitos. O ato fotográfico deriva de uma ação que tece em conjunto fatores fragmentados de sua produção. A construção da interpretação da imagem oferece, portanto, múltiplas interpretações ao desalinhar esse tecido. Observação O significado etimológico da palavra iconografia provém do grego eikon, que significa imagem, e graphia, que significa escrita, ou seja, “escrita da imagem”. Iconologia, cujo prefixo é o mesmo, difere pelo significado do sufixo logia, logos, ou pensamento, ou seja, “pensamento da imagem”, que indica a ideia de análise em sentido mais profundo. Kossoy (2002, p. 135) busca, na iconologia complexa, o desafio de decifrar os diversos “elos perdidos da cadeia de fatos” da imagem fotográfica, ultrapassando o plano iconográfico. Para o autor: Poderemos quiçá decifrar olhares e gestos, compreender o entorno, decifrar o ausente. Na tentativa de “descongelarmos” o documento poderemos, talvez, devolver aos cenários e personagens sua anima, ainda que seja por um instante. Poderemos, por fim, intuir sobre seus significados ocultos. O imaterial, que afinal é o que dá sentido à vida que se busca resgatar e compreender, pertence ao domínio da imaginação e dos sentimentos (KOSSOY, 2002, p. 135). Para o autor, decifrar o enigma da natureza complexa da fotografia é o ponto de chegada da desmontagem do signo fotográfico. Esse desafio só é possível quando se compreende a importância da imaginação e dos sentimentos que operam juntos na tarefa de reconstruir a face ausente da imagem, situando‑se no nível iconológico, como se fosse o iconográfico carregado de sentidos. Kossoy (1989) considera essa interpretação uma viagem na trajetória histórica da imagem, classificando três estágios que marcam sua existência. Primeiro, há uma intenção do registro fotográfico, que parte ou não do próprio fotógrafo. Daí parte o ato do registro dando origem à materialização da fotografia. Finalmente, o terceiro estágio refere‑se aos caminhos que o artefato fotográfico percorreu, como afirma o próprio Kossoy: [...] as vicissitudes por que passou, as mãos que a dedicaram, os olhos que a viram, as emoções que despertou, os porta‑retratos que a emolduraram, os 75 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO álbuns que a guardaram, os porões e sótãos que a enterraram, as mãos que a salvaram (KOSSOY, 1989, p. 29). A iconologia, centrada no indivíduo que interpreta sua própria história, é capaz de conduzir o sujeito à reflexão sobre o significado da fotografia na condição humana, pois percebe o decorrer do tempo e a noção real do passado, reconstituindo a trajetória de toda uma vida. É diante dos álbuns de fotografias, por exemplo, que o indivíduo reconstrói a trama de acontecimentos na qual foi personagem em outras épocas e lugares, como fragmentos interrompidos da vida. A partir desta reflexão, recorremos novamente a Morin, que explica que o ato de se observar não congela sua condição de sujeito por tornar‑se objeto, mas desdobra‑se em dois: aquele que observa e o que é observado. Foi a partir dessa aptidão que o indivíduo humano tomou consciência de si, objetivando‑se no seu “duplo”, pois o espírito humano pôde se autoexaminar, praticar a introspecção, a autoanálise, o diálogo consigo mesmo (MORIN, 2001, p. 80). Essa aptidão de objetivação e a ideia do duplo advinda de Morin parte do pressuposto de interação entre dois tipos de consciência: uma objetiva e outra subjetiva. Essa dupla consciência ora se esclarece, ora se esconde, mas se apresenta como uma união complementar e antagônica. Mesmo assim, a consciência objetiva não anula a consciência subjetiva. Observação O duplo, para Morin, “é efetivamente essa imagem fundamental do homem, anterior à íntima consciência de si próprio, imagem reconhecida no reflexo ou na sombra, projetada no sonho, na alucinação, assim como na representação pintada ou esculpida, imagem fetichizada e magnificada nas crenças duma outra vida, nos cultos e nas religiões” (MORIN, 1997, p. 44). 8 REAL E IMAGINÁRIO NA PERCEPÇÃO IMAGÉTICA Morin (2001) afirma que a relação dual subjetiva e objetiva do ser humano projeta‑se a partir da confusão gerada entre o real e o imaginário. Para conceber não apenas a distinção, a oposição e a concorrência entre ambos, mas também a unidade complexa e a complementaridade, ele propõe a quebra de paradigmas que reduz, disjunta e simplifica conceitos heterogêneos ou antagônicos. O autor entende ainda que a imagem é a “placa‑giratória” entre o real e o imaginário e, sob essa perspectiva, concebe sua realidade paradoxal de imagem‑reflexo: o “duplo”. Como “A riqueza da fotografia reside, de fato, no que nela não existe, mas que nela é projetado e fixado por nós” (MORIN, 1997, p. 41), o que realmente se projeta na fotografia, segundo o autor, não é a realidade, mas um retrato dela. A imagem revelaria, na verdade, uma qualidade que o original não possui, ou seja, uma qualidade do duplo. 76 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Nesse contexto, Kossoy (2002) analisa a imagem fotográfica como um motor que aciona nossa imaginação para dentro de um mundo de representação do indivíduo, ultrapassando, em sua mente repleta de fantasias, ambições, conhecimentos e ansiedades, a realidade pura registrada nas imagens. Esse processo de construção de realidades está em conflito com a realidade objetiva e material da fotografia. Há uma realidade que se vê e outra que se imagina. Para o autor: É o confronto entre a realidade que se vê: a segunda realidade (a que se inscreve no documento, a representação) – através de nossos filtros culturais, estético/ideológicos – e a realidade que se imagina: a primeira realidade (a do fato passado), recuperado apenas de maneira fragmentada por referências (pleno de hiatos) ou pelas lembranças pessoais (emocionais) (KOSSOY, 2002, p. 46–47). Kossoy (2002) denomina “tensão perpétua” esse conflito constante entre o visível e o invisível,e entende que domina o espírito do receptor quando este constrói realidades e ficções diante da fotografia por determinação de suas imagens mentais. A ficção, ou irrealidade imaginária, segundo Morin (1997, p. 189), possui uma camada muito fina da imagem objetiva, mas também pode envolvê‑la por uma realidade extraordinariamente fantástica. Tudo depende da resistência (ou intransigência) do real em relação ao imaginário que o ser humano emana. No que diz respeito às subjetivas tendências dominantes da ficção, Kossoy afirma: A fantasia mental desloca o real em conformidade com a visão de mundo do autor da representação e do observador que a interpreta segundo seu repertório cultural particular. O que é real para uns é pura ficção para outros (KOSSOY, 2002, p. 140). A realidade da fotografia não busca no registro da aparência fotográfica sua verdadeira realidade. As realidades que envolvem a trama fotográfica, por serem múltiplas, possibilitam diferentes interpretações, leituras, montagens, vindo a confirmar sua natureza ficcional. Portanto, já que a fotografia não é sinônimo da realidade, provoca, em cada indivíduo, um impacto, uma realidade, uma trama diferente. A ficção que transborda do receptor pode, então, vir a substituir o real, o que Kossoy (2002) afirma ser um desejo de legitimar um ideário. Desse modo, a fantasia passa a tomar formas concretas quando o indivíduo transfere seus desejos ao objeto que reflete o seu ego: a fotografia torna‑se testemunha de uma ficção provocada pelo processo de construção de outra realidade. Esse estado de alucinação é incorporado, segundo o autor, à sua própria imagem, que deixa de ser representação e assume uma ilusão de presença. 77 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Para Morin (1997, p. 42), “pode, pois, haver um aperfeiçoamento subjetivo a partir de uma simples representação objetiva”, ou seja, uma imagem pode possuir as objetividades da vida real ou até mesmo qualidades que esta não possui. Isso se deve à exterioridade material da imagem que, ao mesmo tempo que valoriza a subjetividade, aumenta sua própria verdade objetiva. Morin (op. cit.) denomina esse estado de alucinação objectividade‑subjectividade extrema, que é a luta travada entre o homem e a erosão do tempo fixada na imagem. Observação Segundo o dicionário Houaiss (HOUAISS, VILLAR, 2009, p. 1779): Subjetividade s.f. (1874) 1 Característica do que é subjetivo. 2 Domínio do que é subjetivo. 3 FIL Realidade psíquica, emocional e cognitiva do ser humano, passível de manifestar‑se simultaneamente nos âmbitos individual e coletivo, e comprometida com a apropriação intelectual dos objetos externos. Enfim, o que Kossoy (1989) chama de “ilusão de presença”, para Morin (1997, p. 45) é a manifestação do “duplo”, no qual o homem é capaz de fixar a ambição fundamental da sua morte: a imortalidade. Na imagem o homem, portanto, projeta seu duplo, reflexo que se manifesta a partir da confusão entre o real e o imaginário, como um esboço fantástico de seu superego e de seu próprio ego. Narciso é o mito que mais representa esse estado de alucinação porque, querendo ver na sua imagem um caráter puramente objetivo, foi absorvido por toda a sua subjetividade nesse ato de objetivação, ao ser representado. A imagem adquire uma realidade absoluta diante das aspirações e terrores do indivíduo e pode ser tão grande essa projeção, que o duplo liberta‑se da carne e torna‑se espectro, transformando‑se em deus. O homem, enfim, pode então realizar seu maior anseio e tornar‑se detentor da imortalidade. 8.1 A objetivação diante da imagem Conta a história do mito de Narciso da mitologia greco‑romana que um dia o herói chegou muito cansado da caça e debruçou‑se às margens de uma fonte para se refrescar. Ao ver a própria imagem refletida na água, surpreendeu‑se com sua beleza e, vaidoso que estava, pensou que ali vivesse um belo espírito. Narciso não se reconheceu na própria imagem, e essa passagem é aludida na música Sampa, de Caetano Veloso: “Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto / Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto / É que Narciso acha feio o que não é espelho” (VELOSO, 2005). 78 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Veja a letra da música na íntegra: Sampa Caetano Veloso Alguma coisa acontece no meu coração Que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São João É que quando eu cheguei por aqui eu nada entendi Da dura poesia concreta de tuas esquinas Da deselegância discreta de tuas meninas Ainda não havia para mim, Rita Lee A tua mais completa tradução Alguma coisa acontece no meu coração Que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São João Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto É que Narciso acha feio o que não é espelho E à mente apavora o que ainda não é mesmo velho Nada do que não era antes quando não somos Mutantes E foste um difícil começo Afasta o que não conheço E quem vem de outro sonho feliz de cidade Aprende depressa a chamar‑te de realidade Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas Da força da grana que ergue e destrói coisas belas Da feia fumaça que sobe, apagando as estrelas Eu vejo surgir teus poetas de campos, espaços Tuas oficinas de florestas, teus deuses da chuva Pan‑Américas de Áfricas utópicas, túmulo do samba Mais possível novo quilombo de Zumbi E os Novos Baianos passeiam na tua garoa E novos baianos te podem curtir numa boa Fonte: Veloso (2005). 79 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Figura 78 ‑ Caravaggio – Narciso (1594‑1596). Óleo sobre tela O mito de Narciso representa o estado de alucinação porque, ao querer ver em sua imagem um caráter puramente objetivo, o sujeito é absorvido por sua subjetividade no ato de objetivação. O mesmo acontece com a imagem projetada na fotografia, como o nosso duplo, que muitas vezes não reconhecemos. Como afirma Morin (1997, p. 41): “a riqueza da fotografia reside, de fato, no que nela não existe, mas que nela é projetado e fixado por nós”. A imagem adquire uma realidade absoluta diante das aspirações e terrores do indivíduo. Pode ser, de fato, tão grande essa projeção, que o duplo liberta‑se da carne e torna‑se espectro, transformando‑se em deus. O homem, então, pode realizar o seu maior anseio e tornar‑se detentor da imortalidade. É a partir dessa comunhão entre realidade e imaginação que o reflexo do humano se manifesta: uma ausência passa a possuí‑lo. A fotografia registra também a subjetividade humana e é por meio dela, portanto, que o sujeito pode se olhar, se admirar e se amar. É a partir desta comunhão entre o real e o imaginário que o reflexo do homem se manifesta, como uma ausência que passa a possuí‑lo. A fotografia registra o subjetivo das pessoas. É por meio dela, portanto, que o homem pode se olhar, se amar e se retratar. Essa objetivação é a capacidade do sujeito de se ver como objeto, o ego, sem anular sua condição de sujeito, o eu. A aptidão de objetivar‑se é importante para a construção da identidade humana, pois implica o desenvolvimento da capacidade de auto‑observação, de autoconhecimento e de autocrítica. Se o sujeito se torna sujeito a partir da dependência entre 80 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II si eo objeto de que necessita, conclui‑se que ele desenvolve uma relação consigo mesmo de necessidade de autoafirmação. É isso que lhe permite ser capaz de dialogar consigo mesmo e confrontar os desejos e realidades que o mundo lhe oferece. Sob este ponto de vista, a fotografia é capaz de desencadear a reflexão do sujeito através dessa objetivação, pois ele se percebe ora produto, ora produtor da sua realidade. Kossoy afirma: Algumas imagens nos levam a rememorar, outras a moldar nosso comportamento; ou a consumir algum produto ou serviço; ou a formar conceitos ou reafirmar pré‑conceitos que temos sobre determinado assunto; outras despertam fantasias e desejos (KOSSOY, 2002, p. 44–45). Essa experiência sugere ao sujeito a realidade complexa de sua relação com o ecossistema, pois, integrando‑se na intersubjetividade, no seu meio de existência, constitui‑se em um ser relacional como marca de sua identidade. Morin (1997) alerta para o fato de o sujeito objetivar o outro enquanto o reconhece como sujeito. Quando o sujeito humano, que se considera ao mesmo tempo sujeito e objeto, para de reconhecer a subjetividade no outro e passa a considerá‑lo apenas objeto, deixa de ser humano, pois não é mais capaz de enxergar a humanidade alheia. Segundo o autor: Para conhecer o outro, certo, deve‑se percebê‑lo objetivamente, estudá‑lo, se possível, objetivamente, mas também se deve compreendê‑lo subjetivamente. O desenvolvimento de um conhecimento objetivo do mundo deve avançar junto com um conhecimento intersubjetivo do outro (MORIN, 2002, p. 80). A sabedoria do espírito é justamente praticar a compreensão de si e do outro, viabilizada pelas autoanálise, autocrítica e autoética, que definem o pensar solidário e que, segundo Morin (2005, p. 141), são canais fundamentais para o convívio em harmonia entre os homens. 8.2 Punctum e studium de uma imagem Punctum e studium são conceitos elaborados por Roland Barthes (1989). Podemos chamar de dualidade norteadora de uma imagem a análise do punctum e o studium a um só tempo. Ambos estão presentes numa mesma imagem e, fazendo uma análise atenta, podemos reconhecê‑los. Em outras palavras, podemos dizer que são os elementos estruturais, chamados aqui de objetivos e subjetivos de uma imagem (sendo o punctum o elemento subjetivo e o studium o elemento objetivo de uma foto). 81 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO O punctum, tendo caráter subjetivo, é o detalhe pungente que afeta e seduz, ou seja, o ponto de efeito que nos causa interesse e nos provoca a reflexão ao olhar determinada fotografia. Por ser subjetivo, ele varia de pessoa para pessoa. Ele não precisa necessariamente ser um detalhe, pode ser uma situação ou uma expressão. Barthes (1989) chama de studium (palavra latina que significa estudo), o todo da fotografia, o interesse geral presente nos elementos visíveis. Studium seria ainda um interesse guiado pela consciência, tendo de pano de fundo o contexto cultural e técnico da imagem. Segundo esses elementos, uma imagem pode despertar o interesse de uma pessoa sem ter um punctum. Nesse caso, o studium pode agradar ou desagradar o observador/espectador, sem que o tenha atingido de uma forma especial. Na imagem a seguir começamos a exemplificar o que entendemos por punctum: Figura 79 ‑ Felix Nadar, Savorgnan de Brazza (1882). Fotografia 82 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Vale abrir um parêntese e ressaltar a importância do ilustre fotógrafo Felix Nadar, autor da foto anterior. Figura 80 ‑ Felix Nadar (1865) Gaspard‑Félix Tournachon (1820–1910) nasceu em Paris, França, no dia 6 de abril. Ele foi fotógrafo, caricaturista e jornalista. Estudou medicina em Lyon, mas devido a problemas financeiros do pai, largou os estudos e começou a trabalhar escrevendo folhetins (romances com estilo jornalístico), nos quais passou a assinar com o pseudônimo de Nadar. Após 1846, dedicou‑se ao desenho, no qual obteve muito sucesso. No início dos anos 1850, já era um fotógrafo de mérito e tinha aberto seu estúdio na Rua Saint‑Lazare, onde recebia vários amigos sem protocolo e os fotografava. Seus retratos fotográficos não são satíricos; não são “caras”, procura apenas a semelhança íntima dos fotografados. 83 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Seguem algumas dessas imagens ilustres, feitas por Felix Nadar: Figura 81 – Victor Hugo, s.d. Figura 82 – Charles Baudelaire (1860) Figura 83 – Edouard Manet (1865) Posteriormente, nos anos 1860, montou um estúdio maior no Boulevard des Capucines, local que se tornou uma referência e ponto de encontro dos intelectuais parisienses. Voltando à nossa discussão sobre a figura 79, Barthes (1984, p. 80) afirma: “O punctum, para mim, são os braços cruzados do segundo grumete”. Nesse caso, o punctum, além de ser um detalhe da imagem, é também um gesto, uma atitude, que não condiz exatamente com o assunto da cena, já que os garotos são marinheiros aprendizes. Em contrapartida, para Baudrillard (1999, p. 115), não há mais arte fotográfica quando buscamos justamente compreender a imagem por meio de inúmeros contextos. Consequentemente, ele nega o sujeito como “figura de vazio, de ausência e de irrealidade” na fotografia, e explica: É este vazio no coração da imagem que faz a sua magia. É este vazio que expulsamos de todas as maneiras possíveis, saturando a fotografia como todo o tipo de referências e de significações. Nos festivais de foto‑reportagem e nas galerias, há uma profusão de testemunhos, de sentimentalismos estético ou demagógico, de estereótipos de reconhecimentos. É uma verdadeira prostituição da imagem naquilo que ela significa, como se tornar refém de seu próprio conteúdo (BAUDRILLARD, 1999, p. 115). Baudrillard (1999, p. 114) acredita que afastar esse “vazio simbólico” – que, para ele, constitui a força da imagem – é a razão de não haver mais arte fotográfica. Segundo o autor, isso faz com que ela passe a ser objeto de interpretação e, “como objeto, não [tenha] nada a dizer e não [tenha] desejos”. Assim, não há mais interpretação possível. 84 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Saiba mais Para mais informações sobre Jean Baudrillard, leia: SOCIÓLOGO e filósofo francês Jean Baudrillard. Uol Educação. [s.d.]. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/biografias/jean‑baudrillard. jhtm>. Acesso em: 15 out. 2014. Para compreender melhor o significado desse “vazio”, recorremos novamente a Barthes, que denomina este processo punctum, o ponto de efeito que nos torna interessante ao olhar diante da fotografia, não investido de intervenções externas: A subjetividade absoluta só é atingida em um estado, um esforço de silêncio (fechar os olhos é fazer a imagem falar no silêncio). A foto me toca se a retiro de seu blablablá costumeiro: “Técnica”, “Realidade”, “Reportagem”, “Arte” etc.: nada a dizer, fechar os olhos, deixar o detalhe remontar sozinho à consciência afetiva (BARTHES, 1984, p. 84–85). A seguir, vamos analisar a presença do punctum e do studium em mais algumas imagens. Cada fotografia traz em si, inúmeras particularidades, tanto nos aspectos de punctum e studium como na interpretação e leitura de aspectos culturais e técnicos. Figura 81 ‑ James van der Zee, Retrato de Família (1926). Fotografia 85 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão: J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Segue, na íntegra, a análise feita por Roland Barthes acerca da fotografia anterior: Eis uma família negra americana, fotografada em 1926 por James Van der Zee. O studium é claro: interesso‑me com simpatia, como bom sujeito cultural, pelo que a foto diz, pois ela fala (trata‑se de uma “boa” foto): ela diz da responsabilidade, do endomingamento, um esforço de promoção social para enfeitar‑se com os atributos do Branco (esforço comovente, na medida em que é ingênuo). O espetáculo me interessa, mas não me “punge”. O que me punge, coisa curiosa de dizer, é a larga cintura da irmã (ou da filha) – oh negra nutriz –, seus braços cruzados por trás das costas, à maneira de uma colegial, e sobretudo seus sapatos de presilha (por que algo fora de moda e tão datado me toca? Quero dizer: a que data ele me remete?). Esse punctum não leva em consideração a moral ou o bom gosto; o punctum pode ser mal educado [...] (BARTHES, 1984, p. 71). Notamos mais uma vez, agora na análise de Barthes, como a escolha do punctum é totalmente subjetiva. Em seu caso, o observador/autor faz uma leitura da imagem, na qual o punctum vai de um lugar a outro da cena. Saiba mais Leia e pesquise um clássico da teoria fotográfica: BARTHES, R. A câmara clara. Tradução de Júlio Castañon Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. Barthes (1984, p. 72) era muito peculiar e subjetivo quando “escolhia” seu punctum. Com relação à imagem a seguir, ele diz: “o que vejo com obstinação são os maus dentes do garoto”. Figura 82 ‑ William Klein – O bairro italiano (1954). Nova Iorque. Fotografia 86 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Tanto na figura 80 como na figura 82 Barthes informa que a escolha do punctum está acima de valores culturais ou sociais. Figura 83 ‑ Lewis H. Hine – Anormais em uma instituição. New Jersey. Fotografia A seguir incluímos detalhe da análise por Roland Barthes: [...] das duas crianças anormais de uma instituição de New Jersey (fotografadas em 1924 por Lewis H. Hine), não vejo as cabeças monstruosas e os perfis deploráveis (isso faz parte do studium); o que vejo, [...] é o detalhe descentrado, a imensa gola Danton do garoto, o curativo no dedo da menina; sou um selvagem, uma criança – ou um maníaco; mando embora todo saber, toda cultura, abstenho‑me de herdar de um outro olhar (BARTHES, 1984, p. 78–80). Apesar de muitas fotos “infelizmente” permanecerem inertes ao olhar de Barthes, ou seja, não atingirem o punctum, outro tema de interesse pela imagem fotográfica é essencial ao seu estudo: o studium. Neste último, a intenção do fotógrafo é fatalmente reconhecida. Segundo o autor, isso seria um contrato cultural entre o criador e o consumidor, ou seja: O studium é uma espécie de educação (saber e polidez) que me permite encontrar o Operator, viver os intentos que afundam e animam suas práticas, mas vivê‑las de certo modo ao contrário, segundo meu querer de Spectator. Isso ocorre um pouco como se eu tivesse de ler na fotografia os mitos do fotógrafo, fraternizando com eles, sem acreditar inteiramente neles. Esses mitos visam evidentemente (é para isso que serve o mito) a reconciliar a fotografia e a sociedade (é necessário? – Pois bem, é: a foto é perigosa), dotando‑a de funções, que são para o fotógrafo outros álibis. Essas funções são: informar, representar, surpreender, fazer significar, dar vontade. E eu, Spectator, eu as reconheço com mais ou menos prazer: nelas invisto meu studium (que jamais é meu gozo ou minha dor) (BARTHES, 1984, p. 48–49). 87 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO O studium, que para Baudrillard é a imagem fotográfica analisada como objeto, será para Barthes sempre uma imagem codificada, sem prazer, funcional, à espera de interpretações diante do spectator, ou seja, do consumidor. O autor refere‑se ao punctum, por sua vez, como o detalhe pungente que afeta, que seduz, sem atestar a arte do operator, ou seja, o fotógrafo. O punctum, tema principal do estudo de Barthes em A Câmara Clara, seria como a “passagem de um vazio” que preenche toda a fotografia, isto é, a interpretação subjetiva da imagem baseada na sensibilidade física e emocional do autor. Baudrillard refere‑se ao punctum analisado por Barthes como a instantaneidade contrária à simultaneidade do tempo real. Segundo ele, “O que não pode falar, é preciso calar – mas pode‑se calar com imagens” (BAUDRILLARD, 2002, p. 143‑144), e complementa: Resistir ao ruído, à palavra, ao rumor pelo silêncio da foto – resistir ao movimento, ao fluxo e à aceleração pela imobilidade da foto – resistir ao ímpeto da comunicação e da informação pelo segredo da foto – resistir ao imperativo moral do sentido pelo silêncio da significação. Resistir, acima de tudo, ao desdobramento automático das imagens, à sua sucessão perpétua, em que o que se perde é não somente o traço, o detalhe pungente do objeto (o punctum), mas também o momento da foto, imediatamente completada, irreversível e, por isso, sempre nostálgica (BAUDRILLARD, 2002, p. 143–144). Para Baudrillard, a fotografia que resiste aos aspectos significativos e interpretativos impõe‑se como a imagem mais pura e real, pois a realidade não depende de análise ou de nossa observação. Baudrillard (2002, p. 83–84) analisa essa realidade, na interpretação da imagem, como simulação de si própria, tornando‑se hiper‑realidade e aceitando “todo tipo de interpretação porque ela não faz mais sentido, porque ela não quer mais ser interpretada”. Pensador polêmico, Baudrillard vai contra a linha de pensamento que costumamos ter quando analisamos imagens, mas é um autor interessante e reconhecido, por isso devemos nos ater a suas colocações. Para finalizar, vamos analisar a presença do punctum e do studium em mais algumas imagens. Na imagem a seguir, que é um retrato provocante de Andy Warhol, em que ele esconde seu rosto com as mãos, Barthes (1984, p. 75) afirma que não tem vontade de comentar “esse jogo de esconde”, para ele, isso faz parte do studium: [...] pois para mim Andy Warhol não esconde nada; ele me dá a ler abertamente suas mãos; e o punctum não é o gesto, é a matéria um pouco repelente dessas unhas espatuladas, ao mesmo tempo moles e sem cutícula (ibidem, p. 75). 88 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Figura 84 ‑ Duane Michals – Andy Warhol (1958). Fotografia Figura 85 ‑ G. W. Wilson – A rainha Victoria (1863). Fotografia Exemplo de aplicação Na imagem da rainha Victoria, qual seria o studium e o punctum? Você se arriscaria a responder? Quando identificamos o punctum em uma fotografia, é como se ela tomasse vida: começamos a imaginar e ver coisas que antes não víamos. Nessa imagem anterior, temos a rainha Victoria fotografada sobre um cavalo. O studium seria a cena, no caso, a rainha sentada no cavalo e sua saia cobrindo a garupa. O punctum seria o personagem ao lado e o fato de ele aparecer e desaparecer da fotografia ao mesmo tempo. 89 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Barthes nos ajuda a entender e interpretar melhor essa imagem: Eis a rainha Victoria fotografada (em 1863) sobre um cavalo, cuja garupa sua saia cobre dignamente (isso é o interesse histórico, o studium); mas ao lado dela, atraindo meu olhar, um auxiliar de kilt segura a rédia da montaria:é o punctum, pois mesmo que eu não conheça bem a posição social desse escocês (criado? estribeiro?), vejo bem sua função: velar pelo bom comportamento do animal: se ele pusesse de súbito voltear? O que aconteceria com a saia da rainha, ou seja, com sua majestade? O punctum, fantasmagoricamente, faz o personagem vitoriano (é o caso de dizê‑lo) sair da fotografia, ele provê essa foto de um ponto cego (BARTHES,1984, p. 86–88). Barthes (1984, p. 85) afirma ainda uma última coisa sobre o punctum: “[...] quer esteja delimitado ou não, trata‑se de um suplemento: é o que acrescento à foto e que todavia já está lá nela.” A seguir podemos observar algumas imagens seguidas de suas análises interpretativas: Figura 86 ‑ Lewis H. Hine – Anormais em uma instituição. New Jersey. Fotografia Na imagem de Lewis Hine, Barthes (1984, p. 88) diz que não acrescenta de modo algum a essas duas crianças anormais a degeneração do perfil: “o código o diz antes de mim, toma meu lugar, não me deixa falar; o que acrescento – e que, é bem verdade, já está na imagem – é a gola, o curativo”. O autor apenas realça o que, na foto, se destaca para ele, porém são elementos que já estão presentes. 90 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Figura 87 ‑ R. Mapplethorpe – Jovem com braço estendido. Fotografia Dessa maneira, concluímos (BARTHES, 1894, p. 89) que o punctum é uma espécie de pontos de sutileza, “como se a imagem lançasse o desejo para além daquilo que ela dá a ver”. A respeito da imagem de Mapplethorpe, Barthes afirma: Esse jovem de braço estendido, de sorriso radiante, ainda que sua beleza não seja de modo algum acadêmica e que ele esteja pela metade fora da foto, deportado ao extremo para um lado do enquadramento, encarna uma espécie de erotismo vivaz; a foto me induz a distinguir o desejo pesado, o da pornografia, do desejo leve, do desejo bom, o do erotismo; no fim das contas talvez seja uma questão de “oportunidade”: o fotógrafo fixou a mão do jovem (o próprio Mapplethorpe, penso eu) em um bom grau de abertura, em sua densidade de entrega: alguns milímetros a mais ou a menos e o corpo suspeitado não mais teria se ofertado com benignidade (o corpo pornográfico, compacto, mostra‑se, não se dá, nele não há nenhuma generosidade) o fotografo encontrou o bom momento, o kairos do desejo (BARTHES, 1984, p. 89–90). O autor nos mostra mais uma vez como a interpretação e as escolhas do punctum e do studium são totalmente subjetivas. Explicou também que quando tentamos reconhecer esses elementos em uma imagem, ela toma movimento e passamos a ver muitas cosias que antes não víamos. Resumo Pudemos verificar no início da unidade 2 deste livro‑texto que a percepção é o ponto de partida no processo da criatividade, pois perceber 91 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO é compreender, e compreender é dar significado às coisas. Desse modo, descrevemos a criatividade como uma necessidade inerente do ser humano de dar forma às suas percepções. Entendemos, pela Gestalt, que a percepção é um método de ordenação, e como não poderia de ser diferente, observamos que ela só é possível a partir de uma intuição oriunda de nossas experiências cotidianas. Essas demonstrações humanas são expressas no ato de criar, o que torna este processo um ato consciente do indivíduo. Essa capacidade foi primeiro verificada na herança deixada por nosso ancestral, o Homo erectus, quando ele surgiu como ser cultural ao transmitir seus conhecimentos técnicos da pedra lascada. A vantagem biológica de manusear suas ferramentas e de utilizar a cultura em proveito próprio, a própria conscientização de seu papel social fez surgir o hominídeo na linha evolutiva. Consciente ao perceber sua individualidade subjetiva, o primata se interrogou e interpretou os fenômenos a sua volta. A natureza se manifesta filtrando no consciente os valores culturais, por isso podemos afirmar que a cultura é o fator que norteia o ser sensível e o ser consciente. Finalmente, é ela que estrutura a sensibilidade do homem, que ordena e guia suas ações e dá asas à sua imaginação. Observamos, dentro dessa perspectiva, a importância, para o ser humano, de manter sua cultura utilizando as memórias passadas por meio da tradição oral. O Homo erectus expressou sua experiência subjetiva do mundo pela palavra, motivo pelo qual a cultura pôde se propagar. Estudos mostram que as representações com mais chances de sobreviver são aquelas contadas por narrativas, pelo teatro e pela emoção, fatores de suma importância à proximidade do homem, o que fortalece a memória coletiva de uma sociedade. Notamos, ao longo de nossa discussão, os diferentes viéses que a imagem perpassa a partir de percepções subjetivas e interpretações imagéticas. Estudando a percepção e a complexidade no fenômeno fotográfico, nos damos conta de infinitas possibilidades, quando o assunto são os inúmeros componentes que constituem o processo fotográfico. A fotografia tem uma natureza muito complexa, por isso a discussão sobre real e imaginário na percepção imagética não tem fim. Por fim, explicamos o que são punctum e studium de uma imagem e analisamos minuciosamente diversas imagens para entender melhor esses conceitos. 92 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 Unidade II Exercícios Questão 1. Considere a fotografia de Sebastião Salgado e as afirmativas a seguir. Figura 88 I. O assunto da fotografia é um conflito entre trabalhadores e o poder do Estado. II. Por ser uma fotografia jornalística e retratar o fato, não apresenta subjetividade. III. Aplicando‑se o conceito de Barthes, observa‑se que a foto não apresenta punctum, pois a intenção do fotógrafo é registrar o conflito. Está correto o que se afirma somente em: A) Afirmativa I, apenas. B) Afirmativa II, apenas. C) Afirmativa III, apenas. D) Afirmativas I e II. E) Afirmativas I e III. Resposta correta: alternativa A. Análise das afirmativas I. Afirmativa correta. 93 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 PERCEPÇÃO E REPRESENTAÇÃO Justificativa: a foto retrata um conflito em Serra Pelada. II. Afirmativa incorreta. Justificativa: a subjetividade é inerente a qualquer produção simbólica. III. Afirmativa incorreta. Justificativa: de acordo com Barthes, toda foto apresenta punctum, de caráter subjetivo, que punge o leitor por algum aspecto. Questão 2. Considere a foto e as afirmativas a seguir. Figura 89 I – A foto provoca no leitor a percepção de que o bebê está sendo amamentado, sugerindo que o lanche é tão bom ou saudável quanto o leite materno. II – A foto é referencial e mostra apenas um bebê encostando a boca em um pão com gergelim. III – O ângulo em que os elementos são retratados não é significativo para a percepção do leitor. Está correto o que se afirma somente em: A) Afirmativa I, apenas. B) Afirmativa II, apenas. C) Afirmativa III, apenas. D) Afirmativas I e III. E) Afirmativas II e III. Resolução desta questão na plataforma. 94 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on /Is aa c - 27 /1 0/ 14 FIGURAS E ILUSTRAÇÕES Figura 1 GOMES FILHO, J. Gestalt do objeto: sistema de leitura visual da forma. 6. ed. São Paulo: Escrituras, 2004. p. 19. Figura 2 GOMES FILHO, J. Gestalt do objeto: sistema de leitura visual da forma. 6. ed.
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