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1 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Hérnias abdominais Objetivos • Definição e importância das hérnias; • Anatomia de parede abdominal; • Hérnia umbilical; • Hérnia inguinal e femoral; • Hérnia incisional; • Hérnias raras; • Tratamento cirúrgico. Definição • Protusão anormal do conteúdo de uma cavidade, observada através de um defeito em sua parede. Tal defeito vai englobar as suas camadas. • Defeito na parede abdominal → Protusão do conteúdo por dentro → formação da hérnia. • Hérnia X diástase do músculo do reto abdominal: a hérnia engloba camadas e a diástase não, apesar que a diástase de reto pode provocar uma hérnia. Foto: Visão laparoscópica intra-abdominal. É visto como se fosse um furo, no qual entra o conteúdo da barriga. Tal conteúdo só entra no furo porque ocorre um defeito na parede abdominal. A região mais afetada é a abdominal – principalmente a inguinal. • Saco da hérnia abdominal: ❖ Peritônio parietal que envolve o conteúdo herniado, o qual passa por dentro da parede abdominal. Esse conteúdo pode ser: alça intestinal, bexiga, apêndice, cólon. Então, independente do conteúdo da hérnia, o saco herniário é formado por esse peritônio parietal. • Colo do saco herniário: ❖ Porção mais estreita/afilada do saco herniário; ❖ Defeito na camada aponeurótica mais interna do abdômen. É o distanciamento entre uma extremidade e outra extremidade do defeito. ❖ É medido por exames de imagens, laparoscopia. Hérnias da parede abdominal 1º imagem: mais tranquila. 2 protusões na região da virilha. Abaulamento bilateral na região inguinal, vista no exame físico. 2º imagem: caso mais deformoso. Possui uma cicatriz central na parede abdominal. Abdome assimétrico. Parece que dá pra ver as haustrações intestinais por fora dele. O defeito é tão grande que só tem o defeito e a pele, não tem o peritônio. O colo do saco, que é medido pelo defeito, tem o seu tamanho associado com o conteúdo que vai herniar e o conteúdo que vai herniar depende do tamanho do defeito. Exemplo: um defeito de 1cm não vai poder herniar um colón de 5cm. Então, a importância clínica cirúrgica da hérnia é pela viabilidade do conteúdo abdominal, porque o defeito pode fazer com que esse conteúdo se coloque para fora da cavidade e não volte mais. Também existe a importância estética, porque sendo uma hérnia grande, causa um desconforto por ser assimétrica. Anatomia da parede abdominal Dentro da anatomia será necessário entender algumas estruturas que podem fazer com que ocorra o aparecimento da hérnia. • Grupos musculares antero abdominais: antero laterais – mais importantes. ❖ Músculo reto abdominal; ❖ Músculo oblíquo externo; ❖ Músculo oblíquo interno: Visualização dos músculos oblíquos. É como se colocasse a mão dentro dos bolsos e as fibras musculares seguissem a direção. ❖ Músculo transverso do abdome: se entremeia entre o interno e o reto abdominal. 2 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Vascularização • Arterial ❖ Artéria epigástrica superior; ❖ Artéria epigástrica inferior; ❖ Artéria epigástrica superficial; ❖ Ramos arteriais subcostais. • Venoso ❖ Veia epigástrica superior; ❖ Veia epigástrica inferior; ❖ Veias periumbilicais, veia umbilical. Os vasos são importantes para localizar as hérnias e para o reparo anatômico/tratamento, mas não tem fator causal com a hérnia, não servindo para sua caracterização. Importante: ➢ Saber a vascularização das artérias epigástricas (origem e trajeto) superior, inferior e superficial. Saber alguns ramos arteriais subcostais. ➢ As veias epigástricas são as mais importantes para o reparo. A periumbilical e a umbilical serão apenas para referência. Sendo as hérnias um problema na parede abdominal, terá que ser compreendido como é toda a formação/composição dessa parede. • Fáscias e camadas: Desde a pele até a cavidade intra abdominal. • Canal inguinal: componentes; limites. Esse canal é um defeito fisiológico que todos possuem, só que algumas pessoas causam hérnia e em outras não. • Musculatura: • Triângulo de Hasselbach: Área da fáscia posterior, da parede abdominal. Fáscias e camadas 1. Pele; 2. Fáscia de camper/tecido adiposo e fáscia de scarpa (fazem parte do tecido celular subcutâneo); 3. Fáscia do músculo oblíquo externo e músculo oblíquo externo; 4. Fáscia do m.o.interno e m.o.interno; 5. Fáscia do m.transverso e m.transverso; 6. Fáscia transversalis (é um tecido conjuntivo que as vezes pode estar fraco na hérnia. Dentro dela, tem o triângulo de hasselbach); 7. Espaço pré-peritoneal (está no assoalho da fáscia transversalis, entrando para a cavidade); 8. Peritônio. Lembrar: Antes do músculo ... sempre vem sua fáscia! Fáscia X Aponeurose: A fáscia é um tecido conjuntivo que está acima do músculo e funciona como uma camada de proteção. A aponeurose liga o músculo ao tendão. Na parede abdominal, é uma grande área protetora que ajuda a não ter uma hérnia. Canal inguinal: é um tubo que tem dentro: músculo cremáster, vasos cremastéricos, ducto deferente no homem e ligamento redondo. É protegido por um assoalho que é posterior, anterior e lateral. Junto ao canal inguinal: • Lateralmente: passa nervos que fazem parte do trato ileopúbico. • Perpendicular: passam os vasos epigástricos: artéria e veia epigástrica transversal. • Lateral: tem os músculos, sendo de dentro pra fora (oblíquo interno, oblíquo externo e fáscia transversalis). A fáscia transversalis tem a lâmina posterior (lâmina visível) e lâmina anterior (não dá pra ver na figura). O músculo transverso é mais fino, mas também tem o efeito protetor do canal inguinal. 3 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Dentro do canal inguinal passa o funículo espermático (tubinho). É importante saber, porque, ao corrigir uma hérnia, tem que saber o que é saco herniário e o que é funículo espermático, pois o saco passa perto do funículo. Saber o que é o conteúdo normal da pessoa e o que é o peritônio que formou o saco herniário. Por isso, é necessário saber qual é o conteúdo do funículo espermático, para sabe o que é anatomicamente normal. Funículo espermático • Músculo cremáster; • Plexo venoso pampiniforme: as veias testiculares se unem parar formar esse plexo que passa pelo funículo espermático). • Ducto deferente e artéria deferente; • Vasos espermáticos; • Ramo genital dos nervos genitofemoral e o ilioinguinal; • Conduto peritônio-vaginal obliterado. Mulheres: canal de Nuck Nas pessoas que não tem hérnia, na parede abdominal, tem uma falha fisiológica, por onde passa esse tubo do canal inguinal e, por dentro dele, o funículo espermático. Nessas pessoas, o conduto peritônio vaginal - parte do peritônio que, no defeito do canal inguinal, se fecha depois que nasce. Em algumas pessoas, o conduto peritônio vaginal não se fecha logo de imediato, por isso que existe hérnia congênita. O funículo espermático nas mulheres é chamado de canal de nuke, dentro dele tem um ligamento redondo. Triângulo de Hasselbach • Limite superolateral: vasos epigástricos inferiores; • Limite medial: borda lateral do reto abdominal; • Limite inferior: ligamento inguinal. • Pavimento: fáscia transversalis. O triângulo é uma área de fragilidade na parede abdominal. Essa falha é o local mais propenso para as hérnias, mas isso não quer dizer que todas as hérnias acontecem na falha. Esse triângulo é imaginário (linhas virtuais). Por isso, a importância de saber a anatomia, pois o triângulo é formado pelos reparos anatômicos. A borda lateral do reto abdominal constitui o limite medial do triângulo de Hasselbach. A estrutura esbranquiçada ao abrir a barriga do paciente é o ligamentoinguinal, que constitui o limite inferior. Proveniente de alguns vasos ilíacos, tem as veias e as artérias epigástricas que constituem o limite súperolateral. O que é real no triângulo de Hasselbach é a fáscia transversalis, ela existe, sendo a parte frágil da parede abdominal. Para identificar essa parede frágil tem que ir pela parte virtual do triângulo. VISÃO LAPAROSCÓPICA Nessa visão, é possível ver os vasos epigástricos e a área da falha (fáscia tansversalis) de dentro pra fora. Tem o triângulo de Hasselbach (imaginário). Borda lateral do músculo reto abdominal, vasos epigástricos e ligamento inguinal. Para identificar este último ligamento, vai pela sínfise púbica e segue o osso até ver a parte esbranquiçada. Existem duas áreas importantes nas hérnias: 1. Triângulo da morte (triângulo de Dumm): tem a ver com sangramento. É formado pelos vasos deferentes, veia e artéria gonadal e ilíacas (centro). 2. Triângulo da dor: Formado pelo trato íleopúbico. 4 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Para corrigir uma hérnia nessa área, o paciente apresenta muita dor no pós operatório, pois meche no ramo genital do nervo genitofemoral. Etiologia Se existe essa falha na parede abdominal em todo mundo, porque nem todo mundo forma hérnia? Etiologia multifatorial, mas existem 2 principais: 1. Aumento crônico da pressão intra-abdominal; 2. Fragilidade da parede abdominal. Aumento crônico da pressão intra-abdominal Causas: obesidade; esforço abdominal por exercícios ou levantamento de pesos vigorosos; pessoas portadoras de DPOC; tosse; pacientes com obstipação crônica; prostatismo; ascite; gravidez; pacientes com cateter peritoneal; órgãos pélvicos dilatados (ex. hepatoesplenomegalia); tumores pélvicos; grandes tumores ovarianos. Nesse grupo de causas, os pacientes normalmente tem a parede boa, mas tem uma força que fica batendo nela. Fragilidade da parede abdominal Nesse grupo de causas, os pacientes não tem uma força batendo na parede abdominal, e sim uma fragilidade. Causas: Idade avançada (a pessoa perde colágeno ao longo do tempo, gerando uma fragilidade); doenças debilitantes crônicas; pacientes desnutridos com síndrome consumptiva; câncer; traumatismos; anomalias do desenvolvimento embrionário da parede e cavidade abdominal; doenças de colágeno; tabagismo; doenças genéticas - deficiência de alfa 1 anti-tripsina; atrofia muscular. Semiologia e identificação da hérnia A hérnia é uma das doenças que mais tem a ver com a semiologia. Então, é necessária uma boa anamnese e um bom exame físico. Só com isso, já é possível fazer o diagnóstico de hérnia, sendo que às vezes não é necessário exame. • Identificação: ❖ Idade ❖ Sexo: Os homens tem uma propensão muito maior a forma hérnia. ❖ Profissão: carga de peso. • História da doença: ❖ Tumefação: ➢ Evolução insidiosa ou desencadeada por um esforço muscular vigoroso; ➢ Aumento do volume com o aumento da PIA; ➢ Redução espontânea com o decúbito ou por pressão manual; ❖ Desconforto: pior no final do dia, alívio com o decúbito. ❖ Distensão abdominal, dor abdominal, modificação do trânsito intestinal, vômitos → oclusão intestinal. No saco herniário tem uma área chamada de colo herniário, onde pode passar alças intestinais (intestino delgado, intestino grosso, apêndice, bexiga). Se passar, por exemplo, o colón pelo colo de uma hérnia pode provocar uma oclusão intestinal e simular uma síndrome semi oclusiva. • Antecedentes pessoais: ❖ Outras patologias e condições que aumentem cronicamente a pressão intra-abdominal; (Ex. hiperplasia prostática). ❖ História individual de hérnias e sua reparação. Exame físico Examinar o doente em posição ortostática e decúbito dorsal, pois o abdome tem que ser visto na sua condição de pressão intra-abdominal (PIA) normal e elevada. De preferência, pedir para o paciente realizar a manobra de valsalva (Ex. soprar a mão) → esforço → Aumento da PIA. • Inspeção: ❖ Avaliação de abaulamentos na parede abdominal. ❖ Localização e forma da tumefação; ❖ Impulso da tumefação com a tosse; ❖ Presença de sinais inflamatórios: Se tiver encarceramento (presa) da hérnia, se ela ficar presa pelo colo do saco herniário, podem ter sinais flogísticos locais. ❖ Presença de cicatrizes: A cicatriz é uma substituição do tecido fisiológico. Assim, pode provocar fragilidade na parede e levar a formação de uma hérnia. • Ausculta/percussão: ❖ Avaliação do conteúdo do saco herniário; 5 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais ❖ Observar se tem ruído hidroaéreo dentro de um grande saco herniário. ❖ Avaliação de sinais de oclusão intestinal: perguntas sobre hábitos intestinais. • Palpação: ❖ Tamanho, consistência (endurecida – tumor?), limites, mobilidade em relação aos planos profundos e à pele e sensibilidade dolorosa do tecido herniário; ❖ Palpação do orifício herniário: O orifício vai dizer o que está passando por dentro. Saber o tamanho, pois os grandes são tratados de uma forma e os pequenos de outra. ❖ Impulso com a tosse: Saber se o conteúdo dentro desse orifício tem aumento ou diminuição com a tosse. ❖ Redutibilidade: Lembrar que algo redutível vai e volta. Então pode diminuir, por exemplo. Classificação As hérnias abdominais podem ser de 3 grupos principais, caracterizadas de acordo com a anamnese e o exame físico. • Redutíveis: O paciente relata que pela manhã não se vê nada, porém, durante o dia, aparece um caroço da virilha. Ou seja, a hérnia aparece e some. Nesse caso, a hérnia está lá o tempo inteiro, pois hérnia não é protusão, e sim falha. A diferença é que pela manhã o conteúdo não passa pela falha, e no final do dia ele passa. • Encarceradas: quando a protusão acontece e o conteúdo não volta para dentro da cavidade abdominal. Não se observa sinais flogísticos e o paciente não relata alterações intestinais. • Estranguladas: é aquela hérnia em que o colón herniário está apertando o conteúdo da hérnia, fazendo com que uma alça do intestino, por exemplo, perca sua função, ou seja, o peristaltismo bate na parede do cólon e volta. É uma URGÊNCIA cirúrgica. O paciente tem uma oclusão intestinal, mecânica causada por um colón herniário Resumo: encarcerada não volta e não tem sinais flogísticos. A estrangulada tem sinais flogísticos locais, alterações sistêmicas e até resposta inflamatória, a depender do tempo em que o conteúdo herniário fica preso no saco herniário. . Diagnóstico • Clínico; • Exames complementares: ❖ Dúvida diagnóstica: ❖ Preparo pré-operatório: já que o exame de imagem mostra o tamanho do orifício e se o paciente tem outras áreas de fragilidade. ❖ Planejamento terapêutico e cirúrgico. Hérnia umbilical e epigástrica • Defeitos localizados na linha alba – linha central que se insere no apêndice xifoide e vem passando no meio dos retos abdominais, atravessa o umbigo e vai até a sínfise púbica. • Todo saco herniário que ocorre nessa linha é chamado de hérnia umbilical, ventral ou epigástrica. • Protusão de gordura pré-peritoneal. • Congênitos X Adquiridos; • Relação M:H (5:1) – A cada 5 mulheres acometidas tem-se 1 homem acometido na linha alba. • Fatores de risco: gravidez (provoca o aumento do volume uterino que faz que haja um afastamento readaptativo dos músculos reto abdominal. O afastamento não é hérnia e nem falha, e sim um fator de adaptação ao volume intra-abdominal, podendo provocar fragilidade. Em suma, a diástase de reto abdominal não é hérnia, mas pode causar a hérnia; ascite e obesidade (mesmos mecanismos da gravidez). Importante lembrar que o saco herniário é o peritônio. Observar na imagem que o peritônio passa por dentro do músculo e vai para a pele. Ou seja, a hérnia atravessa todas as camadas- músculo transverso, 6 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais músculo oblíquo interno ... abaula a aponeurose do músculo oblíquo externo (última aponeurose até chegar no tecido celular subcutâneo), face de camper e scarpa e pele. Manifestações clínicas • Conteúdo encarcerado → dor. A hérnia estrangulada tem alteração do trânsito intestinal. Tratamento Tanto a hérnia umbilical quanto a epigástrica, o tratamento é cirúrgico. Hérnias normalmente estão no colo e o colo do saco herniado é pequeno, tendo mais chance de encarcerar e complicar. Se a hérnia é uma falha da aponeurose, a cirurgia vai ser: pegar um fio e uma agulha e aproximar para fechar. Só que muitas fezes essa falha é maior do que 2 cm (criança e adulto), e quando isso acontece, pensa- se em outra estratégia, pois quando vai fazer o ponto de aproximação, não fica seguro e não aproxima bem. É possível fazer a correção com uma tela. CORREÇÃO PRIMÁRIA Quando vai operar uma hérnia umbilical, por exemplo, são dados pontos em X para aproximar a falha. É uma cirurgia relativamente simples, sem muitas complicações. CORREÇAÕ COM PRÓTESE ( TELA) Muitas vezes, a falha é grande (>2cm) e não é possível aproximar, sendo necessária a tela. Tal tela ajuda a dar segurança a cirurgia. Toda vez que a falha for grande, é preciso pensar em algo que dê segurança. Indicações na criança Indicações no adulto Não fechamento após 4-6 anos Sintomático Defeitos > 2cm Grande defeito herniário Hérnias associadas à derivação ventriculoperitoneal Encarceramento e complicações Concomitância com hérnia inguinal Ascite volumosa Hérnias inguinais Mais importante desse grupo. • Relação H:M (12:1): Diferente da hérnia umbilical. • Incidência máxima na 6º década: relação com idade avançada. • Indireta prevalece (65%); • Lado direito mais acometido; • Podem ser bilaterais. A respeito do mecanismo de formação, podem ser diretas ou indiretas: • Diretas: Passa pela fáscia de Halsselbach/transversalis. • Indiretas: Passa por dentro do canal inguinal. São mais prevalentes e o lado direito é mais acometido, pois, apesar do triângulo de Halssebach estar dos dois lados, o direito não tem a proteção do sigmoide. Classificação de Nyhus Tipo I Hérnia inguinal indireta, com anel inguinal interno normal. Tipo II Hérnia inguinal indireta, com anel inguinal interno dilatado, mas com parede posterior preservada Tipo III Defeito na parede posterior. A: hérnia inguinal direta/falha na fáscia transversalis; B: H. inguinal indireta/passa dentro do canal inguinal; C: femoral. Tipo IV Hérnia recidivada O anel inguinal é o começo do canal inguinal. 7 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Indiretas Diretas Maior prevalência (65%) Menos comum Persistência do canal peritônio-vaginal. Mais frequente na criança e adultos jovens Mais comum no idoso Frequentemente sintomática e associada a complicações (encarceramento, estrangulamento) Menos sintomática e raramente associada a complicações Hérnia mais frequente no sexo masculino Lateral aos vasos epigástricos Medial aos vasos epigástricos Manobra de Landivar Como diferenciar da hérnia inguinal direta? No exame físico, pode ser complexo de se olhar e definir se é direta ou indireta, portanto, faz-se a manobra de Landivar. Se direciona no sentido superolateral do canal inguinal, acima da bolsa testicular. Coloca o dedo e segue o canal inguinal. Se sentir o conteúdo herniado na extremidade distal do dedo, a hérnia é indireta (pois vem dentro do canal inguinal). Se sentir na lateral ou medial do dedo, a hérnia é direta. Ajuda muito no exame físico, mas nem sempre vai ser esclarecedor. Pode não se conseguir identificar mesmo com a manobra. Diagnóstico ❖ Anamnese + Exame físico → diagnóstico. • DÚVIDA DIAGNÓSTICA OU PRÉ-OPERATÓRIO ❖ USG de região inguinal ❖ Tomografia computadorizada O exame complementar não é para fazer diagnóstico, e sim para sanar dúvidas ou para planejamento terapêutico cirúrgico. Imagem: Apenas para ilustrar! O conteúdo herniário está em H. Ele vem pelo canal inguinal e entra em contato com o testículo. Ao contrário da direta, que não entra em contato com nada disso. • Esquerda → paciente sem fazer esforço abdominal. • Direita → paciente fazendo esforço. O primeiro exame da hérnia, de parede abdominal, é sempre USG de região inguinal. A TC é quando a hérnia é muito grande, tem muito intestino dentro. A USG não é boa para ver as alças intestinais. Diagnóstico diferencial • Hérnia femoral: a diferenciação tem a ver com a localização, com os reparos anatômicos. • Hematoma; • Adenite inguinal: Importante – linfonodos que já existem na região inguinal. • Testículo ectópico: Se for em criança (lá para a 8º (?) gestação começa a descida dos elementos do cordão, inclusive do testículo, que muitas vezes 8 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais pode não descer completamente para a bolsa testicular). • Lipoma; • Hidrocele. Tratamento O tratamento da hérnia inguinal é sempre cirúrgico. A diferença é que pode ser eletivo ou de urgência. Ao longo dos anos, as técnicas cirúrgicas sofreram uma evolução. Primeiro, se pensou em fazer a sutura do reparo. Depois, viram que as hérnias muito grandes não respondiam bem a isso, precisando da colocação de prótese/tela de marlex ou polipropileno - substitui a fáscia de halsselbach. Hoje em dia, já se fala em técnicas videolaparoscópicas que também usam telas. A vídeo tem vantagens, mas nem sempre é melhor que a aberta. O tratamento pode ser: • Abordagem anterior: inguinotomia – cirurgia aberta que pode ou não colocar tela para o reparo tecidual. • Reparos teciduais: Mc Vay; Shouldice; Bassini; • Reparo tecidual livre de tensão: Lichtenstein: uso de prótese por usher em 1950; tension free repoir, Lichtenstein, 1986; efeitos do material sintético; bons resultados; técnica padrão ouro. • Abordagem posterior: por vídeo. TÉNICA MCVAY Pega-se um fio de sutura (pode ser absorvível como vicryl, por exemplo) e faz a sutura do tendão conjunto (que vem junto do ligamento inguinal) dessa parte nessa parte (acredito que seja um triângulo com o outro) até próximo do canal femural, onde passa a artéria e a veia femural – é um outro canal fisiológico. NÃO PRECISA APROFUNDAR, É SÓ PRA ENTENDER. BASSINI Quando fazia uma hérnia, que estrangulava, com infecção do local e, nesse caso, não colocava a tela. Porque a tela é um corpo estranho e muitos autores dizem que pode ser contraindicado por conta do local infectado (não é uma regra). Sabe-se que os músculos protegem a aponeurose. Para não colocar a tela no local infectado, fazia-se a técnica de bassini, que consiste em suturar os músculos todos – primeiro o oblíquo interno, depois o oblíquo interno e externo, depois o transverso, por cima da fáscia transversalis e fazia a chamada tripla camada (tentativa de substituir a tela). SHOUL DICE Primeira técnica estudada para correção de hérnia. Tinha alguns problemas porque suturava muito os músculos nas aponeuroses e poderia causar dor porque pegava os ramos genitais, o nervo genitofemoral, por exemplo, que passa pelo ligamento inguinal. LICHTENSTEIN (ATUAL) Pode ser chamada de tension free. Desde 1950, foi proposto uma colocação de uma tela, feita de um material sintético, de polipropileno. Hoje em dia, quando se pede na farmácia do centro cirúrgico, se fala “ tela de Marlex”, que é uma tela macroporosa e que vai ser colocada para substituir a fáscia transversalis. Por que tension free? Por que a tela é colocada solta na cavidade? Por que se eu não suturar ela é melhor? Por que a técnica de tension free é boa? Técnica cirúrgicaA 1º coisa que se faz em todas as cirurgias é a incisão. Então eu vou pegar (isso aqui – na imagem- é o tubérculo ou a sínfise púbica e aqui é a ilíaca anterosuperior), vou medir lá com a minha mão, que deve dar uns 4 ou 5 cm e faço a incisão. Incisei a pele, 9 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais então vou encontrar quem? A fáscia Camper, depois Scarpa; mais profundamente se encontra o músculo oblíquo interno, externo, transversalis, ligamento inguinal (branquinho) e no final do ligamento inguinal tem o chamado tendão conjunto. Então peguei a tela monofilamentar, de polipropileno, fiz um furinho central pra passar os elementos do funículo espermático, e aqui onde eu cortei é onde canal passa (não pode apertar ele porque tem vasos, então tem que ficar aberto); faz então a sutura da extremidade da borda da tela com o ligamento inguinal e deixa o restante livre. O princípio da tela de Marlex é a geração de uma inflamação crônica. A tela vai se aderir aos tecidos profundos por inflamação crônica e se suturar a tela ela vai provocar retração; a retração é uma das fases da inflamação, que é a cicatrização da pele. Então, eu não preciso fixar a tela, porque meu objetivo é só uma inflamação, não quero que a tela fique dura, quero que ela cicatrize e fique próximo/substituindo a fáscia transversalis. A lógica da tension free é essa, sem contar que cada vez que eu vou suturar alguma coisa na região inguinal, eu posso pegar os nervos - principalmente o nervo genital do trato genitofemural, ou o trato iliopúbico. Imagem: elementos do cordão ou funículo espermático (deferente, artéria e veia, plexo panpiniforme). A tela tinha aquele furinho do centro, o pretinho deve ser o fio e o branco deve ser o ligamento inguinal. Fixei a tela no ligamento inguinal e dei esses pontos em preto (pontos alternados para fixação). Não é para a tela ficar colada naquele tecido, é só pra gerar uma reação inflamatória. • Resultado das técnicas cirúrgicas abertas: ❖ Técnica factível, boa reprodutibilidade; ❖ Bons resultados quanto à recidiva; ❖ Índice de dor crônica. Observação: Alguns pacientes não irão reagir bem a esse processo inflamatório da tela e não vão ¨aceitá- la¨, porque a resposta imune pode ser diferente em várias pessoas. É mais raro, pois o polipropileno é um material inerte, e normalmente não causa essa reação de ¨expulsão¨. Dúvida: A vídeo é melhor que a aberta? A vantagem da videolaparoscópica é que o paciente tem um pós operatório melhor, com menos dor e menos chance de lesão necrosa. A técnica da vídeo visualiza melhor as estruturas. Vai substituir a aberta? Nem sempre, por exemplo, hérnias recidivadas devem ser tratas de forma contrária à da primeira abordagem. Se eu abordei por vídeo e recidivou, deve ser abordado agora com a técnica aberta. Se eu abordei aberta e recidivou, será feita por vídeo agora. Técnica videolaparoscópica • Vantagens: • Acessos: ❖ TAPP - Acesso transabdominal pré-peritoneal: é uma técnica que entra ¨dentro da barriga¨,e coloca a tela por dentro. ❖ TEP – Acesso totalmente extra peritoneal: entra no tecido celular subcutâneo abaixo da fáscia de camper e scarpa e coloca a tela. No Brasil se faz muito a TAPP. Nos EUA se faz muito a TEP. Nós temos pouco avanço e a curva de aprendizagem é bem difícil. Lembrar: Hérnias recidivadas devem ter a técnica de cirurgia oposta à da anterior. ▪ Hérnias bilaterais; todas as hérnias bilaterais vão ser melhor tratadas por vídeo? Não é regra! É mais fácil colocar uma tela que corrija os dois defeitos de ambos os lados. ▪ Hérnias abertas recidivadas (abordagem oposta à da anterior). • Desvantagens: ❖ Custos/acessibilidade: material, tela e custos maiores. ❖ Curva de aprendizado: Nem todo mundo vai conseguir fazer a correção da mesma forma com o mesmo tempo cirúrgico de um especialista. 10 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais VISÃO INTERNA LAPAROSCÓPICA Entrada na cavidade abdominal → Incisão → Trocater → Sistema óptico (oferece uma visão de 30º). Imagem: Falha e protusão do peritônio. Dá pra ver que tem alguns vasos, por exemplo, o epigástrico. O ligamento umbilical está mostrado no meio da barriga. Dica: DM – direta medial; IL – Indireta lateral. Tudo que é mais pra direita é lateral e tudo que está mais pro centro é medial. Os vasos epigástricos e o ligamento umbilical dividem a barriga em direta e esquerda. As imagens anteriores foram TAPP. O TEP é um balão de endoscopia. D – Direta; F – Femural. De um lado passa os vasos deferentes e do outro passa os vasos espermáticos. Doom – centro da morte – sangra – tem vasos ilíacos dentro; Pain – Centro da dor – o trato iliopúbico passa lateral aos vasos espermáticos. Correção da hérnia: abre um flap de peritônio/corta o peritônio. Depois do flap, coloca a tela. Normalmente se usa um fio absorvível, fecha e pronto. 1 – Flap de peritônio; 2 – Colocação de tela dupla face Hérnia femoral Hérnia femoral (F na imagem anterior) é a mesma lógica. • Defeito adquirido; • Deficiência metabolismo do colágeno; • Aumento da pressão abdominal; • Hérnia comum em mulheres/lado direito. É mais complicada porque está mais próxima da área de Doon (centro da morte). • Canal inelástico/endurecido: todo intestino que entrar ali vai ter mais chance de encarcerar e estrangular. • Assoalho do canal femoral: ligamento de cooper. • Teto: ligamento inguinal. • Medial: ligamento lacunar: liga o ligamento inguinal ao púbis; • Lateral: veia femoral. O ligamento lacunar, o canal inguinal, a veia femoral e o teto do canal inguinal é exatamente o ligamento inguinal. Atenção: artéria e veia femoral são vasos calibrosos. Se ocorrer alguma iatrogenia, pode ser irreversível para o paciente. Imagem: figura real. Demonstra dois abaulamentos principais em região inguinal no lado esquerdo. O abaulamento inferior é maior, já que por aqui passa o canal femoral, que parece ¨estrangular¨ o intestino. O acesso vai desde a crista ilíaca até o púbis. É possível visualizar na imagem uma parte do intestino (antes e depois do canal femoral), visualizando o canal femoral. Na cirurgia, tenta reduzir (puxa o intestino acima do canal e verifica a viabilidade dessa alça). Se tiver ruim, será necessária uma secção do intestino. Na imagem, é possível ver um afastador de farabeuf. 11 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Hérnia incisional • Defeito ¨iatrogênico¨: nem sempre é causado por um erro do cirurgião. Às vezes são provocadas por fatores do próprio paciente. • Complicação de ferida operatória; • Fatores associados: ❖ Complicações locais; ❖ Complicações sistêmicas; ❖ Fatores pré–operatórios: pacientes desnutridos, idosos que apresentam cicatrização ruim. As pessoas podem adquirir essa hérnia após a incisão cirúrgica, já que a incisão enfraquece o peritônio. Tal enfraquecimento também pode estar relacionado a fatores de enfraquecimento local, como por exemplo, infecções locais que podem levar a uma cicatrização errática e enfraquecer o peritônio. Causas sistêmicas também podem ocasionar, como por exemplo, diabéticos que apresentam dificuldade na cicatrização; pacientes com doença do colágeno (ex. síndrome de marfan, deficiência de alfa 1 antitripsina). Em relação a cirurgia, se o fio absorver, pode abrir novamente a aponeurose antes mesmo da cicatrização. Algumas aponeuroses demoram cerca de 3 meses até a cicatrização completa. Dessa forma, não podemos utilizar fios que absorvam antes dos 3 meses. Melhor fio para aponeurose: Polidiazanona. Absorvível com um tempo de meia vida de 180 dias, porém é caro. Não é recomendado o uso de vicryl (perde a força tênsil em 40 dias, podendo sofrer absorção e levara abertura da aponeurose). ❖ Fatores de risco: ❖ Obesidade/desnutrição; ❖ Doença pulmonar: DPOC – tosse aumenta a chance de abrir a aponeurose. ❖ Idade avançada; ❖ Doença oncológica: Câncer – estado consumptivo que aumenta muito o metabolismo e diminui a cicatrização local. ❖ Infecção intra abdominal. ❖ Complicação cirúrgica ❖ Fechamento da parede abdominal. Como foi a técnica cirúrgica? Fechou da forma correta? Não é regra, mas normalmente quem faz hérnia incisional são pacientes portadores de obesidade, desnutridos e com doença pulmonar. • Evolução: Podem aumentar de volume ao longo do tempo. • Quadro clínico: Hérnia domiciliada. Ou seja, a pessoa tem a hérnia há tantos anos que chega um momento que ela se adequa aquele saco herniário e é muito difícil fazer a correção. • Tratamento: Uso de prótese (se a hérnia for grande); técnica videolaparoscópica. Imagem: somente para localizar as hérnias que estão na parede ventral. M1 → até 3 cm do apêndice xifoide. M2 → epigástricas. M3 → Umbilicais – podem estar localizadas 3 cm acima ou abaixo do umbigo. M4 → infraumbilicais. M5 → suprapúbicas. Para reparar uma hérnia incisional existem 4 possibilidades: Posição da tela para o reparo • Opção 1- Onlay - logo abaixo de camper e escarpa, acima do músculo reto abdominal → adiciona à tela. • Opção 2- Sublay - logo abaixo do músculo e acima do peritônio. • Opção3- Underlay- abaixo do peritônio. • Opção 4- Inlay- entre uma extremidade do grupamento reto abdominal direito com o esquerdo. 12 Beatriz Machado de Almeida Cirurgia – Hérnias abdominais Imagens: Fotos reais. A primeira é o antes do paciente com hérnia domiciliada. Depois, o aspecto intraoperatório, mostrando o conteúdo que foi reduzido. Última fotografia é o aspecto final. Foi necessária a retirada de boa parte da pele. Hérnias especiais É necessário saber que elas existem. Diferencial! • Garangeot (apêndice na hérnia femoral): hérnia femoral cujo conteúdo herniário é o apêndice vermiforme. • Amyand (apêndice na hérnia inguinal); • Littré (Divertículo do merckel dentro da hérnia): é quando a hérnia inguinal é o divertículo dentro da hérnia. Mais comum em jovens e crianças e que pode herniar (defeito na embriogênese). Conceito: a borda mesentérica é aquela ligado aos vasos que nutrem o mesentério, que é a parte amarela do intestino (vasos, nervos e artérias). A borda antimesentérica é a porção lisa (rosa). • Richter (pinçamento da borda antimesentérica da alça): Ou seja, somente a borda antimesentérica que hérnia. • Spieget (linha semilunar); • Pett e Grynfelt (pequeno e grande triângulo lombar): Hérnias posteriores que ocorrem nas falhas do triângulo lombar. Conclusão • Patologia frequente na prática clínica; • Quadro clínico diverso; • Técnicas terapêuticas em evolução. ❖ Complicações cirúrgicas: Seroma, acúmulo de líquido, hematoma, acúmulo de sangue, infecção, rejeição da prótese ou da tela. ❖ É necessário saber: músculos da parede abdominal; grupos musculares; fáscias mais importantes; aponeurose. Entender o que é um vaso epigástrico, o que é lateral e medial. ❖ Saber que é uma patologia que não é necessário exame complementar.
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