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CENTRO EDUCACIONAL CAPACITAR Sara Almeida Souza da Silva DISSERTAÇÃO ARGUMENTATIVA DO ARQUIVO “DISLEXIA E AS CONTRIBUIÇÕES DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA” Curso: Neuropsicologia Disciplina: Funções Neuropsicológicas e seus Distúrbios II - Aprendizagem, Pensamento e Linguagem ALAGOINHAS/BA 2019 Pretende-se neste texto dissertativo-argumentativo realizar breves apontamentos sobre a dislexia e as contribuições da avaliação neuropsicológica. Compreende-se que a educação e a neurociência tratam do mesmo objeto de estudo, ou seja, a pessoa, o seu comportamento, a maneira como aprende e a sua individualidade. É neste contexto que é salutar à educação voltar sua atenção e incorporar em seu núcleo conhecimentos que relacionam o cognitivo (neuropsicologia), a biologia e o comportamento. De acordo com os estudos da neurociência (THOMPSON, 2005), o aprender e o lembrar dos seres humanos ocorre no cérebro, sendo o cérebro um órgão moldável aos estímulos do ambiente. A neuropsicologia, um dos ramos da neurociência, procura estudar as relações entre a cognição e o comportamento humano e as funções cerebrais preservadas ou alteradas. Além da linguagem, diversas outras áreas vêm sendo pesquisadas, como atenção, memória, percepção auditiva, e, influenciada pelos avanços da bioquímica surgiu o interesse pelos substratos orgânicos das emoções e suas interrelações com outros sistemas orgânicos (KRISTENSEN; ALMEIDA; GOMES, 2001). Feitas estas primeiras considerações, passa-se agora a questão central desta dissertação-argumentativa, a dislexia, e posteriormente - adentraremos na contribuição da neuropsicologia para este distúrbio de aprendizagem. A aprendizagem está intimamente ligada ao desenvolvimento do cérebro; portanto, o conhecimento do funcionamento do cérebro é uma maneira de ajudar os alunos a aprenderem. Assim, a aprendizagem torna-se o processo pelo qual o cérebro, reagindo aos estímulos do ambiente, ativa as sinapses tornando-as mais intensas, processando as informações. A sinapse pode ser definida como o “ponto de junção entre um neurônio e outro, na maioria das vezes, produzido pelos axônios e dendritos” (TAFNER; FISCHER, 2004, p. 17). Para Capellini e Souza (2008), o ensino pode provocar alteração na taxa de conexão sináptica, e afetar a função cerebral dependendo de vários fatores, entre eles a natureza do currículo, da capacidade do professor, o método de ensino e o contexto da sala de aula, da família e da comunidade. A alimentação também afeta o cérebro da criança em idade escolar. Se a dieta for de baixa qualidade, a mesma não corresponde devidamente ao ensino que lhe for aplicado. Todos estes fatores interagem com as características do cérebro de cada indivíduo. Ainda conforme os autores supracitados, estudos focalizados no cérebro direcionados a aspectos de atenção, memória, linguagem, leitura, raciocínio lógico, sono, emoção e cognição estão trazendo valiosas contribuições para a educação. A aprendizagem da escrita e da leitura é complexa para crianças em processos iniciais de alfabetização e ocorre durante todo o período escolar, pois, conforme Capellini e Souza (2008, p.55), “esta aprendizagem envolve habilidades cognitivas e motoras que exigem dos escolares o uso dos componentes sensório-motores e perceptivos, ou seja, a capacidade de decodificação das palavras e a ação motora adequada no ato de escrever”. Do déficit na aprendizagem da leitura surgiu o termo dislexia específica ou distúrbio específico da leitura. Conforme Johnson e Myklebust (1991, p. 9), o termo normalmente é usado para “referir-se a crianças com dificuldades na aprendizagem da leitura em consequência de envolvimento neurológico”. Essa designação tem valor diagnóstico e educacional, mas não pode ser aplicada àquelas crianças que têm outras dificuldades de aprendizagem, além da dislexia. A leitura é um sistema de símbolos a dois níveis de distância das realidades que representam, ou seja, primeiramente, a aluno integra experiências não-verbais, para, em seguida, adquirir a representação auditiva e, posteriormente, um sistema verbal visual, que representa tanto a experiência quanto o símbolo auditivo. Daí a questão da complexidade e da dificuldade da leitura do disléxico, pois esse sistema de símbolos requer uma série de integridades, exige a capacidade de diferenciar um símbolo de outro, atribuindo- lhe um significado, assim como memorizá-lo, e o disléxico apresenta uma disfunção nesse percurso (SENNYEY; CAPOVILLA; MONTIEL, 2008). A dislexia causa dificuldade de aprendizagem gerando uma incapacidade de ler, restringindo as atividades diárias e o norteamento global das crianças. Na figura abaixo alguns sintomas característicos da dislexia em crianças Fonte: http://psicopedagogiaclin.blogspot.com/2015/02/dislexia.html De acordo com Capellini e Souza (2008), “a dislexia é muitas vezes tardiamente identificada no contexto da sala de aula e consequentemente tratada de forma inadequada, o que potencializa o fracasso na escolarização”. A avaliação de alunos com dislexia é dificultosa, pois, de acordo com Snowling e Stackhouse (2004), cujas pesquisas revelam que a maior parte das http://psicopedagogiaclin.blogspot.com/2015/02/dislexia.html crianças disléxicas é encaminhada para especialistas quando não conseguem aprender a ler e, ainda, que a idade mais abrangente de crianças está localizada na idade escolar. Outra questão que envolve o disléxico e que prejudica o desenvolvimento escolar, assim como as crianças com TDAH, é o fator biológico, pois de acordo com pesquisas, “há evidências conclusivas de que a dislexia é hereditária” (SNOWLING; STACKHOUSE, 2004, p.19) e gera um agravante no aprendizado, se refletindo na autoestima dos alunos, tanto no ambiente escolar como no social. Na figura seguinte, apresenta-se as áreas do cérebro afetadas nas pessoas com dislexia. Fonte: http://wwwpsicopedagogiaecia.blogspot.com/2017/10/publicacao- neurosaber-com-dr-clay-brites.html Para Capellini e Souza (2008), a dificuldade de ler e de escrever obstrui o aprendizado e, quando as dificuldades são expostas, o aluno disléxico vê-se retraído, podendo, por vezes, se sentir ou também ser estigmatizado. Todas as dificuldades, quando expostas para a grande maioria, de colegas de classe, de pessoas da sociedade, gera uma carga que tende a ser negativa para a criança com essa dificuldade de aprendizagem. Um processo pedagógico e avaliativo viável para crianças com dislexia baseia-se na utilização da repetição, de atividades adaptadas no sentido de trabalhar o aspecto fonológico das mesmas. Snowling e Stackhouse (2004, p. 21) explicam que os disléxicos têm déficits fonológicos que os impedem de se alfabetizarem no ritmo normal e que “descobertas comprovam que o treinamento das habilidades fonológicas tem efeito benéfico sobre o desempenho na leitura e na ortografia, especialmente quando combinado com o ensino dos relacionamentos entre letra e som”. Um aspecto importante a ser trabalhado com alunos disléxicos é a “consciência fonológica”, que, segundo Snowling e Stackhouse (2004, p. 41), “é uma habilidade necessária para que a alfabetização se desenvolva satisfatoriamente” e consiste, em síntese, na forma como a criança recebe as informações. No caso do disléxico, ele escuta, porém não consegue discriminar e sequenciar os fatos. Para trabalhar com algumas das necessidades apresentadas pelos disléxicos, existem disponíveis, em bibliografias contemporâneas, testes de memória fonológica; atividades com rima; repetições; atividades que envolvem a ortografia, com letras e fonemas específicosapresentados de acordo com as peculiaridades de cada disléxico; atividades com vocabulário, associando palavras, como substantivos e verbos, a figuras ou objetos; e habilidades de memorização, cognitivas e sensoriais. Muitos materiais de apoio, assim como sugestões bibliográficas estão disponíveis no site da Associação Brasileira de Dislexia (2019). Diante do exposto, de que forma a neuropsicologia pode auxiliar no tratamento da pessoa com dislexia? Entende-se que a avaliação neuropsicológica é essencial. Para Silva (2017, p. 533) “A avaliação neuropsicológica abrange dois aspectos de estudo, os quantitativos com uso de testes normatizados, e os qualitativos, que incluem entrevistas, questionários, entre outros”. Para Camacho (2012) a avaliação neuropsicológica possibilita identificar alterações cognitivas, como quadros de demência, déficit cognitivos, quadros emocionais patológicos, dentre outros. Capovilla (2007) explica que a avaliação neuropsicológica torna-se relevante, pois dentre os seus propósitos temos: o diagnóstico e a identificação do tratamento necessário. A avaliação neuropsicológica, trata-se de uma avaliação sistemática das relações entre cérebro e comportamento humano. A avaliação neuropsicológica agrega fatores emocionais, etiológicos e comportamentais, que servem como parâmetros para desenvolver possíveis intervenções. No caso da dislexia, sabe-se que a identificação precoce, permite organizar desde cedo estratégias de intervenção eficazes, podendo minimizar as dificuldades e potencializar o desenvolvimento. Na avaliação neuropsicológica em crianças, Afiune (2019), sugere por exemplo, que sejam utilizadas: estratégias lúdicas, se necessário realizar pausas ou sessões menores (devido as crianças cansarem com mais facilidade). Esta avaliação “consiste num processo psicodiagnóstico que tem como foco a relação cérebro- comportamento” (AFIUNE, 2019, p. 38). A avaliação neuropsicológica procura investigar possíveis comprometimentos nas funções cognitivas e se isto pode estar a afetar o comportamento do indivíduo, ou no ambiente escolar, o processo de ensino- aprendizagem. Para Afiune (2019, p.66), a avaliação neuropsicológica em pessoas com transtornos de aprendizagem, o qual encontra-se a dislexia, deverá ser feita “com base em uma síntese clínica da história do indivíduo (do desenvolvimento, médica, familiar, educacional), em relatórios escolares e em avaliação psicoeducacional”. Diante desta breve exposição, entende-se que a dislexia é um problema que preocupa pais, professores e principalmente o aluno, que a depender de sua faixa etária poderá ter afetada a sua autoestima. A avaliação neuropsicológica poderá contribuir para um melhor direcionamento no ensino-aprendizagem do disléxico, pois identificará os problemas de aprendizagem associados, além das questões relacionadas ao desenvolvimento cognitivo e emocional do aluno. Por fim, entende-se que o trabalho a ser empregado no cotidiano do aluno com dislexia deve ser de continuidade, de monitoramento, com o auxílio de testes para identificar os graus de dificuldades apresentados, se de leitura, ortografia, entendimento ou construção de sentidos, para, assim, estabelecer métodos e instrumentos que agreguem mais qualidade ao ensino dessas crianças que possuem essa dificuldade de aprendizagem. REFERÊNCIAS AFIUNE, Fernanda Guedes. Neuropatologias da criança, adulto e idoso. Disponível em: <https://drive.google.com/file/d/1Ku7A0vi2Z4FJIiKDstXh0zxZ5K- ogwB9/view> Acesso em: 09 abr. 2019. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISLEXIA. Dislexia. 2019. Disponível em: <http://www.dislexia.org.br/category/artigos/dislexia/> Acesso em: 9 abr. 2019. CAMACHO, Marta. Avaliação neuropsicológica com adultos idosos: especificidades. Revista de Psicologia da IMED, Passo Fundo, v. 4, n. 1, p. 662-670, jun. 2012. CAPELLINI, Simone Aparecida; SOUZA, Aline Viganô. Avaliação da função motora fina, sensorial e perceptiva em escolares com dislexia do desenvolvimento. In SENNYEY, Alexa L.; CAPOVILLA, Fernando C.; MONTIEL, José M. Transtornos de aprendizagem: da avaliação à reabilitação. São Paulo: Artes Médicas, 2008. CAPOVILLA, A. G. S. Contribuições da neuropsicologia cognitiva e da avaliação neuropsicológica à compreensão do funcionamento cognitivo humano. Cadernos de Psicopedagogia, 6(11), 2007. JOHNSON, Doris J.; MYKLEBUST, Helmer R. Distúrbios de aprendizagem. 3.ed. São Paulo: Pioneira, 1991. KRISTENSEN, C. H.; ALMEIDA, R. M. M.; GOMES, W. B. Desenvolvimento histórico e fundamentos metodológicos da neuropsicologia cognitiva. Psicologia - Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 14, n. 2, p. 259-74, 2001. TAFNER, Malcon Anderson; FISCHER, Julianne: O cérebro e o corpo no aprendizado. Indaial: Editora ASSELVI, 2004. https://drive.google.com/file/d/1Ku7A0vi2Z4FJIiKDstXh0zxZ5K-ogwB9/view https://drive.google.com/file/d/1Ku7A0vi2Z4FJIiKDstXh0zxZ5K-ogwB9/view http://www.dislexia.org.br/category/artigos/dislexia/ THOMPSON, F. Richard. O cérebro: uma introdução à neurociência. Trad. Silvia M. Spada. São Paulo: Santos Livraria Editora, 2005. SENNYEY, Alexa L.; CAPOVILLA, Fernando C.; MONTIEL, José M. Transtornos de aprendizagem: da avaliação à reabilitação. São Paulo: Artes Médicas, 2008. SILVA, Denice Resende. Dislexia: contribuições da avaliação neuropsicológica. Fragmentos de Cultura, Goiânia, v. 27, n. 4, p. 529-543, out/dez. 2017. SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy; Dislexia fala e linguagem: um manual profissional. Porto Alegre: Artmed, 2004.
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