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Tumores ósseos Os tumores ósseos primários representam 1% dos casos ambulatoriais de ortopedia e 3% dos casos diagnosticados de neoplasias. Nos países desenvolvidos, a média de tempo para diagnóstico é de 6 semanas, tempo que é pelo menos 2x maior no Brasil. Isso ocorre, pois eles iniciam sua sintomatologia de forma insidiosa, sendo confundidos com problemas musculoesqueléticos corriqueiros. As etapas da abordagem incluem estadiamento por imagem, diagnóstico anatomopatológico e o tratamento. Os tumores benignos contêm uma cápsula verdadeira, formada por células não tumorais, e não unicompartimentais. Os tumores malignos possuem uma pseudocápsula cercada por uma zona fibrovascular de tecido reativo e apresentam potencial de invadir e ultrapassar essa pseudocápsula para formar lesões satélites no osso. Eles tendem a ser extra ou multicompartimentais, destruindo a cortical do osso de origem e crescendo em direção aos tecidos moles adjacentes. Os principais tumores malignos primários diagnosticados são osteossarcomas, seguidos por condrossarcomas, Ewing, fibrossarcomas, fibrohistiocitoma maligno, cordoma e angiossarcoma. • Osteossarcoma É um tumor maligno caracterizado pela produção de osteoide pelas células malignas (câncer que multiplica tecido ósseo imaturo). É a 1ª neoplasia óssea primária, acometendo principalmente homens adolescentes e adultos jovens (10-25 anos). Os osteossarcomas parosteal e secundário podem acometer indivíduos mais velhos, sendo o primeiro mais comum de 30-40 anos e o segundo, em idosos. Ocorrem geralmente na metáfise de ossos longos, por serem locais de crescimento rápido, principalmente fêmur distal, tíbia proximal e úmero proximal. Podem ser classificados em primários, que podem ser subdivididos em convencional, intramedular de baixo grau, parosteal, periosteal, alto grau de superfície, teleangiectásico e de pequenas células, ou secundários, decorrentes de doença de Paget ou radioterapia prévia. Outra classificação diz respeito ao local de origem. A apresentação clínica é marcada por dor progressiva, presente na maioria dos casos de alto grau, relacionada ao crescimento rápido dos tumores, que não é acompanhada pelo crescimento de vasos, provocando microinfartos responsáveis pela dor. Em tumores de baixo grau, a principal queixa é a presença de uma massa indolor. Como ocorre multiplicação de tecido ósseo imaturo, exames laboratoriais podem demonstrar aumento da fosfatase alcalina. No exame de imagem, podem estar presentes o triângulo de Codman (neoformação óssea eleva o periósteo) e lesão em raios de sol pelas reações periosteais. A lesão geralmente é agressiva e apresenta aspecto misto, com áreas de produção de osso e áreas de destruição, e bordas mal definidas. A RNM é importante para avaliação da extensão do tumor no interior do osso e para partes moles adjacentes. A TC de tórax é importante para realização de estadiamento e a cintilografia avalia metástases ósseas. O tratamento consiste em cirurgia e quimioterapia neoadjuvante (reduz a magnitude da cirurgia, pois reduz o tumor). Na realização de cirurgia isolada, o risco de recidiva ultrapassa 80%. → Osteossarcoma convencional É o tipo mais comum e apresenta alto grau. Seu aspecto radiográfico é clássico e a lesão é inicialmente intramedular. Na histologia, a lesão pode ser primariamente osteoblástica, fibroblásticas ou condoblástica, apresentando hipercelularidade e pleomorfismo nuclear. → Osteossarcoma intramedular de baixo grau É mais raro. Apresenta curso indolente, crescendo lentamente e com aspecto radiográfico e histológico é relativamente benigno. A histologia é marcada por atipias leves, produzindo trabéculas ósseas irregulares, inicialmente intramedulares. → Periosteal Também chamado de osteossarcoma condroblástico, é um tumor de superfície que apresenta malignidade intermediária. Principalmente localizado nas diáfises do fêmur e da tíbia, em uma faixa etária mais avançada. A histologia é marcada por cordões de células fusiformes produtoras de osteoide irradiando entre lóbulos de cartilagem. → Parosteal Também chamado de osteossarcoma justacortical, é uma lesão de baixo grau, localizada na superfície. A apresentação típica é uma massa ossificada e lobulada no aspecto posterior do fêmur distal. A histologia é semelhante ao intramedular de baixo grau. O diagnóstico diferencial deve ser feito com miosite ossificante e osteocondroma. → Alto grau de superfície É o tipo menos comum de osteossarcoma. Tumor altamente agressivo, que emerge da superfície, e é caracterizado por uma lesão invasiva sem bordas definidas no rx e por histologia semelhante ao convencional. Apresenta invasão medular precoce. → Teleangiectásico Lesão puramente lítica que pode ter aparência invasiva ou insuflativa no raio x, com aspecto macroscópico de cisto cheio de sangue com pequena porção sólida. Na histologia, em baixo aumento lembra COA (cisto ósseo aneurismático), com espaços cheios de sangue separados por septos finos, e em grande aumento apresenta aparência francamente maligna das células nos septos. → De pequenas células É raro e se comporta como sarcoma de Ewing e lnfoma. Presença de pequenas células azuis, com material fibrina-like. Geralmente é necessária a imuno- histoquímica para o diagnóstico diferencial. • Sarcoma de Ewing Acomete principalmente crianças e adolescentes (5-15 anos), homens, da raça branca. É a malignidade primária mais comum no osso em < 10 anos, a segunda em < 30 anos e a quarta em geral. As lesões são mais comuns na diáfise de ossos longos, principalmente femoral, e na pelve. É raro em coluna, pés e mãos. A dor de início insidioso é a queixa mais comum e pode responder a tratamento inicial, dando falsa sensação de melhora. Por isso, é sempre importante pedir raio x para crianças com queixa de dor óssea. Pode apresentar febre baixa associada a astenia, eritema e edema, simulando a osteomielite. O aspirado de agulha é semelhante ao pus. É necessário enviar para cultura e citológico. O hemograma tem anemia normo normo e leucocitose. LDH, fosfatase alcalina, PCR e VHS estão aumentados. O padrão de imagem é de lesão salpicada e permeativa, descrita como roído de traças, ou de reação periosteal, com lesão destrutiva na diáfise, caracterizada como casca de cebola. Também são vistas áreas líticas ao lado de áreas blásticas. A RNM deve sempre ser solicitada, pois avalia a extensão da lesão e o acometimento de partes moles. Rx e TC de tórax também devem ser realizadas em todos os pacientes para avaliar metástases, que ocorrem mais comumente nos pulmões. A cintilografia também é útil na avaliação das metástases. A histologia é marcada por pequenas células azuis, com pouca matriz intercelular. A imuno-histoquímica pode ser necessária para diagnóstico diferencial com tumor de pequenas células e é capaz de detectar antígeno CD99, específico para Ewing. O prognóstico depende da presença de metástases a distância (pior fator), tamanho da lesão primária e localização. Diagnóstico precoce tem uma chance de cura de 75-80%, que cai para 20% quando é feito em fase de metástase. O tratamento consiste em quimioterapia neoadjuvante, cirurgia e quimioterapia adjuvante. A radioterapia pode ser realizar, se a margem cirúrgica não for livre. A classificação de Huvos avalia a ação da quimioterapia nas células tumorais. Grau I Mínimo ou nenhum efeito nas células tumorais (50% céulas viáveis) Grau II Resposta parcial com 50-90% de necrose Grau III Mais do que 90% de necrose (focos de tumor viáveis são vistos em algumas lâminas) Grau IV Nenhuma área de tumor viável • Condrossarcoma Tumor maligno derivado de tecido cartilaginoso que corresponde a 9% das neoplasias ósseas primárias malignas, acometendo principalmente pacientes homens de 40-60 anos. Ocorre geralmente napelve, no fêmur ou no úmero proximais e é o tumor maligno mais comum na mão. Tem crescimento lento e apresenta-se com dor progressiva ou massa palpável. O condrossarcoma secundário ocorre em local de lesão cartilaginosa benigna pré-existente. No raio x é possível visualizar calcificações em pipoca, salpicas ou em formato de vírgula. Também são visualizadas áreas de destruição óssea, erosão cortical e reação periosteal. A lesão emerge do canal medular, com matriz calcificada irregular, sendo a invasão de partes moles mais rara. Na histologia é possível visualizar células malignas com matriz cartilaginosa abundante. O diagnóstico diferencial deve ser feito entre condrossarcoma de baixo grau e encondroma, que apresenta hipercelularidade, núcleos grandes, muitas células binucleadas, padrão permeativo e aprisionamento de trabéculas. O tratamento do condrossarcoma baixo grau é controverso, mas geralmente curetagem ampla e tratamentos adjuvantes intraoperatórios são suficientes. Para tumores de alto grau, é realizada a ressecção com margem oncológica. As células cartilaginosas sobrevivem ao transplante, portanto apresenta altas taxas de recorrência por contaminação intraoperatória. Os tumores não são responsivos à quimio e radioterapia. Clínica Devem ser suspeitados em pacientes dor óssea e proeminência, com evolução de semanas a meses. A história geralmente não é relacionada a nenhum trauma e apresenta como queixa mais comum a dor, que inicialmente pode ser relacionada a atividades, mas aparece mais frequentemente ao repouso ou à noite (osteoma osteoide). Não costumam causar sintomas constitucionais, exceto o sarcoma de Ewing. Também podem se apresentar com uma fratura patológica, geralmente em locais atípicos e gerada por pequenos traumas. A história familiar é importante, pois alguns tumores são mais incidentes quando há história em parentes de 1º grau. Alguns tumores são mais raros em determinadas etnias, como o sarcoma de Ewing em negros. A idade é fator isolado mais importante no diagnóstico diferencial. Ao exame físico, deve-se avaliar as medidas da massa, sua localização, forma, consistência, mobilidade, dor, temperatura e vascularização e se há presença de atrofias, manchas e sinais de síndromes associadas. Exames Na maioria das vezes, somente o anatomopatológico pode dar certeza do diagnóstico e da escolha terapêutica correta. O raio X é o exame mais útil na investigação de tumores ósseos. Deve-se avaliar detalhadamente o local da lesão, a zona de transição (área entre a lesão tumoral e o osso doente, para avaliar a agressividade), a reação do organismo à lesão e os aspectos da lesão (se há calcificação, cistos, etc). As lesões benignas apresentam demarcação distinta, podendo haver área de esclerose ao redor. As malignas tem maior tendência a limites mal definidos. Em tumores benignos agressivos, é possível observar alterações como expansão, abaulamento e afilamento, como ocorre nos encondromas, na displasia fibrosa e no cisto aneurismático. A reação cortical representa a transição entre a lesão tumoral e o osso sadio. Tumores muito agressivos crescem muito rápido e causam descolamento do periósteo, que irá calcificar, formando o triângulo de Codman. Outros sinais de reação cortical são a casca de cebola, em que há deposições laminares de cálcio, e os raios de sol, que são imagens transversas em relação à diáfise do osso. Sempre que a radiografia indicar tumor maligno, devem ser solicitadas TC, RNM e cintilografia antes da realização da biópsia. A TC auxilia a identificação de acometimento de tecidos moles e a presença ou não de metástases pulmonares. A RNM revela a extensão intra e extramedular de um tumor, além de avaliar a invasão de tecidos moles adjacentes. É importante no estadiamento local, avaliando o tamanho, a extensão e a relação anatômica com partes moles. A cintilografia óssea é útil na avaliação de metástases e da atividade osteoblástica do tumor, mas pode ser negativa em alguns tumores, como granuloma eosinofílico, mieloma múltiplo, câncer de células renais e sarcomas intensamente anaplásicos. A USG ajuda a diferenciar tecidos císticos de sólido. A TC avalia ossificação heterotópica, a integridade cortical e a presença de metástases. Os exames laboratoriais, como hemograma, aumento de VHS e de PCR falam mais a favor de quadros infecciosos, leucemia, linfoma e histiocitose. A eletroforese de proteínas e proteinúria de Bence Jones são positivas em mielomas múltiplos, assim como a hipercalcemia. Fosfatase alcalina pode estar aumentada em casos de metástases, alterações metabólicas, osteossarcoma, Paget, Ewing ou linfoma. Aumento de PTH pode falar a favor de tumores marrons de hiperparatireoidismo. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial de lesões não tumorais inclui fraturas por estresse, miosite ossificante, doenças metabólicas, infarto ósseo, distúrbios sinoviais como condromatose sinovial e sinovite vilonodular pigmentada e infecções, como osteomielite aguda. Estadiamento Existem duas classificações mais utilizadas: padrão de comportamento GTM (grau, topografia e metástase) e Enneking. O estadiamento tem como finalidade a descrição dos riscos progressivos de recorrência local e de metástase à distância, a estratificação de estágios e o planejamento dos tratamentos. • GTM Graduação G0 (benigno) G1 (baixo grau) G2 (alto grau) Clínica Sem metástase Crescimento lento e raras metástases Crescimento rápido e metástases frequentes Radiografia Bem delimitada Invasão indolente Destrutiva Histologia Bem diferenciado Diferenciação moderada Pouca diferenciação São descritos como T1 quando intracompartimentais e T2 quando extracompartimentais. • Enneking É uma das mais utilizadas. → Tumores benignos Para tumores benignos, usa-se B. B1 se refere a um achado acidental, com uma lesão latente, intracapsular, em que o paciente se encontra assintomático. No raio X, a imagem é bem definida, com esclerose ao redor, sem erosão ou destruição cortical. Não requer tratamento. B2 é classificado como benigno ativo. Ainda é uma lesão intracapsular, mas o crescimento é ativo e o paciente pode apresentar sintomas. No raio X, as margens são bem definidas, a cortical geralmente é fina e pode ser expansivo. O tratamento consiste na curetagem. B3 é um benigno agressivo, com expansão extracapsular, geralmente ultrapassando a cortical. O tratamento consiste na curetagem extensa ou ressecção. Há alta taxa de recidiva e é possível que eles gerem metástases. B1: latentes Crescimento lento, assintomáticos, descobertos por acaso e não deformam as barreiras do compartimento do osso cortical ou cartilagem articular B2: ativos Crescimento moderado, geralmente sintomáticos, possuindo uma fina camada de tecido areolar frouxo como zona reativa e podem expandir o osso por deformação do osso cortical B3: agressivos Crescimento rápido, penetrando a cápsula como extensões digitiformes, protraindo diretamente na zona ao redor. → Tumores malignos A classificação de tumores malignos é dividida em I, II e III. Grau I é referente a uma lesão de baixo grau, sendo dividida em A, intracompartimental, e B, extracompartimental. São massas indolores, de crescimento lento, que apresentam baixo risco de metástases. O crescimento ocorre mais por erosão do que por destruição. No raio x, as lesões são similares e até menos agressivas do que alguns B3, podendo haver um halo de esclerose e presença de triângulo de Codman. Na histologia, as células são bem diferenciadas, pouca presença de mitose e moderadas atipias celulares. Podem haver áreas de necrose, hemorragia e invasão vascular. As metástases para nódulos regionais são infrequentes e pulmonares são raras,tardias e únicas. As lesões de grau II são de alto grau, sendo divididas em A e B da mesma forma que as de grau I. As lesões são destrutivas, sintomáticas e frequentemente associadas a fraturas patológicas. Elas estimulam a formação de grandes quantidades de osso reativo, crescem rápido, rapidamente se tornando extracompartimentais, e envolvem o feixe vásculo-nervoso. Além disso, cruzam a placa de crescimento. Ao raio X, as margens são indefinidas, há presença de destruição cortical importante, invasão de tecidos moles e pode haver triângulo de Codman. Na cintilografia há concentração além das margens. Na histologia há um alto índice de célula/matriz, com matriz imatura, mitoses abundantes, invasão vascular, necrose e destruição de tecidos moles. O grau III é caracterizado por metástases. Carcinomas de disseminação linfática são mais frequentes. A disseminação é sanguínea, podendo haver envolvimento pulmonar nos estágios precoces e quando a metástase é não pulmonar, o prognóstico é pior. A biópsia deve ser planejada de acordo com o tratamento cirúrgico, apenas avaliação clínica, laboratorial e de imagem e seu trajeto é considerado contaminado. Deve-se evitar incisões transversas e realizar violando apenas um compartimento, sem ser sobre um futuro acesso cirúrgico. Se precisar perfurar o osso, realizar uma perfuração oval ou circular para diminuir a chance de fraturas patológicas. A hemostasia deve ser rigorosa, pois o hematoma pode disseminar essas células, principalmente em casos de condrossarcoma (célula cancerosa que produz cartilagem, que não necessita de circularização intensa). Estadio Grau Localização Metástase IA Baixa Intracompartimental Não IB Baixa Extracompartimental Não IIA Alta Intracompartimental Não IIB Alta Extracompartimental Não III Baixa ou alta Intra ou extra Regional ou distante Tratamento Os avanços nos diversos campos de tratamento geralmente permitem a salvação do membro. Ao avaliar amputação ou preservação, pensar se a sobrevida será afetada pelo tratamento escolhido, na morbidade a curto e a longo prazo e se haverá consequências psicossociais. A margem intralesional é no interior da área reacional, a marginal resseca toda a área reacional, a ampla retira tecidos saudáveis e a radical retira o compartimento todo. - Intralesional: margem dentro do tumor, com tumor retirado em fragmentos. Feita em casos de tumores benignos sintomáticos, em que teria que sacrificar estruturas importantes. - Marginal: o plano é da pseudocápsula, deixando uma parte da zona reativa, podendo conter células viáveis. É realizado para a maioria dos tumores benignos ou até mesmo para malignos de baixo grau. A terapia adjuvante tornou uma modalidade aceitável. - Ampla: o plano é o tecido normal. Utilizados em malignos de alto grau - Radical: retira todo o compartimento que contém o tumor. É pouco usado. As técnicas realizadas são curetagem, curetagem estendida, ressecção e reconstrução e amputação.
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