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41PROENEM Aproxime seu dispositivo móvel do código para acessar a teoria ROMANTISMO NO BRASILCONTEXTOS E EXPRESSÕES O Romantismo brasileiro nasce das possibilidades que surgem com a chegada da família real em 1808. A urbanização do Rio de Janeiro e o contato com a corte propiciam o campo necessário à divulgação das influências europeias. Tais ideais de autonomia e respirando-se um ar notadamente nacionalista, a colônia caminhava rumo a sua independência. Após a Independência cresce ainda mais o sentimento nacionalista e intensificam-se tendências já cultivadas na Europa, como a busca do passado histórico e a exaltação da natureza. Aliado a esses fatores, havia enorme interesse da novo governo em ofuscar as crises sociais, financeiras e econômicas geradas por nossa separação da corte portuguesa. DEBRET, Jean-Baptiste. Coroação de D. Pedro I, 1828. A política nacional passava por um momento conturbado: o autoritarismo de D. Pedro I, representada pela dissolução do Congresso e pela outorga de uma Constituição, a luta pelo trono português que acaba por aclamá-lo Pedro IV, a Confederação do Equador e a abdicação. Sem contar o assassinato de Líbero Badaró, o período regencial e a prematura maioridade de D. Pedro II. Contudo, a independência política teve suas consequências socioculturais: surgem as instituições universitárias e um público leitor. Os escritores são os principais intérpretes dos anseios desse novo quadro social. E foi assim, nos folhetins que o Romantismo ganhou corpo e conquistou mentes e corações dessa nova geração leitora, formada, em especial, por senhoras ricas da sociedade e estudantes que agora fervilhavam na capital. Os valores do Romantismo europeu adequavam-se às exigências ideológicas dos escritores brasileiros, opondo-se à arte clássica, que, por estas terras, era sinônimo de dominação portuguesa. O Romantismo voltava-se para a natureza, para o exótico, encontrando aqui uma natureza exuberante, própria à grandiloquência do estilo. Tudo contribuía para os maiores delírios ufanistas que uma jovem pátria poderia proporcionar. PORTO-ALEGRE, Araújo. Selva brasileira, sem data. GÊNESE ROMÂNTICO A publicação, em Paris, da revista Niterói (1836) foi o grande passo para a deflagração do movimento romântico. A revista estampava em sua primeira página: “Tudo pelo Brasil e para o Brasil”. A produção foi elaborada por intelectuais que estudavam na Europa, propondo a investigação “das letras, artes e ciências brasilienses”. Um desses jovens, Gonçalves de Magalhães, lançaria no mesmo ano o livro que é considerado o marco do Romantismo no Brasil: Suspiros poéticos e saudades. Capa da revista Niterói, publicada em Paris no ano de 1836 13 ROMANTISMO NO BRASIL - CONTEXTOS E EXPRESSÕES 42 Contudo, o projeto dos autores românticos não se realizou completamente, já que seus princípios “nacionalistas” estavam, em maior ou menor grau, comprometidos com uma visão europeia de mundo. Esse nacionalismo, feito de imagens exteriores, continha mais paisagem do que qualquer ideologia. Além disso, os escritores desse primeiro momento viviam à sombra do poder, exercendo importantes cargos políticos, como ministros, secretários, embaixadores, burocratas do alto escalão. Esse fato certamente os comprometeu com a classe dominante, daí fugirem da escravidão e da pobreza, ignorando os privilégios das elites e a miséria das ruas, ou mesmo a violência que já se espalhava pelas ruas das nossas cidades. Talvez tenha sido esse um pensamento de mercado, tendo em vista que ele apenas correspondiam às expectativas de seus leitores. A celebração do idílio e da natureza, a mitificação das regiões e do índio, criava uma arte conservadora, muito ao gosto do público que a consumia. AS FASES ROMÂNTICAS O estudo do Romantismo pode ser divido em três gerações distintas, sem que isso signifique uma separação rígida entre elas. Devemos entender que cada autor passeia pelas gerações assumindo com maior ou menor intensidade características em voga na época. É fundamental perceber que há também uma grande diferença entre as obras produzidas em prosa e poesia, já que adotam características distintas, atendendo a interesses específicos no quadro de leitores. Esses três momentos distintos caracterizam-se por apresentar temas e visões de mundo diferenciadas. Cada geração assume uma perspectiva própria, embora sejam todas elas marcadas pelo caráter romântico. Contudo, os elementos que definem cada uma delas não lhes são exclusivos, demonstrando pontos de contato de forma bastante acentuada. A primeira geração é chamada de nacionalista ou de indianista. Nela, revela-se com intensidade o sentimento nacionalista, marcadamente a saudade da Pátria, a valorização da natureza, um retorno à religiosidade cristã. Além disso desenvolve-se uma espécie de novo amor cortês, platônico e impossível, retomando as novelas de cavalaria europeias da Idade Média. O índio surge nesse contexto como o verdadeiro herói nacional, muito em razão de substituir figura do cavaleiro medieval, inexistente na história brasileira. Esse índio apresenta valores clássicos e comportamento europeu. A segunda geração, subjetivista, ficou conhecida como Ultrarromantismo ou Mal-do-século. Influenciados pelo poeta Inglês Lord Byron, a geração também leva a alcunha de byronista. Os poetas ultrarromânticos abordavam os temas do tédio, da morte, do suicídio, das sombras, da dor e do sofrimento. O medo de amar era constante e levava à evasão poética. Tais fugas levavam a lugares exóticos, à própria infância e, mais comumente à morte. PHILLIPS, Thomas. Lord Byron em trajes albaneses, 1813 A terceira geração é marcada por uma forte preocupação social, influenciada pelos movimentos abolicionista e republicano que ganhavam força no cenário político. A geração condoreira, como ficou conhecida, faz a denúncia da escravidão, defende as causas humanitárias, canta a liberdade, opõe-se à monarquia. No campo dos sentimentos, a sensualidade volta à tona e surge um amor erótico, possível de se realizar. É, em verdade, um momento de transição do Romantismo para o movimento Realista que já começa a se manifestar em alguns autores. EXERCÍCIOS PROPOSTOS Acesse os códigos de cada questão para ver o gabarito QUESTÃO 01 (IBMEC – RJ) SABIÁ -Tom Jobim e Chico Buarque Vou voltar Sei que ainda vou voltar Para o meu lugar Foi lá e é ainda lá Que eu hei de ouvir Uma sabiá Vou voltar Sei que ainda vou voltar Vou deitar à sombra de uma palmeira Que já não há Colher a flor que já não dá E algum amor talvez possa espantar As noites que eu não queria E anunciar o dia LITERATURA 43PROENEM Vou voltar Sei que ainda vou voltar Não vai ser em vão Que fiz tantos planos de me enganar Como fiz enganos de me encontrar Como fiz estradas de me perder Fiz de tudo e nada de te esquecer (…) A canção “Sabiá” é apenas uma das inúmeras releituras e citações que o poema de Gonçalves Dias, “Canção do Exílio” recebeu a partir do Modernismo. Esse poeta pertenceu à 1ª geração do Romantismo Brasileiro. Nas opções abaixo, assinale a única que não apresenta características desse estilo de época. a) Nacionalismo, onde a exaltação da pátria somente enaltece as qualidades. b) Exaltação da natureza. c) Sentimentalismo e religiosidade. d) Indianismo. e) Conceptismo (jogo de ideias) e cultismo (jogo de palavras). QUESTÃO 02 (FUVEST) Poderíamos sintetizar uma das características do Romantismo pela seguinte aproximação de opostos: a) Aparentemente idealista, foi, na realidade, o primeiro momento do Naturalismo Literário. b) Cultivando o passado, procurou formas de compreender e explicar o presente. c) Pregando a liberdade formal, manteve-se preso aos modelos legados pelos clássicos. d) Embora marcado por tendências liberais, opôs-se ao nacionalismo político. e) Voltado para temas nacionalistas, desinteressou-se do elemento exótico, incompatível com a exaltação da pátria. QUESTÃO03 (UFSM-UNIPAMPA/2008) A tela de Doré, ao representar o desespero de Andrômeda (princesa da mitologia grega que enfurece Poseidon), expressa o arrebatamento sentimental que constitui a sensibilidade romântica do século XIX. Sobre isso, pode-se afirmar: Andrômeda (1869), Tela de Gustave Doré http://www.illusionsgallery.com/Andromeda-Dore.html - 06.7.07 a) o ideário romântico invade o campo político, predispondo os homens a reconhecer a liberdade dos povos como condutora dos Estados Nacionais. b) o romantismo não interfere nas ações políticas dos homens do século XIX, pois se restringe ao campo das artes. c) o ideário romântico não colabora na formação identitária dos Estados Nacionais nem nas lutas por liberdade e democracia. d) o exagero sentimental dos românticos produz um desinteresse em relação à Natureza, especialmente quanto às matas tropicais. e) o romantismo se constitui, ao longo do século XIX, na ideologia que justifica o desenvolvimento burguês na indústria e no comércio internacional. QUESTÃO 04 (Unifesp) Canção do exílio Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. 13 ROMANTISMO NO BRASIL - CONTEXTOS E EXPRESSÕES 44 Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar sozinho, à noite Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que disfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu’inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá. Gonçalves Dias Gonçalves Dias consolidou o romantismo no Brasil. Sua “Canção do exílio” pode ser considerada tipicamente romântica porque a) apoia-se nos cânones formais da poesia clássica greco-romana; emprega figuras de ornamento, até com certo exagero; evidencia a musicalidade do verso pelo uso de aliterações. b) exalta terra natal; é nostálgica e saudosista; o tema é tratado de modo sentimental, emotivo. c) utiliza-se do verso livre, como ideal de liberdade criativa; sua linguagem é hermética, erudita; glorifica o canto dos pássaros e a vida selvagem. d) poesia e música se confundem, como artifício simbólico; a natureza e o tema bucólico são tratados com objetividade; usa com parcimônia as formas pronominais de primeira pessoa. e) refere-se à vida com descrença e tristeza; expõe o tema na ordem sucessiva, cronológica; utiliza-se do exílio como o meio adequado de referir-se à evasão da realidade. QUESTÃO 05 (UEM) Em relação à arte do Romantismo, assinale as alternativas em V (verdadeiro) ou F (falso). a) A pintura do Romantismo pode ser considerada como uma reação à pintura do período Neoclássico. b) Os pintores românticos apresentaram uma predileção em retratar a mitologia greco-romana em grande parte de suas obras. c) A pintura romântica não retoma algumas características do período barroco, como a valorização das cores e o contraste entre claro- escuro. d) A expressão das emoções humanas e a natureza representada de forma viva não são temas recorrentes nas artes do Romantismo. e) Apesar das diferenças temáticas em relação à arte do Neoclassicismo, os pintores românticos continuaram a prezar as regras e convenções das academias de belas artes em detrimento da liberdade de expressão artística. QUESTÃO 06 (ENEM) Do amor à pátria São doces os caminhos que levam de volta à pátria. Não à pátria amada de verdes mares bravios, a mirar em berço esplêndido o esplendor do Cruzeiro do Sul; mas a uma outra mais íntima, pacífica e habitual — uma cuja terra se comeu em criança, uma onde se foi menino ansioso por crescer, uma onde se cresceu em sofrimentos e esperanças plantando canções, amores e filhos ao sabor das estações. MORAES, V. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1987. O nacionalismo constitui tema recorrente na literatura romântica e na modernista. No trecho, a representação da pátria ganha contornos peculiares porque a) o amor àquilo que a pátria oferece é grandioso e eloquente. b) os elementos valorizados são intimistas e de dimensão subjetiva. c) o olhar sobre a pátria é ingênuo e comprometido pela inércia. d) o patriotismo literário tradicional é subvertido e motivo de ironia. e) a natureza é determinante na percepção do valor da pátria. QUESTÃO 07 (ENEM) Estas palavras ecoavam docemente pelos atentos ouvidos de Guaraciaba, e lhe ressoavam n’alma como um hino celestial. Ela sentia-se ao mesmo tempo enternecida e ufana por ouvir aquele altivo e indómito guerreiro pronunciar a seus pés palavras do mais submisso e mavioso amor, e respondeu-lhe cheia de emoção: — Itajiba, tuas falas são mais doces para minha alma que os favos da jataí, ou o suco delicioso do abacaxi. Elas fazem- me palpitar o coração como a flor que estremece ao bafejo perfumado das brisas da manhã. Tu me amas, bem o sei, e o amor que te consagro também não é para ti nenhum segredo, embora meus lábios não o tenham revelado. A flor, mesmo nas trevas, se trai pelo seu perfume; a fonte do deserto, escondida entre os rochedos, se revela por seu murmúrio ao caminhante sequioso. Desde os primeiros momentos tu viste meu coração abrir-se para ti, como a flor do manacá aos primeiros raios do sol. GUIMARÃES, B. O ermitão de Muquém. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 7 out. 2015. LITERATURA 45PROENEM O texto de Bernardo Guimarães é representativo da estética romântica. Entre as marcas textuais que evidenciam a filiação a esse movimento literário está em destaque a a) referência a elementos da natureza local. b) exaltação de Itajiba como nobre guerreiro. c) cumplicidade entre o narrador e a paisagem. d) representação idealizada do cenário descrito. e) expressão da desilusão amorosa de Guaraciaba. QUESTÃO 08 (FGV) Nova canção do exílio Um sabiá na palmeira, longe. Estas aves cantam um outro canto. O céu cintila sobre flores úmidas. Vozes na mata, e o maior amor. Só, na noite, seria feliz: um sabiá, na palmeira, longe. Onde é tudo belo e fantástico, só, na noite, seria feliz. (Um sabiá, na palmeira, longe.) Ainda um grito de vida e voltar para onde é tudo belo e fantástico: a palmeira, o sabiá, o longe. Carlos Drummond de Andrade, A rosa do povo. Da “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias, o poema de Drummond conserva, sobretudo, a) a ausência de adjetivação. b) o antilusitanismo. c) o ufanismo nacionalista. d) a regularidade métrica. e) a idealização nostálgica. QUESTÃO 09 (PUC - Campinas) O tempo e suas medidas O homem vive dentro do tempo, o tempo que ele preenche, mede, avalia, ama e teme. Para marcar a passagem e as medidas do tempo, inventou o relógio. A palavra vem do latim horologium, e se refere a um quadrante do céu que os antigos aprenderam a observar para se orientarem no tempo e no espaço. Os artefatos construídos para medir a passagem do tempo sofreram ao longo dos séculos uma grande evolução. No início o Sol era a referência natural para a separação entre o dia e a noite, mas depois os relógios solares foram seguidos de outros que vieram a utilizar o escoamento de líquidos, de areia, ou a queima de fluidos, até chegar aos dispositivos mecânicos que originaram as pêndulas. Com a eletrônica, surgiram os relógios de quartzo e de césio, aposentando os chamados “relógios de corda”. O mostrador digital que está no seu pulso ou no seu celular tem muita história: tudo teria começado com a haste vertical ao sol, que projetava sua sombra num plano horizontal demarcado. A ampulheta e a clepsidra são as simpáticas bisavós das atuais engenhocas eletrônicas, e até hoje intrigam e divertem crianças de todas as idades. Mas a evolução dos maquinismos humanos que dividem e medem as horas não suprimiu nem diminuiu apreocupação dos homens com o Tempo, essa entidade implacável, sempre a lembrar a condição da nossa mortalidade. Na mitologia grega, o deus Chronos era o senhor do tempo que se podia medir, por isso chamado “cronológico”, a fluir incessantemente. No entanto, a memória e a imaginação humanas criam tempos outros: uma autobiografia recupera o passado, a ficção científica pretende vislumbrar o futuro. No Brasil, muito da força de um José Lins do Rego, de um Manuel Bandeira ou de um Pedro Nava vem do memorialismo artisticamente trabalhado. A própria história nacional sofre os efeitos de uma intervenção no passado: escritores românticos, logo depois da Independência, sentiram necessidade de emprestar ao país um passado glorioso, e recorreram às idealizações do Indianismo. No cinema, uma das homenagens mais bonitas ao tempo passado é a do filme Amarcord (“eu me recordo”, em dialeto italiano), do cineasta Federico Fellini. São lembranças pessoais de uma época dura, quando o fascismo crescia e dominava a Itália. Já um tempo futuro terrivelmente sombrio é projetado no filme “Blade Runner, o caçador de androides”, do diretor Ridley Scott, no cenário futurista de uma metrópole caótica. Se o relógio da História marca tempos sinistros, o tempo construído pela arte abre-se para a poesia: o tempo do sonho e da fantasia arrebatou multidões no filme O mágico de Oz estrelado por Judy Garland e eternizado pelo tema da canção Além do arco-íris. Aliás, a arte da música é, sempre, uma habitação especial do tempo: as notas combinam-se, ritmam e produzem melodias, adensando as horas com seu envolvimento. 13 ROMANTISMO NO BRASIL - CONTEXTOS E EXPRESSÕES 46 São diferentes as qualidades do tempo e as circunstâncias de seus respectivos relógios: há o “relógio biológico”, que regula o ritmo do nosso corpo; há o “relógio de ponto”, que controla a presença do trabalhador numa empresa; e há a necessidade de “acertar os relógios”, para combinar uma ação em grupo; há o desafio de “correr contra o relógio”, obrigando-nos à pressa; e há quem “seja como um relógio”, quando extremamente pontual. Por vezes barateamos o sentido do tempo, tornando-o uma espécie de vazio a preencher: é quando fazemos algo para “passar o tempo”, e apelamos para um jogo, uma brincadeira, um “passatempo” como as palavras cruzadas. Em compensação, nas horas de grande expectativa, queixamo-nos de que “o tempo não passa”. “Tempo é dinheiro” é o lema dos capitalistas e investidores e dos operadores da Bolsa; e é uma obsessão para os atletas olímpicos em busca de recordes. Nos relógios primitivos, nos cronômetros sofisticados, nos sinos das velhas igrejas, no pulsar do coração e da pressão das artérias, a expressão do tempo se confunde com a evidência mesma do que é vivo. No tic-tac da pêndula de um relógio de sala, na casa da avó, os netinhos ouvem inconscientemente o tempo passar. O Big Ben londrino marcou horas terríveis sob o bombardeio nazista. Na passagem de um ano para outro, contamos os últimos dez segundos cantando e festejando, na esperança de um novo tempo, de um ano melhor. (Péricles Alcântara, inédito) Costuma-se reconhecer que o Indianismo, na nossa literatura, é marcado por idealizações que emprestam uma espécie de glória artificial ao nosso passado como Colônia. Tais idealizações I. consistem, basicamente, em atribuir aos nossos silvícolas atitudes e valores herdados da aristocracia medieval, caros ao ideário romântico. II. processam-se com base em fidedignos documentos históricos, nos quais há registro detalhado dos usos e costumes das várias nações indígenas. III. ocorreram como reação às tendências nacionalistas do nosso Romantismo, que valorizavam sobretudo a vida urbana e os valores burgueses. Atende ao enunciado o que está em a) I, II e III. b) I e II, apenas. c) II e III, apenas. d) I e III, apenas. e) I, apenas. QUESTÃO 10 (PUC - Campinas) Nos poemas indianistas, o heroísmo dos indígenas em nenhum momento é utilizado como crítica à colonização europeia, da qual a elite era a herdeira. Ao contrário, pela resistência ou pela colaboração, os indígenas do passado colonial, do ponto de vista dos nossos literatos, valorizavam a colonização e deviam servir de inspiração moral à elite brasileira. (...) Já o africano escravizado demorou para aparecer como protagonista na literatura romântica. Na segunda metade do século XIX, Castro Alves, na poesia, e Bernardo Guimarães, na prosa, destacaram em obras suas o tema da escravidão. (Adaptado de: NAPOLITANO, Marcos e VILLAÇA, Mariana. História para o ensino médio. São Paulo: Atual Editora, 2013, p. 436-37) Entende-se do texto que o Indianismo, no Brasil, identificou- se como um movimento romântico que a) se dedicou a expressar com fidedignidade o processo de aculturação dos nativos brasileiros. b) traduziu os aspectos típicos e essenciais da cultura indígena, exaltando-os em si mesmos. c) se opôs aos rumos tomados pela Abolição, uma vez que se considerava prioritária a atenção aos indígenas. d) idealizou o caráter dos indígenas, tomando-o como paradigma de moralidade a ser seguido. e) valorizou a bravura dos nossos indígenas, para melhor sublinhar as fraquezas da cultura civilizada. ANOTAÇÕES 47PROENEM Aproxime seu dispositivo móvel do código para acessar a teoria POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRAAS FASES DO ROMANTISMO A GERAÇÃO INDIANISTA – CARACTERÍSTICAS MEIRELLES, Victor. Moema, 1865 Indianismo A concepção do bom selvagem, ideia apresentada por Rousseau, define um modelo de um herói indígena que deveria se tornar o passado e a tradição de um país como o Brasil, sem uma história gloriosa que pudesse ser cantada. O nativo – que nada guarda de sua cultura original – converte-se no herói europeu, forjado à imagem e semelhança de um cavaleiro medieval. Valorização da natureza O Romantismo assume a imagem exótica que as metrópoles europeias faziam dos trópicos, adaptando-a ao ufanismo, um orgulho idealizado e exagerado pelas coisas da terra. Sem o passado histórico para ser cantada e com um desenvolvimento urbano ainda acanhado frente às capitais europeias, restava cantar a natureza e o índio que, na sua condição de primitivo habitante, era o próprio símbolo da nacionalidade. A terra é a imagem da própria pátria. Por isso, até mesmo os fenômenos naturais tornam-se representativos da grandeza do país. Essa natureza jovem, vital, exuberante, compensa a pobreza social ao mesmo tempo que aponta novas potencialidades para o Brasil. Enfim, a natureza vai além de ser mero cenário, sendo tema e personagem principal dessa visão romântica. Desta forma mostra-se uma nação rica diante do mundo. Além disso, a imagem positiva criada para o índio confere às elites o orgulho de uma ascendência nobre, fator importante na legitimação de seu próprio poder no Brasil em face à Independência. Assim, percebe-se claramente o interesse político em se assumir uma determinada postura estética. Regionalismo A consciência de um país novo e sua consequente euforia gera um sentimento regionalista de descoberta, que procura afirmar as particularidades e a identidade das regiões e da vida rural, na ânsia de tornar literário todo o Brasil. Contudo, esse registro do mundo não urbano é superficial, já que a trama romanesca é essencialmente citadina, atendendo os esquemas românticos do folhetim. Além disso, os autores usam sempre a linguagem culta e literária das cidades jamais a fala particular da região retratada. Uma linguagem brasileira Os escritores românticos – principalmente o romancista José de Alencar – reivindicam uma língua brasileira. Não provocação revolucionária, mas baseado em dois fatores: um político e outro mercadológico. No campo político, a afirmação do Brasil como nação independente era fundamental, por isso não é difícil imaginar que a sintaxe lusitana passa a receber críticas; mercadologicamente, uma língua “brasileira” seria mais acessívelao novo público leitor que surgia, garantindo maior sucesso das produções artísticas. A POESIA DA PRIMEIRA GERAÇÃO Gonçalves de Magalhães Domingos José Gonçalves de Magalhães nasceu em Niterói em 1811 é considerado o poeta que iniciou o Romantismo no Brasil. Formado em medicina, viajou para a Europa, tomando contato com os ideais românticos. 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 48 Foi um dos fundadores da revista Niterói, no mesmo ano em que publica “Suspiros Poéticos e Saudade”, o marco inicial do Romantismo brasileiro. Em 1837, volta ao Brasil e dez anos mais tarde ingressa na carreira diplomática. Exerceu essa função até seu falecimento, em Roma, no ano de 1882. Sua poesia cultivava os valores fundamentais do Romantismo primitivo, com ênfase na religião e no patriotismo. Ele inicia a elaboração dos primeiros versos românticos brasileiros, lançando Suspiros poéticos e saudades, no qual busca a afirmação de uma literatura nacional, destruindo os artifícios neoclássicos, propondo em substituição a valorização da natureza, do índio e de uma religiosidade panteísta. Sua poesia foi considerada fraca, recebendo muitas críticas, algumas muito contundentes, como as de José de Alencar, gerando uma grande polêmica, tendo em vista que essa inimizade tinha repercussão política, já que Magalhães era protegido de D. Pedro II e fez com que José de Alencar fosse preterido na indicação ao Senado pelo Imperador. Faltava a Magalhães autêntica emoção poética, os sentimentos apresentam-se em sua obra de maneira retórica, frequentemente “despoetizados” por imagens de mau gosto, como no trecho abaixo: Nas veias o sangue já não me galopa, em sacros furores nos lábios me fervem; A lira canora do cisne beócio, deixei sobre a trípode. Apesar disso, Gonçalves de Magalhães foi considerado o maior poeta pátrio durante muito tempo. Transformou-se em símbolo oficial da literatura brasileira, merecendo inclusive grande apreço de D. Pedro II. Mas insistentemente denunciado por Alencar pelo artificialismo de sua composição, a obra de Magalhães passa a ser relegada a um plano secundário. O próprio Imperador tentou defendê-lo – usando um pseudônimo, claro – mas Alencar já detinha prestígio que lhe garantia a autoridade para seus argumentos. Coube a Magalhães o mérito histórico de ter introduzido o Romantismo no país. Gonçalves Dias Filho de um comerciante português e de uma mulata, Antônio de Gonçalves Dias nasceu em Caxias, no Maranhão, em 10 de agosto de 1823. Orgulhava-se de ter no sangue as três raças formadoras do povo brasileiro: branca, indígena e negra. Ainda contava com seis anos de idade, quando o pai casou-se com uma moça branca e proibiu o filho de visitar a mãe, com quem somente se reencontraria quinze anos depois. Em 1840, cursou Direito na Faculdade de Coimbra, encontrando ali os principais escritores da primeira fase do Romantismo português. Em 1843, escreveu “Canção do Exílio”, um dos maiores poemas brasileiros. Graduado bacharel, volta ao Brasil e inicia uma fase de intensa produção literária. Muda-se para o Rio de Janeiro, torna-se professor de Latim no Colégio Pedro II e lança, com grande sucesso, os Primeiros cantos e os Segundos cantos. Ocupa diversos cargos de importância nas áreas de pesquisa escolar e de busca de documentos históricos, devido ao bom trânsito que consegue junto à corte imperial. Em visita ao Maranhão, reencontra seu grande amor, Ana Amélia, e a pede em casamento, o que lhe é negado pela família, por sua origem bastarda e mulata. Transtornado com essa recusa, casa-se com Olímpia Coriolana, provavelmente a primeira mulher que encontrou após tal negativa e com a qual viveu um casamento infeliz. A serviço, viajou muito pelas províncias do Norte e pela Europa. Contraiu tuberculose e buscou tratamento na França. Em 1864, durante a viagem de volta ao Brasil, o navio Ville de Boulogne naufragou na costa brasileira. Todos a bordo salvaram-se, à exceção do poeta que, por estar agonizando em seu leito, foi esquecido, tornando-se a única vítima fatal do desastre. Gonçalves Dias é responsável pela consolidação do Romantismo no Brasil, desenvolvendo com maestria todas as características iniciais dessa primeira fase. Sua produção poética é de boa qualidade destacando-se entre os autores do período, conseguindo o equilíbrio entre os temas sentimentais, patrióticos e saudosistas. Dono de uma linguagem harmoniosa e de relativa simplicidade, evita os excessos verbais, foge da pompa declamatória bem como do popularesco. Sua obra trata principalmente do índio, da natureza e do amor impossível. Demonstra grande conhecimento da vida dos índios, com dosagem certa de idealização, transformando o índio em verdadeiro herói. Seu poema Juca Pirama faz uma espécie de síntese do indianismo: Meu canto de morte Guerreiros, ouvi: Sou filho das selvas, Nas selvas cresci; Guerreiros, descendo Da tribo tupi Da tribo pujante, Que agora anda errante Por fado inconstante, Guerreiros, nasci: Sou bravo, sou forte, Sou filho do Norte; Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi. Gonçalves Dias, ao valorizar a natureza, canta o mar, o céu, os campos e as florestas. No entanto, a natureza não tem um valor universal, pois apenas a celebra sob o viés ufanista da nação. Apenas no espaço da pátria, LITERATURA 49PROENEM os elementos naturais se manifestam em sua plena majestade. A celebração da natureza entrelaça-se com o sentimento saudosista trazendo de volta a infância, os amores idos e vividos e, seu sentimento “exilado” quando estava na Europa. Sua obra mais representativa, a Canção do exílio, sintetiza a identificação entre o país e sua natureza. Desde a concepção, tornou-se o poema mais conhecido do Brasil, o mais imitado e o mais parodiado. Apesar do estilo laudatório, o poema exalta as maravilhas naturais do Brasil sem fazer uso de nem um adjetivo sequer. É a própria essência do ufanismo romântico: minha pátria é a melhor, a única terra em que se pode ser feliz, sem defeitos, um verdadeiro paraíso. Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar - sozinho, à noite - Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar - sozinho, à noite Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu’inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá.” Por fim, cabe ressaltar sua lírica amorosa, marcada pelo sofrimento. Nela, o amor raramente se concretiza, ganhando ares de uma ilusão perdida. Apaixonar-se significa predispor-se à angústia e à solidão. A resposta da amada às súplicas poéticas simplesmente não existe, levando o poeta ao desespero. As sementes do ultrarromantismo já brotam na lírica amorosa de Gonçalves Dias. A CRISE DO PENSAMENTO BURGUÊS A metade do século XIX marca uma importante mudança no pensamento artístico nacional: o modelo de sociedade burguesa já não atende mais aos anseios da juventude, que se desinteressa pela vida político- social. Apesar do crescente desenvolvimento urbano, a jovem vida acadêmica dos grandes centros afasta-se dos princípios burgueses consagrados pelo romantismo. Desta forma, o nacionalismo e o indianismo entram em declínio e o descontentamento com a vida burguesa torna- se evidente, gerando uma atitude pessimista, entediada, à espera da morte. O protesto contra o mundo burguês e suas relações sociais, dá origem a uma lírica voltada para a subjetividade, para o individualismo, baseada na confissão e no transbordamento dos sentimentos interiores. Essa nova geração, influenciada pelo inglês Byron e pelo francês Musset, prega a rebeldiamoral, a recusa do entediante cotidiano burguês e a busca de novas formas sentimentais. ALMEIDA, Belmiro. Arrufos, 1887 O país vivia um período de estabilidade no chamado Segundo Reinado, repleto de barganhas políticas entre liberais e conservadores que partilhavam o poder sob arbítrio do Poder Moderador de D. Pedro II. A economia apresentava um bom desempenho, baseada no crescimento da produção cafeeira, com a consequente consolidação desta aristocracia rural no poder. As rebeliões escasseavam, pacificando internamente o país. Um fato curioso sobre o ultrarromantismo é que a maior parte de seus representantes morreu na faixa dos vinte anos; vidas curtas, porém carregadas de complexidade. Apesar de que sua produção sugira o cultivo de ideias suicidas, não se pode dizer que as mortes prematuras tenham sido intencionais, já que todos foram vitimados por doenças incuráveis na época, especialmente a tuberculose. O estilo de vida boêmio de muitos desses poetas pode ter contribuído com suas mortes, contudo, não se pode afirmar que havia qualquer intencionalidade nesses atos, diante do horror que demonstraram diante da morte. POETAS DO MAL DO SÉCULO Os poetas dessa geração demonstraram uma inadequação à realidade em que viveram, reproduzindo em suas vidas um comportamento desregrado, levando uma vida entre os estudos acadêmicos, o ócio e a boêmia. O ultrarromantismo brasileiro foi amplamente influenciado por Lord Byron, poeta inglês que escandalizava a sociedade com seu estilo de vida dedicado aos vícios e às relações extraconjugais. 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 50 Somado a isso, foi ainda acusado de manter relações incestuosas com a irmã e também de pederastia. O mal do século caracteriza-se pela atração pelo sombrio e pela morte, acrescida, por muitas vezes, de temas macabros e satânicos. O sentimentalismo, o egocentrismo e a idealização são exagerados, criando uma visão do amor bastante particular, com a mistura de atração e medo, desejo e culpa. Desta forma, cria- se a figura do amor impossível, da mulher inatingível e idealizada: virgem e incorpórea. Diante das negativas e do medo que traz o amor, surge a evasão, já que a própria realidade não o acolhia, nem os sonhos tornavam-se possíveis. Daí ser comum a apresentação de lugares exóticos, as lembranças da infância e, sobretudo, o culto à morte. Álvares de Azevedo Nascido em São Paulo em 12 de setembro de 1831, Manuel Antônio Álvares de Azevedo descendia de família ilustre no cenário político. O pai exercera, entre outros cargos, o de juiz de direito, chefe de polícia e deputado geral. Em razão disso, teve sua formação básica e secundária na capital do Império. Sua volta a São Paulo dá-se para cursar a Faculdade de Direito, onde participa ativamente da vida acadêmica e literária. Apesar de ser um aluno excelente e de ser bastante querido entre os colegas, sentia-se incapaz de estabelecer um relacionamento amoroso concreto, principal razão de sua infelicidade. A mediocridade da vida em São Paulo, quando comparada às intensas experiências dos europeus, atormentava sua alma, fazendo-o mergulhar na leitura dos ultrarromânticos europeus. Por conta da saudade de sua mãe e de sua irmã, o sentimento de solidão e o desejo insatisfeito levaram-no a um pensamento depressivo, aproximando-o de inclinações mórbidas. No início de 1852, descobre-se com tuberculose e desespera-se ante a visão da morte. Buscou tratamento na fazenda do tio, onde deu efetivos sinais de melhora, mas uma queda de cavalo afetou-lhe a região ilíaca. Sem outra coisa a fazer, os médicos resolveram operá-lo, o que, na época, significava uma intervenção sem anestesia. Apesar de ter suportado heroicamente as dores, a tuberculose já o deixara muito debilitado. Dias depois, ao leito de morte, diz a seu pai: “Que fatalidade!”. E, sendo essas suas últimas palavras, morre em 25 de abril de 1852, no ano de sua formatura, sem que completasse vinte e um anos de idade. Nem mesmo seu corpo descansou em paz com sua morte. O cemitério em que foi enterrado foi vítima de uma ressaca marinha e seu corpo teve de ser exumado. Seu túmulo havia sido destruído e seus ossos encontrados por seu cão e só então transferidos, inaugurando o cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. Não publicou nenhum de seus escritos em vida e, como afirmara em um de seus poemas, a “glória que pressinto em meu futuro” veio efetivamente após sua morte. Sua obra é bastante autobiográfica e, como não poderia ser diferente, representa uma vida adolescente de tal modo dilacerada e conflituosa que acaba por se tornar experiência mais aguda do Romantismo brasileiro, considerando-se aspectos pessoais e poéticos. Em muitos poemas, expressa um cinismo típico de quem – por incansáveis leituras – detém a experiência do saber, mas não experimenta a própria vida. Sua poesia, que começa como imitação dos ultrarromânticos europeus, carregada de fantasias delirantes, evolui significativamente, superando o artificialismo byroniano característico dos demais poetas da geração. Suas obras falam de amor, da morte, do tédio, mas revelam também certo humor e cinismo. Quando trata de amor, usa os modelos byronianos, tornando sua lírica pouco convincente. As orgias e vícios que descreve como sua maldição moral são artificiais, tendo em vista que tais experiências não tenham ocorrido e, mais ainda, porque carecem de certa persuasão, não traduzindo nenhuma inquietação. No entanto, essa máscara acaba por revelar o que havia por detrás das aparências: o devasso e o cínico, na verdade, revelam profundo medo das relações amorosas, traduzindo-se pela não concretização das vontades sexuais, criando uma imagem feminina carregada de imagens eróticas, cuja volúpia jamais é saciada, por ser ela intocável e inatingível, fruto da própria timidez do poeta. Já na temática da morte, a genialidade expressiva de Álvares de Azevedo se manifesta. Tema recorrente em sua produção, poeta profetiza sua própria morte, diz não poder esquecê-la; entrega-se a ela de peito aberto. Mas não é por isso que essa entrega será desprovida de desespero e angústia. As perdas dos afetos, das pessoas e do futuro, levam-no às lamentações. Ao mesmo tempo, em uma atitude escapista, a morte representa a solução para suas dores. O tédio, sentimento que levou o nome para a geração “mal do século”, traduzia-se em uma espécie de cinismo e enfado por ter vivido todas as experiências possíveis: sexo, bebidas, ópio, transgressões. Paradoxalmente, o tédio de Álvares de Azevedo era resultado da falta de tais experiências a que estava condenado vivendo em São Paulo. Lembremo-nos que a maior cidade do Brasil hoje era, na época, uma cidadezinha provinciana, sem vida noturna, sem grandes horizontes para as ambições e sonhos dos jovens. Esse sentimento, causa dos excessos ultrarromânticos, é atenuado pela exposição de sua subjetividade, revelando um jovem tímido, inexperiente e ansioso por amor. Suas poesias são confissões de um adolescente solitário e impotente diante de sua existência; um poeta conflituoso, entre o tédio de sua realidade e os sonhos que alimentavam sua alma, possibilitando que vivesse no descompasso de seu mundo. Apesar de tudo, surpreende em sua poesia a ironia, resultante do riso das coisas cotidianas. Despido do LITERATURA 51PROENEM sentimentalismo, o poeta lança seu olha em torno de si e traça observações que vão do leve humor ao sarcasmo cínico. Fora da poesia, merece destaque Noites na taverna, uma reunião de contos que revela o espírito transgressor ultrarromântico, ambientando sete rapazes que bebem, fumam e gritam em uma taverna, narrando histórias exageradas de suas vidas orgíacas e criminosas. É a expressão adolescente de rebeldia contra o mundo e de comportamento social, apresentando cenas de necrofilia, incesto, canibalismo, assassinato e violação de todos os códigos morais da época(e da nossa também!). Nesses escritos propõe--se a criação de um mundo de sombras, povoado por indivíduos de impulsos imorais e que praticam toda sorte de ações que mostram o lado cruel de suas almas. Como exemplo de sua poesia, a presença constante da morte e a certeza do poeta diante da proximidade dela fazem de “Lembrança de morrer”, um dos mais belos exemplos de sua sensibilidade, mesmo quando se trata das instruções sobre o seu túmulo e sua lápide: Quando em meu peito rebentar-se a fibra, Que o espírito enlaça à dor vivente, Não derramem por mim nem uma lágrima Em pálpebra demente. E nem desfolhem na matéria impura A flor do vale que adormece ao vento: Não quero que uma nota de alegria Se cale por meu triste passamento. (...) Descansem o meu leito solitário Na floresta dos homens esquecida, À sombra de uma cruz, e escrevam nela - Foi poeta, sonhou e amou na vida. Casimiro de Abreu Casimiro José Marques de Abreu nasceu em 4 de janeiro de 1839, em Barra de São João, no estado do Rio de Janeiro. Filho de um imigrante português, enriquecido pelo comércio, Casimiro passou a infância numa fazenda. Enviado à capital do Império para exercer as atividades de seu pai, não demonstrou tino para a área. Ainda assim, seu pai não desistiu e enviou-o para Lisboa com a mesma intenção. Após quatro anos em Portugal, já com dezoito anos, retornou ao Brasil conciliando a vida boêmia e as atividades comerciais. Foi em Lisboa que tomou contato com o Romantismo, estabelecendo ligação com o meio intelectual português. Chegou a escrever para alguns jornais, trabalho que o fez conhecer Machado de Assis. Primaveras é sua única obra e obteve enorme êxito, sendo aclamado pelo público da época. Contudo, não desfrutou muito de sua fama, pois logo se descobriu com tuberculose, falecendo em pouquíssimo tempo, no dia 18 de outubro de 1860, com vinte dois anos incompletos. Poeta de linguagem simples e espontânea, expõe um lirismo singelo com rimas fáceis e atmosfera musical, beirando a superficialidade, mas que encantou o público, tornando-se um dos poetas mais populares do romantismo. Sua temática também revela o mal do século, com ênfase na tristeza da vida e certo grau de pessimismo, apesar de não abandonar o sentimento saudosista-nacionalista da primeira geração. Seu lirismo amoroso revela a melancolia que se traduz na atitude de evasão do poeta: não para a morte, mas para a infância. De visão extremamente subjetiva, Casimiro de Abreu substitui a dor adolescente por uma visão inocente e deslumbrada dos tempos juvenis. Canta a mocidade como um tempo idealizado, “a primavera da vida”. Longe do sombrio, prefere as manhãs, as brincadeiras infantis, as paisagens da fazenda de sua infância e os salões de baile onde se compartilha a dança e os namoros. Influenciado por Gonçalves Dias, inunda seus poemas de sentimento nostálgico, refletindo o “exílio” de seu precursor. Se a saudade da nação não enriquece sua lírica, descobre na nostalgia sua consagração. As saudades são misturadas ao subjetivo, trazendo as lembranças da família, da casa e da própria infância. Canta a “aurora da vida”, o tempo de meninice, as emoções que ficaram na memória. Com suas poesias melodiosas, sem abstrações, nas quais empresta sentimento e delicadeza à evasão romântica, garante a imortalidade de sua visão, em um dos poemas mais famosos da literatura nacional: Meus oito anos Oh! que saudades que tenho Da aurora da minha vida, Da minha infância querida Que os anos não trazem mais! Que amor, que sonhos, que flores, Naquelas tardes fagueiras À sombra das bananeiras, Debaixo dos laranjais! Como são belos os dias Do despontar da existência! - Respira a alma inocência Como perfumes a flor; O mar é - lago sereno, O céu - um manto azulado, O mundo - um sonho dourado, A vida - um hino d’amor! Que auroras, que sol, que vida, Que noites de melodia Naquela doce alegria, Naquele ingênuo folgar! O céu bordado d’estrelas, A terra de aromas cheia, As ondas beijando a areia E a lua beijando o mar! 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 52 Oh! dias da minha infância! Oh! meu céu de primavera! Que doce a vida não era Nessa risonha manhã. Em vez das mágoas de agora, Eu tinha nessas delícias De minha mãe as carícias E beijos de minha irmã! Livre filho das montanhas, Eu ia bem satisfeito, De camisa aberto ao peito, - Pés descalços, braços nus - Correndo pelas campinas À roda das cachoeiras, Atrás das asas ligeiras Das borboletas azuis! Naqueles tempos ditosos Ia colher as pitangas, Trepava a tirar as mangas, Brincava à beira do mar; Rezava às Ave-Marias, Achava o céu sempre lindo, Adormecia sorrindo E despertava a cantar! Merecem destaque no período poetas como Junqueira Freire e Fagundes Varela que, apesar de ultrarromânticos, já demonstram algumas das características da geração seguinte. Podem ser assim chamados de “poetas de transição”. O CAMINHO DA TRANSIÇÃO A partir da segunda metade do século XIX, a sociedade brasileira passa por significativas mudanças em termos políticos, sociais e econômicos. A constante pressão britânica pelo fim do comércio de escravos fez com que o Brasil abolisse o tráfico negreiro da África, o que representou o surgimento de um pensamento abolicionista nacional. Por outro lado, há uma forte reação contra esses movimentos, especialmente dos grandes cafeicultores e isso aumenta as pressões internas sofridas pelo Império. No plano econômico, o país inaugura suas primeiras fábricas de produtos simples, como tecidos, bebidas e artigos como sabão e outros produtos que antes eram importados. Além disso, as cidades começam a crescer, inauguram-se estradas de ferro, empresas de gás, mineração e até mesmo o transporte urbano começa a desenvolver-se, especialmente no Rio de Janeiro e São Paulo. Em meio a este início de desenvolvimento econômico, rompeu-se a Guerra do Paraguai, que arrastou-se ao longo de seis anos e causou diversas reações sociais, criando inúmeros problemas a serem resolvidos pelo governo imperial. Ainda que o Brasil tenha vencido a guerra, a coroa acumulou enormes prejuízos com o confronto, o que criou um rombo nas finanças imperiais e acarretou em inúmeras dívidas pela tomada de empréstimos estrangeiros. Aos poucos a monarquia brasileira ia perdendo apoio de diversos setores que criticavam a condução econômica, a organização social, os favorecimentos políticos, entre outros aspectos. Esses grupos pressionavam o governo, que não conseguia atender às demandas de todos os campos, gerando um descontentamento generalizado. Por exemplo, o Império buscava leis que terminassem com a escravidão de maneira progressiva, como a lei do ventre livre e a lei dos sexagenários; por um lado, os abolicionistas criticavam as medidas, pois as consideravam tímidas e queriam o fim da escravidão imediato; por outro, grandes escravocratas afirmavam que tais medidas representavam uma ameaça a seus interesses. Não por acaso, ao tentar equilibrar-se entre as diversas posições, o governo não resistiu e, um ano após a assinatura da lei áurea, a monarquia caiu ante ao golpe militar que instituiu a República. MEIRELLES, Victor. Abolição da escravatura, s/d A TERCEIRA GERAÇÃO ROMÂNTICA Conhecida como Geração Condoreira, a terceira geração foi marcada por um forte posicionamento político abolicionista e pela incessante defesa da liberdade, tomando como metáfora o condor, ave andina que voa alto, livre e domina os céus. A busca pela identidade nacional é ainda tema das obras, porém ultrapassa os valores do indianismo e enxerga a sociedade de maneira diversificada, incluindo conflitos oriundos da escravidão para a composição do cenário brasileiro. LITERATURA 53PROENEM Mantendo a idealização típica do romantismo, há um retorno às ideias inicias do lema francês da “liberdade, igualdade e fraternidade”, em que se defende uma sociedade construída em outros moldes, ainda que não sejam defesas consistentes e aprofundadas.Por outro lado, a visão do amor e da mulher afasta- se do paradigma da segunda geração e ganha contornos mais materiais, em que a mulher – ainda que idealizada em sua figura – apresenta-se de forma tangível e sensual, em uma relação amorosa que ultrapassa as linhas do imaginário. É, em verdade, um momento de transição do Romantismo para o movimento Realista que já começa a se manifestar em alguns autores. O POETA DOS ESCRAVOS Castro Alves Antônio Frederico de Castro Alves nasceu em uma fazenda no município de Muritiba, na Bahia em 14 de março de 1847, no seio de uma das mais tradicionais e poderosas famílias do interior baiano. Ainda criança mudou-se para Salvador, onde fez seus estudos. A morte de sua mãe, quando ele tinha apenas nove anos, deixou-o bastante abalado, ainda mais por ver o desespero de seu irmão mais velho que se suicida alguns anos depois, ainda inconformado pela perda da mãe. Em 1862, já em Recife e preparando-se para a faculdade de Direito, Castro Alves torna-se amante de uma famosa atriz portuguesa e entrega-se à boêmia e aos ideais abolicionistas. Assim, passa grande parte de seu tempo em reuniões e agitações políticas que em salas de aula. Foi reprovado diversas vezes em várias matérias diferentes, algumas porque nem sequer as frequentava, estando naqueles horários nos bares a produzir ou recitar versos. Castro Alves percebeu de imediato seu talento, pois sua produção tinha grande impacto, repercutindo entre os colegas e dando a Castro um status de fama. Castro Alves ainda produziu um drama para que Eugênia Câmara – a atriz portuguesa – pudesse encená-la. E ambos foram a Salvador para montar a peça, que recebeu espetacular consagração, deixando Castro Alves radiante. O agora casal viajou rumo a São Paulo, onde Castro prometeu retomar e concluir o curso de Direito. Em uma breve parada no Rio de Janeiro, Castro foi recebido por José de Alencar e Machado de Assis: Castro tornara-se uma lenda, fosse por sua qualidade de poeta, fosse como declamador de sua própria obra. Seus poemas faziam enorme sucesso e eram declamados nas faculdades, tornando-se a voz dos estudantes abolicionistas. Contudo, sua vida amorosa não ia bem. A fama lhe trouxe glória e também mulheres, às quais não conseguiu negar os favores amorosos, o que deixava a orgulhosa Eugênia com os nervos à flor da pele. A atriz portuguesa o abandonou, sumindo-se para sempre da vida de Castro Alves, que se mostrou muito abalado pela separação. Para tentar esquecer as dores de amor, passou a dedicar-se à caça e foi em uma caçada em São Paulo que o fim do poeta se aproximou. Ao caminhar segurando a espingarda, acidentalmente feriu-se no pé, mais precisamente no calcanhar, que infeccionou. Levado ao Rio de Janeiro para tratamento, não teve grande sorte. Como a infecção não cedia e piorava, foi submetido a uma amputação sem anestesia. Transferido para Salvador, viveu por mais um ano aproximadamente, até que sobreviesse a tuberculose que lhe mataria. Em 6 de julho de 1871, Castro Alves nos deixava, antes de completar vinte e quatro anos de idade. Sua poesia refletia os ideais abolicionistas que abraçava, mais que um intelectual, Castro era um homem de ação, participando ativamente dos movimentos abolicionista e republicano. Seu engajamento político é tão forte que chega a prejudicar sua arte literária, vista, por muitas vezes como mais denúncia e ação que propriamente estética. Consciente da importância dos estudos, valorizou o papel da educação na sociedade, da imprensa e do livro. Engajado em uma série de lutas sociais, usou sua poesia para combater toda e qualquer injustiça, cantando a liberdade e a igualdade em uma pregação que atingia todos os setores sociais. Mas, sem dúvida, o que mais de marcante lhe restou foram seus poemas abolicionistas. Sua retórica é eloquente, sua poesia grandiosa, feita para declamações públicas, com inúmeras apóstrofes e imagens espetaculares. Seu lirismo amoroso distancia-se dos padrões anteriores: não apresenta o amor inatingível, impossível e, por isso, idealizado; não esconde a sensualidade nem a perverte. O amor em Castro Alves é viril, sensual e caloroso, explorando o erotismo sem qualquer vestígio de culpa, de plena realização sexual, refletindo, na poesia, o comportamento do poeta. 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 54 QUESTÃO 01 Soneto Já da morte o palor me cobre o rosto, Nos lábios meus o alento desfalece, Surda agonia o coração fenece, E devora meu ser mortal desgosto! Do leito embalde no macio encosto Tento o sono reter!... já esmorece O corpo exausto que o repouso esquece... Eis o estado em que a mágoa me tem posto! O adeus, o teu adeus, minha saudade, Fazem que insano do viver me prive E tenha os olhos meus na escuridade. Dá-me a esperança com que o ser mantive! Volve ao amante os olhos por piedade, Olhos por quem viveu quem já não vive! AZEVEDO, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000. O núcleo temático do soneto citado é típico da segunda geração romântica, porém configura um lirismo que o projeta para além desse momento específico. O fundamento desse lirismo é a) a angústia alimentada pela constatação da irreversibilidade da morte. b) a melancolia que frustra a possibilidade de reação diante da perda. c) o descontrole das emoções provocado pela autopiedade. d) o desejo de morrer como alívio para a desilusão amorosa. e) o gosto pela escuridão como solução para o sofrimento. QUESTÃO 02 Tanto na prosa de José de Alencar quanto na poesia de Gonçalves Dias, a figura do índio é caracterizada a) com os atributos da honradez de um cavaleiro medieval. b) enquanto um herói pagão movido pelas forças da natureza. c) como uma mescla de ingenuidade e violência incontrolável. d) por meio de uma fiel descrição de seus valores naturais. e) da mesma forma como o representava Anchieta em suas peças. QUESTÃO 03 “Em frente do meu leito, em negro quadro A minha amante dorme. É uma estampa De bela adormecida. A rósea face Parece em visos de um amor lascivo De fogos vagabundos acender-se...” Esses versos de Álvares de Azevedo, da Lira dos Vinte Anos, apoiam a seguinte afirmação sobre o conjunto “Ideias íntimas”, de onde foram extraídos: a) Em versos brancos e em ritmo fluente, o discurso poético combina notações realistas e fantasias amorosas. b) A lascívia, combinada com a sátira, elimina a possibilidade de lirismo amoroso, reservado para a segunda parte do livro. c) No espaço do quarto, o poeta vinga-se das frustrações amorosas, satirizando a imagem de sua amada. d) Imaginando-se pintor, o poeta vai esboçando num quadro as figuras da virgem romântica e da amante calorosa. e) Os decassílabos e o lirismo intimista são traços que já fazem antever as tendências poéticas da geração seguinte. QUESTÃO 04 “É ela! é ela! - murmurei tremendo, E o eco ao longe murmurou - é ela! Eu a vi, minha fada aérea e pura - A minha lavadeira na janela!” Os versos acima são de Álvares de Azevedo e constituem um exemplo a) da idealização romântica da mulher amada. b) do intimismo sentimental de sua lírica mais pura. c) do fatalismo e da morbidez que dominaram seus versos. d) da veia irônica que caracteriza parte da sua obra. e) de timidez diante da típica musa da adolescência romântica. QUESTÃO 05 O trecho a seguir é parte do poema “Mocidade e morte”, do poeta romântico Castro Alves: EXERCÍCIOS PROPOSTOS Acesse os códigos de cada questão para ver o gabarito LITERATURA 55PROENEM Oh! eu quero viver, beber perfumes Na flor silvestre, que embalsama os ares; Ver minh’alma adejar pelo infinito, Qual branca vela n’amplidão dos mares. No seio da mulher há tanto aroma… Nos seus beijos de fogo há tanta vida… – Árabe errante, vou dormir à tarde À sombra fresca da palmeira erguida. Mas uma voz responde-me sombria: Terás o sono sob a lájea fria. (ALVES, Castro. Os melhores poemas de Castro Alves. Seleção de Lêdo Ivo. São Paulo: Global, 1983.)Esse poema, como o próprio título sugere, aborda o inconformismo do poeta com a antevisão da morte prematura, ainda na juventude. A imagem da morte aparece na palavra a) embalsama. b) infinito. c) amplidão. d) dormir. e) sono.QUESTÃO 06 Soneto Oh! Páginas da vida que eu amava, Rompei-vos! nunca mais! tão desgraçado!... Ardei, lembranças doces do passado! Quero rir-me de tudo que eu amava! E que doido que eu fui! como eu pensava Em mãe, amor de irmã! em sossegado Adormecer na vida acalentado Pelos lábios que eu tímido beijava! Embora — é meu destino. Em treva densa Dentro do peito a existência finda Pressinto a morte na fatal doença! A mim a solidão da noite infinda Possa dormir o trovador sem crença. Perdoa minha mãe — eu te amo ainda! AZEVEDO, A. Lira dos vinte anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996. A produção de Álvares de Azevedo situa-se na década de 1850, período conhecido na literatura brasileira como Ultrarromantismo. Nesse poema, a força expressiva da exacerbação romântica identifica-se com a(o) a) amor materno, que surge como possibilidade de salvação para o eu lírico. b) saudosismo da infância, indicado pela menção às figuras da mãe e da irmã. c) construção de versos irônicos e sarcásticos, apenas com aparência melancólica. d) presença do tédio sentido pelo eu lírico, indicado pelo seu desejo de dormir. e) fixação do eu lírico pela ideia da morte, o que o leva a sentir um tormento constante. QUESTÃO 07 TEXTO I A canção do africano Lá na úmida senzala, Sentado na estreita sala, Junto ao braseiro, no chão, entoa o escravo o seu canto, E ao cantar correm-lhe em pranto Saudades do seu torrão... De um lado, uma negra escrava Os olhos no filho crava, Que tem no colo a embalar... E à meia-voz lá responde Ao canto, e o filhinho esconde, Talvez p’ra não o escutar! “Minha terra é lá bem longe, Das bandas de onde o sol vem; Esta terra é mais bonita, Mas à outra eu quero bem.” ALVES, C. Poesias completas. Rio de Janeiro: Ediouro, 1995 (fragmento). TEXTO II No caso da Literatura Brasileira, se é verdade que prevalecem as reformas radicais, elas têm acontecido mais no âmbito de movimentos literários do que de gerações literárias. A poesia de Castro Alves em relação à de Gonçalves Dias não é a de negação radical, mas de superação, dentro do mesmo espírito romântico. MELO NETO, J. C. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003 (fragmento). O fragmento do poema de Castro Alves exemplifica a afirmação de João Cabral de Melo Neto porque a) exalta o nacionalismo, embora lhe imprima um fundo ideológico retórico. b) canta a paisagem local, no entanto, defende ideais do liberalismo. c) mantém o canto saudosista da terra pátria, mas renova o tema amoroso. d) explora a subjetividade do eu lírico, ainda que tematize a injustiça social. e) inova na abordagem de aspecto social, mas mantém a visão lírica da terra pátria. 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 56 QUESTÃO 08 Outro traço importante da poesia de Álvares de Azevedo é o gosto pelo prosaísmo e o humor, que formam a vertente para nós mais moderna do Romantismo. A sua obra é a mais variada e complexa no quadro da nossa poesia romântica; mas a imagem tradicional de poeta sofredor e desesperado atrapalhou a reconhecer a importância de sua veia humorística. (Antonio Candido. “Prefácio”. In: Álvares de Azevedo. Melhores poemas, 2003. Adaptado.) A veia humorística ressaltada pelo crítico Antonio Candido na poesia de Álvares de Azevedo está bem exemplificada em: a) Cavaleiro das armas escuras, Onde vais pelas trevas impuras Com a espada sanguenta na mão? Por que brilham teus olhos ardentes E gemidos nos lábios frementes Vertem fogo do teu coração? b) Ontem tinha chovido... Que desgraça! Eu ia a trote inglês ardendo em chama, Mas lá vai senão quando uma carroça Minhas roupas tafuis encheu de lama... c) Pálida, à luz da lâmpada sombria, Sobre o leito de flores reclinada, Como a lua por noite embalsamada, Entre as nuvens do amor ela dormia! d) Se eu morresse amanhã, viria ao menos Fechar meus olhos minha triste irmã; Minha mãe de saudades morreria Se eu morresse amanhã! e) Quando em meu peito rebentar-se a fibra, Que o espírito enlaça à dor vivente, Não derramem por mim nem uma lágrima Em pálpebra demente. QUESTÃO 09 Leia o soneto “Já da morte o palor me cobre o rosto”, de Álvares de Azevedo, que pertence à estética romântica brasileira, período em que uma das vertentes passou a ser designada como “geração do mal do século”, e assinale a ALTERNATIVA CORRETA. Soneto “Já da morte o palor me cobre o rosto, Nos lábios meus o alento desfalece, Surda agonia o coração fenece, E devora meu ser mortal desgosto! Do leito embalde no macio encosto Tento o sono reter!...já esmorece O corpo exausto que o repouso esquece... Eis o estado em que a mágoa me tem posto! O adeus, o teu adeus, minha saudade, Fazem que insano do viver me prive E tenha os olhos meus na escuridade. Dá-me a esperança com que o ser mantive! Volve ao amante os olhos por piedade, Olhos por quem viveu quem já não vive!” (AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos (1853), São Paulo: Martin Claret, 1999. p. 187) a) O poeta faz uso constante de expressões ligadas à morte, revelando uma preferência pelos aspectos dolorosos, cruéis e até repugnantes. Isso se caracteriza por meio de impressões sensoriais e dentro do culto do contraste entre a vida e a morte, visando revelar a miséria da condição humana. b) Por meio do culto do contraste, uma das características românticas, o poeta faz uso constante de elementos ligados às ideias de vida e de morte, visando não só a tentativa de conciliação de polos opostos, considerados irreconciliáveis, como carne e espírito, mas também a humanização do sobrenatural. c) Por meio do uso constante de expressões ligadas à morte, o poeta busca descobrir valores escondidos no âmago do seu “eu”, procurando dar-lhes objetividade para chegar a um ideal realizável e provocar um movimento que afete o seu espírito e o mundo. Com isso, pretende facilitar a fusão entre o subjetivo e o objetivo, a vigília e o sono, visando o êxtase. d) O poeta faz uso constante de expressões ligadas à morte, não só diretamente, como “morte” e “fenece”, mas também indiretamente, como “desfalece”, “esmorece”, “viver me prive” e “já não vive”. Essa opção pela intensificação na temática da morte, vinculada aos demais aspectos do poema, representa a fuga da realidade e revela o descontentamento do poeta com a realidade circundante. e) Por meio da imaginação criadora, uma das características românticas, o poeta faz uso constante de elementos ligados às ideias de vida e de morte, visando libertar o homem das limitações de uma existência meramente utilitária. Com isso, busca, como atitude de vida, sistematizar os valores da imaginação para modificar as estruturas do mecanismo da realidade odiada, tal como se apresenta objetivamente. LITERATURA 57PROENEM QUESTÃO 10 INSTRUÇÃO: para responder à questão, leia o excerto abaixo, retirado da obra Macário, de Álvares de Azevedo. (O DESCONHECIDO) Eu sou o diabo. Boa-noite, Macário. (MACÁRIO) Boa-noite, Satã. (Deita-se. O desconhecido sai). O diabo! uma boa fortuna! Há dez anos que eu ando para encontrar esse patife! Desta vez agarrei-o pela cauda! A maior desgraça deste mundo é ser Fausto sem Mefistófeles. Olá, Satã! (SATÃ) Macário. (MACÁRIO) Quando partimos? (SATÃ) Tens sono? (MACÁRIO) Não. (SATÃ) Então já. (MACÁRIO) E o meu burro? (SATÃ) Irás na minha garupa. Sobre o movimento literário em que se inscreve Álvares de Azevedo, é INCORRETO afirmar: a) A representação de figuras do mundo sobrenatural também constitui uma das características desse movimento, conforme se lê no excerto acima. b) José de Alencar é o autor de romances mais representativos desse movimento, com obras como O Guarani, O sertanejo, As minas de prata. c) A representação da nação, um dos temas do movimento em que se inscreve a obrade Álvares de Azevedo, exaltou as belezas naturais da terra brasileira. d) Os estados de alma em que o sujeito poético expressa seus sentimentos de tristeza, dor e angústia é tema recorrente no movimento em que se inscreve a obra de Álvares de Azevedo. e) A poesia de Álvares de Azevedo, como a dos outros românticos brasileiros, define-se em torno de dois polos poéticos: a marcante presença da natureza, explorada com destaque em Noites da taverna, e a constante viagem ao interior do sujeito para exprimir sua dor e seus sentimentos. ANOTAÇÕES 14 POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA - AS FASES DO ROMANTISMO 58 ANOTAÇÕES 59PROENEM Aproxime seu dispositivo móvel do código para acessar a teoria PROSA ROMÂNTICA JOSÉ DE ALENCAR, MACEDO E ALMEIDA CONTEXTO DE INSERÇÃO DA PROSA NO BRASIL Evidentemente, as condições históricas que permitiram a fixação dos princípios românticos no Brasil aplicam-se igualmente à poesia e à prosa. É claro que fatores como a urbanização da cidade do Rio de Janeiro, a “corte” do Império, além da formação de uma sociedade consumidora crescente que frequentava a cidade, influenciam decisivamente a procura por entretenimento – nesse caso, já influenciado pelo espírito nacionalista – com a “cor local”. E foi assim que prosa romântica fez sucesso no Brasil, ganhando adeptos e formando um núcleo leitor, introduzida pelas histórias de autores europeus como Victor Hugo, Alexandre Dumas e Walter Scott, principalmente com a publicação desses escritores nos jornais, em folhetins diários, uma espécie de precursora das novelas televisivas dos dias atuais. Tal estratégia aumentou de forma expressiva a tiragem dos periódicos, devido ao entusiasmo declarado dos leitores, cativados pela nova narrativa, envolvente, de linguagem acessível, sem complicações intelectuais, de acontecimentos rápidos e de emoções fortes. A estrutura folhetinesca buscava retratar pequenas desarmonias na ordem social burguesa vigente, com suas histórias apresentando conflitos que perturbavam a tranquilidade anterior, provocando a desordem e estabelecendo a crise nos valores burgueses; contudo, as dificuldades eram superadas e a felicidade era restabelecida com a reordenação da ordem burguesa, reafirmando-se os seus valores. No Brasil, o público leitor desses folhetins era tipicamente urbano, apesar de ter suas raízes no mundo rural que lhes sustentavam: mulheres e estudantes que se estabeleceram na corte após a Independência, como parte da mudança da família em busca de ascensão econômica ou política – as esposas e filhas de tais famílias acompanhavam o traslado – ou filhos de senhores rurais mandados aos grandes centros para completar os estudos. ALMEIDA JR, José Ferraz. Leitura, 1892 O sentimentalismo dos folhetins veio a modernizar uma sociedade que já se sentia incomodada com um conjunto de ideias intolerantes que refletiam a visão agrária e atrasada que não combinava com os valores urbanos que o pensamento burguês apregoava. Em 1844, com a publicação de A Moreninha de Joaquim Manoel de Macedo, a literatura brasileira avançava em busca da construção de uma identidade própria e abandonava as meras cópias e versões dos folhetins europeus, inaugurando a era do romance nacional. ESTRUTURA DO FOLHETIM Podem-se elencar algumas marcas bastante significativas do folhetim romântico do século XIX. O caráter conservador das narrativas nacionais fixava moralmente um modelo de sociedade que emergia pós-Independência. Características libertárias, luta por igualdade ou adaptações mais ligadas a determinados contextos europeus só aparecerão no romance brasileiro no final do movimento romântico. No geral, o folhetim estruturava-se em uma ordem mais ou menos definida: 1. Situação inicial de ordem burguesa. 2. Perturbação na ordem burguesa: alguma ruptura com preceitos familiares ou institucionais. 15 PROSA ROMÂNTICA - JOSÉ DE ALENCAR, MACEDO E ALMEIDA 60 3. Crise nos valores burgueses, rejeição e desaprovação de ações dos protagonistas (via de regra jovens “contestadores”. 4. Busca pelo mérito e pela superação dos rejeitados. 5. Decadência ou equívoco do planejamento inicial imposto, normalmente com a descoberta de falhas morais que caracterizam o antagonista. 6. Superação das dificuldades. 7. Revelação de atitudes e personalidades com retratação e reaproximação. 8. A felicidade se restabelece com a reordenação da ordem burguesa, reafirmando os seus valores iniciais. Lucélia Santos e Rubens de Falco em uma cena da adaptação televisiva do romance A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães exibida em 1976. Assim, fatores como o sentimentalismo, o impasse amoroso e a idealização de sentimentos ou mesmo das questões nacionais surgem, em um primeiro momento, como as mais fortes características desses folhetins. As personagens eram normalmente planas – isto é, previsíveis em seu comportamento, sem grandes alterações no arco de sua própria história –, com utilização abusiva de modelos de heróis clássicos. No plano da narrativa, apesar de que o foco narrativo pudesse variar bastante, são mais comuns as construções em terceira pessoa. Entretanto, uma característica constante é a ampla utilização de flash backs na narrativa. A linguagem busca uma afirmação nacional, afastando-se de modelos gramaticais lusitanos e, ainda que não reivindique a total oralidade popular, passa a representar a modalidade brasileira reconhecida pela aristocracia nacional. TIPOS DE ROMANCES ROMÂNTICOS Pode-se dividir os romances brasileiros em quatro “classes”, segundo a temática desenvolvida: a) Regionalista • Visão romântica e idealizada do país sobre sobre si mesmo. • Valorização da diversidade étnica, linguística, social e cultural. • Experiência nova na literatura nacional, fez os escri- tores observarem a realidade nacional. • Afirmação da identidade nacional. b) Indianista • Exaltação do índio e da natureza nacional. • Celebra a pureza do índio e a formação mestiça da raça brasileira. • Idealização de personagens e relações. c) Histórico • Busca o passado “glorioso” do país • Visão ufanista e exagerada. d) Urbano • Comunicação direta com o público burguês. • Retrata as relações cotidianas. • Personagens comuns e de fácil identificação. • Idealização amorosa. • Retrato dos valores e ideais burgueses. ALGUNS ROMANCISTAS Joaquim Manuel de Macedo Nasceu em Itaboraí, no Rio de Janeiro, em 24 de junho de 1820, filho de uma família relativamente abastada. Formou-se em Medicina, ciência que não colocaria em prática, pois já se decidira pelas carreiras literária, docente e política. Destacou-se em todas elas, ensinando os filhos da princesa Isabel, lecionando História no colégio Pedro II e tornando-se deputado em várias legislaturas, além apresentar inúmeras contribuições ao jornalismo. Como escritor, foi o primeiro a conhecer a fama, sendo o pioneiro na prosa romântica nacional e grande produtor de romances, deixando mais de quarenta obras publicadas. Nos últimos anos de vida, Joaquim Manuel de Macedo sofreu com a decadência de suas faculdades mentais, junto à superação de sua fama por outros escritores e pela perda de sua situação financeira. Esquecido pelo público, morre no Rio de Janeiro em 11 de abril de 1882. Sua importância é resultado da visão de “mercado” que possuía: Macedo percebeu que o público nacional aceitaria de bom grado um romance adaptado aos cenários brasileiros, desde que fosse conservado o estilo das narrativas inglesas e francesas com o qual os leitores estavam acostumados por culpa dos folhetins publicados nos jornais. Sua obra reflete os ideais do romantismo europeu somados aos valores morais da sociedade patriarcal brasileira. Com sua escrita simples e descritiva, de histórias sem grandes surpresas, focava principalmente na LITERATURA 61PROENEM identificação dos leitores com os locais reais da cidade que eram descritos. Sua obra não possui grande valor artístico, não apresenta novidadesestilísticas nem mergulha em quaisquer análises psicológicas ou sociológicas. Cabe-lhe o destaque pelo pioneirismo do romance nacional. Em lugar das grandes paixões, namoros respeitáveis que seguem o padrão da sociedade, com a sequência de noivado e casamento. O afeto era apresentado pelos olhos do decoro, sem revoltas ou tragédias. Enfim, como se convencionou classificar a obra de Macedo: mais açúcar do que sangue, retratando o cotidiano da burguesia e, por que não dizer, a mediocridade de seus valores. José de Alencar José Martiniano de Alencar nasceu em Mecejana, no interior do Ceará, em 1º de maio de 1829, filho de uma das mais tradicionais famílias da elite cearense. Seu pai chegou a participar da Confederação do Equador e também foi senador do Império. Aos nove anos, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, onde estudou, completando seus estudos em São Paulo, onde se formou em Direito. De volta ao Rio, trabalhou como advogado e aproveitou para contribuir na imprensa. Polemista, fez duras críticas ao trabalho de Gonçalves de Magalhães, apadrinhado do Imperador, que comprou a polêmica. Começa a publicar seus livros em 1857, lançando Cinco Minutos em livro e o Guarani como folhetim, obtendo uma repercussão jamais antes vista no país. José de Alencar foi político, orador parlamentar e consultor do Ministério da Justiça, chegando a Ministro de Estado; só não foi Senador – cargo a que se candidatou – porque D. Pedro II vetou-lhe a nomeação. Casou-se aos trinta e cinco anos com Georgina Cochrane, uma jovem de 18 anos, sobrinha do Almirante Cochrane, herói da Independência. José conheceu a jovem na Tijuca, em um de seus retiros para cuidar de sua tuberculose. Em 12 de dezembro de 1877, depois de uma séria piora em seu estado de saúde, José de Alencar sucumbe à tuberculose e morre no Rio de Janeiro. A importância de José de Alencar para a literatura nacional é enorme, chegando a ser considerado como seu patriarca. Buscou fazer em suas obras um painel do país, mostrando a diversidade de aspectos geográficos, sociais e étnicos do Brasil. Em sua ideia de construção do romance brasileiro encontra-se um projeto abrangente, buscando histórias gloriosas e idealizando mitos dos fundadores da raça. Inovador quanto à linguagem, decidiu que, se o romance deveria ser o retrato do país, não bastava somente a temática brasileira, mas uma linguagem nacional. Assim, rompe com o estilo literário lusitano, usando períodos curtos e sintéticos, valendo-se de comparações e metáforas, buscando analogias na natureza para descrever as expressões do índio, do qual se utiliza da linguagem, usando por muitas vezes vocábulos indígenas. Alencar representa em suas obras a idealização da realidade humana e social do país, passando, assim, ao largo dos problemas sociais como a escravidão, por exemplo. Suas personagens são exemplares positivos e que devem ser imitados, correspondendo às necessidades das classes elitizadas do país na formação de uma boa imagem da nação. Seus romances urbanos idealizam a própria sociedade, dando-lhe um caráter inverossímil ao tentar retratar os conflitos entre a realidade e o universo sublimado. Isso mostra uma transição, já com alguma influência de percepções pré-realistas. Apesar de extremamente folhetinesco, Alencar introduz novidades temáticas em sua trilogia de “perfis femininos”, nas quais apresenta análises psicológicas mais desenvolvidas e mistura as questões financeiras aos relacionamentos amorosos. O drama das personagens liga-se às questões da organização social. Em Lucíola, a prostituta que se apaixona – um amor impossível frente à diferença dos grupos sociais; Senhora apresenta o casamento por interesse; e Diva, um retrato do mundo fútil das elites, transformando o relacionamento em um jogo de interesses, desprezo e humilhações, explorando os limites dos sentimentos humanos. Seus romances indianistas também figuram entre os mais importantes da literatura nacional. É nítida a idealização do índio e sua colocação como herói nacional, alçando-o como um dos pilares – junto ao europeu – de formação do povo brasileiro, ignorando por completo o papel do negro na gênese brasileira. Tais romances ocorrem em um passado distante, chegando mesmo, em Ubirajara, a ocorrer antes do descobrimento. O índio em Alencar é inspirado no cavaleiro medieval europeu, possuindo características épicas de um herói clássico. Alencar também apresenta uma gama de romances históricos, ambientados no passado colonial, buscando representar a formação da nação como povo. Contudo, não há fidelidade nos relatos históricos, deixando os fatos em segundo plano, servindo como pano de fundo para as mais idealizadas e inverossímeis aventuras. Por fim, José de Alencar dá início aos romances regionalistas na literatura brasileira. Nascidas da nostalgia do autor e de uma evasão para a infância, é de nítida intenção ideológica a produção de tais obras. Retratam a condição do país da forma mais pura, localizando-as no mundo rural, buscando revelar o país em sua extensão geográfica, demonstrando os típicos brasileiros da região, com a finalidade de integrá-los a um projeto de unidade, como desejo das elites imperiais e que encontra em Alencar seu porta-voz. Em O Sertanejo, faz uma belíssima descrição, demonstrando claramente ter os conhecimentos para a realização de tal obra, fato que se revela insuficiente em O Gaúcho, já que o autor jamais conhecera a região, traçando um perfil superficial e estereotipado dos habitantes do sul. 15 PROSA ROMÂNTICA - JOSÉ DE ALENCAR, MACEDO E ALMEIDA 62 José de Alencar foi o mais nacionalista de nossos autores, considerou sua arte uma missão patriótica a ser cumprida, registrando a marca da autonomia literária de nossa arte e de nossa linguagem. Percebeu o país em sua extensão e buscou analisar o Brasil em todas as suas vertentes: urbana, rural, geográfica, étnica e histórica. Não se pode acusar Alencar de não ter se posicionado frente às mazelas sociais, visto que o escritor possuía um posicionamento político claro, defendendo os interesses da monarquia e das elites do Império da qual fazia parte; sua escrita ideológica representa coerentemente seu pensamento e seu discurso de classe. OUTROS AUTORES Há inúmeros outros romancistas do período que são importantes e que valem a pena ser conhecidos e pesquisados. Nomes como Bernardo Guimarães, Manuel Antônio de Almeida, Visconde de Taunay, Franklin Távora e Martins Pena merecem uma boa leitura. EXERCÍCIOS PROPOSTOS Acesse os códigos de cada questão para ver o gabarito QUESTÃO 01 “Ele era o inimigo do rei”, nas palavras de seu biógrafo, Lira Neto. Ou, ainda, “um romancista que colecionava desafetos azucrinava D. Pedro II e acabou inventando o Brasil”. Assim era José de Alencar (1829-1877), o conhecido autor de O guarani e Iracema, tido como o pai do romance no Brasil. Além de criar clássicos da literatura brasileira com temas nativistas, indianistas e históricos, ele foi também folhetinista, diretor de jornal, autor de peças de teatro, advogado, deputado federal e até ministro da Justiça. Para ajudar na descoberta das múltiplas facetas desse personagem do século XIX, parte de seu acervo inédito será digitalizada. (História Viva, n.99,2011.) Com base no texto, que trata do papel do escritor José de Alencar e da futura digitalização de sua obra, depreende-se que: a) a digitalização dos textos é importante para que os leitores possam compreender seus romances. b) o conhecido autor de O guarani e Iracema foi importante porque deixou uma vasta obra literária com temática atemporal. c) a divulgação das obras de José de Alencar , por meio da digitalização, demonstra sua importância para a história do Brasil imperial. d) a digitalização dos textos de José de Alencar terá importante papel na preservação da memória linguística e da identidade nacional. e) o grande romancista José de Alencar é importante
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