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FACULDADE DE DIREITO EMANUELA LUFT ANÁLISE DOS PRINCIPAIS FATORES QUE LEVAM AO GRANDE NÚMERO DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ADOÇÃO TARDIA CANOAS 2020 EMANUELA LUFT ANÁLISE DOS PRINCIPAIS FATORES QUE LEVAM AO GRANDE NÚMERO DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ADOÇÃO TARDIA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito do Centro Universitário Ritter dos Reis, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharela em Direito. Orientador: Prof. Rodrigo Freitas Paixão CANOAS 2020 AGRADECIMENTOS Agradeço a minha mãe, por sempre ter me incentivado a estudar, mesmo sem ter tido está oportunidade. Ao meu pai, por ser um porto seguro ao longo da minha vida, permitindo- me errar ao longo dela. As minhas irmãs, que sempre me apoiaram nas minhas decisões. Em especial agradeço ao meu companheiro, Jhonatan de Souza Vaz, por ter sempre caminhado ao meu lado nesta vida, sempre compreensível e disposto a me ajudar, e que compreendeu a minha ausência enquanto eu me dedicava à realização deste trabalho. Ainda, agradeço a minha colega/amiga, Ana Irís, por ter partilhado desta mesma aventura comigo, e por termos conseguido chegar até onde tanto temíamos. Por fim, agradeço ao meu orientador, Rodrigo Paixão, por todo apoio, correções e ensinamentos que me transmitiu, permitindo-me apresentar um melhor trabalho, além de sua paciência e dedicação, que ultrapassam este trabalho e vem desde as cadeiras iniciais do curso de Direito. “Quanto mais aumenta nosso conhecimento, mais evidente fica nossa ignorância.” John Fitzgerald Kennedy RESUMO Este estudo analisa os fatores que levam a adoção tardia e o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. O problema de pesquisa é verificar quais os fatores levam à adoção tardia e se eles infringem o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. O objetivo é fazer uma análise dos fatores que levam a adoção tardia, trazendo uma compreensão sobre o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Para tanto, será feita uma análise aprofundada do instituto adoção, do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e dos fatores que levam ao grande número de crianças em situação de adoção tardia, de modo a analisar os procedimentos acolhimento institucional, destituição do poder familiar, habilitação para adoção e adoção. O conteúdo do trabalho foi dividido em dois capítulos: o primeiro falará sobre Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e sobre o instituto adoção, e o segundo adentrará na adoção tardia, realizando uma análise dos fatores que levam ao grande número de crianças em situação de adoção tardia, sendo eles: insistência pela manutenção das crianças/adolescentes na família natural, extensa ou ampliada, morosidade do judiciário e perfil de crianças preferido pelos adotantes. O estudo conclui que os fatores que levam a adoção tardia são a insistência pela manutenção das crianças/adolescentes na família natural, extensa ou ampliada, morosidade do judiciário e perfil de crianças preferido pelos adotantes e que estes fatores infringem o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, visto que não colocam os interesses das crianças – mesmo se tendo apresentado uma grande evolução aos longos dos anos – na frente ao dos adultos, pois a falta de celeridade nos processos e a insistência na família natural e extensa/ampliada acabam por ocasionar a perda de perfil do infante do almejado pelos casais adotantes, fazendo com que crianças fiquem acolhidas mais de dez anos, privando de terem uma vida digna. Nota-se que a adoção tardia é um fator negativo para as crianças, na medida que - quando conseguem serem adotadas - sua adaptação na nova família pode se mostrar conturbada, especialmente pelas desilusões sofridas por essa na família anterior. Esse trabalho foi desenvolvido por meio da pesquisa de bibliografia específica e da legislação pertinente. Palavras chave: Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Adoção. Adoção tardia. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 7 2 O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O INSTITUTO ADOÇÃO ..................................................................................................... 10 2.1 PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ........ 10 2.2 ADOÇÃO NO CONTEXTO HISTÓRICO ....................................................................... 17 3 OS PRINCIPAIS FATORES QUE LEVAM AO GRANDE NÚMERO DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ADOÇÃO TARDIA ........................................................................... 23 3.1 INSISTÊNCIA PELA MANUTENÇÃO NA FAMÍLIA NATURAL, EXTENSA OU AMPLIADA ............................................................................................................................. 23 3.2 MOROSIDADE DO JUDICIÁRIO ................................................................................... 30 3.3 PERFIL DE CRIANÇAS PREFERIDO PELOS ADOTANTES ...................................... 33 4 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 37 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 40 7 1 INTRODUÇÃO O presente estudo visa analisar os fatores que levam a adoção tardia e o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. O problema de pesquisa é verificar quais os fatores levam à adoção tardia e se eles infringem o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, na medida em que podem existir casos em que a persistência em algumas medidas podem causar prejuízos aos infantes acolhidos a longo prazo. O objetivo desse trabalho é fazer uma análise dos fatores que levam a adoção tardia, trazendo uma compreensão sobre o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Para tanto, será feita uma análise aprofundada do instituto adoção, do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e dos fatores que levam ao grande número de crianças em situação de adoção tardia, de modo a analisar os procedimentos acolhimento institucional, destituição do poder familiar, habilitação para adoção e adoção. A pesquisa apontou que os fatores que levam à adoção tardia são a insistência pela manutenção das crianças/adolescentes na família natural, extensa ou ampliada, morosidade do judiciário e perfil de crianças preferido pelos adotantes. Diante disso, questiona-se se a insistência pela manutenção na família natural, extensa ou ampliada é a melhor medida a ser aplicada na vida daquela criança ou adolescente. Destaca- se que o presente trabalho se destina a crianças que se encontram acolhidas institucionalmente (Abrigo), onde tal acolhimento se deu em razão da negligência/omissão dos pais. Assim, necessário que se compreenda quais os motivos que levam a necessidade de Acolhimento Institucional daquele infante, como ocorre o Processo de Acolhimento e quando se inicia o processo de Destituição do Poder Familiar dos genitores, a fim de verificar um fator muito importante, o tempo que se “perde” nesta insistência. Ademais, veremos se a morosidade do judiciário causa prejuízos aos infantes, seja nos Processos de Acolhimento Institucional, Destituição do Poder Familiar, Habilitação para Adoção e Adoção de fato. Necessário mencionar - para elucidar o terceiro fator da adoção tardia- que a morosidade causa sim um prejuízo, que é a perda de perfil de crianças preferido pelos adotantes. Por esta razão, a presente pesquisa visa responder o seguinte questionamento: quais são os fatores que levam a adoção tardia e eles obedecem ao Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente? 8 O presente trabalho tem a pretensão de possibilitar que o leitor, por meio da análise do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, dos procedimentos acolhimento institucional, destituição do poder familiar, habilitação para adoção e adoção consiga compreender esse Princípio, como ocorrem os procedimentos citados e, ao final, conclua se a decisão tomada nesses institutos são as mais adequadas aos interesses das crianças ou ao dos adultos. Para tal intento, o presente trabalho está dividido em dois capítulos, onde, no primeiro capítulo, será discorrido sobre o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e sobre o instituto adoção, no qual veremos o conceito de adoção, como ela se deu ao longo dos anos e quais são suas principais características, dá mesma forma, veremos como surgiu o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente - que adveio de uma série de injustiças que as crianças estavam sendo submetidas - e qual a importância de sua aplicação e preservação, fazendo-se uma análise da transição da Doutrina da Situação Irregular para a Doutrina da Proteção Integral. Mostra-se extremamente importante, a compreensão do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente para que se possa concluir se os fatores que levam a adoção tardia não o infringem, tal prncípio seria a plena satisfação dos direitos das crianças, tendo como função limitar e orientar o Magistrado a tomar a decisão correta. Em um segundo momento, no capítulo que sucede, adentrar-se-á na adoção tardia, realizando uma análise nos fatores que levam ao grande número de crianças em situação de adoção tardia, abordando no subtítulo “insistência na família natural e extensa/ampliada” a imposição fortemente do ECA para que a criança retorne ao seio da família e a consequência das diversas tentativas infrutíferas para a criança, que por vezes, passam anos acolhidas na tentativa de ressocialização dos genitores. Tal medida de ressocialização, acaba por prejudicar a criança, que está em um local não adequado para sua idade (Abrigo não é referência de lar) e beneficiar os pais, que por vezes, não fazem esforços para reaver seu filho(a). Além disso, falaremos das formalidades excessivas do Poder Judiciário, que causam morosidade em questões relacionadas as crianças ou adolescentes, especialmente nos processos de acolhimento institucional, destituição do poder familiar, habilitação para adoção e adoção. Por fim, faremos uma análise do perfil de crianças preferido pelos adotantes, embasando a pesquisa com dados do Sistema Nacional de Adoção (SNA) relativos as crianças do Estado do Rio Grande do Sul, de modo a verificar o perfil buscado pelos pretensos adotante versus o perfil de crianças 9 disponíveis para adoção, demonstrando as motivações dos pretensos adotantes por determinado perfil. O método de abordagem foi desenvolvido por meio da pesquisa de bibliografia específica e da legislação pertinente. 10 2 O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O INSTITUTO ADOÇÃO O presente capítulo é o ponto de partida para entendimento do instituto adoção, bem como de qual sua origem e como foi sua evolução no decorrer do tempo. Adoção é o ato pelo qual pessoa recebe desconhecido como membro de sua família na qualidade de filho. A partir de tal ato o adotado passa a integrar sua família, onde abre-lhe um leque de novos caminhos e oportunidades. Dito isso, é necessário que se compreenda a origem e conceito da adoção, e entender o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que norteia ou deveria nortear o judiciário e toda a sociedade para que se garanta os direitos da criança e do adolescente. Deste modo, inicialmente abordaremos o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, de modo a verificar a necessidade de aplicação desse, demonstrando como no passado sua falta causou graves injustiças à crianças e adolescentes, que tiveram os destinos de suas vidas decididos sob a perspectiva do que seria melhor para elas, sob a ótica dos adultos e não analisando o caso concreto e suas necessidades. Posteriormente, serão abordados alguns dos conceitos existentes acerca do instituto adoção, assim como será demonstrado seu contexto histórico. 2.1 PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Primeiramente, calha mencionar que são diversos os princípios que norteiam o instituto adoção, mas neste trabalho analisaremos o princípio que mais deve ser aplicado em questões relativas à criança e a adoção, sendo o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Em razão disso, vamos verificar como se deu seu surgimento, para também compreender o motivo de sua importância. Sua origem se deu na Inglaterra, pelo instituto parens patriae (princípio), com o intuito do Rei e da Coroa protegerem os incapazes. No século XIV, tal responsabilidade foi delegada ao Chanceler (encarregado da guarda), de modo que as Cortes de Chanceler passaram a agir como guardiões supremos dos que não tinham discernimento para conduzir seus interesses (crianças, loucos e débeis). Nos casos da época, tinha-se que o foco dos problemas não deveria ser a lide das partes, mas sim o bem estar da criança, devendo este se sobrepor ao dos pais. Tal princípio se tornou efetivo mesmo na Inglaterra apenas no ano de 1836. Os Estados Unidos, 11 por intermédio do princípio best interest (inserido no ano de 1813 no país), também se vinculou ao instituto parens patriae, tendo o Rei transferido o poder de guarda a cada Estado. Destaca- se que o princípio best interest permanece ativo no referido país até hoje e tem como objetivo considerar as necessidades dos infantes em detrimento aos interesses dos pais. 1 Atualmente, os direitos das crianças e adolescentes estão assegurados. Todavia, nem sempre foi assim, a primeira aparição do termo “melhores interesses da criança/adolescente” foi em 1924, quando a extinta Liga das Nações, promulgou a Declaração dos direitos da criança de Genebra. Após, em 1948, pela Organização das Nações Unidas (ONU), na Declaração universal dos direitos humanos, que trouxe em seu artigo 25 que as crianças têm “direito a cuidados e assistência especiais”. Já em 1959, a ONU lançou a Declaração Internacional dos Direitos das Crianças e após, em 1989, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, que estabeleceu, com intensidade, o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, usado nos dias de hoje. 2 De todo modo, na América Latina, até o início do século XX as crianças e os adolescente (com menos de 18 anos) não tinham um tratamento diferenciado em relação aos adultos, apenas a redução de um terço da pena em caso de cometimento de crimes. Tal redução, no entanto, se dava apenas em relação ao cálculo da pena, e não em seu cumprimento, haja vista que o infante era inserido no mesmo sistema “penitenciário” que o adulto, 3 ou seja, tendo um tratamento mais severo do que se estivesse inserida em um local destinado a sua idade, o que na época não havia. Ainda, houve a criação de Tribunais direcionados as crianças, sendo o primeiro criado nos Estados Unidos, em 1899, o Tribunal de Menores de Illinois. Outros países também aderiram a criação desses juizados especiais, entre eles: Inglaterra (1905), Alemanha (1908), Portugal e Hungria (1911), França (1912), Argentina (1921), Japão (1922), Brasil (1923), Espanha (1924), México (1927) e Chile (1928). 41 BARBOZA, Heloisa Helena. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Dentro: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A família na travessia do milênio: Anais do II congresso brasileiro de direito de família. Belo Horizonte: Livraria del rey editora ltda, IBDFAN, 2000, p.216-218. 2 MENDES, Josimar Antônio de Alcântara; ORMEROD, Thomas. O Princípio dos Melhores Interesses da Criança: Uma Revisão Integrativa de Literatura em Inglês e Português. Maringá: Psicologia em Estudo, Vol. 24, 2019, Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413- 73722019000100233&lang=pt>. Acesso em: 04 out. 2020. 3 PAIXÃO, Rodrigo Freitas; COSTA, Ana Paula Motta. Revista de Direito de Família e Sucessão: A imposição da guarda compartilhada como regra no ordenamento jurídico brasileiro: um paralelo com a doutrina da situação irregular. Vol. 3, jan/jun de 2017, p.15-16. 4 MACHADO, Marta de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Barueri: Manole, 2003, pag.34. 12 A fim de mudar o quadro de tratamento das crianças e adolescentes, a partir da segunda década do século XX, surgiu na América Latina a Doutrina da Situação Irregular.5 As crianças e os adolescentes eram submetidos as decisões tomadas sob a visão do que seria melhor para eles sob a convicção dos adultos, o que permitiu que acontecessem diversas injustiças. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente tem como função exterminar com essa ideia de que cabe ao Juiz avaliar o que é o melhor para aquela criança, pois esta avaliação deve ser feita de modo a avaliar a melhor alternativa que garanta o conjunto de direitos mais amplo a aquela criança. Ainda, deve ser um limitador ao poder familiar dos genitores, na medida em que se encontra limitado aos direitos da criança, que devem ser resguardados.6 A Doutrina da Situação Irregular entrou em vigor no Brasil, de fato, com o Código de Menores de 1979, que prevaleceu mais de dez anos no país, gerando decisões baseadas na discriminação e desinformação dos Magistrados. 7 O juiz exercia um papel de bom pai, e como bom pai, não se mantinha inerte e imparcial, sequer garantia o cumprimento das normas processuais. Ocorre que as crianças e adolescentes nascidos em famílias de baixo poder aquisitivo, foram margilizados e tiveram privação de sua liberdade, sob o pretexto de a sociedade estar agindo da melhor forma a protegê-las. Uma questão social acabou virando um problema de polícia. 8 O artigo 2º do Código de menores classificava as crianças que se encontravam em situação irregular da seguinte forma: Art. 2º - Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; 5 PAIXÃO, Rodrigo Freitas; COSTA, Ana Paula Motta. Revista de Direito de Família e Sucessão: A imposição da guarda compartilhada como regra no ordenamento jurídico brasileiro: um paralelo com a doutrina da situação irregular. Vol. 3, jan/jun de 2017, p.15-16. 6 COSTA, Ana Paula Motta. Os adolescentes e seus direitos fundamentais: da invisibilidade à indiferença. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p.152-153. 7 BARBOZA, Heloisa Helena. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Dentro: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A família na travessia do milênio: Anais do II congresso brasileiro de direito de família. Belo Horizonte: Livraria del rey editora ltda, IBDFAN, 2000, p.219. 8 MACHADO, Marta de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Barueri: Manole, 2003, pag.46-47. 13 VI - autor de infração penal. 9 Verifica-se que as crianças vulneráveis (carentes) e as infratoras do ordenamento jurídico - mencionadas acima - recebiam o mesmo tratamento. O infante vulnerável pode ter privada sua liberdade sob a justificativa de que ele será um futuro delinquente, já o adolescente infrator pode ter privada sua liberdade, sem a observância de garantias individuais, sob a justificativa de que está sendo protegido pelo Estado. 10 Ocorre que as crianças e os adolescentes – carentes e infratores (denominados menores) – eram deixados a mercê dentro das casas de acolhimento, de modo que eram largados sem qualquer cuidado e por tempo indeterminado nos Abrigos, tendo infringido seus direitos de pessoa humana. 11 Apenas a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Criança (1989 – ratificada pelo Brasil através do Decreto 99.71/90), é que as crianças passaram a ter respeitados os seus direitos genuínos, sendo estes utilizados para limitação e orientação dos pais e do Estado. Essa simbolizaria um consenso de diferentes culturas e ordenamentos jurídicos em proteger os direitos da criança, por intermédio de políticas públicas e imposição de limites a intervenção do Estado. 12 A Convenção trouxe consigo o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, positivado no seu artigo 3º, 1, da seguinte forma: “Todas as ações relativas à criança, sejam elas levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de assistência social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar primordialmente o melhor interesse da criança”. O referido texto, conforme artigo 5º, § 1º e § 2º da Constituição Federal, tem força de norma fundamental interna, haja vista ser um tratado internacional que visa sobre Direitos Humanos. 13 9 BRASIL. Código de Menores (1979). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970- 1979/l6697.htm#:~:text=LEI%20No%206.697%2C%20DE%2010%20DE%20OUTUBRO%20DE%201979.&te xt=Institui%20o%20C%C3%B3digo%20de%20Menores.&text=Art.,prote%C3%A7%C3%A3o%20e%20vigil% C3%A2ncia%20a%20menores%3A&text=II%20%2D%20entre%20dezoito%20e%20vinte,nos%20casos%20ex pressos%20em%20lei.>. Acesso em: 26 set. 2020. 10 MACHADO, Marta de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Barueri: Manole, 2003, pag. 45 e 48. 11 PAIXÃO, Rodrigo Freitas. A imposição da guarda compartilhada discutida à luz do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. 2018, p. 25. Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário Ritter dos Reis, Faculdade de Direito, Porto Alegre, 2018. 12 BRUÑOL, Miguel Cillero. O interesse superior da criança no marco da convenção internacional sobre os direitos da criança. Dentro: MÉNDEZ, Emílio García; BELOFF, Mary. Infância, Lei e Democracia na América Latina. Edifurb Blumenau, 2001. p. 94 e 100. 13 COSTA, Ana Paula Motta. Os adolescentes e seus direitos fundamentais: da invisibilidade à indiferença. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p.152. 14 O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente serviu para reconhecer de forma progressiva ao longo dos anos os direitos das crianças, de modo a deixarem de serem consideradas objetos dos pais ou da arbitrariedade da autoridade, de modo que a criança passou a ser reconhecida como pessoa. Ainda, deve contrariar quaisquer ameaça e vulnerabilidade aos direitos das crianças e dos adolescentes, de modo a preservar a proteção desses. O Princípio é uma obrigação das autoridades, não podendo deixar de ser aplicado ao caso concreto em que a criança estiver sendo submetida. Inclusive,antes de ser tomada qualquer medida em relação a uma criança, deve-se observar se aquela decisão não infringe nenhum de seus direitos, sob essa perspectiva menciona que o superior interesse da criança é um princípio garantidor.14 A doutrina jurídica da proteção integral – que chegou para acabar com a doutrina da situação irregular – é regida pelo Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e pelo Princípio da Prioridade Absoluta. 15 A doutrina foi debatida no Brasil na década dos anos 80, mas passou a vigorar mesmo com a Constituição Federal de 1988, que garante a criança proteção com prioridade absoluta, sendo um dever da sociedade prover essa e não apenas do Estado e da família. Tal proteção se deve em razão das crianças e os adolescentes serem pessoas em condição peculiar de desenvolvimento. O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 consolida os direitos fundamentais da infância e representa o Princípio da Prioridade Absoluta.16 Desta forma, prudente trazê-lo à baila: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 17 14 BRUÑOL, Miguel Cillero. O interesse superior da criança no marco da convenção internacional sobre os direitos da criança. Dentro: MÉNDEZ, Emílio García; BELOFF, Mary. Infância, Lei e Democracia na América Latina. Edifurb Blumenau, 2001. p.100-103. 15 PAIXÃO, Rodrigo Freitas; COSTA, Ana Paula Motta. Revista de Direito de Família e Sucessão: A imposição da guarda compartilhada como regra no ordenamento jurídico brasileiro: um paralelo com a doutrina da situação irregular. volume 3, jan/jun de 2017, p. 18. 16 BARBOZA, Heloisa Helena. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Dentro: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A família na travessia do milênio: Anais do II congresso brasileiro de direito de família. Belo Horizonte: Livraria del rey editora ltda, IBDFAN, 2000, p.220. 17 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 out. 2020. 15 Muitas vezes o Princípio do melhor interesse pode parecer vago e sem parâmetros, para auxiliar sua interpretação, tem-se os artigos 5º e 6º do Estatuto da Criança e do adolescente (Lei 8.069/90), que facilitam o seu entendimento, nota-se: 18 Art. 5º. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.19 Art. 6º. Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.20 Ou seja, atitudes e comportamentos de cunho discriminatório (sexo, cor, religião, nacionalidade e condição financeira), bem como de violência, devem ser interpretadas como violações ao princípio. 21 O interesse superior da criança seria a plena satisfação de seus direitos, tendo como função limitar e orientar o Magistrado a tomar a decisão correta, especialmente quando não se tem outras orientações concretas, bem como que tal decisão não surja fundamentada “a partir do nada” e sim a partir do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, que é um direito juridicamente reconhecido. O princípio age como um limitador do paternalismo estatal (quando o juiz tomava as decisões investido do papel de bom pai, a partir de parâmetros esperados pela sociedade, tomando decisões em benefício da sociedade predominante daquela época, e não com base no que a criança necessitava), de modo que auxilie o Magistrado na elaboração de uma decisão que envolva regras complexas, para assim proteger o vulnerável. 22 Tal princípio não é uma faculdade e sim uma obrigação para as autoridades, obrigando inclusive as instituições privadas de antes de tomarem qualquer decisão pensarem se aquela medida está protegendo os direitos da criança, pois a partir da Convenção, o principio do melhor interesse, passou a ser um garantidor, que obriga a todos primar pelos interesses das crianças. Os direitos das crianças, pode-se dizer que seria um conjunto de garantias frente ao Estado, de 18 BARBOZA, Heloisa Helena. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Dentro: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A família na travessia do milênio: Anais do II congresso brasileiro de direito de família. Belo Horizonte: Livraria del rey editora ltda, IBDFAN, 2000, p.221. 19 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm >. Acesso em: 03 out. 2020. 20 Ibidem. 21 BARBOZA, op. cit., p.221. 22 BRUÑOL, Miguel Cillero. O interesse superior da criança no marco da convenção internacional sobre os direitos da criança. Dentro: MÉNDEZ, Emílio García; BELOFF, Mary. Infância, Lei e Democracia na América Latina. Edifurb Blumenau, 2001. p.102-104. 16 modo que esse, por intermédio do poder público inclua os interesses das crianças nas estruturas e decisões de assuntos públicos. 23 Além disso, quando se for aplicar o princípio, deve se ter em mente que sempre prevalecerá os direitos das crianças sobre qualquer cultura, bem como sobre qualquer benefício coletivo. Vale destacar que o princípio é de extrema importância para que as crianças sejam reconhecidas como pessoas e não como meros objetos sujeitos as decisões dos pais ou da autoridade, de modo que se possa contestar qualquer ameaça aos direitos pelas crianças até agora conquistados. 24 Ademais, pode ocorrer dos direitos das crianças se sobreporem uns aos outros, exemplo disso é quando temos colidindo o direito de liberdade e o direito de proteção, explica-se: quando a criança é separada dos pais, limita-se o direito de liberdade da criança, mas é necessário para que não se fira o direito de proteção da criança, que é um direito superior em relação ao de liberdade, mas mesmo afastada dos genitores, terá resguardado o direito ao “convívio” com esses, salvo se lhe ser prejudicial. A Convenção assegura que os pais têm o direito de criar e educar seus filhos, no entanto respeitando a “evolução de suas faculdades”, de modo que os pais devem desenvolver seus papéis de acordo com o superior interesse da criança. O Estado, por sua vez, deve apoiar os genitores em suas funções, mas assegurar que a criança seja educada de forma coerente e para que tenha autonomia, ressalvando que o direito dos pais não é absoluto.25 Outrossim, o princípio demonstra uma série de características: garantidor, de modo que as decisões que versem sobre crianças devem ser também com ele embasadas; grande amplitude, já que obriga a toda a sociedade em primar pelos direitos das crianças e adolescentes, devendo aplicá-lo em quaisquer decisões do dia-a-dia, seja em instituições públicas, privadas ou pelos próprios pais; norma de interpretação e de resolução de conflitos, visto que pode embasar decisões complexas, que nem sempre estão previstas no ordenamento jurídico; e de orientação, em razão de servir como conduta para a criação de políticas públicas voltadas para a infância. 26 Diante disso, conclui-se que a aplicação e interpretação do Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente deve ser feita da forma mais favorável ao infante, atendendo o 23 BRUÑOL, Miguel Cillero. O interesse superior da criança nomarco da convenção internacional sobre os direitos da criança. Dentro: MÉNDEZ, Emílio García; BELOFF, Mary. Infância, Lei e Democracia na América Latina. Edifurb Blumenau, 2001. p.97 e 101-103. 24 Ibidem, p.96 e 100-101. 25 Ibidem, p.108-109. 26 Ibidem, p.109-110. 17 melhor interesse da criança e do adolescente e não ao melhor interesse dos adultos, devendo serem respeitadas as suas limitações e serem resguardados seus direitos. Como exemplo, para fins de proporcionar uma possível adoção mais rápida, deve-se tornar célere o processo de destituição do poder familiar, a fim de manter a criança fora de risco e em um ambiente destinado à sua idade. 27 Tal celeridade também se dá em razão dos fatores que levam a possível adoção tardia, como perda de perfil do infante do almejado pelos casais adotantes. Estes últimos pontos (destituição do poder familiar e perda de perfil do infante) serão vistos no próximo capítulo. 2.2 ADOÇÃO NO CONTEXTO HISTÓRICO Primeiramente, deve-se ter em mente o conceito de adoção na atualidade, sendo a adoção um ato jurídico de receber para si como filho, pessoa que não possui laço consanguíneo consigo.28 Ou ainda, seria o ato solene de receber pessoa estranha em sua família, com condão de filho. 29 No decorrer da história da humanidade há diversos relatos de adoção, de modo que não há como se precisar o momento e local onde o tema surge pela primeira vez. Inclusive, há escritos bíblicos sobre o tema, o mais famoso é a história da criança Moisés, que em meados dos anos 1250 a.c., por ordem de um faraó foi determinado que todas crianças israelitas do sexo masculino deveriam ser mortas ao nascer. Todavia, a mãe de Moisés resolveu colocá-lo em um cesto à beira do rio Nilo, para que sobrevivesse. Moisés foi encontrado por Térmulus, filha do faraó, que lhe adotou. Posteriormente, Moisés se tornou um herói do povo hebreu. Ainda, a adoção está presente no Código de Hamurabi (1686 a.c), que possui 282 dispositivos de lei, regulando a adoção entre os artigos 185 e 193, de modo a resguardar a indissolubilidade da adoção. 30 Na antiguidade greco-romana, a adoção restou ligada ao culto religioso, de modo que os vivos tinham obrigações com os mortos, os mortos recebiam dos descendentes vivos 27 SOUZA,Hellen Luana de; POLLI, Marielle Teixeira da Silva. O princípio do melhor interesse da criança e adolescente nos casos de adoção tardia: uma análise do aplicativo A.dot. Revista dos estudantes de direito da UNB, 16º edição, 2019. p. 289. Disponível em: <https://periodicos.unb.br/index.php/redunb/article/view/24328/24017>. Acesso em: 04 out. 2020. 28 PEREIRA, Caio Mário da Silva; revista e atualizada por Tânia da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil: direito de família. 27. ed. Vol. V, Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 466. 29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 17. ed. Vol. 6, São Paulo: Saraiva, 2020, p. 376. 30 PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008, p. 35-36. 18 banquetes fúnebres, em troca os vivos recebiam “ajuda e força de que necessitavam”. Sendo assim, para garantir o culto era necessário ter descendentes, os que não possuíam adotavam pessoas para prosseguir com o ritual. Além disso, em Roma, a adoção também tinha papel político, tendo o Imperador Cláudio adotado Nero e lhe concedido direitos políticos, mesmo tendo filho legítimo.31 Ainda, pode-se citar “Augusto”, adotado por Júlio César, que reinou por mais de um século o Império romano, por meio de seus descendentes. Da mesma forma, fez Napoleão Bonaparte, pois sua esposa Josefina era estéril. Na época de Cláudio e Napoleão Bonaparte a finalidade da adoção era conferir as famílias nobres o direito a descendência, a fim de garantir a transmissão de títulos de nobreza, assegurando a manutenção das dinastias. 32 Já na Idade Média, a adoção não era uma prática adotada, em razão de que quando as famílias não tinham descendentes, o patrimônio que restava após a sua morte era administrado pela Igreja e pelo senhor feudal. A igreja também via a adoção como possível caso de incesto.33 Ademais, na Idade Moderna a adoção voltou a ser aceita e passou a ser inserida nas legislações de diferentes países, Dinamarca (1683), Alemanha (1751) e Bavária (1756), tais legislações tinham requisitos para a adoção, devendo o adotante possuir mais de cinquenta anos, ser estéril, ter mais de 15 anos de diferença com o adotado e o adotado ter mais de vinte e três anos. A legislação garantia ao adotado direitos sucessórios e não havia possibilidade por parte do adotante de revogabilidade. Cabe ressaltar que o Código de Napoleão foi de extrema importância para o ingresso da adoção na legislação moderna, como nos Códigos romeno (1864), italiano (1865) e espanhol (1889).34 No início da Idade Contemporânea ocorre uma certa conscientização de que o Estado tem responsabilidade em relação as crianças, especialmente as abandonadas. A França aborda a matéria adoção na lei de 1904, de modo que quase todos países da Europa copiam. Após a Primeira Guerra Mundial, ante o cenário de mortes, surgem muitos órfãos, fazendo com que os legisladores se preocupem mais com a situação destas crianças. Entre os anos 1914 e 1930 surgem várias leis sobre a matéria, mas somente após a Segunda Guerra Mundial e a Declaração 31 PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008, p.36-37. 32 VARGAS, Marlizete Maldonado. Adoção Tardia: Da família sonhada à família possível. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2013, p.21. 33 JORGE, Dilce Rizzo. Histórico e aspectos legais da adoção no Brasil. Revista Brasileira de Enfermagem. vol.28 no.2 Brasília Apr./June 1975. Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71671975000200011>. Acesso em: 20 set. 2020. 34 PAIVA, op. cit., p.38. https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71671975000200011 19 Universal dos Direitos da Criança (1959) surgem as leis de adoção plena, a qual garante ao adotado a condição de filho legítimo.35 No Brasil, a proteção as crianças desamparadas iniciou no período de colonização, ficando mais conhecido como fase caritativa. Nesse período, quem era responsável pelas crianças em situação de vulnerabilidade eram as câmaras municipais (autorizadas pelo rei), que realizavam convênios com as Santas Casas de Misericórdia, responsáveis pelo funcionamento das “Rodas dos Expostos” 36 (cilindro giratório no qual as crianças eram deixadas pelos pais ou familiares que não tinham a intenção ou condições de cuidar daquelas crianças, abandonando elas em tais locais, o cilindro recebia a criança do lado externo e girava para o interior dos muros).37 Destaca-se que este sistema de “coleta” de crianças abandonadas surgiu na Europa católica, em países como França e Portugal, tendo atendido uma vasta população de infantes abandonados. A criação destes bebês se fazia possível em razão do sistema de amas-de-leite, que recebiam valores para amamentar os bebês, muitas eram escravas, sendo que o proprietário que recebia o valor pela disponibilização do leite daquela ama. Inclusive, muitas eram acusadas de maltratar os bebês. Além disso, muitos bebês faleceram em razão deste sistema de aleitamento, haja vista as propriedades do leite de cada ama. 38 Sendo assim, no Brasil o Estado não assumiu diretamente os cuidados dessas crianças. Além disso, a sociedade exerceu importante papel no acolhimento dos infantes vulneráveis, pois as famílias acolhiam as crianças como “filhos de criação”, sendo esses coletados na porta de suas casas ou até mesmo nas Rodas de Expostos, sem qualquer documento formal, sendo as famílias motivadas pela piedade cristã ou pela mão de obra gratuita que lhes prestariam. Muitasvezes estas crianças se tornavam adultos dentro daquela família, mas diferentemente dos filhos legítimos, tinham status de “empregados”. 39 No Brasil, somente a partir do ano de 1828 que surgiram políticas públicas direcionadas para as crianças, surgindo nesse período as primeiras leis de adoção, sendo regulamentada pelo Código Civil de 1916 (Lei 3.071/1916), que determinava que o adotante teria que ter no mínimo 50 anos, não ter filhos consanguíneos e ter uma diferença de 18 anos em relação ao adotante, o 35 PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008, p 40. 36 MARCÍLIO, Maria Luiza. História social da criança abandonada. São Paulo:Editora Hucitec Ltda, 1998, p. 134-135. 37 Roda dos Expostos. Disponível em: <https://www.santacasasp.org.br/portal/site/quemsomos/museu/pub/10956/a-roda-dos-expostos-1825-1961>. Acesso em: 20 set. 2020. 38 RIZZINI, Irene; RIZZINI, Irma, Maria Luiza. A institucionalização de crianças no brasil: Percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2004, p. 23. 39 MARCÍLIO, op. cit., p. 135-137. 20 qual poderia ter qualquer idade. Nesse Código a adoção era revogável e não rompia os vínculos do adotado com sua família biológica. Ainda, a Adoção era feita em cartório, por escritura pública, em forma de posse, o que remete muito a ideia de um objeto, visto que a forma que se dá é a mesma para registro de móveis e imóveis. 40 Em 1957 foi instituída a Lei 3.133, que “relaxou” os requisitos para ocorrer a adoção. A lei diminui a idade do adotante, passando de 50 anos para 30 anos. Além disso, a diferença de idade do adotante em relação ao adotado, passou de 18 anos para 16 anos, e caso o adotado fosse menor ou incapaz o casal adotante poderia adotar somente 5 anos após seu casamento. O adotado maior de idade deveria consentir a adoção. Ainda, o adotante poderia ter filhos, 41 no entanto, se os filhos consanguíneos fossem concebidos antes do adotado, o adotado não herdaria nada do patrimônio, somente os filhos legítimos, e se os filhos consanguíneos fossem concebidos depois do adotado, o adotado teria direito a metade do que os filhos legítimos teriam. Neste período os Juizados pressionaram os cartórios para que somente lavrassem escrituras de adoção com autorização judicial. 42 Em 1965, com o advento da Lei 4.655, passou a ser permitido que a mulher viúva com mais de 35 anos pudesse adotar sozinha, todavia, o adotado teria que estar inserido em sua casa há mais de 5 anos. Ainda, os desquitados também passaram a poder adotar, mas o adotado deveria estar aos seus cuidados antes da ocorrência da separação. A referida lei trouxe ao ordenamento a “legitimação adotiva”, que consistia em conceder, a crianças de até sete anos ou órfãos de pais desconhecidos, por intermédio de sentença, os mesmos direitos dos filhos consanguíneos em caso deste ser o primeiro filho do casal, se fosse adotado após a concepção de filhos legítimos, não tinha os mesmos direitos sucessórios, a lei também tornou irrevogável a adoção e rompeu os vínculos do adotado com sua família biológica. 43 No ano de 1979, a “legitimação adotiva” foi extinta e passou a vigorar a Lei 6.697 (Código de Menores – explicado no subtítulo anterior), que determinou 2 tipos de adoção, sendo elas: a adoção plena, que se aplica a crianças de até 7 anos, que rompe os vínculos do adotado 40 PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008, p. 43-45. 41 VARGAS, Marlizete Maldonado. Adoção Tardia: Da família sonhada à família possível. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2013, p. 26-27. 42 PAIVA, op. cit., p. 45. 43 JORGE, Dilce Rizzo. Histórico e aspectos legais da adoção no Brasil. Revista Brasileira de Enfermagem. vol.28 no.2 Brasília Apr./June 1975. Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-1671975000200011>. Acesso em: 20 set. 2020. https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-1671975000200011 21 com sua família biológica e é irrevogável e a adoção simples, que se aplica a menores de até 18 anos. Em 1988, com a Constituição Federal, o direito de ambos os filhos (consanguíneos e adotados) foram igualados. 44 Art. 227, § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. 45 Dessa forma, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu a igualdade de direitos independentemente da origem dos filhos e proibiu designações discriminatórias, antes dessa os filhos se classificavam da seguinte forma: legítimos, quando eram frutos de pais casados e ilegítimos, quando os pais não eram casados. Dentro da classificação de ilegítimos, tínhamos os ilegítimos naturais, quando os pais não tinham impedimentos para casar e os filhos ilegítimos espúrios, quando os pais tinham impedimentos para casar, e dependendo do impedimento, eram chamados de filhos adulterinos (quando um dos pais já era casado) ou filhos incestuosos (quando os pais eram parentes), tais classificações discriminam o filho em razão dos atos dos pais, algo extremamente injusto, visto que não contribuiu para o ato ocorrer. Essa discriminação restou presente no Código de 1916, haja vista que este favorecia as relações matrimoniais. A mesma discriminação sofrida por essas crianças, sofria o filho adotado, principalmente em relação ao patrimônio. Dessa forma, a inscrição registral (Registro de Nascimento) deve ser feita com cautela, devendo ser apagado o registro da família anterior, não devendo constar nada sobre a origem da criança, a fim de acabar com as discriminações. 46 Frisa-se que no momento que a adoção conclui-se, por intermédio da sentença judicial e é lavrado o Registro de Nascimento, o adotado converte-se completamente em filho, pois o status de filho se dá na convivência e no afeto e não na sua origem. 47 Em 1990, a Lei 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), reduziu a idade do adotante, de 30 anos para 21 anos, permitiu a adoção por pessoas casadas e solteiras, vedou a adoção por parte de avós e irmãos, rompeu o vínculo do adotado com a família biológica, autorizou a retirada da família biológica e inclusão dos adotantes na Certidão de Nascimento, 44 MAUX, Ana Andréa Barbosa; DUTRA, Elza. A adoção no Brasil: algumas reflexões, Revista da Universidade do Rio de Janeiro (UERJ), 2010, pag. 360-361. Disponível em: <http://www.revispsi.uerj.br/v10n2/artigos/pdf/v10n2a05.pdf>. Acesso em: 20 set. 2020. 45 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 20 set. 2020. 46 MARQUES, Claudia Lima. Igualdade entre filhos no direito brasileiro atual – Direito pós-moderno?, Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, 1999, pag. 32-38. Disponível em: <https://seer.ufrgs.br/revfacdir/article/view/70564/40039>. Acesso em: 01 nov. 2020. 47 LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 9º. ed. Vol. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2019, p.281-282. http://www.revispsi.uerj.br/v10n2/artigos/pdf/v10n2a05.pdf 22 manteve os mesmos direitos sucessórios deliberados na Constituição Federal de 1988 e regulamentou a adoção unilateral, póstuma e internacional. 48 Os avanços do intituto adoção foram de grande importância, mas ainda se têm uma série de obstáculos que permanecem causando prejuízos aos infantes, como o percurso até que a criança esteja disponível para adoção de fato. No próximo capítulo iremos elucidar os fatores que causam a adoção tardia. 48 PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo,2008, p. 46-47. 23 3 OS PRINCIPAIS FATORES QUE LEVAM AO GRANDE NÚMERO DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ADOÇÃO TARDIA Até o presente momento vimos o que seria a aplicação do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, o qual deve visar sempre a atender melhor às necessidades dos infantes e não a dos adultos. Ainda, foi trabalhado o contexto histórico e o conceito do instituto adoção, além claro suas características. Neste capítulo abordaremos os principais fatores que levam ao grande número de crianças em situação de adoção tardia, sendo eles: insistência na família natural e extensa/ampliada, a morosidade do judiciário e o perfil preferido de criança pelos pretensos adotantes. Calha destacar que as crianças de que estamos tratando neste trabalho, são as abandonadas pelos pais, ou advindas ne negligências/omissões severas cometidas por seus genitores, aquelas que se encontram acolhidas em Abrigos a espera de uma nova família. Diante dessas crianças que se encontram em uma situação tão vulnerável, questiona-se se estes fatores que causam a adoção tardia obedecem ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente - abordado no capítulo anterior -, para que se obtenha esta conclusão é necessário que se entenda um pouco sobre cada fator, e como ocorre os diversos procedimentos para até então chegar-se na adoção de fato, com a conclusão de inserção dos novos genitores na certidão de nascimento daquela criança. Passemos então, ao estudo dos fatores da adoção tardia. 3.1 INSISTÊNCIA PELA MANUTENÇÃO NA FAMÍLIA NATURAL, EXTENSA OU AMPLIADA Um dos principais fatores que causam a adoção tardia é a persistência em manter a criança na família natural ou extensa/ampliada49. A fim de melhor elucidar como isto ocorre, é necessário que primeiramente compreenda-se alguns institutos, os quais dão origem as crianças disponíveis para adoção. 49 O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define, no Art. 25, caput, como família natural: “a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes”. Também, em seu Art. 25, parágrafo único, define a família extensa/ampliada como: “aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade”. 24 O Acolhimento Institucional é uma medida de proteção que visa defender crianças e adolescentes vítimas de violência, abuso sexual e maus tratos/opressão dos genitores ou responsáveis. Tal instituto consiste em manter a criança ou adolescente em um Abrigo, seja público ou privado, enquanto perdurar a situação de risco envolvendo o infante, sendo previsto no artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) 50, conforme texto de lei abaixo: Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: (...) VII - acolhimento institucional; 51 Como o artigo traz à baila o artigo 98 do ECA, conveniente transcrevê-lo: Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta. 52 A insistência em manter a criança na família está muito presente na legislação, pois a Constituição Federal de 1988 garante ao infante a convivência familiar (artigo 227 da CF), de modo que o infante deve crescer no seio de sua família, em um ambiente permeado por amor, compreensão e felicidade, compatível com as necessidades de uma criança. Ainda, a Lei de Adoção prioriza que a criança retorne a sua família biológica (natural ou extensa/ampliada), sendo a adoção a última opção para atender os melhores interesses da criança e do adolescente. Assim, o ECA estabelece programas para que as famílias em estado disfuncional sejam incluídas, a fim de que sejam orientadas e tenham auxílio (tais programas estão previstos nos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129), de modo que a família se reestruture e se reconstitua para poder manter a criança consigo. 53 Observa-se a prioridade que o ECA dá à família biológica: Art. 19, caput. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. (...) § 3º - A manutenção ou a reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será está incluída em serviços e programas de proteção, apoio e promoção, nos termos do § 1 o do art. 50 MADALENO, Rolf. Direito de Família. 9º ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2019, p. 668. 51 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 11 out. 2020. 52 Ibidem. 53 MADALENO, op. cit., p. 666-668. 25 23, dos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei. 54 Passamos então a entender como surge a necessidade do acolhimento, para isso é necessário que se compreenda o que é o poder familiar. Dito isso, entende-se por poder familiar um conjunto de regras que engloba tanto direitos como deveres que os pais têm com os filhos, seria um “munus público”, que decorre da filiação, imposto pelo Estado aos pais, de modo que os pais cuidem dos filhos. O poder familiar é imprescritível, irrenunciável e indelegável, sendo atribuição de forma igualitária de ambos os genitores, como preceitua o artigo 21 da Lei n.º 8.069/90 (ECA) e o artigo 1.631 do Código Civil. Além disso, o Código Civil trás no artigo 1.634 os deveres dos pais, mas esses são menos voltados aos deveres de desenvolvimento da criança, com exceção do inciso I, que assegura que os pais devem dirigir-lhes a criação e a educação. Os principais direitos das crianças estão previstos no artigo 227 da Constituição Federal, de modo a garantir “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar”. Ainda, previsto também no artigo 229 da Constituição Federal que os pais devem “assistir, criar e educar os filhos menores”. Os filhos deixam de estar submetidos ao poder familiar com 18 anos completos (maioridade). 55 Quando violados esses direitos por ambos os pais, têm-se a necessidade de acolhimento institucional, sendo as principais formas de violação o abandono (material e imaterial), o uso imoderado de drogas e álcool e a violência doméstica. Nos casos de abandono material, esse pode ser percebido na aparência da criança ou adolescente, que apresentam desnutrição, falta de higiene pessoal e roupas inadequadas. 56 Calha destacar que a pobreza não é motivo para acolhimento institucional ou destituição do poder familiar (conforme artigo 23 do ECA), haja vista que prestar suporte as famílias pobres - para que possam conviver junto aos seus filhos - é uma obrigação do Poder Público, tal atribuição de cobrança ao Poder Público se dá pelo Ministério Público, que deve cobrar políticas sociais do Poder Público. Entretanto, não se pode confundir a falta de recursos materiais, com 54 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 11 out. 2020. 55 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. Vol. 6. 17. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2020, p. 414-420. 56 RECANELLO, Laiana Delakis. Acolhimento institucional x adoção tardia: o “tempo” comofator de exclusão social. Dentro: Coleção CONPEDI/UNICURITIBA. Direito de Família. Vol. 7. 1º. ed. Curitiba: Editora Clássica, 2014, p. 509/510. Disponível em: <http://www.editoraclassica.com.br/novo/ebooksconteudo/Direito%20de%20Familia.pdf>. Acesso em: 12 out. 2020. 26 o desleixo dos pais, que optam por não cumprir seus deveres de pais voluntariamente, deixando a criança a mercê de suas vontades. 57 O pedido de afastamento da criança ou do adolescente de sua família biológica vêm por intermédio de uma recomendação técnica, de algum dos órgãos da rede de proteção do Município na qual o infante está inserido. Estes órgãos podem ser o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS), o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), o Conselho Tutelar (CT) e locais da área da saúde (exemplo: hospitais e UPAS). Antes de se solicitar o acolhimento, deve-se ter tentado passar a responsabilidade deste infante para membros da família extensa/ampliada, devendo constar a recusa/impossibilidade dos familiares em tal relato. A recomendação do acolhimento deve ser direcionado a Justiça da Infância e da Juventude e ao Ministério Público, para fins de embasar o pedido de acolhimento e o deferimento desse. Destaca-se que em casos de extrema urgência a criança pode ser acolhida diretamente no Abrigo, mas a autoridade judiciária deve ser comunicada em até 24 horas, como preceitua o artigo 93 do ECA. 58 Muitas vezes o Ministério Público possui expedientes administrativos, onde acompanha a situação de crianças inseridas em contexto social vulnerável, tais acompanhamentos se deram em função de denúncias, de modo que os órgãos de proteção já acompanham aquela família por ordem do Ministério Público, remetendo relatos constantes ao órgão e destes acompanhamentos sem êxito que surge a necessidade de acolhimento institucional. Sendo assim, o órgão (Conselho Tutelar) envia um relato ao Ministério Público solicitando o acolhimento daquela criança. O Ministério Público requer que o CREAS verifique a situação e emita relato, sendo esse no mesmo sentido, o Ministério Público aplica a medida de proteção pertinente. 59 Após o acolhimento institucional, o Abrigo realiza um estudo psicossocial e elabora um Plano de Atendimento, tendo como objetivo a reinserção da criança em sua família, nesse indica quais seriam os acompanhamentos necessários para a família. A Equipe Técnica do Judiciário da Vara da Infância e Juventude também deve acompanhar a família. Para que a família reaveja aquela criança é fundamental que ela entenda os motivos que originaram o seu acolhimento, de 57 MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4º. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 127-130. 58 CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social). Orientações Técnicas para os serviços de acolhimento para crianças e adolescentes. Brasília, 2008. p. 10 e 18. Disponível em: <https://www.mprs.mp.br/media/areas/infancia/arquivos/conanda_acolhimento.pdf>. Acesso em: 11 out. 2020. 59 O Conselho Tutelar em perguntas e respostas. Site do Ministério Público do Paraná. Disponível em: <http://crianca.mppr.mp.br/pagina-1082.html>. Acesso em: 11 out. 2020. 27 modo que somente após superada tais questões, essa poderá retornar ao seio da família. É um processo gradativo, onde a família deve aderir aos encaminhamentos lhe solicitados e visar exterminar com os fatores de risco.60 O Abrigo deve remeter relato a Juízo no prazo máximo de 03 (três) meses, a fim de noticiar as evoluções ou não daquele infante e família. 61 A criança somente deve retornar a família quando se verificar os seguintes elementos: comprovação de aderência da família aos encaminhamentos feitos pela equipe social do abrigo ou do judiciário, ausência dos fatores que ensejaram o acolhimento, demonstração de vontade da criança em retornar para a família e houver presença de vínculo afetivo. Quando tais elementos não se mostrarem presentes ao longo do tempo e não haver aderência da família ao plano de atendimento, demonstrando que não há possibilidades de retorno do infante ao lar, o Abrigo remeterá relato opinando pela Destituição do Poder Familiar dos genitores, visando encaminhar o infante a família substituta (Adoção). 62 O artigo 19, § 2º, do ECA estabelece o tempo limite de 18 meses (1 ano e meio) para a criança ficar acolhida. Todavia, muitos infantes permanecem no Lar por período superior.63 Nota-se que se tenta a ressocialização da família durante todo o Processo de Acolhimento, o qual não tem um tempo máximo para tentativa estabelecido, somente quando se tornar inviável o retorno do infante para família - após muitas tentativas de aderência as propostas - é que a Equipe do Abrigo emite parecer indicando a destituição do poder familiar dos pais. Agora, inicia-se uma segunda fase, a do Processo de Destituição do Poder Familiar, que é um processo a parte do de acolhimento. A extinção do Poder Familiar (que vimos o conceito anteriormente) decorre das formas elencadas no artigo 1.635 do Código Civil, sendo elas “I – pela morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único; III – pela maioridade; IV – pela adoção; V – por decisão judicial, na forma do artigo 1.638”. 64 60 CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social). Orientações Técnicas para os serviços de acolhimento para crianças e adolescentes. Brasília, 2008. p. 17-18 e 21. Disponível em: <https://www.mprs.mp.br/media/areas/infancia/arquivos/conanda_acolhimento.pdf>. Acesso em: 11 out. 2020. 61 CAOPCAE/MPPR. 27 Anos do ECA: Comparativo ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente e as alterações definidas pela Lei nº 13.509/2017, de 22 de novembro de 2017, 2018, p. 02. Disponível em: <https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/caopca/comparativo_eca_x_lei_13509_2017_caopcae.pdf>. Acesso em: 12 out. 2020. 62 CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social). op. cit., p. 18 e 21 63 CAOPCAE/MPPR, op. cit., p. 03. 64 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. Vol. 6. 17. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2020, p.433. 28 No presente trabalho estamos tratando do inciso V, ou seja, decorrente de decisão judicial, em razão das hipóteses previstas no artigo 1.638 do Código Civil, sendo elas: “a) o castigo imoderado do filho; b) o abandono do filho; c) a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes; d) a incidência reiterada nas faltas previstas no art. 1.637 do CC; e e) a entrega, de forma irregular, do filho a terceiros para fins de adoção. Ainda, conforme o parágrafo único, perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar: a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher; b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão. Igualmente, também gera a destituição do poder familiar o ato de praticar contra o filho, a filha ou outro descendente, caso de um neto ou neta, esses mesmos crimes.” 65 Ainda, o artigo 22 do ECA trás os deveres que os pais possuem para com seus filhos, conforme abaixo: Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.66 E o não cumprimento desses deveres, também enseja a destituição do poder familiar dosgenitores, conforme artigo 24 do ECA: Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. 67 O procedimento especial para destituição dos genitores do poder familiar está disciplinado nos artigos 155 a 163 do ECA, tendo prioridade de tramitação. Destaca-se que o pedido normalmente é feito com pedido de colocação em família substituta (visando a inclusão da criança no Cadastro Nacional de Adoção após o tramite da destituição). A fim de trazer celeridade ao feito, o Ministério Público deve ajuizar a ação no prazo de 30 dias após 65 TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. Capítulo 6.5. Vol. 5. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p.541-542 66 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 17 out. 2020. 67 Ibidem. 29 recebimento de relatos e estudos que indiquem a necessidade de tal medida (artigo 101, § 10 do ECA), as testemunhas já devem ser elencadas na inicial (artigo 156, IV do ECA). 68 Recebida a inicial o(a) Magistrado(a) determinará a citação dos genitores (polo passivo da demanda) e a realização de estudo social ou perícia por equipe interprofissional ou multidisciplinar (artigo 157, § 1º do ECA), realizada normalmente pela Equipe Técnica do Judiciário, tal estudo independe de solicitação das partes e serve para evidenciar o contexto em que a criança se encontra, a fim de garantir o contraditório, deve-se obrigatoriamente ouvir os pais, salvo se estiverem em local incerto e não sabido (§ 4º do art. 161 do ECA). A citação deve ser feita de modo presencial, inclusive a do genitor privado de liberdade (artigo 158, § 1º e 2º do ECA) e caso o oficial de justiça compareça a casa dos réus por duas vezes e estes não se encontrem - havendo suspeita de ocultação -, o oficial notificará o vizinho ou familiar do dia que retornará a residência, fazendo a citação por hora certa (artigo 158, § 3º do ECA), caso os genitores estejam em local incerto e não sabido, serão citados por edital no prazo de 10 dias (artigo 158, § 4º do ECA). Ainda, se porventura os genitores não possuirem condições financeiras de constituir advogado, poderão constituir defensor público, o genitor que estiver privado de sua liberdade será questionado no momento da sua citação se tem interesse em defensor público ou não (artigo 159, caput e § 1º do ECA). O prazo para contestação é de 10 dias, e da mesma forma que o Ministério Público, os genitores devem arrolar suas testemunhas em tal peça, além dos documentos que acharem pertinentes (artigo 158, caput do ECA). Apresentada a Contestação e se houver necessidade, Réplica, será designada audiência de instrução e julgamento para oitiva de testemunhas e dos genitores (artigo 161, § 1º, 4º e 5º do ECA), nesta o(a) Magistrado(a) poderá prolatar sentença, ou deverá prolatá-la no prazo de 5 dias (artigo 162, § 3º do ECA). 69 Restou estabelecido o prazo limite de 120 dias para a conclusão do feito (art. 163), e em havendo recurso, que este tenha prioridade em sua apreciação (art. 199-C). Em se tratando de criança em situação vulnerável por abandono e negligência dos pais, o processo tramita perante a Vara da Infância e Juventude da Comarca onde reside o infante, já se for o caso de criança fora de situação de risco, o feito pode tramitar na Vara de Família daquela Comarca. Calha destacar que dependerá da legislação local da organização judiciária daquela Comarca. 70 68 MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4º. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 597. 69 Estatuto da Criança e do Adolescente (1990): Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 17 out. 2020. 70 MACIEL, op. cit., p. 597-598. 30 Diante disso, verifica-se que a insistência na família natural ou extensa/ampliada, pode acabar gerando uma perda de tempo muito significativa na vida da criança. Isso porque, o tempo na vida de uma criança é muito mais significativo do que na vida de um adulto, 2 ou 3 anos podem fazer com que ela crie valores, afetividade com a família e inclusive, perda o perfil mais buscado por casais adotantes. Motivo que leva ao questionamento se a tentativa de ressocialização da família natural ou extensa obedece ao Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. 3.2 MOROSIDADE DO JUDICIÁRIO Pode-se dizer que este capítulo é totalmente relacionado com o anterior, visto que a morosidade do Poder Judiciário afeta o tempo de prosseguimento dos feitos anteriormente mencionados, ou seja do Processo de Acolhimento e do Processo de Destituição do Poder Familiar, e além desses do Processo de Adoção, que será melhor abordado neste subtítulo. Inicialmente veremos como se dá o procedimento para se adotar uma criança, a fim de verificar se é ou não algo prático, fácil e rápido de modo a respeitar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Dito isso, passamos então a verificar os requisitos para a adoção, sendo eles: a) possuir 18 anos (artigo 42 do ECA), b) ter mais de dezesseis anos de diferença do adotado (artigo 42, § 3º do ECA), c) consentimento dos pais ou dos representantes legais de quem se deseja adotar (o que não se aplica as crianças que estão acolhidas e já destituídas de poder familiar), d) concordância do adotado, se tiver mais de 12 anos (artigo 28, § 2º do ECA), e) processo judicial (artigo 47, caput do ECA) e f) ser benéfico para o adotado (artigo 43 do ECA). 71 Ultrapassados tais requisitos, o pretenso adotante, antes de realmente entrar na lista de espera para adoção, deve passar pelo procedimento de habilitação para adoção, que consiste em ele direcionar-se ao Fórum ou Vara da Infância e Juventude de sua cidade ou região, com os seguintes documentos: a) Cópias autenticadas: da Certidão de nascimento ou casamento, ou declaração relativa ao período de união estável; b) Cópias da Cédula de identidade e da Inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), c) Comprovante de renda e de residência, d) 71 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 16. ed. Vol. 6, São Paulo: Saraiva, 2019, p. 399. 31 Atestados de sanidade física e mental, e) Certidão negativa de distribuição cível e f) Certidão de antecedentes criminais.72 Apresentado tais documentos, o expediente será remetido ao Ministério Público, que poderá solicitar outros documentos, caso entenda necessário. Passa-se a etapa do estudo psicossocial, o qual é realizado pela equipe interprofissional, onde as profissionais buscam entender quais são as motivações e expectativas dos candidatos, além de poder orientá-los de como funciona a adoção. Após, os candidatos passam pelo programa de preparação para adoção, que ocorre por intermédio da Equipe Técnica do Judiciário, tal programa tem como função preparar os pretensos adotantes para as possíveis dificuldades que possam enfrentar na adoção, bem como para estimular a adoção das crianças normalmente não desejadas, como negras, com deficiências, doenças ou ainda, que possuam irmãos.73 Nessa preparação, o postulante deverá ter contato com crianças que se encontrem acolhidas em Abrigos, a espera de pais adotivos, tal acompanhamento se dará sob a supervisão, orientação e avaliação da equipe técnica e dos demais profissionais envolvidos, como prevê o artigo 50, § 3º e 4º da Lei 12.010/2009 e o artigo 197-C, § 2º do ECA . Ademais, o prazo máximo para a referida preparação é de 1 ano. (artigo 6º da Lei 12.010/2009). 74 Feito isso, novamente será dada vista ao Ministério Público, para parecerfinal. 75 Destaca-se que o artigo 50 da Lei 12.010/2009 acabou por tornar complexo e moroso a adoção, pois trouxe várias exigências. 76 A partir disso (estudo psicossocial, programa de preparação para adoção e parecer do Ministério Púbico), o juiz deferirá ou não a habilitação a adoção. 77 Importante ressaltar que a habilitação deve ser renovada trienalmente, sendo dispensada quando o adotante se candidatar a uma nova adoção (artigo 197-E, § 2º e 3º do ECA). Ainda, o prazo máximo para habilitação deve ser de 120 dias, podendo ser prorrogado por igual período (artigo 197-F do ECA). 78 Sendo deferida a habilitação, os dados do pretenso adotante serão inseridos no Sistema Nacional de Adoção (SNA), que foi lançado em 15/08/2019, o qual se originou da união dos Cadastros Nacionais de Adoção (CNA) e de Crianças Acolhidas (CNCA) que funciona para 72 Corregedoria Nacional de Justiça. Passo a passo da adoção: Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Disponível em: https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a- passo-da-adocao/. Acesso em: 20 de out. 2020. 73 Ibidem. 74 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 531. 75 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 20 out. 2020. 76 RIZZARDO, op. cit., p. 531. 77 Corregedoria Nacional de Justiça. op. cit. 78 RIZZARDO, op. cit., p. 535. https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a-passo-da-adocao/ https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a-passo-da-adocao/ 32 busca de pretendentes à adoção, fazendo a vinculação da criança ao pretendente e permite uma visão geral da entrada da criança ou adolescente no sistema de proteção, até sua saída. 79 Quando localizado um pretendente, esse será contatado pelo Poder Judiciário e será informado sobre o perfil e história da criança disponível para adoção, havendo interesse, passará ao período de aproximação com a criança/adolescente. Inicia-se com visitas ao Abrigo e passeios marcados, sendo positiva a aproximação, dará-se início ao estágio de conivência, passando o infante a residir com o(os) pretenso(s) adotante(s), todo este período deve ser acompanhado pela Equipe Técnica do Judiciário. O estágio de conivência possui o prazo de 90 dias, podendo ser prorrogado por igual período (artigo 46 caput e § 2º do ECA). Contado do dia seguinte à data do término do estágio de convivência, o(s) pretendente(s) terão 15 dias para propor a ação de adoção. Nesse, o Magistrado analisará a documentação pertinente (laudos, avaliações e outros), a situação e vínculo da criança e sendo positivo profere a sentença de adoção, bem como ordenará a confecção do novo registro de nascimento, com os dados dos novos pais. 80 Calha destacar, que no caso de adoção por estrangeiros, o estágio de convivência será de no mínimo 30 dias, podendo ser de 45 dias, também podendo ser prorrogado uma única vez por igual período (artigo 46 caput e § 3º do ECA), que deve ser cumprido em território nacional, preferencialmente na comarca de residência do infante. 81 Somente é admitida a adoção de crianças por casais que não estejam cadastrados na lista de espera do Sistema Nacional de Adoção, nos casos previstos no Artigo 50 § 13 do ECA, conforme abaixo: § 13. Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previamente nos termos desta Lei quando: I - se tratar de pedido de adoção unilateral; II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade; III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má- fé ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei.82 79 Coordenadoria da Infância e Juventude. Sistema Nacional de Adoção (SNA). Disponível em: http://www.tjrr.jus.br/cij/index.php/sistema-nacional-de-adocao-sna.Acesso em: 20 de out. 2020. 80 Corregedoria Nacional de Justiça. Passo a passo da adoção: Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Disponível em: https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a- passo-da-adocao/. Acesso em: 20 de out. 2020. 81 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 528/529. 82 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 20 out. 2020. http://www.tjrr.jus.br/cij/index.php/sistema-nacional-de-adocao-sna https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a-passo-da-adocao/ https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/passo-a-passo-da-adocao/ 33 Nota-se que para os pretensos adotantes serem habilitados a adoção há uma grande burocracia, o que acaba por fazer com que os casais desistam da adoção e mantenham a cultura e a propagação de que a adoção é muito difícil e demorada, o que pode, inclusive, influenciar a adoção à brasileira (registrar filho que não é seu como assim fosse), a fim de “encurtar” o caminho. No subtítulo passado, verificamos alguns procedimentos (Acolhimento Institucional e Destituição do Poder Familiar). Cabe aqui, fazer uma mera lembrança a morosidade dos feitos. O artigo 19, § 2º, do ECA estabelece o tempo limite de 18 meses (1 ano e meio) para a criança ficar acolhida. 83 Entretanto, a realidade é outra, pois há crianças acolhidas aguardando serem adotadas há mais de dez anos. 84 Durante todo processo de acolhimento, tenta-se a ressocialização da família, não tendo êxito, inicia-se o processo de Destituição do poder familiar dos genitores, que tem como objetivo concluir-se em 120 dias, mas que pode se prorrogar por muito mais tempo. Observa-se que a morosidade afeta o Poder Judiciário, de modo que não obedecem sequer ao principio da prioridade absoluta em relação as crianças acolhidas institucionalmente, haja vista não possuir estrutura física e humana para tanto, fazendo com que as chances do desacolhimento de crianças mais “velhas” se torne muito baixa. Enquanto o sistema permanecer dessa forma, as crianças ficarão à mercê de preconceitos, exclusão social, de falta de informação e de políticas públicas, que impulsionem campanhas de adoção, bem como com o fito de esclarecer tais procedimentos, que não devem serem vistos com maus olhos pela sociedade.85 Sendo assim, novamente se questiona se o princípio do superior interesse da criança está sendo aplicado na prática, haja vista que as excessivas formalidades ocasionam prejuízos aos infantes acolhidos. Abordaremos no próximo subtítulo o perfil buscado pelos casais adotantes, e demonstrar que o tempo é um fator crucial na vida dos infantes. 3.3 PERFIL DE CRIANÇAS PREFERIDO PELOS ADOTANTES 83 CAOPCAE/MPPR. 27 Anos do ECA: Comparativo ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente e as alterações definidas pela Lei nº 13.509/2017, de 22 de novembro de 2017, 2018, p. 03. Disponível em: <https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/caopca/comparativo_eca_x_lei_13509_2017_caopcae.pdf>. Acesso em: 12 out. 2020. 84 LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 9º. ed. Vol. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2019, p. 283. 85 RECANELLO, Laiana Delakis. Acolhimento institucional x adoção tardia: o “tempo” como fator de exclusão social. Dentro: Coleção CONPEDI/UNICURITIBA. Direito de Família. Vol. 7. 1º. ed. Curitiba: Editora Clássica, 2014, p. 516-517. Disponível em: <http://www.editoraclassica.com.br/novo/ebooksconteudo/Direito%20de%20Familia.pdf>. Acesso em: 20 out. 2020. 34 Conforme os especialistas, quanto mais cedo a criança for adotada melhor, pois não terá vivenciado o abandono
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