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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI HISTÓRIA DA AMÉRICA GUARULHOS – SP SUMÁRIO 1 O PROCESSO DE EXPANSÃO MARÍTIMA ........................................................... 2 1.1 Lusitânia ........................................................................................................... 3 2 ORDENS MILITARES E RELIGIOSAS ................................................................... 6 2.1 O papel da nobreza .......................................................................................... 6 2.2 A importância do mar na formação de Portuga ................................................ 7 2.3 Desenvolvimento Econômico e Social .............................................................. 8 3 O ENCONTRO DA CIVILIZAÇÃO EUROPEIA COM AS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES PRÉ-COLOMBIANAS ............................................................................................... 14 3.1 Os Astecas ..................................................................................................... 16 3.2 Os Maias ........................................................................................................ 19 3.3 Os Incas ......................................................................................................... 21 4 A AMÉRICA APÓS A CHEGADA DE COLOMBO ................................................. 25 5 FORMAS DE OCUPAÇÃO E ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO NAS COLÔNIAS ...................................................................................................................................30 5.1 O fim do Sistema Colonial .............................................................................. 35 6 A FASE DE INSTABILIDADE POLÍTICO-ADMINISTRATIVA ................................ 36 6.1 A Fase de Estabilidade Política e Econômica ................................................ 38 6.2 Exemplo de Estado Oligárquico: a Argentina ................................................. 41 6.3 ROSAS: o caudilho dos caudilhos .................................................................. 43 7 O PROCESSO DE IMIGRAÇÃO E INDUSTRIALIZAÇÃO .................................... 45 8 O PARAGUAI NO SÉCULO 19 ............................................................................. 46 8.1 A Guerra contra o Paraguai ............................................................................ 50 9 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 53 2 1 O PROCESSO DE EXPANSÃO MARÍTIMA Fonte: descomplica.com.br A condição fundamental para o processo de formação das nações europeias foi a crise do feudalismo, que teve início em meados do século XIII. Esta crise foi resultante da relativa paz que vivia o continente europeu, que permitiu a criação dos burgos (fora dos limites do senhor feudal, que lhes dava proteção em troca da vassalagem), que viriam a se transformar em vilas ou cidades com relativa autonomia. Isto provocou o enfraquecimento dos senhores feudais, reduzindo o poder da nobreza e, consequentemente, abrindo espaço para a retomada do poder político pelos reis. Os soberanos, à medida que obtinham recursos financeiros, em troca de privilégios, fortaleciam seus exércitos e submetiam os antigos feudos e as novas vilas e cidades à sua autoridade, incorporando esses territórios ao que viria ser seus reinos. Era o embrião do futuro Estado Nacional. Intensas lutas precederam e consolidaram o Estado português. Iniciou com a expulsão dos mouros da Península Ibérica em 1249 (os mouros invadiram a Península Ibérica no ano de 711), no movimento denominado Reconquista, quando Portugal 3 consolidou seu território e firmou-se como “o primeiro Estado europeu moderno”, segundo o historiador Charles Boxer. Mas somente após a vitória sobre os Reinos de Leão e Castela, em 1385, na Batalha de Aljubarrota, e a assinatura do tratado de paz e aliança perpétua com o Reino de Castela, em 1411, a paz foi selada. Portugal iniciou seu processo de expansão ultramarina conquistando aos mouros a cidade de Ceuta, no norte da África. A partir daí, virou-se para o mar, onde se tornou dominante. Como não poderia deixar de ser, está empreitada envolveu somas altíssimas e, para financiá-la, a coroa portuguesa se valeu do aumento de impostos e recorreu a empréstimos de grandes comerciantes e banqueiros (inclusive italianos). 1.1 Lusitânia Fonte: vortexmag.net A região que hoje é conhecida como Portugal foi originalmente habitada por populações iberas de origem indo-europeia. Mais tarde, foi ocupada, sucessivamente, por fenícios (século XII a.C.), gregos (século VII a.C.), cartagineses (século III a.C.), romanos (século II a.C.) e, posteriormente, pelos visigodos (povo germânico, convertido ao cristianismo no século VI), desde 624. Em 711, a região foi conquistada pelos muçulmanos, impulsionados por sua política de expansionismo, tendo como base uma coligação formada por árabes, 4 sírios, persas, egípcios e berberes, estes em maioria, todos unidos pela fé islâmica e denominados mouros. Quase a totalidade da península caiu em mãos dos mouros que, em seu avanço, só foram bloqueados quando tentaram invadir a França. A resistência aos invasores só ganhou força a partir do século XI, após a formação dos reinos cristãos ao norte, como Leão, Castela, Navarra e Aragão. A guerra deflagrada contra os mouros contou com o apoio de grande parte da aristocracia europeia, atraída pelas terras que a conquista lhes proporcionaria. Fonte: www.redebim.dphdm.mar.mil.br Durante o reinado de Afonso VI (1069-1109), de Leão e Castela, a partir de 1072, dois nobres franceses – Raimundo e Henrique de Borgonha – receberam como recompensa pelos serviços prestados na campanha a mão das filhas do rei, além de terras como dote. D. Raimundo recebeu as terras a norte do Rio Minho, o Condado de Galiza, e D. Henrique o Condado Portucalense. Estas terras não se constituíam em reinos independentes e seus proprietários deviam prestar vassalagem ao rei de Leão. A origem do próprio Estado português se deu com a formação do Condado Portucalense, sob o domínio de D. Henrique de Borgonha. 5 Este nobre, tendo o senhorio de ampla região entre os Rios Minho e Mondego, procurou reforçar, através da luta contra os mouros, seu poderio sobre os demais senhores de terras daquela área, bem como conseguir autonomia frente aos interesses do vizinho Reino de Leão, a cujo soberano, como já foi dito, devia vassalagem. O caráter inicial da formação dos reinos ibéricos, definido pelos aspectos militar e religioso desenvolvidos nas lutas contra os mouros, marcou as tendências principais da constituição desses Estados. De um lado, o processo de expulsão do inimigo muçulmano deu prioridade ao aspecto militar, o que criou a necessidade de unificação do comando das forças cristãs, papel exercido pelos senhores de terras mais poderosos das diversas regiões da península. Por outro lado, o profundo caráter religioso tomado pela Reconquista, identificada com as cruzadas contra os infiéis muçulmanos, fez com que a Igreja de Roma tivesse grande interesse no sucesso das forças cristãs. As vitórias alcançadas pelos exércitos de D. Henrique mostraram à Santa Sé a importância que estes vinham adquirindo no sucesso das lutas militares. Assim, os interesses do senhorio do condado e os do papado iam aos poucos convergindo para o reconhecimento da autonomia portucalense ante o Reino de Leão. O Tratado de Zamora, firmado em 1143 entre o Duque portucalense D. Afonso Henriques (1128- 6 1185), filho de Henrique de Borgonha, e D. Afonso VII, imperador de Leão, determinou o reconhecimento por parte deste último da independência do antigo condado, agora Reino de Portugal.2 ORDENS MILITARES E RELIGIOSAS Outro fator a ser ressaltado diz respeito às ordens militares (ordens de cavalaria sujeitas a um estatuto religioso e que se propunham a lutar contra os mulçumanos) no processo da Reconquista. Tais ordens, fundadas com o intuito de auxiliar os doentes e peregrinos que iam à Terra Santa e, sobretudo, para combater militarmente os adeptos da fé mulçumana, participaram das batalhas contra os mouros na Península Ibérica. Seus contingentes, em muitos casos, formaram a base dos exércitos cristãos. Em consequência dessa atuação, várias ordens receberam doações de terras nos reinos ibéricos. Em Portugal, as ordens dos Templários, de Avis e de Santiago foram as mais beneficiadas por tais privilégios. As ordens, no entanto, não se destacaram apenas pelo seu aspecto militar. Contribuíram significativamente para o povoamento do território português, a partir das regiões que lhes foram distribuídas. Em torno de castelos e fortalezas, com efeito, desenvolveram atividades agrícolas que levaram à fixação da população. Além disso, foi igualmente importante nesse processo de ocupação territorial a participação das ordens religiosas cujos membros não atuavam das lutas militares. Os mosteiros e capelas destas ordens, dentre as quais se destacou a dos beneditinos, tornaram-se pólos de atração pela segurança que ofereciam a inúmeras famílias. Da mesma forma, desde a Reconquista, as ordens tomaram a peito a colonização de zonas desertas ou dizimadas pela guerra, criando novos focos de povoamento e estimulando a exploração da terra. 2.1 O papel da nobreza Além de setores diretamente ligados à Igreja, assinala-se também intensa vinculação da nobreza portucalense na formação do Estado Nacional lusitano. Este setor social, cujo poder se originava na propriedade da terra, também participou de forma decisiva nas guerras da Reconquista, apoiando o esforço militar da realeza. 7 Esta, num primeiro momento, concedeu privilégios bastante amplos à nobreza. Mais tarde, contudo, pretendeu limitar tais privilégios, impondo medidas que beneficiavam a centralização do poder. Uma das providências tomadas nesse sentido foi a autonomia concedida pelo poder central aos concelhos (que correspondem aos municípios nos dias de hoje), onde começavam a ter influência as aspirações de comerciantes e mestres de ofício. O apoio do rei aos concelhos visava a enfraquecer o poder da nobreza fundiária em sua própria base territorial, impedindo assim que os senhores de terras fizessem prevalecer livremente seus interesses nas áreas que comandavam, sem levar em conta as determinações régias. Outro mecanismo de limitação do poder da nobreza foi o estabelecimento das inquirições. A partir de uma interrupção nas lutas militares contra os mouros, entre os séculos XII e XIII, a coroa portuguesa buscou avaliar a situação da propriedade de terras no reino. Durante a Reconquista, a nobreza laica e eclesiástica aproveitou-se da falta de controle régio para alargar seus domínios territoriais e privilégios, prejudicando em alguns casos os direitos e rendimentos da coroa. Para coibir tal situação, o poder real utilizou-se das inquirições, pelas quais se formavam comissões de inquérito (alçadas) a fim de investigar se os direitos reais devidos estariam sendo cumpridos e até mesmo verificar o direito legal às propriedades. Tal mecanismo se completava com as confirmações, processo pelo qual o rei sancionava não só a propriedade da terra como o próprio título nobiliárquico do senhor em questão. Esses poderes submetiam, de certa maneira, a nobreza eclesiástica e civil à coroa, já que passavam a depender desta para a preservação tanto do título quanto da propriedade. 2.2 A importância do mar na formação de Portuga Paralelamente aos problemas político-territoriais apontados, é digno de destaque que, além da agricultura, o comércio marítimo e a pesca eram as mais importantes atividades praticadas em Portugal, país de solo nem sempre fértil e produtivo. A atividade pesqueira destacou-se como fundamental para complemento da alimentação de sua população. Situado em posição geográfica estratégica, à beira do Oceano Atlântico e próximo ao Mediterrâneo, era de se esperar que desenvolvesse grande devotamento 8 à navegação e, consequentemente, à construção naval. Natural, também, que a Marinha portuguesa fosse utilizada em caráter militar, o que ocorreu a partir do século XII. No reinado de D. Sancho II (1223-1245) podem ser assinaladas as primeiras tentativas de implantação de uma frota naval pertencente ao Estado, ordenando, inclusive, a construção de locais específicos nas praias para reparo de embarcações. 2.3 Desenvolvimento Econômico e Social Durante o reinado de D. Dinis (1279-1325), sexto rei de Portugal (primeiro a assinar documentos com nome completo e, presumidamente, primeiro rei não analfabeto daquele país), iniciativas bastante relevantes foram adotadas para o fomento da cultura, da agricultura, do comércio e da navegação. Denominado O Lavrador ou Rei Agricultor e ainda Rei Poeta ou Rei Trovador, D. Dinis foi um monarca essencialmente administrador e não guerreiro. Envolvendo-se em guerra contra Castela, em 1295, desistiu dela em troca das Vilas de Serpa e Moura. Pelo Tratado de Alcanizes (1297) formou a paz com Castela, ocasião em que foram definidas as fronteiras atuais entre os países ibéricos. Fonte: www.mundoportugues.pt Preocupado com a infraestrutura do país, ordenou a exploração de minas de cobre, estanho e ferro, fomentou as trocas comerciais com outros países, assinou o primeiro tratado comercial com a Inglaterra, em 1308, e instituiu a Marinha Real. 9 Nomeou então o primeiro almirante (que se tem conhecimento) da Marinha portuguesa, Nuno Fernandes Cogominho, para cuja vaga foi contratado, em 1317, o genovês Pezagno (ou Manuel Pessanha). Data dessa época a chegada dos portugueses às Ilhas Canárias. Deve-se também à sua iniciativa a intensificação da monocultura do pinheiro bravo (Pinhal de Leiria), em princípio, com a finalidade de criar uma barreira vegetal que protegesse as terras agrícolas do avanço das areias costeiras e, também, como reserva florestal para o fornecimento de madeira destinada à construção naval e à exportação. O cultivo era extremamente racional: sempre que havia corte de árvores, novas mudas eram plantadas de imediato, recorrendo-se a enormes sementeiras. Esta ação manteve o pinhal praticamente intacto e foi bastante utilizado durante os séculos XV e XVI, no período dos descobrimentos marítimos. Além de fornecer madeira para a construção naval, o pinho fornecia um subproduto importantíssimo para conservação e calafeto dos cascos das embarcações: o chamado pez, alcatrão vegetal de grande poder de vedação. É notável que o Pinhal de Leiria exista até os dias de hoje, constituindo uma das maiores manchas naturais da região do norte do distrito de Leiria. No reinado de D. Fernando I (1367-1383), último soberano da dinastia de Borgonha, foi baixada a Lei de Sesmarias, de 28 de maio de 1375. Tendo como medida coercitiva mais rígida a expropriação das terras não produtivas, essa lei foi mais uma tentativa de solucionar a carência de mão-de-obra no campo, causada pela fuga das populações para os centros urbanos, devido à peste negra. O resultado foi uma séria crise de abastecimento de gêneros alimentícios no reino. A Lei de Sesmarias, que mais tarde seria aplicada no Brasil, teve pouco efeito prático. Seus artigos, apesar de conterem ameaças aos proprietários de terras, atuaram no sentido de fortalecê-los, pois obrigavam os trabalhadores a permanecerem nos campos, mesmo em troca de baixa remuneração. Ainda durante o reinado de D. Fernando I, a construção naval recebeu grande incentivo, mediante a isenção de impostos e a concessão de vantagens e garantias aos construtoresnavais, tais como a autorização aos construtores de embarcações com mais de cem tonéis que cortassem a madeira necessária nas matas reais com isenção de impostos. Também ficou isenta de impostos, a matéria-prima importada destinada à construção naval. Em 1380, o monarca criou a Companhia das Naus, que 10 funcionava como uma empresa de seguros destinada a evitar a ruína financeira dos homens do mar. Como resultado, incrementaram-se o comércio marítimo, a exportação de produtos da agricultura e a importação de tecidos e manufaturas. As rendas da Alfândega de Lisboa, considerado porto franco, aumentaram significativamente e era intensamente frequentado por estrangeiros. Outra importante iniciativa de D. Fernando foi a instalação da Torre do Tombo, o Arquivo Nacional Português, onde se guardavam documentos importantes que preservavam a memória e a história de Portugal. Foi-lhe dado este nome porque ficava sediado numa torre do Castelo de São Jorge, e tombo, porque significava lançar em livro, inventariar, registrar. D. Fernando I envolveu-se em três guerras contra Castela e passou a ser malvisto pela opinião pública por seu casamento com Dona Leonor Teles (cujo casamento anterior fora anulado). Após a morte de D. Fernando, os portugueses não aceitaram a regência da rainha viúva em nome da filha, a Infanta Dona Beatriz, casada com um potencial inimigo, o rei de Castela. Este fator, somado à continuidade da crise de abastecimento, deflagrou a Revolução de Avis. Após deliberação das Cortes, foi aclamado rei o Mestre da Ordem de Avis, D. João I (1385-1433), filho bastardo do oitavo rei de Portugal D. Pedro I (1357-1367), a quem caberia inaugurar uma nova dinastia. Vitoriosa em Lisboa, a revolta transformou-se em movimento de fidalgos e plebeus em guerra contra Castela, cujo rei declarou pretensão à coroa portuguesa. Os castelhanos foram vencidos em várias batalhas e, embora tenham bloqueado Lisboa, foram, afinal, fragorosamente derrotados na Batalha de Aljubarrota (1385). A paz só foi selada em 1411. Outra consequência importante dos fatos apontados foi a renovação da aristocracia portuguesa. Os setores que haviam apoiado Castela tiveram seus bens confiscados pela coroa, a qual os doou em parte aos seus aliados. Com tal divisão na nobreza, houve até mesmo casos em que pais perderam os bens para seus próprios filhos. Além disso, o apoio dos grupos mercantis a D. João I fez com que as aspirações de tais grupos passassem a ser valorizadas pelo poder régio. A situação econômica do reino, ao sair vitoriosa da revolução, era uma das mais graves. A alta do custo de vida e a queda do valor da moeda colocaram o tesouro português em situação bastante difícil. A nobreza também teve suas bases de poder atingidas pelo movimento de centralização régia, com a colocação em prática da Lei Mental. Por meio dessa lei, 11 baixada por D. Duarte (1433-1438) em 8 de abril de 1434, os bens doados pela coroa à nobreza só poderiam ser herdados pelo filho varão legítimo mais velho. Isso permitiu à coroa retomar uma série de propriedades antes doadas às famílias nobres, reforçando seu poder e, de alguma maneira, minando as bases do poderio senhorial. Tal processo de centralização do poder foi o elemento essencial que permitiu ao reino português lançar-se na expansão ultramarina. Deve-se destacar ainda que os limites da extração das rendas obtidas com a agricultura fizeram a coroa voltar seus olhos às atividades comerciais e marítimas. O monopólio exercido pelas cidades italianas de Gênova e Veneza sobre as rotas de comércio com a Ásia levou os grupos mercantis portugueses a procurar outra alternativa para a realização de seus negócios e, consequentemente, para obtenção de lucros. A saída seria a tentativa de contato direto com os comerciantes árabes, evitando o intermediário genovês ou veneziano. Para isso muito contribuiu a estrutura naval já existente no reino, cujo desenvolvimento foi estimulado pela coroa. A expansão marítima portuguesa caracterizou-se por duas vertentes. A primeira, de aspecto imediatista, realizada ao norte do continente africano, visava à obtenção de riquezas acumuladas naquelas regiões através de prática de pilhagens. A tomada de Ceuta, no norte da África (Marrocos), em 1415, seria um dos exemplos mais representativos deste tipo de empreendimento e marca o início da expansão portuguesa rumo à África e à Ásia. Em menos de um século, Portugal dominou as rotas comerciais do Atlântico Sul, da África e da Ásia, cuja presença foi tão marcante nesses mercados que, nos séculos XVI e XVII, a língua portuguesa era usada nos portos como língua franca – aquela que permite o entendimento entre marinheiros de diferentes nacionalidades. Na segunda vertente, o objetivo colocava-se mais a longo prazo, já que se buscava conquistar pontos estratégicos das rotas comerciais com o Oriente, criando ali entrepostos (feitorias) controlados pelos comerciantes lusos. Foi o caso da tomada das cidades asiáticas. Tal modo de expansão também ficou marcado pelo aspecto religioso (cruzadas), pois mantinha-se a ideia de luta cristã contra os muçulmanos. A expansão ultramarina permitiu, assim, uma convergência de interesses entre os setores mercantis e a nobreza, tendo o Estado o papel de controle e direção de tal empreendimento. O monopólio do comércio dos produtos asiáticos e o tráfico de escravos africanos (mão-de-obra para as regiões produtoras de matérias-primas) enriqueciam não só os grupos mercantis, como geravam vultosas receitas para o 12 tesouro régio, as quais a coroa, em certa medida, repassava à nobreza através da doação de mercês, bens móveis e de raiz, bem como de privilégios. Entre 1421 e 1434, os lusitanos chegaram aos Arquipélagos da Madeira e dos Açores e avançaram para além do Cabo Bojador. Até esse ponto, a navegação era basicamente costeira. Em 1436 atingiram o Rio do Ouro e iniciaram a conquista da Guiné. Ali se apropriaram da Mina, centro aurífero explorado pelos reinos nativos em associação aos comerciantes mouros, a maior fonte de ouro de toda a história de Portugal até aquela data. Em 1441, chegaram ao Cabo Branco. Em 1444, atingiram a Ilha de Arguim, no Senegal, onde instalaram a primeira feitoria em território africano e iniciaram a comercialização de escravos, marfim e ouro. Entre 1445 e 1461, descobriram o Cabo Verde, navegaram pelos Rios Senegal e Gâmbia e avançaram até Serra Leoa. Entre 1470 e 1475, exploraram a costa da Serra Leoa até o Cabo de Santa Catarina. Em 1482, atingiram São Jorge da Mina e avançaram até o Rio Zaire, o trecho mais difícil da costa ocidental africana. O navegador Diogo Cão explorou a costa da África Ocidental entre 1482 e 1485. No período 1487/1488, Bartolomeu Dias atingiu o Cabo das Tormentas, no extremo Sul do continente – que passou a ser chamado de Cabo da Boa Esperança – e chegou ao Oceano Índico, conquistando o trecho mais difícil do caminho das Índias. Em 1498, Vasco da Gama chegou a Calicute, na costa Sudoeste da Índia, estabelecendo a rota entre Portugal e o Oriente. Durante o reinado de D. João II, iniciado em 1481, a expansão ultramarina atingiu o auge com os feitos dos navegadores Diogo Cão e Bartolomeu Dias. Abriram- se, desse modo, novas e extraordinárias perspectivas para a nação portuguesa. O negócio das especiarias do Oriente, levadas para a Arábia e para o Egito pelos árabes e dali transportadas aos países europeus, por intermédio de Veneza – que 13 enriquecera com o tráfico –, vai se concentrar em novas rotas, deslocando o foco do comércio mundial do Mediterrâneo para o Oceano Atlântico. Foi justamente um genovês, Cristóvão Colombo, quem abalou as pretensões de D. João II na sua política expansionista, ao descobrir a América em 1492. No retorno de sua famosa viagem, Colombo avistou-se como rei de Portugal comunicando-lhe a descoberta. Anteriormente, o mesmo Colombo já havia oferecido seus serviços ao soberano português, que recusou a oferta baseado em informações dadas pelos cosmógrafos do reino, levando o genovês a dirigir-se a Castela, onde obteve apoio financeiro para sua famosa viagem. Abalado com as notícias trazidas por Colombo, D. João II cogitou em mandar uma expedição em direção às terras recém descobertas, convencido de que lhe pertenciam por direito. Pouco depois, a questão foi arbitrada por três bulas do Papa Alexandre VI, que concederam à Espanha os direitos sobre as terras achadas por seus navegadores a ocidente do meridiano traçado a cem léguas a oeste das Ilhas dos Açores e de Cabo Verde. Os portugueses discordaram da proposta e novas negociações resultaram na assinatura do Tratado de Tordesilhas (cidade espanhola) em 7 de junho de 1494, que garantiu à coroa portuguesa as terras que viessem a ser descobertas até 370 léguas a oeste do Arquipélago de Cabo Verde. As terras situadas além desse limite pertenceriam à Espanha. 14 D. João II morreu em 1495 e coube ao seu sucessor, D. Manuel, dar continuidade ao projeto expansionista. Durante sua gestão aconteceu a famosa viagem de Vasco da Gama, que partiu do Rio Tejo em julho de 1497, dobrou o Cabo da Boa Esperança, transpôs o Rio Infante, ponto extremo da viagem de Bartolomeu Dias, reconheceu Moçambique, Melinde, Mombaça e, em maio de 1498, após quase um ano de viagem, chegou a Calicute, na Índia. A façanha de Vasco da Gama colocou Portugal em contato direto com a região das especiarias, do ouro e das pedras preciosas, e, como consequência, a conquista do quase total monopólio de tais produtos na Europa, abalando seriamente o comércio das repúblicas italianas. A conquista da rota marítima para as Índias assumiu, na época, importância revolucionária e suas consequências imediatas empalideceram até mesmo o maior acontecimento da história moderna das navegações: o descobrimento da América por Cristóvão Colombo.1 3 O ENCONTRO DA CIVILIZAÇÃO EUROPEIA COM AS ANTIGAS CIVILIZA- ÇÕES PRÉ-COLOMBIANAS Fonte: historiazine.com 1 Texto extraído: Introdução a História Marítima brasileira. Disponível em: www.rede- bim.dphdm.mar.mil.br › vínculos. 15 Esta expressão, “América pré-colombiana”, é empregada amplamente na historiografia para designar o longo período histórico que os povos americanos viveram antes da chegada de Cristóvão Colombo na América em 1492, ano tido como um marco histórico, pois a partir daí os nativos que viviam aqui na América foram incorporados à História Moderna. Essa incorporação não significou um processo de igualdade de relações, muito pelo contrário, os europeus impuseram o seu etnocentrismo, pois se consideravam superiores aos nativos, que não eram considerados cristãos. O mais importante a salientar, contudo, é que estes nativos tiveram as suas vidas totalmente transformadas, sendo subjugados ao processo de colonização. A entrada da América na História Moderna significou uma incorporação ao que podemos denominar de pré- capitalismo, com o início de uma nova fase no sistema produtivo europeu. A partir das grandes navegações alguns países europeus conquistaram terras e riquezas no Novo Mundo. Espanha e Portugal foram agressivos neste processo de expansão, pois investiram capitais e conhecimentos para conquistar riquezas além-mar. Antes da chegada de Colombo à América já havia uma história, não ligada à Europa, mas dos nativos que viviam neste espaço. O importante é preservar as diferentes formas de vivências dos nativos para não cometermos o erro de chamá-los de bárbaros ou selvagens somente porque não tinham os mesmos hábitos dos europeus. A organização social dos nativos era bem diferente daquela do europeu, mas isso não os tornava inferiores, ao contrário do que defendem alguns historiadores, que revelando uma atitude etnocêntrica, os denominam de bárbaros, selvagens e pagãos. Devemos entender que as culturas têm a sua própria organização, e no caso dos nativos, eles viviam em diferentes estágios de desenvolvimento, o que os tornava também diferentes entre si, sem, contudo, que essa diferença seja motivo para que os classifiquemos como inferiores. A História da América antes da chegada de Colombo já era vivida pelo menos há aproximadamente 20 mil anos, ou seja, já tinha a sua própria trajetória, independente da Europa, não fazendo parte das classificações históricas dos povos europeus. Os nativos que viviam aqui na América atingiam um número extremamente expressivo, estima-se que eram aproximadamente 50 milhões de pessoas, mas seus estágios de desenvolvimento eram bem diferentes, vivendo, em sua maioria, em tribos. Alguns, inclusive, ainda no estágio da pedra lascada, pois eram várias etnias e 16 grupos linguísticos, e outros, por sua vez, habitavam cidades, apresentando uma organização social mais complexa. Os nativos tinham os seus próprios credos, os seus deuses, diferentes daquele dos cristãos, gerando, com isso um estranhamento por parte do europeu, que procurava catequizá-los. Esses diferentes estágios de desenvolvimento dos nativos foram decisivos para impor todo o processo de colonização, facilitando ou dificultando a dominação imposta pelo espanhol. A imposição do processo de ocupação e posterior colonização foi totalmente dramática para os nativos, pois estes ainda não haviam feito contatos com os brancos, o que de imediato já causou uma série de problemas, desde doenças contagiosas que ocasionaram a morte de populações nativas que não possuíam resistência àqueles tipos de vírus e bactérias. O que mais dizimou, no entanto, foram realmente os saques que os espanhóis faziam, devastando os povoados em busca de metais preciosos e, mais tarde, com o próprio processo de escravização do nativo. Alguns historiadores chegam a comentar que esse foi um verdadeiro cataclismo demográfico, ou seja, uma destruição em massa da população nativa. É importante destacar e ter sempre em mente que na América viviam nativos em diferentes estágios de povoamento, o que torna ainda mais complexo entender o processo de ocupação. Vamos num primeiro momento apenas fazer alguns comentários sobre estas comunidades ou, como alguns denominam, estas civilizações, por ser uma abordagem ilustrativa para compreendermos a diversidade da ocupação. Serão feitas algumas considerações sobre os astecas, maias e incas, mas não pretendemos aqui esgotar o assunto, fazendo apenas uma ilustração destes povos que foram fundamentais para a história da América pré-colombiana. 3.1 Os Astecas As primeiras considerações sobre os astecas descrevem o seu processo de ocupação no vale do México, mais precisamente às margens do grande Lago Texcoco. Neste local surgiram os primeiros povoados ou civilizações, originários de vários povos que se constituíram como os astecas propriamente ditos. Os astecas foram os últimos a chegarem neste vale. Eram não só provenientes de Astlán, uma região situada no noroeste do México, como também eram oriundos do sul dos 17 Estados Unidos, vindo a ocupar este vale e formando ali uma civilização bem organizada em todos os aspectos. Os astecas ocupavam grande parte do vale do México, e para isso enfrentaram muitos obstáculos, pois naquele espaço já existiam outras comunidades. Foi realmente um processo de conquista, um processo de ocupação que se deu lentamente, pois os astecas foram aos poucos dominando o espaço, criando suas comunidades e também as suas cidades. Construíram a cidade de Tenochtitlán, localizada às margens do Lago Texcoco, local onde se encontra atualmente a Cidade do México. Esse processo de criação de cidades foi lento, pois foram construindo aos poucos as cidades de Texcoco e, mais tarde, Tlacopán.Desta forma foi criado um conjunto de cidades nas quais os astecas estabeleceram os seus domínios sobre os demais povos que ocupavam os espaços próximos, com isso formado um verdadeiro império, não sem lutas e violência, pois enfrentaram a resistência dos demais povos. Fonte: www. historiazine.com A cidade de Tenochtitlán ficava exatamente às margens do Lago de Texcoco, sendo uma região muito pantanosa, apresentando condições de produção muito complexas. Naquele tempo, uma das principais atividades produtivas era a pescaria, e também aproveitavam as terras ao longo do lago, que eram pantanosas, para produzir hortaliças. Com o processo de conquistas de outras terras foram 18 intensificados a agricultura, criando várias técnicas de plantio e irrigações, sendo possível produzir vários tipos de cereais e outros alimentos, tais como: milho, feijão, melão, baunilha, cacau, pimentão e mesmo o algodão. Como podemos perceber, essa agricultura era bem desenvolvida, permitindo o sustento e inclusive o acúmulo de excedentes. Neste contexto, a plantação do cacau foi fundamental para o seu beneficiamento, produzindo o conhecido chocolate, o qual, mais tarde, com a colonização, levado à Europa. A organização da propriedade da terra também era diferente da atual, pois para os astecas ela era, em sua maioria, coletiva, ou seja, de propriedade do Estado, praticamente não existindo a propriedade privada como conhecemos hoje. A distribuição da terra ocorria da seguinte maneira: cada um dos adultos ou famílias recebiam um pedaço de terra para ser cultivada, na qual deveria produzir para a família e mais tarde também para guardar como excedente. Com a expansão dos astecas e conquistas de novas áreas iniciou-se a ocupação privada da terra. Nestas novas áreas conquistadas eram criadas o que chamamos de fazendas (uma grande propriedade de terras); estas terras privadas passaram a pertencer aos nobres, pois a sociedade era dividida em castas (o que chamamos atualmente de classes sociais). Os excedentes produzidos eram comercializados nas cidades, não era utilizada moeda, mas a troca era em forma de escambo, quer dizer, produto trocado por produto. A estrutura da sociedade para os astecas mudou muito desde a sua chegada no vale do México, pois logo que ocupavam o espaço eles formavam uma sociedade mais homogênea, ou seja, mais igualitária, e governada por sacerdotes. Com o processo de ocupação foi se formando e complexificando uma verdadeira sociedade de classes. A divisão social era a seguinte: uma classe dominante (como em toda a sociedade) formada pelos denominados nobres, que eram chefes guerreiros e os sacerdotes. Depois destes havia uma classe média, formada pelos comerciantes, que acumulavam riquezas, não com moedas, mas com um grande volume de produtos que iam adquirindo ao longo do tempo nas atividades comerciais. O povo propriamente dito era dividido em duas camadas: os que eram classificados como cidadãos comuns e os mais baixos, os escravos. Os cidadãos comuns que, em sua maioria, dedicavam-se ao cultivo da terra, eram realmente os trabalhadores, mas também podiam praticar o pequeno comércio e o artesanato. As suas obrigações com o Estado eram várias, pois pagavam os 19 impostos, também prestavam o serviço militar e eram convocados a realizar trabalhos obrigatórios, como na construção da infraestrutura (ruas, pontes, canais e templos). Os escravos eram geralmente os capturados como prisioneiros de guerras, e alguns sacrificados em nome do Deus-Sol. Os demais eram condenados pela justiça, como também por dívidas que não podiam pagar. Os astecas possuíam uma vida cultural bem variada, sua formação cultural foi decorrente da junção das diversas manifestações dos povos que habitavam o vale do México. Os astecas desenvolveram muitos conhecimentos na área da astronomia, e os aplicavam na prática da agricultura. Também desenvolveram a Astrologia e a Matemática. O desenvolvimento da arquitetura foi fenomenal, pois construíram grandes cidades, e suas construções encantaram inclusive os próprios espanhóis. A cidade mais importante foi Tenochtitlán, a qual chegou a contar com aproximadamente 500 mil habitantes. Esta cidade era realmente formidável, tendo sido, inclusive, comparada à Veneza, pois contava com inúmeros canais. A cidade possuía até aquedutos para o fornecimento de água. A vida cultural também era intensa, e o sistema educacional estava dividido em duas partes, ou tipos de escolas: a escola Calmecac, local onde estudavam os filhos dos nobres, e a escola Telpochcalli, frequentada pelos jovens do povo. 3.2 Os Maias Fonte: revistagalileu.globo.com 20 Os maias habitavam uma extensa região, que atualmente compreende o sul do México, Guatemala Honduras e Honduras Britânica. Essa região começou a ser habitada aproximadamente em 300 a.C., o que significa que estes povos já tinham toda uma história antes da chegada de Colombo na América. A história dos maias divide-se em períodos que compreendem três fases: pré-Maia, de 300 a 317; o Antigo Império, 317 a 987, e finalmente o Novo Império, que vai de 987 a 1697. A primeira fase, conhecida como Pré-Maia, é pouco estudada, pois os indícios documentais são raros, mas entende-se que nessa fase teve início a produção do milho, como também o começo da construção das cidades. A segunda fase, o Antigo Império, foi um período marcado pelo estabelecimento de um Estado com características centralizadoras. Nessa época as cidades maias foram dirigidas pelos monarcas divinos, sendo estes os grandes proprietários de terras, que determinavam como deveriam ser os trabalhos obrigatórios que a população precisava cumprir. Já na terceira fase, o Novo Império, as cidades reconquistaram a sua independência. A principal atividade econômica dos maias era a agricultura, e as terras eram de propriedade do Estado. Os produtos cultivados eram os mais diversos, mas basicamente plantavam milho, algodão, feijão, tomate, batata, cacau, etc. Como a agricultura era a principal atividade, eles lhe dedicavam muita atenção e as técnicas eram aplicadas sempre para conseguir uma maior produtividade, destacando-se, por exemplo, a irrigação. Ao mesmo tempo também praticavam a queimada, o que contribuía para o esgotamento dos solos. Fonte: cyberclio.wordpress.com 21 Os historiadores são unânimes em afirmar que o cultivo do milho era realmente uma atividade expressiva, e consistia em a base da alimentação dos maias, e por ser uma cultura fácil de praticar, eles dedicavam grande parte de seu tempo a outras ocupações. As demais atividades eram destinadas à construção de cidades e magníficas obras arquitetônicas, como seus templos. A sociedade maia também tinha a sua complexidade, e era basicamente dividida em classes: a primeira classe incluía os considerados nobres, e constituíam- se em chefes guerreiros; também mantinham a liderança com as tarefas de toda a administração pública. A classe dos sacerdotes era considerada a segunda na hierarquia; eles controlavam as atividades religiosas e culturais. O povo fazia parte desta classe e também exercia várias atividades, como as produtivas, pagamento de impostos, prestação de serviço militar e trabalhos obrigatórios para o Estado. A terceira classe na hierarquia era a dos escravos, não muito numerosa, e formada por prisioneiros de guerras e também condenados pela justiça. A população total dos maias era estimada em aproximadamente 15 milhões de pessoas, e as famílias eram a base da sociedade, mantendo a preocupação de amparar os velhos. A arquitetura maia era extremamente desenvolvida, pois construíram extraordinárias cidades com templos, palácios e observatórios. Isso tudo ainda pode ser visitado, servindo como testemunho do desenvolvimento desta civilização, que impressionou pelo seu esplendor. A questão cultural,porém, não está restrita à cultura material, ela também pode ser percebida nas ciências, por exemplo, na própria astronomia, considerada tão desenvolvida quanto a europeia na época dos descobrimentos. Os instrumentos da cultura material também são expressivos, pois já trabalhavam com alguns metais como o ouro e a prata. Também utilizavam a pedra polida para a confecção de instrumentos, tanto para o trabalho, quanto para a guerra. Quanto às suas crenças, eram adeptos aos deuses da natureza. 3.3 Os Incas Os incas também organizaram um verdadeiro império, formado ao longo dos tempos, num processo de conquistas de outros povos que habitavam a sua região de abrangência. O local ocupado pelos maias era extremamente vasto, compreendendo 22 uma região de aproximadamente 950.000 Km2, localizada em parte da Colômbia, norte da Argentina e Chile. Fonte: www.historiazine.com Esta região é configurada geograficamente pela Cordilheira dos Andes, ou seja, um local de difícil ocupação por questões climáticas. Essa região era ocupada há muito tempo, mesmo antes da chegada dos incas, mas a documentação arqueológica não permite um estudo mais detalhado dessa fase da ocupação. A partir do ano 600 este espaço foi ocupado pelos Chimu, que desenvolveram amplamente os processos de irrigação, possibilitando a agricultura. Os Chimu fundaram a cidade de Chan-Chan, sua capital, que contou com aproximadamente 80 mil pessoas. Os incas foram sucessores dos Chimu. Os incas, segundo os estudos, eram oriundos da região amazônica e pertenciam à etnia quíchua. Tinham a característica de serem bons guerreiros e conquistadores, e com isso alastraram-se até as terras altas do Peru, conquistando Cuzco. A partir daí as guerras continuaram no processo de conquistas e expansões, que durou praticamente três séculos, submetendo ao seu domínio vários povos andinos. Este processo teve várias fases, mas pode-se citar a conquista do Império Chimu e da cidade de Tiahuanaco. Este longo processo de expansão é marcado pela conquista de povos e cidades, bem como pela assimilação de culturas mais 23 desenvolvidas. A expansão dos incas ocorreu devido as suas constantes guerras e busca de riquezas, consequentemente incorporando povos, culturas e bens materiais. Antes da chegada dos espanhóis eles formavam um verdadeiro império, com praticamente 8 milhões de habitantes, divididos em vários grupos étnicos. Os povos andinos tinham muitas dificuldades de sobreviver num clima e relevo extremamente hostil e, sendo assim, criaram muitas técnicas para desenvolver a agricultura naquele espaço. A agricultura destes povos pré-colombianos era bem adiantada, cultivando muitas espécies de alimentos. Para isso várias técnicas foram sendo experimentadas para dominar o clima e a geografia, desenvolveram a irrigação, transformando a área desértica em local produtivo, irrigado com as águas das geleiras. Esse processo agrícola foi realmente bem desenvolvido, inclusive realizavam fertilização dos solos, utilizando o guano como adubo, resíduo proveniente dos excrementos das aves marinhas. Todo este trabalho de agricultura e realização de obras de infraestrutura exigia um grande esforço coletivo, e para isso realizavam mutirões para dar conta destas atividades. Essa relação com a terra é semelhante aos demais impérios, pois em quase todos ela era propriedade do Estado. Com os incas este processo se repete, uma vez que não havia a propriedade privada da terra, e sim, a organização em unidades produtivas chamadas de ayllu. O ayllu consistia num agrupamento de várias tribos num mesmo território, dividido em partes que compreendiam as terras destinadas ao Deus-Sol, ao imperador e às da comunidade. Nestes ayllu havia a prática da mita, ou seja, de trabalhos obrigatórios. Quanto às práticas do comércio, não havia moedas e as trocas eram também em forma de escambo, ou seja, produto trocado por produto. Os impostos eram pagos pela mita. Toda a produção excedente era armazenada pelo Estado, para enfrentar eventuais desastres naturais, como também para sustentar os nobres, sacerdotes e mesmo os militares, os quais dependiam do auxílio do Estado. Como todo império, os incas também se dividiam em classes sociais, as quais compreendiam o clero, a nobreza e naturalmente o povo. O clero, responsável pela parte espiritual do império, tinha como responsabilidade a magia e os rituais. A nobreza era constituída pela família do nobre, ou seja, do imperador inca; também faziam parte dela os chefes guerreiros e os denominados curacas. O povo era constituído basicamente pelos camponeses, os quais muito cedo casavam e permaneciam morando no ayllu, praticando a agricultura e prestando a mita. Quanto 24 às formas de união, as pessoas casavam um tempo depois de morar juntos, e os nobres podiam praticar a poligamia. No que se refere à administração política, havia uma concentração de poder nas mãos da família do Inca, ou seja, do imperador. Era um tipo de império teocrático, pois o domínio era exercido em nome do Deus-Sol. Seus poderes estendiam-se ao papel de chefe civil, poder militar e religioso, e realmente havia uma concentração de poder na sua figura. O processo de sucessão dos imperadores era extremamente complexo, ocorrendo disputas que incluíam guerras e desordens políticas. Este processo de luta pelo poder serviu para enfraquecer o império, abrindo uma brecha para a conquista por parte dos espanhóis. O grande império era dividido em províncias, cada uma delas com um governador, havendo uma estrutura política bem organizada, o que possibilitava a perfeita comunicação dentro do império. A vida cultural dos incas foi extremamente desenvolvida, pois estes herdaram um significativo patrimônio cultural dos povos da região andina, incorporando vários elementos destes em sua cultura. Na cultura material destaca-se a arquitetura, com a construção de grandes edifícios utilizando- se de pedras irregulares que se encaixavam perfeitamente. Este patrimônio cultural pode ser constatado nas cidades de Cuzco e Machu Picchu, que são exemplos desta cultura. Os incas também possuíam um sistema numérico decimal, e eram muito eficientes na metalurgia, trabalhavam com ouro, prata, cobre e bronze. A tecelagem também foi extremamente desenvolvida, cuja técnica está presente inclusive nos dias atuais. Essas três civilizações podem ser consideradas as mais desenvolvidas da América Pré-colombiana, pois viviam em cidades e possuíam formas de produção bem organizadas, mas mesmo assim foram dominadas e saqueadas pelos espanhóis, e não conseguiram resistir ao invasor. Isso não significa que seus integrantes não reagiram aos ataques dos espanhóis, pois os relatos dos religiosos revelam que os conflitos foram devastadores para a população nativa, que assistiu à destruição de suas cidades e organizações sociais. Com a finalidade de saquear as riquezas, os espanhóis realmente colocavam fogo nos povoados, matavam a população, não tinham nenhuma piedade, e por incrível que possa parecer, ainda se apresentavam como cristãos que levavam o nome de Deus para os pagãos. 25 Os nativos que ocupavam mais o sul da América ainda viviam no estágio da pedra lascada e polida, não pertenciam às grandes civilizações e a sua vivência ainda era em forma tribal, sofrendo também os ataques dos espanhóis, que procuravam riquezas, principalmente metais. 4 A AMÉRICA APÓS A CHEGADA DE COLOMBO Fonte: noticiasaominuto.com Com a chegada de Colombo, em 1492, a América entra para o mundo moderno, ou seja, passamos a integrar a modernidade, e com o início do pré-capitalismo vamos fazer parte de um mundo cuja forma de produção estava em transformação. A busca de riquezas fora do continente europeu fazia parte do mercantilismo, que procurava metais para incrementar a economia. Quando os espanhóis chegaram naAmérica ocorreu um verdadeiro choque de culturas, e, na realidade, este foi um acontecimento nefasto para os nativos, mas muito lucrativo para os colonizadores. Neste cenário de transformações, a cultura dos nativos passava por uma profunda alteração, pois com a convivência com uma nova forma de organização social e o início do processo de colonização, a partir daí passariam a ser colônias de exploração da Espanha. Logo na chegada os espanhóis foram adentrando no território à procura de riquezas. Este processo foi de submissão dos nativos, para inseri-los no novo sistema econômico estabelecido pelos conquistadores. Esse sistema pode ser designado 26 como colonial mercantilista, ou seja, já estávamos pertencendo ao pré-capitalismo europeu, com todas as consequências que isso poderia gerar, e que realmente foram desastrosas para os nativos. A instituição do sistema colonial fazia parte de todo um processo mais amplo de mudança do feudalismo para o capitalismo. Com a chegada na América efetivou-se este sistema colonial estabelecendo relações de exclusividade entre as metrópoles e as colônias. Assim, tudo o que era explorado e produzido nas colônias era destinado para os países colonizadores. Fonte: www.infoescola.com Neste sentido, podemos afirmar que este sistema econômico era complementar ao pré-capitalismo europeu, ou seja, os metais preciosos eram todos enviados para o país colonizador, além dos produtos tropicais e matérias-primas. A organização do sistema colonial foi extremamente rígida, pois a Espanha criou todo um aparato para garantir a dominação nos territórios conquistados, além de estabelecer as formas de produzir riquezas, organizando as formas de trabalho de acordo com o próprio sistema mercantilista. O aparato criado pela Espanha era complexo, havia o Conselho das Índias, tendo a tarefa de organizar as questões judiciais, legislativas, militares e eclesiásticas. Já a Casa de Contratação era responsável pelo comércio. Toda a parte administrativa era regulamentada pelos vice-reis, que se instalavam por todo o território conquistado, formando o seu núcleo de poder, mas subordinado às metrópoles. 27 O poder mais local era representado pelos cabildos e ayuntamientos, que consistiam em órgãos locais de poder; seus representantes eram os descendentes de espanhóis nascidos na América. A organização dos territórios conquistados foi distribuída em vice-reinados e capitanias gerais. Foi a forma encontrada para controlar a administração com os vice-reis e os capitães encarregados de manter a estrutura de poder representando a Espanha e seus interesses na América. A distribuição dos vice-reinados ficou assim estabelecida: vice-reinado da Nova Espanha; vice-reinado da Nova Granada; vice-reinado do Peru; vice-reinado do Rio da Prata, além de algumas capitanias gerais. O vice-reinado da Nova Espanha se expandia pelo oeste dos Estados Unidos, o atual México e uma parte da América Central, e, como podemos observar nos diferentes mapas (disponíveis na biblioteca), era um território muito extenso. Convém salientar que o México e o Peru foram importantes centros produtores para o sistema colonial, com grande parte da produção consistindo na extração de metais preciosos, pois era o que a Espanha procurava naquele período. Com a decadência da extração de metais, iniciou-se o sistema produtivo agrícola, com isso dividindo as terras e utilizando-se da mão de obra indígena. A divisão das terras formou as grandes propriedades, as denominadas fazendas, que eram unidades produtivas rurais praticamente isoladas do poder da Espanha. Os proprietários das terras, que exploravam os tributos e o trabalho dos indígenas, eram os espanhóis e seus descendentes. As grandes propriedades também eram exploradas pela Igreja mexicana, um dos maiores latifundiários do vice-reinado. Os índios eram os mais explorados, posto que não possuíam direitos, apenas trabalhavam nas grandes fazendas e nas minas. A localização do vice-reinado da Nova Granada compreende os atuais territórios da Colômbia, Panamá e Equador, sendo estes territórios os primeiros a ser ocupado pelos espanhóis, nele sendo criados os primeiros povoamentos. Foi a partir daí que os espanhóis se deslocaram para a conquista dos novos territórios na busca constante de metais preciosos. Os espanhóis logo na chegada dominaram os nativos, que já se encontravam num acentuado processo de desenvolvimento, e que foram forçados a trabalhar nas minas e, mais tarde, na agricultura. Os espanhóis, no início, caçavam os índios e os vendiam para as áreas de mineração, e somente mais tarde começaram a praticar a agricultura com produtos destinados ao mercado europeu, também criando gado para vender para as zonas de mineração. Na agricultura utilizavam a mão de obra indígena 28 e mais tarde a escravidão negra. Com a redução do ouro e prata do México, este vice- reinado foi intensificando a sua produção para suprir as necessidades da Espanha. O vice-reinado do Peru situava-se onde atualmente estão o Peru e parte da atual Bolívia, ou seja, um espaço do Império Inca. Antes da chegada dos espanhóis era um território muito rico, com metais preciosos que foram motivo de cobiça pelos colonizadores. Após o saque das riquezas, os espanhóis escravizaram os nativos, obrigando-os a trabalharem nas minas extraindo metais, como também formaram grandes fazendas, cuja mão de obra era composta pelos nativos. Os proprietários das minas e os fazendeiros detinham um amplo poder local, entrando em conflito com os representantes da Coroa. Os nativos foram os que mais sofreram com a colonização, pois estavam submetidos à escravidão, trabalhando nas minas e nas fazendas, tendo sua liberdade condicionada à prestação do trabalho compulsório. Na nova escala social os nativos estavam condicionados à escravidão, era a classe mais baixa na hierarquia social, acima deles estavam os mestiços, que constituíram uma classe livre, mas que não subiam na escala social e permaneciam temerosos de serem rebaixados a escravos. Esse processo de colonização também teve as suas reações, a exemplo do caso de Tupac Amaru, que era descendente de índios, mas revoltou-se contra a servidão e a abusiva cobrança de impostos, sendo morto e esquartejado pelos espanhóis. Na parte mais meridional da América tivemos o vice-reinado do Rio da Prata, território que compreendia um amplo espaço onde atualmente localizam-se a Argentina, Uruguai, Paraguai e uma parte do Peru e da Bolívia. Como podemos perceber, era realmente uma extensa área. Começou a ser ocupada ainda no século 16, quando os espanhóis desceram do Peru e seguiram até o extremo norte da Argentina, chegando ao Rio da Prata, território que disputavam com os portugueses, todos em busca de ouro e prata. Como não encontraram de imediato, este território permaneceu abandonado por um longo tempo. Os núcleos de povoamento eram raros, pois não se tinha uma riqueza aparente, então se atraía um grande número de aventureiros que se dedicavam ao comércio e também à apropriação de grande quantidade de terras que tinham pouco valor, mas já contava com a presença de gado selvagem. Os espanhóis geralmente ocupavam as margens do Rio da Prata, pois era uma área dedicada ao comércio e ao contrabando de couro e metais. Nesse vice-reinado as relações com os nativos de imediato foram diferentes das ocorridas nos demais territórios, pois os espanhóis não 29 encontraram minas, nem cultivavam a terra. Sendo assim, os nativos não sofreram num primeiro momento o processo de escravização. Os espanhóis tiveram muitos filhos com as nativas, gerando um grande número de mestiços. Fonte: www.nationalgeographic.sapo.pt Com o declínio da mineração os espanhóis descem em direção ao Rio da Prata e passam a intensificar a atividade agropecuária e o comércio. O couro erao produto de exportação, e também praticavam outras atividades comerciais, pois ali era um porto de entrada de produtos para os demais vice-reinados. Além disso, o contrabando era amplamente praticado. Os filhos de espanhóis nascidos aqui eram chamados de criollos, e formavam um grupo que se dedicava à agropecuária, possuindo poder local, sendo decisivos para o processo de independência desse vice- reinado. Para além dos vice-reinados ainda havia as capitanias gerais, as quais ficavam subordinadas àqueles. As mais expressivas eram as da Guatemala, Flórida, Cuba, Venezuela e Chile, e como podemos perceber, ocupavam uma vasta região territorial. Também desenvolviam atividades produtivas, como nos vice-reinados. Essa divisão territorial em vice-reinados e capitanias gerais foi fundamental para a Espanha controlar todas as atividades de extração de metais e produção agrícola praticada aqui, pois o pacto colonial obrigava a enviar para a metrópole toda a produção, bem 30 como a pagar impostos da extração e exportação. Esse período colonial foi realmente muito longo, mas ao mesmo tempo foi estabelecido um poder local pelos criollos, que mais tarde se revoltaram com a situação colonial e lutaram pela independência das colônias. 5 FORMAS DE OCUPAÇÃO E ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO NAS COLÔ- NIAS ENTRE PORTUGUESES, ESPANHÓIS E INGLESES As formas de trabalho foram extremamente exploradoras, com os espanhóis submetendo os nativos a tarefas que eles não desejavam realizar. Dentre as diversas formas de organização do trabalho podemos destacar a mita, que foi muito utilizada durante todo o período colonial. Logo que os espanhóis chegaram à América a busca de metais preciosos foi constante e a economia mineradora tornou-se responsável pelo enriquecimento da Espanha. A exploração iniciou-se pelos planaltos do México, expandindo-se pela Cordilheira dos Andes, e todo o trabalho foi feito pelos nativos, com a denominação de mita. Esse sistema consistia num trabalho compulsório que empregava as comunidades dos nativos no processo de mineração. Fonte: www.todamateria.com.br Os nativos eram forçados ao trabalho nas minas, sendo denominados de mitayos. Quando os nativos partiam para explorar as minas era feito um verdadeiro ritual, pois rezava-se o oficio dos mortos. Com a mita era feito muitos deslocamentos 31 dos nativos e o trabalho era tão exaustivo que poucos voltavam vivos para casa. Além da mita ainda podemos destacar com outra forma de exploração do trabalho dos nativos, a encomienda, também amplamente utilizada no período colonial americano. Podemos destacar duas formas distintas de atividade econômica, a mineração e a produção agrícola, e nesta última era adotada a encomienda. A forma de distribuição da propriedade de terras foi a base da grande propriedade, conhecidas como fazendas, nas quais eram produzidos gêneros alimentícios e matérias-primas, no início geralmente direcionados para as regiões mineradoras. Com a gradual crise da mineração, essa produção passou a ser mais destinada ao consumo nas propriedades, e somente mais tarde para a exportação. A partir do século 18, com o auge da crise da mineração, os produtos exportáveis passaram a ser realmente os produzidos nas grandes fazendas nos territórios do Caribe e do Rio da Prata, transformando-as em grandes propriedades rurais exportadoras. A forma de trabalho denominada de encomienda consistia na servidão dos nativos em vastas áreas de terras apropriadas pelos colonizadores. A administração colonial reconhecia a propriedade privada do colonizador e encomendava um considerável número de nativos, os quais deveriam pagar tributos aos proprietários de terras sob a forma de prestação de serviços. O encomendeiro, porém, tinha suas obrigações, tais como cristianizar os nativos que lhe prestavam serviços e também pagar impostos à Coroa pelo número de nativos confinados. Outra forma de trabalho presente na América foi a escravidão negra, introduzida a partir do século 16 nas regiões onde os nativos resistiam à servidão ou foram exterminados pelos espanhóis. Podemos perceber que os negros trabalhavam nas Antilhas, alguns também nas minas e no serviço doméstico das grandes fazendas. Alguns historiadores defendem a tese de que a Espanha não participava diretamente do tráfico de escravos, mas que comprava de outras companhias, como dos portugueses, que praticaram intensamente o tráfico por vários séculos. Os escravos negros também reagiam à escravidão por meio de fugas e motins, pois não aceitavam facilmente as condições de trabalho impostas pelos seus proprietários. A intensa exploração dos nativos despertou o interesse da Igreja, que mandou para as terras americanas a Companhia de Jesus, ainda no século 16, formando assim o que podemos denominar de Reduções Jesuíticas. No Rio Grande do Sul tivemos os sete povos das missões: São Francisco de Borja, São Nicolau, São Luiz Gonzaga, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista e Santo Ângelo 32 Custódio, sendo um dos mais conhecidos o de São Miguel, patrimônio da humanidade reconhecido pela Unesco. As reduções ocupavam grandes territórios e agrupavam um grande número de índios, os quais viviam coletivamente, praticavam a agricultura, a pesca e o artesanato, mas em troca eram cristianizados pelos jesuítas. Nas reduções a distribuição dos bens era igualitária, pois produziam para viver e manter a ordem religiosa, os nativos eram inclusive alfabetizados em sua própria língua. Também podemos constatar a presença do trabalho semilivre, que se iniciou ainda no final do século 16, nas grandes fazendas e mais tarde se estendeu para as minas, onde era conhecido como sistema de peonagem, que em algumas regiões ainda persiste na atualidade. É uma forma de trabalho assalariado, mas o trabalhador recebe o seu salário em produtos e não em dinheiro. Esses produtos podem ser os mais variados possíveis, tais como: carne, cachaça, roupas, utensílios, etc. O detalhe desta relação é a seguinte: esses produtos são comprados nos armazéns das minas ou fazendas por um preço muito alto. Sendo assim, o trabalhador fica permanentemente endividado, e isso faz com que ele continue trabalhando para esse mesmo patrão pelo resto de sua vida, caracterizando mais uma servidão do que um trabalho livre. A estrutura comercial da América Espanhola era totalmente atrelada à metrópole, pois as relações eram estabelecidas a partir dos tratados que os regulamentavam. No início do processo de colonização tudo era feito a partir de Castela, pois foi instituída a Casa de Contratación para cuidar da administração da América Espanhola. O comércio era feito todo pelo porto de Sevilha, e a partir de 1717 o porto único foi transferido para Cádiz. No século 18 foi posto fim ao regime de porto único. Sendo assim, qualquer porto espanhol poderia comercializar com a América. Toda a produção de metais explorados aqui deveria ser enviada à Espanha, bem como as matérias-primas que aqui eram produzidas. O ouro e a prata pagavam altos impostos, e era chamado de quinto um imposto de 20% sobre o metal. Os produtos manufaturados importados pelas colônias eram comprados com um alto preço, resultando em altos ganhos por para a Espanha. Nas colônias poderiam ser praticados a produção de manufaturas e o artesanato. Isso servia para atender à economia interna, mas era proibido elaborar produtos que concorressem com a metrópole, como o vinho. Durante um longo período as colônias não podiam comercializar entre si, pois todo o comércio deveria ser feito pelos espanhóis, no entanto era possível encontrar práticas de contrabando. 33 A Espanha tinha uma fraca indústria, que não conseguia atender às demandas das colônias. Com isso, havia muito contrabando, inclusive com a permissão dos administradores locais, que recebiam propinas parapermitir que os navios estrangeiros atracassem e vendessem as suas mercadorias para as colônias. Os funcionários corruptos recebiam muitas propinas por permitir esse comércio, juntando muito dinheiro e voltando a viver na Espanha. Os ingleses, holandeses e franceses frequentavam constantemente os portos para fazer contrabando, vendiam os produtos manufaturados, e, em troca, compravam produtos agrícolas recebendo em ouro e prata, comércio lucrativo para os contrabandistas. A sociedade espanhola era extremamente tradicional, possuindo resquícios do feudalismo, mostrando-se muito aristocrática e fechada, transferindo esse modelo para as colônias. Os critérios para classificações dos indivíduos em classes sociais foram estabelecidos pela renda de cada um, pelo poder e nascimento. Aqui ainda levava-se em conta a cor da pele, tudo isso era critério para a alocação nas classes. Outra grande herança espanhola foi a questão da grande propriedade, pois foi constituída uma estrutura agrária com predomínio dos latifúndios destinados aos conquistadores e seus sucessores. A estrutura dos latifúndios é um modelo que começou no período colonial e que persiste até a atualidade. Toda a produção colonial era destinada para a metrópole, assim o desenvolvimento interno das colônias foi extremamente prejudicado, pois não se investia internamente. A estrutura social determinava que no seu topo ficariam alocados os espanhóis provenientes da península ibérica, os denominados chapetones, descendentes da nobreza empobrecida da Espanha. Esses chapetones ocupavam todos os cargos administrativos das colônias, pois eram os letrados, também se tornando donos das grandes propriedades e das minas, portanto tinham poder político e econômico ao mesmo tempo. Abaixo dos chapetones ficavam os criollos. Esses eram os filhos de espanhóis nascidos na América, mas não podiam ter mestiçagem, ou seja, não podiam ter cruzamento interétnico. Os criollos geralmente eram grandes proprietários de terras, mas também comerciantes. Não podiam ocupar altos cargos administrativos, mas participavam dos cabildos, um órgão que representava o poder local. O modelo de estrutura de classes foi complexo, pois sempre privilegiou os brancos e a superioridade da raça e do sangue, e isso, de imediato, já excluía índios, negros, mestiços e outros cruzamentos raciais. 34 Os mestiços, resultado do cruzamento de brancos com índios, de brancos e negros e de negros com índios, constituíam a maior parcela da população, mas nunca ocupavam os cargos administrativos, no máximo poderiam ser capatazes das fazendas e minas, bem como mão de obra servil e livre. Na base da sociedade estavam os índios, que na época da chegada dos espanhóis eram aproximadamente 30 milhões e ficaram reduzidos a cerca de 10 milhões. Isso comprova o verdadeiro massacre que essa população sofreu ao longo do processo de colonização, pois foram condenados à servidão nas minas e fazendas. Na tentativa de interferir no massacre dos índios, a Espanha criou a Lei das Índias, que procurava proteger a organização comunitária da propriedade e do trabalho indígena. Na prática, porém, essas leis não funcionaram, pois o encomendero que cobrava impostos e estava encarregado de cristianizar os indígenas, na realidade os explorava ainda mais, transformando-os em força de trabalho e quando estes morriam ou deixavam as terras, ficava com elas. Essa mesma Lei da Índias também proibia a mita, mas isso, na prática, também não teve acesso, pois os índios continuavam a ser alocados em trabalhos forçados, o que contribuiu decisivamente para o genocídio desse povo. Na lei foi instituída a igualdade de direitos entre índios e espanhóis, mas isso somente existiu formalmente, pois na realidade os indígenas continuaram a ser mão de obra nas fazendas e minas. A cultura colonial foi uma imposição dos espanhóis sobre os colonizados, e a cristianização, mais especificamente o catolicismo, que era a religião oficial dos espanhóis, a maior delas. Com a imposição do cristianismo as crenças dos nativos foram todas relegadas a segundo plano, algumas proibidas e até consideradas heresias. O clero participou de todo o processo de colonização, em acordo com a Coroa, pois eram os reis que nomeavam os religiosos, bem como cobravam o dízimo. Convém salientar que a Igreja Católica Espanhola foi a que mais praticou a Inquisição, e na América a Santa Inquisição foi realmente de causar medo nos colonos. Qualquer coisa poderia ser considerada como heresia, e os religiosos ainda estavam na caça de judeus, muçulmanos e protestantes. Por outro lado, também foram tenazes na conversão dos índios ao cristianismo. A Igreja Católica foi representada também pela Companhia de Jesus, cujos integrantes eram os que mais se dedicavam a catequizar os índios. Os jesuítas foram implacáveis na difusão do cristianismo e no combate às heresias, sendo os principais responsáveis pela introdução do cristianismo na América, e no seu trabalho de 35 cristianização criaram escolas, batizaram índios e colonos e tentaram de todas as formas livrar os índios da escravidão. Foram os responsáveis pelas missões jesuíticas, como já vimos anteriormente, e obedeciam diretamente ao papa. Nesse sentido, não acatavam as ordens dos bispos e demais autoridades eclesiásticas, e após muito tempo de conflito com as autoridades, foram expulsos da América Espanhola e Portuguesa no século 18. O estilo barroco também esteve presente na América Espanhola, mostrando- se uma fiel reprodução do que estava em voga na Europa e muito divulgado pelos jesuítas a partir do século 17, chegando ao seu auge no século 18. A arquitetura foi decisivamente influenciada pelo barroco: cidades inteiras, como exemplo algumas do Peru, e vários tipos de construções, como igrejas, cadeias, cabildos e mesmo residências particulares, todas seguindo os traços da arquitetura barroca. As igrejas eram as que mais ostentavam as riquezas, todas barrocas, com pinturas e altares recobertos com finas camadas de ouro. O barroco também influenciou a própria literatura, sendo fruto da sociedade colonial, ou seja, as artes em geral eram todas influenciadas por este estilo, que possuía seus próprios fundamentos estéticos. 5.1 O fim do Sistema Colonial Fonte: estudopratico.com.br 36 O período colonial foi o mais longo de toda a história da América Espanhola, pois começou no século 16 e foi até o início do século 19, mais de três séculos de intensa exploração da Espanha em todos os territórios, nos vice-reinados e capitanias gerais. Durante todo o período colonial a produção mineral e agropecuária era destinada à metrópole, além, é claro, dos impostos que os colonos tinham de pagar. Houve inclusive a concorrência desleal dos produtos aqui produzidos com os comprados da Europa. No começo do século 19 iniciaram-se as lutas pela independência, pois os que aqui viviam não suportavam mais a dominação da Espanha e queriam liberdade de comércio e produção. Neste processo de independência podemos destacar o papel fundamental dos criollos, filhos de espanhóis nascidos na América, e que foram os que mais ansiavam pela independência, daí deflagrando todo um processo de lutas contra a Espanha. Este período violento começou no século 19. Nos vários vice-reinados ocorreram lutas pela independência, mobilizadas pelos criollos, para acabar com as velhas estruturas coloniais, mas a Espanha reagiu violentamente a esse processo, pois não desejava o fim do período colonial. Os criollos, por sua vez, se mostraram muito organizados e com força de mobilização, mantendo a luta até conseguirem definitivamente a libertação da Espanha, tendo fim o longo período colonial. 6 A FASE DE INSTABILIDADE POLÍTICO-ADMINISTRATIVA Esta primeira fase após o processo de independências foi marcada por um longo período de reestruturaçãode toda a sociedade, pois ainda não estava definido exatamente como seriam as bases do Estado. Alguns historiadores chamam esta de fase da anarquia, haja vista que ainda não se tinha organizado as formas administrativas, tendo essa expressão sido largamente utilizada na historiografia latino-americana, pois remete a um período difícil no processo político destes novos países independentes, que passaram por um longo processo até atingir um ordenamento estável. Por outro lado, os historiadores também observam que essa desorganização do Estado deu origem ao fenômeno conhecido como caudilhismo, ou seja, o poder concentrado nas mãos de uma figura política centralizadora, denominado caudilho. Isso tudo atestou a incapacidade das classes dominantes de instituir um Estado que 37 realmente ocupasse um lugar de poder, sendo um processo muito longo no decorrer do século 19. Podemos afirmar que após a independência foi marcante a militarização na sociedade latino-americana, pois o Estado ainda não se encontrava estruturado. Os militares desempenhavam vários papéis, e estavam quase sempre presentes nos momentos em que a classe dominante não conseguia um consenso, com cada segmento tentando impor a sua hegemonia sobre as demais classes. Outro papel dos militares era servir como mediadores para acalmar conflitos em alguns países que apresentavam a economia totalmente debilitada em decorrência do processo de independência. A economia foi a que mais se desestabilizou, pelo fato de ter ficado muito tempo sem receber os capitais dos investidores estrangeiros. A situação de instabilidade e as dificuldades de impor uma política estável, transformaram toda a economia da América Latina num verdadeiro caos, uma situação totalmente dramática para esses países livres. A interrupção das exportações foi a principal causa do desequilíbrio econômico. Toda esta instabilidade política e econômica que abateu a América Latina foi decorrente das lutas de poder, criando um clima de pessimismo em vários países, principalmente a partir de 1830, dando margem para que segmentos tradicionais tomassem o poder e constituíssem um Estado totalmente conservador. Podemos citar vários exemplos destes conservadores e centralizadores no poder, tais como: Antonio López de Santa Anna, no México, Juan Manoel Rosas, na Argentina (este foi, no sentido literal da palavra, um verdadeiro caudilho), além de Diego Portales, no Chile. A instabilidade econômica entrou em uma outra fase na segunda metade do século 19, pois a partir desse período foi percebido um acelerado desenvolvimento do setor primário exportador, isso tudo devido a uma melhor organização das economias internas pela intervenção do Estado. Por outro lado, a economia europeia também já se encontrava estável, demandando mais produtos primários e, com isso, fortalecendo a economia dos países exportadores de matérias-primas. Com a recuperação, fez-se necessário uma nova política econômica, com a reformulação do sistema fiscal, pois alguns segmentos sociais mais produtivos defendiam que seria preciso abolir os impostos abusivos que impediam determinadas atividades mercantis. Alguns destes impostos eram resquícios do período colonial, tais como o dízimo e a alcabala, e os segmentos mais liberais defendiam o seu fim, bem como argumentavam que o governo federal não deveria intervir em determinados assuntos 38 econômicos, por exemplo, nas tarifas alfandegárias protecionistas e nos privilégios de certas empresas públicas. 6.1 A Fase de Estabilidade Política e Econômica Na segunda metade do século 19 já se percebia certa estabilidade econômica e política, tendendo a estabilizar as relações sociais, até então conflituosas. Em muitos países os liberais conquistaram o poder e lutaram pelas reformas fundiárias, na tentativa de apropriação de grande parte de terras que os índios ocupavam. Outro projeto seria a formação de um mercado de trabalho, pois no novo contexto econômico era preciso criar uma mão de obra que atendesse as demandas do novo mercado. Os liberais no poder eram a favor da expulsão dos índios das terras comunais e pretendiam também nacionalizar os bens do clero. Eles viam como uma ameaça ao seu poder os privilégios do clero, dado que pretendiam pôr em prática um projeto de modernização econômica e social. Esses liberais denunciavam que o clero não poderia mais ter o poder de decisão na educação e cultura, pois viam isso como uma forma de centralização da liberdade de pensamento. A intervenção dos liberais foi decisiva no novo modelo de Estado, conquistando o poder em diversos países, como na Argentina e no Uruguai onde, a partir de 1830, introduziram políticas de contenção do próprio clero. O outro objetivo dos liberais era a desapropriação das terras indígenas, no que obtiveram muito sucesso em toda a América Latina. No caso específico da Argentina foi estabelecida a campanha do deserto, que ocasionou o total extermínio dos índios que habitavam o sul do país. No caso do Chile, ocorreu uma verdadeira matança de índios, exterminando essa população de nativos. A historiografia latino-americana descreve que a atuação dos caudilhos foi realmente muito controvertida, pois eles representavam algum segmento da classe dominante, não tendo uma legitimidade em relação a todos os grupos sociais. Isso gerou tensão entre os caudilhos, resultando em muitas guerras civis entre eles, que desejavam a concentração de poder em suas mãos. Os caudilhos representavam um segmento mais conservador, que defendia um Estado centralizador, com o poder concentrado num governante com reconhecimento popular. Os caudilhos eram temidos e ao mesmo tempo respeitados e amados, pois eles realmente personalizavam o poder de decisão. A configuração do Estado 39 nacional foi de fato um longo processo, pois os grupos que assumiam o poder não tinham uma visão muito clara do que concretamente era necessário fazer para dar conta de toda uma diversidade socioeconômica vivenciada por esses países. Fonte: www.coladaweb.com Era possível perceber vários estágios de desenvolvimento da própria economia, até se chegar a uma definição mais precisa do capitalismo, pois como o período colonial foi muito amplo, as mudanças também foram lentas. Havia, como declaram os historiadores, um verdadeiro hibridismo na matriz econômica e social. O Estado nacional institui verdadeiramente uma nova matriz econômica, agora baseada no grande latifúndio, daí decorrendo um grande processo de desapropriações de terras, as quais foram parar nas mãos dos latifundiários ligados ao setor primário exportador. O Estado nacional, a partir de suas novas políticas, foi incisivo na efetivação de uma estrutura econômica mais compatível com o mercado externo, conquistando dessa forma uma retomada dos negócios internacionais. O latifúndio foi responsável pelo incremento da produção para exportação, aumentando significativamente a quantidade de produtos. Nesta fase a economia já estava mais estabilizada, mas direcionada para o mercado externo, marcando decisivamente o mercado latino- americano, que adotou uma economia voltada para as exportações. 40 O ordenamento político passou para as oligarquias primário-exportadoras, estabelecendo, desta forma, um modelo de Estado extremamente centralizador, com o poder concentrado nas mãos desse segmento dominante. Neste sentido, podemos perceber que este foi um momento de consolidação do Estado Nacional e para isso também foi importante a configuração de um modelo exportador, que conseguiu alavancar a economia. Com isso, alguns segmentos da classe dominante conseguiram fazer parte do Estado, com a posse de capital suficiente para impor o seu domínio sobre os demais. Sendo assim, configurou-se esse segmento dominante tanto no comando político quanto na economia. Vale destacar que desde
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