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Mulheres trans e o esporte de alto rendimento no Brasil

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Mulheres trans e o esporte de alto rendimento no Brasil: o que a Psicologia tem a ver com isso?
Atualmente, vê-se um anseio e pressão social para a não exclusão das transexuais no âmbito profissional esportivo, jurídico e social. Entretanto, deixam de analisar as consequências que a inclusão no esporte traz perante a identidade biológica masculina que a transexual carregava anteriormente à mudança de seu corpo para adequação do seu gênero. Ou seja, a influência que estes fatores tiveram em seu corpo e resultados em quesitos como força, velocidade, resistência, além de outras características que podem ser mais vantajosas para estas no contexto esportivo, mas indiferentes no contexto social.
Diante do alto índice de violência contra transexuais no Brasil, especialmente em relação as mulheres, principalmente no âmbito doméstico, nota-se a necessidade de inclusão da mulher transexual no rol de vítimas da Lei Maria da Penha (11.340/2006), como pretende o Projeto de Lei do Senado nº 191/2017 que, no momento, aguarda deliberação do Senado Federal. A Lei 11.340/2006 é considerada a medida ideal de política pública de combate à violência contra a mulher. Portanto, vislumbra-se que a necessidade de inclusão da transexual na Lei Maria da Penha não está associada à carga hormonal masculina que esta recebeu antes da mudança de seu gênero sexual, mas sim à violência que sofre pelo simples fato de serem mulheres.
Desse modo, observa-se que a análise do enquadramento da mulher transexual no esporte não deve ser restrita à observância do seu contexto social, uma vez que, diante desta ótica, já é evidente o seu reconhecimento como mulher.
Destaca-se que a homossexualidade também era considerada como um transtorno psicológico desde 1973. Entretanto, diferente da transexualidade, a temática foi retirada em 17 de maio de 1990. No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia já havia deixado de considerar a opção sexual como doença em 1985 (PSICOLOGIA, 2019). Com essa conquista social, o dia 17 de maio ficou marcado como o Dia Internacional Contra a Homofobia.
Observando este marco histórico, nota-se o que o psicanalista Jacques Lacan afirmou em seu estudo da psicanálise, “nós não somos um corpo, nós temos um corpo”. Para melhor entendimento, o professor, médico psiquiatra e escritor Marco Antonio Coutinho Jorge e a psicanalista e escritora Natália Pereira Travassos (2018), afirmam no livro “O corpo entre o sujeito e a ciência”, que há uma distância impossível de ser preenchida entre o sujeito e seu corpo. Após inúmeros anos de estudo, conseguiram compreender que a transexualidade não é um distúrbio mental, mas sim uma disforia de gênero; ou seja, inadequação da sua identidade de gênero ao seu corpo.
Para a ciência, até o dia 20 de maio de 2019, o tema transexualidade era encarado como patologia, como está incluso a histeria, por exemplo. Diante do ‘Estudo Sobre Histeria’, realizado pelos médicos neurologistas Sigmund Freud e Josef Breuer em1895, esta patologia apresenta como pontos fundamentais: que existe um trauma que causa esta doença, fazendo com que os sintomas histéricos fizessem sentido. Assim, estes traumas tinham ligação com impulsos libidinais que haviam sido reprimidos. Portanto, para a cura, seriam necessárias lembranças desse trauma, fazendo com que a catarse fosse o caminho para a cura. Com a lembrança das histórias que estavam por trás dos sintomas, estes seriam eliminados através de sugestão (MOURA, 2009). Logo, a transexualidade se curaria da mesma forma.
Freud, no século XIX, foi aluno do médico e cientista Jean Martin Charcot, que defendia a histeria como sendo um transtorno fisiopático do sistema nervoso. Ainda que o professor e psicanalista conseguisse compreender que existe diferença entre histeria e epilepsia, por exemplo, não conseguia depreender ainda a diferença entre uma patologia do sistema nervoso com a psicossomática, em que se encontra a histeria (MOURA, 2009). Logo, demonstrava-se a escassez científica do estudo sobre comportamento humano e muito distante da compreensão de uma futura disforia de gênero, que se inclui as pessoas transexuais.
Portanto, só no ano de 2019, a ciência apresentou para os Estados Membros que as pessoas transexuais não possuem uma patologia, como tal a histeria e a epilepsia. Este novo tópico está sendo debatido há anos por sociólogos, filósofos, educadores, grandes empresas, pais e médicos de várias áreas que investiram em estudos iniciais para ajudar esta pauta tão importante, motor principal para a inclusão das pessoas transexuais no contexto social, aceitando-as como pessoas normais, assim como qualquer ser humano.
De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM) em sua resolução 2.265/2019, a idade mínima para realizar a terapia hormonal de transição de gênero é de 16 anos. Antes dessa idade, os adolescentes e crianças transgêneros devem ser acompanhados por psicólogos. Foi liberado, em caráter experimental, medicamentos que fazem o bloqueio hormonal da puberdade em jovens menores de 16 anos. Neste caso, deverão ser seguidos os protocolos definidos pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conesp) e realizados em hospitais de referência, sendo que para a intervenção em crianças depende de avaliação médica para cada paciente, feita com base em um método científico (PEBMED, 2020).
O projeto americano chamado TransYouth Project E Gender Development, convidam pais que tenham crianças transexuais para incluírem seus filhos em observações comportamentais, para que seja realizado estudos que facilitem no entender do desenvolvimento de gênero nas crianças.
Este projeto foi criado em 2013, em que se iniciou com crianças entre 3 a 12 anos, que já eram assumidas publicamente como transgênero, tendo um grupo controle de crianças cisgênero. O resultado que pretendia encontrar era a comparação entre as crianças cisgêneros e transexuais.
O estudo chamado “Early Findings From the TransYouth ProjeCT: Gender Development In Transgender Children”, publicado em 2017 e embasado no projeto acima citado, concluiu que crianças transgêneros assemelham a crianças cisgênero. Ao mesmo tempo, foram comparadas crianças transgêneros e seus irmãos cisgênero. O resultado foi que estes irmãos demonstraram que há menos probabilidade de crianças que estereotipem de acordo com o gênero e de haver maior tolerância a não conformidade de gênero em outras pessoas, uma vez que entendem que a experiência de gênero possa variar. Ou seja, conseguem entender que no futuro, uma pessoa que não está em conformidade com o seu corpo, possa mudá-lo ao longo da vida (OLSON, GULGOZ, 2017, tradução nossa).
O estudo comprovou que as visões de gênero sugerem que não é preciso ser transexual para pensar com flexibilidade. Portanto, afirmam que a educação sexual e de gênero irá ser o facilitador para a inclusão das pessoas transexuais no contexto social desde a infância (OLSON, GULGOZ, 2017, tradução nossa). As escolas deveriam ser o principal meio de aprendizado dessa tolerância, tendo em vista que possuem diversas educações, tal como a física, entretanto não possui a emocional.
Conclui-se que, diferentemente da inclusão da mulher transexual no contexto profissional esportivo, a alteração da Lei 11.340/2006, que visa garantir a proteção de TODAS as mulheres, não está associada à carga hormonal masculina que a transexual recebeu antes da terapia hormonal, mas sim à violência que sofrem pelo simples fato de serem mulheres.
Toda mulher, independentemente, da orientação sexual, raça, classe, renda, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa, sendo-lhe asseguradas medidas de proteção em situação de violência e, principalmente, no seu reconhecimento como mulher no mercado de trabalho.