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Trabalho Bens de família

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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
GRADUAÇÃO EM DIREITO
BRENDA P.F. AKERMAN
FELIPPE KALIL DOS SANTOS PANNO
GABRIELA MASTRANGE DE MOURA ALLAM
LUCAS MARINHO DA SILVA
PEDRO ANDRÉ MACHADO DE SOUZA
THAMYRES CARDOSO RIBAS
ANÁLISE DO ARTIGO 3° DA LEI 8.009/90
RIO DE JANEIRO
2020
O bem de família legal está assegurado pela lei 8.009/90 e busca garantir a inalienabilidade e impenhorabilidade do único imóvel próprio do casal ou entidade familiar, protegendo esse imóvel de dívidas civis, fiscais, previdenciárias, comerciais ou de outra natureza, que tenham sido contraídas pelos proprietários e que naquele imóvel residam. É válido destacar ainda que, são garantidos por essa lei apenas os imóveis voltados para moradia e aqueles voltados para fins comerciais. 
É importante destacar que a proteção desse bem de família é automática, sendo desnecessário a execução de qualquer ato pelo proprietário. Além disso, fica garantido também a pluralidade das entidades familiares, que podem ser compostas por diversas formações, como: casais hétero e homossexuais, pais ou mães solteiras com seus dependentes, avós com seus netos, irmãos, madrastas e enteados, dentre outras inúmeras possibilidades. Sendo reconhecido inclusive como bem de família o imóvel pertencente a apenas uma única pessoa.
No caso de uma família possuir mais de um imóvel como residência, será executada a impenhorabilidade daquele imóvel de menor valor, como está disposto no artigo 5º, parágrafo único da lei 8.009/90. Podendo ser executados também, aqueles móveis, veículos e obras de arte considerados de valor excessivo na propriedade, aqueles que não interferem nas necessidades mais urgentes daquela família. 
É importante destacar que o bem de família legal ainda pode ser penhorado por dívidas do próprio imóvel, como taxas de IPTU e condomínio, além de algumas exceções dispostas nos incisos do artigo terceiro dessa lei, que serão esmiuçados abaixo, como: dívida de pensão alimentícia, hipoteca e fiança.
Há ainda a interpretação por parte do STJ de que aquele imóvel alugado que sirva para pagamento de outro também seria impenhorável, apesar de não estar disposto na lei.
Por fim, torna-se importante destacar que é possível a existência de outro tipo de bem de família, chamado de bem de família convencional ou voluntário, que é quando uma família possui mais de um bem e pode escolher qual será o imóvel destinado ao bem de família. É necessário observar ainda que o bem de família convencional só é válido a partir do registro em cartório de imóveis, não sendo regulado pela lei 8.009/90.
Ao discorrer sobre o bem de família legal, depara-se com uma unidade de imóvel residencial de um casal e/ou entidade familiar. Em regras gerais, esse bem é impenhorável e sua proteção está disposta na Lei n° 8.009/90. Este bem não responderá por qualquer dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de qualquer outra natureza. Todavia, o artigo 3° da lei supramencionada, apresenta hipóteses excepcionais (BRASIL, 2002). O inciso I do artigo 3° apresentava a hipótese de penhorabilidade do bem de família antes da lei complementar 150/2015 da seguinte forma:
a) Em virtude dos créditos dos trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias. Esse inciso acarretava a possibilidade de penhorar a casa do “patrão” em razão de dívidas trabalhistas que este pudesse vir a ter com a empregada doméstica ou, por débitos relacionados à contribuição previdenciária da funcionária.
O inciso I do artigo 3° da Lei n° 8.009/90 foi revogado pela LC 150/2015 que dispõe sobre a relação de trabalho das empregadas domésticas. Com essa alteração, o bem de família não pode mais ser penhorado devido as dívidas de trabalhadores da própria residência ou relativas às contribuições previdências que se sucedem. É importante perceber, entretanto, que se o devedor possuir mais de um bem imóvel, somente um será considerado bem de família, podendo então, ser penhorado em decorrência de dívidas dos trabalhadores domésticos. Além disso, bens móveis que não são considerados necessários podem igualmente ser penhorados (FREITAS, 2015). 
Por fim, vale falar que a revogação do inciso I do artigo 3° da lei sobre bem de família, é válida e aplica-se as dividas surgidas previamente à Lei Complementar 150/2015, caso a execução encontre-se em curso. Conclui-se, por conseguinte, que o inciso I da Lei n°8.009/90 que trata o bem de família assinalava a penhorabilidade do bem em questão no caso de dívidas do “patrão” em relação aos empregados domésticos e suas respectivas contribuições previdenciárias. Esse inciso foi revogado pela lei complementar número 150 de 2015, do qual dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico (BRASIL, 2015), excluindo a hipótese de penhorabilidade prevista no inciso I desta lei. Observa-se este fato a seguir:
“Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;                       (Revogado pela Lei Complementar nº 150, de 2015) (BRASIL, 1990) ”
O inciso II prevê a penhora para os casos decorrentes de crédito do financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel, evitando-se assim o enriquecimento sem causa. O STJ vem entendendo que “a exceção à impenhorabilidade prevista no artigo 3º, II, da Lei n. 8.009/90 abrange o imóvel objeto do contrato de promessa de compra e venda inadimplido. Vale explicar que o inciso II do artigo 3º ressalva ser possível a penhora quando há pedido do titular do crédito decorrente de financiamento, o que abarca operações de crédito destinadas à aquisição ou construção do imóvel residencial, podendo essas serem stricto sensu – decorrente de operação envolvendo uma financiadora – ou em sentido amplo – nas quais se incluem o contrato de compra e venda em prestações, o consórcio ou a empreitada com pagamento parcelado durante ou após a entrega da obra.
“II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; ”
O inciso III trata da penhora para o credor de pensão alimentícia, por possuir um caráter alimentar e ser uma questão de sobrevivência de quem necessita dos alimentos, de modo que, desde a edição da Lei nº 13.144/15, estão resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida. Observa-se que a proteção de um patrimônio mínimo vai ao encontro da despatrimonialização das relações civis, haja vista que põe em primeiro plano a pessoa e suas necessidades fundamentais. Contudo, o afastamento da proteção do bem de residência familiar, no caso do credor de alimentos, não significa mínimo indispensável, e as coisas não têm qualquer sentido sem essa dignidade funcional. Ao contrário, o prestígio ao credor de pensão é a valorização da solidariedade familiar, que se revela nos alimentos.
“III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; ” (Redação dada pela Lei nº 13.144 de 2015)
A impenhorabilidade, como dispõe o art. 3.º da Lei n. 8.009/90 possui exceções, como se pode observar no rol previsto de seu artigo. 
O inciso IV considera que o bem de família pode ser penhorado para a quitação de débitos derivados de impostos prediais ou territoriais, taxas e contribuições, enquanto que o inciso V garante a penhorabilidade do bem de família em casos em que o mesmo bem seja hipotecado, isto é, se a família der um bem imóvel como garantia de algum débito, hipotecar e acabar este débito não sendo totalmente satisfeito, esse bem poderá ser penhorado.
“IV - para cobrança de impostos,predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; ”
É mister ressaltar a lei referida trouxe sérias discussões, visto que, algumas das exceções não acompanharam a ideia geral do legislador que acabou divergindo da finalidade social em que se orienta o bem de família. De um lado, o inciso IV abrange estritamente os tributos que guardam relação com o imóvel residencial da família. Assim sendo, ele só perderá a imunidade e se tornará passível a penhora nos casos de débito de IPTU (Imposto Predial e Territorial e Urbano), créditos e fiscais resultantes de foro ou laudêmio. Por outro, podemos apontar um suposto equívoco no inciso V, que deixa de proteger o imóvel sede da família por execução advinda de empréstimo que tenha o imóvel sido oferecido como garantia, haja vista que o contrato de hipoteca permite, tanto quanto qualquer outro título de crédito, ou mal uso do capital contra a segurança econômica da família e da sociedade, acaba trazendo tal que equívoco pois é justamente isso que se deseja evitar com a lei. A norma possui um sentido social, logo a coerência deveria ser não permitir que o imóvel seja objeto de hipoteca abrindo assim possibilidade da apreensão judicial. 
Apesar das críticas feitas a lei, como aquela que protegeria os maus pagadores, suas exceções não podem ser vistas como um recurso para fugir das obrigações. O que podemos concluir é que a impenhorabilidade não é absoluta, todavia o foco desta lei deve ser assegurar a dignidade do devedor e de seus familiares. Por fim, “a banalização da honestidade deve ser combatida irrestritamente pelo Poder Judiciário, fechando o cerco aos maus pagadores, sem desrespeitar as determinações constitucionais de proteção à moradia e a família, sendo a constrição de parte do bem, que não restrinja a utilização da residência da família, uma alternativa ao cumprimento das obrigações pecuniárias do devedor e a moralização do sistema que, em regra, privilegia os desonestos de plantão. ” (JUNIOR, 2011)
O inciso VI permite a penhora do bem de família quando o imóvel foi adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. Ressaltando-se que este inciso é o mais justo entre os previstos no artigo terceiro, pois prevê a possibilidade de a vítima ser indenizada, bem como servir de mais um tipo de sanção ao ofensor pela prática de um ilícito penal, além do que se evita o enriquecimento ilícito.
“VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. ”
No artigo 3°, inciso VII, posteriormente inserido pela Lei 8.245/91, podemos observar uma das hipóteses excludentes da impenhorabilidade, que é a garantia do fiador pelo cumprimento das obrigações em contratos de locação, como um meio de estimular o mercado mobiliário e a celebração de contratos de locação, sendo uma garantia mais acessível e sem custos para o locatário.
Esse inciso prevê que na medida em que o indivíduo aceita a sua condição de fiador pelo cumprimento das obrigações em contratos de locação, assume espontaneamente o risco de sofrer constrição de seu único imóvel. Devendo então, suportar as consequências do inadimplemento do locatário, ainda que isso signifique a supressão de seu direito à moradia. Todavia, por mais que seja previsto a penhora de bem de família para satisfazer fiança concedida em contrato de locação, o mesmo não se abrange para contratos de locação comercial. 
“VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. ” (Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991) 
Atualmente, há uma importante discussão sobre a inconstitucionalidade da norma, presente neste inciso, por duplo fundamento: ofensa ao direito de moradia e à isonomia. Pois, tendo em vista o princípio isonômico, “onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de Direito”, o citado dispositivo não foi recebido pela EC 26, de 2000, que inclusive menciona, expressamente, no artigo 6° da CF, o direito à moradia como direito fundamental de segunda geração. Entretanto, o entendimento majoritário na jurisprudência ainda tem sido pela constitucionalidade.
REFERÊNCIAS: 
BRASIL. Lei n° 8.009, de 29 de mar. de 1990. Impenhorabilidade do bem de família, Brasília, DF. 
BRASIL. Lei Complementar n° 150, de 1 de jun. de 2015. Do contrato de trabalho doméstico, Brasília, DF. 
CHATER, Priscilla. Afinal, o bem de família do fiador na locação é passível de penhora?. Migalhas, 2018. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/285959/afinal-o-bem-de-familia-do-fiador-na-locacao-e-passivel-de-penhora>. Acesso em: 05 abril 2020.
DIFERENÇAS ENTRE BEM DE FAMÍLIA LEGAL E CONVENCIONAL. Dom Total, 2016. Disponível em: <https://domtotal.com/noticia/1093983/2016/11/diferencas-entre-bem-de-familia-legal-e-convencional/>. Acesso em: 04 abril 2020.
FREITAS, Danielli. JUSBRASIL: Dizer o direito – LC 150/2015 proíbe penhora do bem de família para pagamento de dívidas trabalhistas ou previdenciárias do empregador com empregadas domésticas, 2015. Disponível em: < https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/noticias/196236182/dizer-o-direito-lc-150-2015-proibe-penhora-de-bem-de-familia-para-pagamento-de-dividas-trabalhistas-ou-previdenciarias-do-empregador-com-empregadas-domesticas>. Acesso em: 02 abril 2020. 
Impenhorabilidade do bem de família a luz da Lei nº 8.009/90. Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 3, maio 2012.
JUNIOR, Adelino Venturi. Aos credores de plantão. Venturi Silva & Huttner Advogados Associados. Disponível em <http://www.venturisilva.adv.br/aos-credores-de-plantao-2/>. Acesso em 05 de abril de 2020. 
MELLO, Marco Aurélio Bezerra. Ainda sobre a penhorabilidade do imóvel de moradia do fiador na locação imobiliária urbana. GENJURIDICO, 2017. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2017/01/23/ainda-sobre-penhorabilidade-do-imovel-de-moradia-do-fiador-na-locacao-imobiliaria-urbana/>. Acesso em: 04 abril 2020.
NETO, Orlando Martins Quintino. Bem de família pode ser penhorado por dívida de obra do próprio imóvel. Teixeira Fortes Advogados Associados, 2019. Disponível em: <https://www.fortes.adv.br/pt-BR/conteudo/artigos-e-noticias/876/bem-de-familia-pode-ser-penhorado-por-divida-de-obra-do-proprio-imovel.aspx>. Acesso em 04 abril 2020.
SILVA, Regina Beatriz Tavares da Silva. A Lei 13.144/2015 e a conciliação dos interesses juridicamente protegidos: impenhorabilidade do bem de família, credor de pensão alimentícia e regime de bens no casamento e na união estável. Revista dos tribunais, 2015. Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RTrib_n.962.06.PDF>. Acesso em: 05 abril 2020.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único – 10. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020. (p. 333-338).

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