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SUMÁRIO 1. Introdução ..................................................................... 3 2. Epidemiologia .............................................................. 3 3. Revisão de anatomia ................................................ 3 4. Fisiopatologia .............................................................. 6 5. Classificação: .............................................................. 7 6. Diarreia aguda ...........................................................10 7. Abordagem ao paciente com diarreia aguda .................................................................................16 8. Diarreia crônica .........................................................21 9. Diarreias secretórias ...............................................29 10. Diarreias inflamatórias ........................................32 11. Diarreias aquosas funcionais ...........................33 12. Abordagem de um paciente com diarreia crônica ...............................................................................35 Referências bibliográficas ........................................39 3DIARREIA 1. INTRODUÇÃO O ritmo intestinal normal varia de três vezes por semana a três vezes por dia. O aumento da frequência por mais de três vezes ao dia, com di- minuição da consistência das fezes, que provocam urgência ou descon- forto abdominal, provavelmente é um quadro de diarreia. A consistência é determinada pela relação entre água fecal e a capacidade de retenção de água dos sólidos insolúveis fecais. É importante ter em mente que diar- reia é diferente de urgência fecal e de pseudodiarreia. A primeira, é a eliminação involuntária das fezes, geralmente por distúrbios neuro- musculares ou problemas estruturais anorretais, sem alteração do peso e consistência. Já o último, é a elimina- ção frequente de pequenos volumes de fezes, geralmente com urgência, sem alteração também da consistên- cia e do peso. 2. EPIDEMIOLOGIA O Global Burden of Disease Study constatou que a diarreia foi a nona principal causa de morte em todo o mundo em 2015. A maioria dos ca- sos de diarreia está associada a ali- mentos e fontes de água contamina- dos, e mais de 2 bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso ao saneamento básico. Mais de 1 bilhão de pessoas, no mundo, sofrem um ou mais episódios de diarreia agu- da a cada ano. Dos 100 milhões de pessoas acometidas anualmente por diarreia aguda nos EUA, quase me- tade tem de restringir as atividades, 10% consultam um médico, cerca de 250 mil precisam de hospitalização e aproximadamente 5 mil morrem. A diarreia infecciosa aguda continua sendo uma das causas mais comuns de mortalidade nos países em de- senvolvimento, principalmente entre crianças pobres. A diarreia aguda, re- corrente, em crianças de países tro- picais resulta em enteropatia ambien- tal com impactos de longo prazo nos desenvolvimentos físico e intelectual. A doença diarreica ocorre com frequ- ência inicial em países com recursos limitados, sobrepostos a casos epidê- micos de diarreia, disenteria ou diar- reia aquosa. 3. REVISÃO DE ANATOMIA O intestino delgado, formado pelo duodeno, jejuno e íleo, é o princi- pal local de absorção dos nutrientes dos alimentos absorvido. Estende- -se desde o piloro do estômago até a junção ileocecal, onde o íleo se une ao ceco do intestino grosso. O duo- deno é a parte mais curta do intestino delgado com cerca de 25cm, sendo também a mais larga e fixa. Possui trajeto em forma de C ao redor da ca- beça do pâncreas. Tem início no pilo- ro do estômago e termina na flexura 4DIARREIA duodenojejunal no lado esquerdo. A maior parte do duodeno está fixada pelo peritônio a estruturas na parede posterior do abdome e é considera- da parcialmente retroperitoneal. O duodeno é dividido em quatro partes parte superior, descendente, inferior e ascendente. A segunda parte do intestino delgado, o jejuno, começa na flexura duode- nojejunal, onde o sistema digestório volta a ser intraperitoneal. A tercei- ra parte do intestino delgado, o íleo, termina na junção ileocecal, a união da parte terminal do íleo e o ceco. Juntos, o jejuno e o íleo têm 6 a 7 m de comprimento, o jejuno representa cerca de dois quintos e o íleo cerca de três quintos da parte intraperitoneal do intestino delgado. A maior parte do jejuno está situada no quadrante superior esquerdo (QSE) do compar- timento infracólico, ao passo que a maior parte do íleo está no quadrante inferior direito (QID). A parte terminal do íleo geralmente está na pelve, de onde ascende, terminando na face medial do ceco. Embora não haja uma linha de demarcação nítida entre o je- juno e o íleo, eles têm características distintas, que são muito importantes e estão descritas na tabela abaixo: CARACTERÍSTICAS JEJUNO ÍLEO Cor Vermelho forte Rosa pálido Calibre 2 - 4 cm 2 – 3 cm Parede Espessa e grossa Fina e leve Vascularização Grande Pequena Vasos retos Longos Curto Arcos Algumas alças longas Muitas alças curtas Gordura no mesentério Menos Mais Pregas circulares Grandes, altas e próximas Baixas e espessas; ausentes na parte distal Nódulos linfoides (placas de Peyer) Poucos Muitos Tabela 1. Características diferenciais entre jejuno e íleo. 5DIARREIA Figura 1. Jejuno Figura 2 Íleo. Fonte: Netter, Frank H. Atlas De Anato- mia Humana. Gen Guanabara Koogan. 7ª Ed. 2019 Já o intestino grosso (formado por apêndice vermiforme, colo ascen- dente, transverso, descendente, sig- moide, reto e canal anal) é o local de absorção de água dos resíduos in- digeríveis do quimo líquido, conver- tendo em fezes semissólidas, que são temporariamente armazenadas e acumuladas até que haja defecação. O intestino grosso se diferencia do delgado por presença de algumas estruturas, como apêndices omen- tais; as 3 tênias do colo, mesocólica, omental e livre; presença de sacula- ções e o maior calibre. O intestino grosso começa na papila ileal, mas sua primeira parte, o ceco, é uma bolsa pendente inferior à papila ileal. O ceco semelhante a uma bolsa e a parte mais larga do intestino gros- so é completamente intraperitoneal e não tem mesentério, de modo que é móvel na fossa ilíaca direita. A papi- la ileal é uma associação de válvula e esfíncter fraco, cuja abertura ativa periódica permite a entrada do conte- údo ileal e forma uma válvula unidire- cional essencialmente passiva entre o íleo e o ceco, que impede o refluxo. O apêndice vermiforme é um divertí- culo intestinal, rico em tecido linfoide, que entra na face medial do ceco, em geral profundamente à junção do ter- ço lateral com os dois terços mediais da linha espinoumbilical. Na maioria das vezes, o apêndice vermiforme é retrocecal, mas em 32% dos casos desce para a pelve menor. O colo tem 6DIARREIA quatro partes: ascendente, transver- so, descendente e sigmoide. O colo ascendente é uma continuação su- perior, secundariamente retroperito- neal do ceco, que se estende entre o nível da papila ileal e a flexura direita do colo. O colo transverso, suspenso pelo mesocolo transverso entre as flexuras direita e esquerda do colo, é a parte mais longa e mais móvel do intestino grosso. O nível de descida depende principalmente do biotipo. O colo descendente ocupa posição secundariamente retroperitoneal en- tre a flexura esquerda do colo e a fos- sa ilíaca esquerda, onde é contínuo com o colo sigmoide. O colo sigmoi- de, com formato de S típico, suspenso pelo mesocolo sigmoide, tem compri- mento e disposição muito variáveis, terminando na junção retossigmoi- dea. As tênias, saculações e apên- dices omentais terminam na junção localizada anteriormente ao terceiro segmento sacral. Figura 3. Intestino grosso. Fonte: Netter, Frank H. Atlas De Anatomia Humana. Gen Guanabara Koogan. 7ª Ed. 2019 4. FISIOPATOLOGIA A maioria dos casos de diarreia são decorrentes da alteração do trans- porte de líquidos e eletrólitos e pouco dependente da motilidade da musculatura lisa. Normalmente, cercade 9L penetra no trato gastrointesti- nal em um dia, sendo apresentado ao duodeno, cerca de 2 L. Apenas 0,2L é excretado nas fezes. Se qualquer perturbação no transporte de eletró- litos ou a presença de solutos não 7DIARREIA absorvíveis no lúmen intestinal redu- zissem a capacidade de absorção do intestino delgado em 50%, o volume de liquido apresentado diariamente ao cólon normal excederia sua capa- cidade de absorção diária máxima de 4 L. Isso resultaria em uma excreção de fezes de l.000 mL, que, por defi- nição, é diarreia. Da mesma forma, se o cólon encontra-se danificado de tal forma que não pode absorver nem mesmo o volume de 1,5 L nor- malmente apresentado pelo intestino delgado, restará um volume fecal su- perior a 200 ml/24 horas - também sendo definido como diarreia. A nível celular, ocorre excesso de lí- quido no lúmen intestinal quando há deficiência na capacidade de trans- porte de eletrólitos do intestino del- gado ou grosso ou quando cria-se um gradiente osmótico desfavorável (inibição da absorção de Na+ ou se- creção ativa de Cl-) que não pode ser suplantado pelos mecanismos nor- mais de absorção de eletrólitos. Na membrana basolateral dos enteró- citos, a atividade da bomba de Na+/ K+ ATPase mantém baixas concen- trações intracelulares de Na+. Isto força um fluxo absortivo contínuo deste eletrólito junto com água. SE LIGA! Se solutos pouco absorvíveis ou não absorvíveis estão presentes no lúmen, como lactose em indivíduos com deficiência de lactase, ou mesmo pre- sença de substâncias, como a entero- toxina da E. coli e toxina da cólera, os mecanismos de absorção de sódio serão incapazes de criar esse gradiente favo- rável, levando a permanência de líquido no lúmen, formando a base para diar- reia osmótica e secretória. A diarreia inflamatória se caracteri- za por lesão e morte de enterócitos, atrofia de vilosidades e hiperplasia de criptas. As criptas hiperplásicas preservam sua capacidade secretó- ria de Cl-. Em inflamação grave, ocor- re extravasamento linfático, além da ativação de vários mediadores infla- matórios, que promovem aumento da secreção de Cl-, contribuindo para a diarreia. A interleucina 1 (IL-1) e o fa- tor de necrose tumoral (TNF) também são liberados no sangue, causando febre e mal-estar. 5. CLASSIFICAÇÃO: A classificação das diarreias pode ser feita com base no tempo de duração do sintoma, nas características clíni- cas e topográficas e na fisiopatologia. Assim, diarreias agudas são aquelas com duração menor que 2, sendo a causa mais comum por infecções. A crônica acima de 4 semanas. Por fim, a diarreia persistente, aquela de du- ração entre 2 e 4 semanas. Quanto 8DIARREIA ao mecanismo fisiopatológico, são ca- tegorizadas em osmótica, secretória, inflamatória, disabsortiva e funcional, sendo as 4 primeiras diarreias orgâni- cas e a última não orgânica. Quanto à classificação padrão: < 2 semanas Entre 2 – 4 semanas > 4 semanas AGUDA PERSISTENTE CRÔNICA Quanto às características clínicas e topográficas, é dividida em alta (do delgado) e baixa (cólon), e diferencia- da por meio do volume por evacuação, frequência, presença de tenesmo e restos alimentares/sangue e muco, conforme quadro a baixo: CARACTERÍSTICAS ALTA BAIXA Volume por evacuação Grande Pequeno Frequência Baixa Alta ( >10x/dia) Tenesmo Não Sim Achados Restos alimentares Sangue, muco e/ou pus Tabela 2. Quanto a classificação fisiopatológica: Diarreia osmótica Ocorre por acúmulo de solutos os- moticamente ativos não absorví- veis no lúmen intestinal. Assim, ocor- re retenção de líquidos intraluminais e consequentemente diarreia. É a partir desse mesmo mecanismo que fun- cionam os laxativos. Uso de antibióti- cos também podem causá-la. As ca- racterísticas desse tipo de diarreia é o fato de ter gap osmolar alto, melhora em jejum e com suspensão de subs- tâncias osmóticas. Ex.: deficiência de 9DIARREIA dissacarídeos, alta ingestão de car- boidratos pouco absorvíveis (sorbitol, manitol, lactulose), abuso de laxativos. CONCEITO: O que é gap osmolar fecal? Trata-se de uma estimativa da contri- buição de eletrólitos para a retenção de água no lúmen intestinal. Fórmula: 290- 2x (Na+ + K+) fecal. Diarreia secretória Distúrbio no processo hidroele- trolítico pela mucosa intestinal, por meio do aumento de secreção de íons e água para o lúmen ou inibição da absorção, por meio de drogas ou toxinas. Diferentemente da osmóti- ca, tem gap osmolar baixo, não me- lhora com jejum e é responsável por um grande volume de fezes aquosas. Esse é o tipo de diarreia provocada por E. coli enterotoxigênica, Vibrio cholerae, Salmonella sp. SE LIGA! A análise de eletrólitos fecais e gap osmolar é de grande importância no diagnóstico diferencial da diarreia crô- nica. Em pacientes com diarreia osmó- tica o gap osmolar é maior do que 125 mosm/Kg, nesse caso a osmolaridade é dependente de outras substâncias nas fezes que não eletrólitos, já quando o gap osmolar é menor do que 50 mosm/ Kg o diagnóstico provável é de diarreia secretória. Em processos mistos o gap varia entre 50 a 124 mosm/Kg. Diarreia inflamatória Como o próprio nome induz, é cau- sada por uma alteração inflamatória, levando a produção de muco, pus e/ ou sangue nas fezes. Pode ter alte- ração laboratorial da calprotectina ou lactoferrina fecal. Entre as causas, destacam-se a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa. Diarreia funcional Nesse tipo de diarreia, a absorção e secreção estão normais, porém não há tempo suficiente para ocorrer a absorção desses nutrientes corre- tamente. É um diagnóstico de ex- clusão, ou seja, quando ausência de doença orgânica justificável. Ocor- re por hipermotilidade intestinal. Exemplos: síndrome do intestino irri- tável e diarreia diabética (neuropatia autonômica). Diarreia disabsortiva Também conhecido como esteator- reia. A causa dessa diarreia está as- sociada a baixa absorção dos lipídios no intestino delgado, ou seja, pode ser causada também por uma síndrome de má absorção ou por uma síndrome de má digestão. Por exemplo doença celíaca, doença de Crohn, doença de Whipple, giardíase, estrongiloidíase e linfoma intestinal. 10DIARREIA 6. DIARREIA AGUDA Inicialmente, as primeiras suspeitas para um quadro de diarreia aguda são infecções e intoxicação alimen- tar. Aproximadamente 80% das diar- reias agudas se devem a infecções por vírus, bactérias, helmintos e pro- tozoários. O restante ocorre devido à ingestão de medicamentos, açúcares pouco absorvidos, impactação fecal, inflamação pélvica ou isquemia intes- tinal. Assim, as principais etiologias de gastroenterite são por: OSMÓTICA • Acúmulo de solutos osmoticamente ativos • Gap osmolar fecal alto DIARREIA DISABSORTIVA • Síndrome de má absorção • Esteatorreia INFLAMATÓRIA • Inflamação com possível eliminação de muco, pus ou sangue FUNCIONAL • Diagnóstico de exclusão • Hipermotilidade intestinal SECRETÓRIA • Distúrbio do transporte hidroeletrolítico • Gap osmolar fecal baixo 11DIARREIA A maioria das diarreias infecciosas é adquirida pela transmissão fecal-o- ral pela água, alimentos ou contato interpessoal. Pacientes com diarreia infecciosa se queixam de náuseas, vô- mitos e dor abdominal, apresentando diarreia aquosa, com má absorção ou com sangue (disenteria). Como visto acima, são diversas as etiologias pos- síveis para a diarreia. Então, por isso é importante buscar as característi- cas da gastroenterite, como o tempo de incubação, fonte de contaminação e fatores de risco. Assim, cada fator está mais relacionado a um tipo de patógeno, como podemos ver abaixo: Norovírus Adenovírus Rotavírus Astrovírus Salmonella Clostridium difficile Campylobacter S. aureus Shigella Yersínia E. colli Vibriocholerae Giárdia Entamoeba hitolytica Ascaris Necator americanus Estrongiloide Ancylostoma duodenalis VÍRUS BACTÉRIA PROTOZOÁRIOS HELMINTOS 12DIARREIA Gastroenterite viral São a causa mais comum de diar-reias infecciosas, sendo o mais im- portante o rotavírus. Esse promo- ve diarreia predominantemente em bebês, comumente no inverno, mas também diarreia aguda não sazo- nal, particularmente em idosos. O norovírus é o que causa mais quadro de gastroenterite em adultos. O rotavírus invade células intestinais a partir de receptores específicos e em seguida, escapa do endossomo, ficando livre no citosol para se mul- tiplicar. Em seguida, passa a produzir uma proteína chamada de NSP4, que bloqueiam alguns transportadores Alimentos e água contaminada Fatores de risco Viajantes Uso recente de antibióticos Asilos Creches Imunodeficiências Piscinas Promiscuidade sexual E. coli, norovírus, shigella E. coli, Campylobacter, Shigella, Salmonella Colite pseudomembranosa Shigella, giardíase, criptosporidiose, rotavirose Infecções oportunistas Giardíase, criptosporidiose Patógenos de transmissão fecal-oral 13DIARREIA como o SGLT1, o que interrompe a absorção de sódio, glicose e agua, provocando diarreia. Além disso, ati- va vias de sinalização, como a do AMP cíclico, que aumentam os níveis de cálcio e promovem hipersecreção e diarreia. Gastroenterite bacteriana O principal agente é a E. coli. Essa é uma bactéria cólonizadora da flo- ra intestinal, porém existem algumas formas patogênicas que podem ser adquiridas e causar diarreias. Essa distinção entre cepas patogênicas e não patogênicas é feita pela cultura das fezes. SE LIGA! E. coli enterotoxigênica (ETEC): É a principal causadora da diarreia dos viajantes. Essa se adere a mucosa intes- tinal, produz toxinas termoestável e ter- mosensível que estimulam a secreção de água para o lúmen intestinal. Como não ultrapassa a mucosa e não promove lesão, a diarreia cursa sem muco, pus ou sangue, porém é caracterizada por ser explosiva e de grande volume. Dura cer- ca de 5 dias. E. coli enteropatogênica (EPEC): Tem capacidade de se aderir a mucosa intestinal, promovendo alteração estru- tural das células, com modificação do citoesqueleto e apagamento das vilosi- dades. A absorção e secreção ficam pre- judicadas, levando a uma diarreia bem aquosa. É comum surtos dessa cepa em crianças, principalmente nas que não são amamentadas. E. coli enterohemorrágica (EHEC): Se adere a mucosa e é capaz de produ- zir toxinas como a “shiga-like”. Essa to- xina é a responsável por causar a colite hemorrágica e manifestações sistêmi- cas. Cursa com diarreia sanguinolenta, dor abdominal, podendo apresentar fe- bre discreta. Após 1 a 2 semanas, pode cursar com síndrome hemolítico-urêmi- ca (anemia hemolítica microangiopática, insuficiência renal e plaquetopenia). E. coli enteroinvasiva (EIEC): Penetra na mucosa intestinal e se re- produz nos enterócitos. Leva a lesão das células cursando, inicialmente, com diarreia aquosa e, posteriormente, san- guinolenta. Portanto, leva a um quadro de disenteria. E. coli enteroagregativa (EAEC): Não se sabe exatamente o mecanismo, foi a última cepa descoberta, leva a uma diarreia persistente em crianças e em pacientes com HIV. A Shigella é uma bactéria Gram-ne- gativa, resistente ao suco gástrico. Encontrada em alimentos e água con- taminadas. Existem quatro fases: in- cubação, durando de 1 a 4 dias; diar- reia aquosa inicial, disenteria e fase pós-infecciosa. As principais com- plicações são intestinais (megacólon tóxico, perfuração intestinal, prolapso intestinal) ou metabólicas (hipogli- cemia, hiponatremia, desidratação). O tratamento de escolha é feito com ciprofloxacino. A Salmonella spp é uma bactéria gram negativa que induz sua fagoci- tose pela ação de um sistema que in- jeta algumas moléculas nas células do 14DIARREIA intestino. Essas moléculas injetadas causam uma polimerização da actina e mudança do metabolismo da nossa célula intestinal de forma a fagocitar a Salmonella. Essa forma de invasão é chamada de gatilho. Após ser fagoci- tada, a Salmonella fica dentro do en- dossomo, que se funde com os lisos- somos, formando o fagolisossomo. A Salmonella não morre lá dentro pois começa a produzir o SPI II, que injeta novas proteínas que fazem a Salmo- nella sobreviver. E, além disso, o SPI II também produz proteínas que mode- lam a atividade de microtúbulos das nossas células. Basicamente, eles incentivam que as cinesinas (prote- ínas motoras) puxem o fagolisosso- mo com a Salmonella dentro até para próximo das extremidades da célula intestinal, favorecendo sua dissemi- nação. A salmonelose pode levar a febre tifoide ao ganhar a circulação através de macrófagos, por isso, todo paciente com suspeita de salmonella, deve pesquisar o sangue. O S. aureus é capaz de produzir uma toxina termoestável. A intoxicação alimentar está intimamente associa- da a essa bactéria, com em maionese, cremes, ovos. Os sintomas se iniciam após algumas horas da ingestão do alimento, cursando com diarreia volu- mosa, náuseas, vômitos e cólicas. A colite pseudomembranosa é cau- sa pela bactéria Clostridium difficile. Trata-se de uma bactéria gram-po- sitiva cujos esporos são observados principalmente em ambiente hospita- lar. O risco de contaminação também está relacionado a idade avançada, doença de base grave, cateteres, anti- ácidos, cirurgias gastrointestinais. Os esporos germinam no delgado e cólo- nizam o cólon. Essas vivem pacifica- mente até que uma causa qualquer, como uso de antibióticos, destrua a flora e as clostidium se multiplica, causando a doença. Essas produzem duas toxinas, A e B, que promovem lesão direta do cólon e alteração do citoesqueleto, respectivamente. As- sim, para a doença é necessário a contaminação pela bactéria, uso de antibióticos, como cefalosporinas, que irão alterar a flora, e a presença de IgG contra a toxina A. Os antibióti- cos que estão relacionados ao desen- volvimento da doença estão listados no quadro abaixo como associados com a doença, ocasionalmente asso- ciados e raramente associados. 15DIARREIA O quadro clínico desses pacientes varia de gravidade, podendo ter apre- sentação clínica desde uma diarreia sem colite até uma colite fulminante. Inicialmente, apresenta diarreia nos 4 a 9 dias após o início do uso de an- tibióticos. Quase nunca apresenta sangue visível, possui um odor carac- terístico e aumento da frequência das evacuações, podendo apresentar até mesmo 20 evacuações por dia. Uma das apresentações se caracterizam por formação de pseudomembranas que cobrem o cólon. Figura 4. Imagem endoscópica de colite pseudo- membranosa (placas esbranquiçadas ou amareladas). Imagem cedida pela divisão de gastroenterologia HC-FMUSP O diagnóstico da colite pseudomem- branosa é feito através de uma com- binação de critérios: (1) Diarreia com mais de 3 episódios de fezes não Clindamicina Amoxicilina Ampicilina Cefalosporinas Fluoroquinolonas ASSOCIADOS OCASIONALMENTE ASSOCIADOS RARAMENTE ASSOCIADO Sulfonamidas Macrolídeos Trimetoprim Outras penincilinas Aminoglicosídeos parenterais Cloranfenicol Tetraciclina Metronidazol Vancomicina 16DIARREIA moldadas por dia, durante um tem- po de 2 dias e que não possua outra causa; (2) Detecção de toxina A e B nas fezes ou detecção de C. diffici- le na coprocultura/PCR ou pseudo- membranas na endoscopia do cólon. O tratamento vai se iniciar suspen- dendo o antibiótico que causou o quadro. Depois a conduta irá se base- ar em infecção primária ou recorrente. Geralmente, no tratamento utiliza-se metronidazol em casos leves a mode- rados e vancomincina ou fidaxomici- na, em casos graves, por 10 dias. Gastroenterites parasitárias A grande parte dos parasitos estão associados a diarreias persistentes à crônicas. Portanto, serão citadas nesse Super Material em diarreias crônicas. Causas medicamentosas Os medicamentos mais associados a quadros de diarreia são os antibi- óticos, particularmente clindamicina, ampicilina, cefalosporina, eritromici- na; antiinflamatórios não esteroidais; anti-hipertensivos, como betabloque- adores,hidralazina, IECA, diuréticos. 7. ABORDAGEM AO PACIENTE COM DIARREIA AGUDA Inicialmente, uma anamnese bem fei- ta e um exame físico bem detalhado vão ser imprescindíveis para levan- tar suspeitas da etiologia da diarreia. Para isso, identificar: • Volume das evacuações • Frequência das evacuações • Sangue, muco ou pus nas fezes • Características das fezes (colora- ção, odor, consistência) • Presença de febre • Dor abdominal associada, náuse- as, vômitos ou outros sintomas • Ausência de melhora após 48h • Surtos na comunidade • Viagens recentes • Uso recente de antibióticos • Idade do indivíduo (> 70 anos) e imunocomprometidos (ambos si- nais de alarme) A partir disso, a base para o diagnós- tico é a cultura das fezes, para bac- térias e vírus, parasitológico de fezes e imunoensaios para toxinas de vírus, bactérias e protozoários. Além dis- so, solicitação de hemograma, para avaliar leucocitose; bioquímica séria, para avaliar perda de eletrólitos. A 17DIARREIA colonoscopia não é indicada para ca- sos de diarreia aguda. Esses exames devem ser solicitados em pacientes com mais de 70 anos, duração maior que uma semana, ≥ 6 episódios/dia, desidratação gra- ve, toxemia, imunossupressão, etio- logia hospitalar ou sinais de diarreia inflamatória. A base do tratamento de diarreias agudas é a hidratação e correção de distúrbios hidroeletrolíticos, rea- limentação, uso de antibióticos e de probióticos. Em geral, o tratamento com antibióti- co é feito com quinolonas, com base em alguns patógenos mais frequen- tes, como Shigella, Salmonella, E. coli e Campylobacter, e vai ser restrito a alguns grupos, como pacientes com: • Febre • Disenteria • Frequência de evacuações maior que 8x por dia • Idosos e imunocomprometidos • Pacientes hospitalizados ANTIBIÓTICO DOSE Levofloxacino 500mg VO dose única ou 3 dias de tratamento* Ciprofloxacino 750mg VO dose única OU 500mg VO por 3 dias* Ofloxacino 400mg VO dose única ou 3 dias de tratamento* Azitromicina 1g VO dose única OU 500mg VO por 3 dias * Rifaximina ** 200mg VO 3xd por 3 dias Tabela 3. Antibioticoterapia no tratamento da diarreia aguda infecciosa. * Se os sintomas não melhorarem em 24h, completar o tratamento de 3 dias ** Não utilizar de suspeita clínica de Campylobacter, Salmonella ou Shigella Pode-se também utilizar agentes an- tidiarreicos em pacientes sem febre e sem disenteria e agentes probióticos. Os probióticos são espécies de bac- térias que colonizam e se replicam no trato intestinal humano e promovem um efeito benéfico no hospedeiro. Existem baixas evidências quanto ao seu resultado eficiente nos casos de diarreia, entretanto, é conhecido seu benefício nos pacientes com diarreias provocadas por uso de antibióticos. A terapêutica obstipante só deve ser instituída após diagnóstico etiológico e se a dieta e medidas de suporte, hi- dratação e correção de alterações ele- trolíticas forem insuficientes. Nenhum 18DIARREIA destes medicamentos ataca as cau- sas básicas promotoras de diarreia ou promovem o restabelecimento de água, eletrólitos e nutrientes perdidos durante o surto. SE LIGA! Agentes antidiarreicos como loperamida ou difenoxilato podem ser úteis para reduzir o número de evacua- ções em pacientes com doença leve. An- ticolinérgicos (tintura de beladona, clidí- nio, brometo de propantelina e cloridrato de diciclomina) são úteis para reduzir as cólicas, dores abdominais e urgência. Mas cuidado! Agentes antidiarreicos e anticolinérgicos não devem ser usados em doença grave pelo risco de precipi- tar megacólon tóxico. Já o subsalicilato de bismuto é a droga de escolha quando o vômito é a principal queixa (principal- mente nas gastroenterites virais. Reduz as evacuações em 50%, podendo ser usado nas profilaxias de diarreia dos viajantes. Reidratação O uso de soluções de reidratação oral (SRO) tem como objetivo reduzir a morbiletalidade por diarreia. Está in- dicada na prevenção da desidratação e no tratamento das formas leve, mo- derada, e grave sem choque e na con- tinuidade do tratamento iniciado por via parenteral. Os quadros diarreicos com desidratação grave devem iniciar a reidratação, preferencialmente por via endovenosa, associando depois a reidratação por via oral. No surto de diarreia não se perde apenas água, mas também eletróli- tos (sódio, potássio e cloro). Por este motivo a ingestão única de água num episódio diarreico será insuficiente. Deve-se oferecer líquidos constituí- dos com SRO equilibradas em água e eletrólitos. Os sais de reidratação oral não vão alterar o sintoma diarreia (no início da administração dos sais as perdas fecais até poderão aumentar), mas o seu uso vai prevenir/tratar a desidratação. SAIBA MAIS! As soluções de reidratação oral foram desenvolvidas depois da descoberta do mecanismo de co-transporte. Um componente da absorção intestinal é mediada por um transportador ativo de glicose dependente do sódio (SGLT1). Quando a glicose e o sódio são absorvidos, o en- terócito fica hiperconcentrado, o que faz demandar também a absorção de água por osmose. O reconhecimento deste fenômeno fisiológico, denominado de co-transporte de glicose-só- dio, é um dos mais relevantes avanços científicos da Medicina do século XX. 19DIARREIA O tratamento das doenças diarreicas agudas se fundamenta na prevenção e na rápida correção da desidrata- ção por meio da ingestão de líquidos e solução de sais de reidratação oral (SRO) ou fluidos endovenosos, de- pendendo do estado de hidratação e da gravidade do caso. Por isso, ape- nas após a avaliação clínica do pa- ciente, o tratamento adequado deve ser estabelecido, conforme os planos A, B e C descritos abaixo. Plano A O plano A consiste em cinco etapas direcionadas ao paciente HIDRATA- DO para realizar no domicílio: • Aumento da ingestão de água e outros líquidos incluindo solução de SRO principalmente após cada episódio de diarreia, pois dessa forma evita-se a desidratação; • Manutenção da alimentação habi- tual; continuidade do aleitamento materno; • Retorno do paciente ao serviço, caso não melhore em 2 dias ou apresente piora da diarreia, vômi- tos repetidos, muita sede, recusa de alimentos, sangue nas fezes ou diminuição da diurese; • Orientação do paciente/respon- sável/acompanhante para reco- nhecer os sinais de desidratação; preparar adequadamente e admi- nistrar a solução de SRO e praticar ações de higiene pessoal e domici- liar (lavagem adequada das mãos, tratamento da água e higienização dos alimentos); • Administração de Zinco uma vez ao dia, durante 10 a 14 dias. Plano B O Plano B consiste em três etapas direcionadas ao paciente COM DESI- DRATAÇÃO, porém sem gravidade, com capacidade de ingerir líquidos, que deve ser tratado com SRO na Unidade de Saúde, onde deve per- manecer até a reidratação completa. • Ingestão de solução de SRO, ini- cialmente em pequenos volumes e aumento da oferta e da frequência aos poucos. A quantidade a ser in- gerida dependerá da sede do pa- ciente, mas deve ser administrada continuamente até que desapare- çam os sinais da desidratação; • Reavaliação do paciente constan- temente, pois o Plano B termina quando desaparecem os sinais de desidratação, a partir de quando se deve adotar ou retornar ao Pla- no A; • Orientação do paciente/respon- sável/acompanhante para reco- nhecer os sinais de desidratação; preparar adequadamente e admi- nistrar a solução de SRO e praticar ações de higiene pessoal e domici- liar (lavagem adequada das mãos, 20DIARREIA tratamento da água e higienização dos alimentos); Plano C O Plano C consiste em duas fases de reidratação endovenosa destinada ao paciente COM DESIDRATAÇÃO GRAVE. Nessa situação o paciente deverá ser transferido o mais rapida- mente possível. Os primeiros cuida- dos na unidade de saúde são impor- tantíssimos e já devem ser efetuados à medida que o paciente seja encami- nhado ao serviço hospitalar de saúde. • Realizar reidratação endovenosano serviço saúde (fases rápida e de manutenção); • O paciente deve ser reavaliado após duas horas, se persistirem os sinais de choque, repetir a prescri- ção; caso contrário, iniciar balanço hídrico com as mesmas soluções preconizadas; • Administrar por via oral a solução de SRO em doses pequenas e fre- quentes, tão logo o paciente acei- te. Isso acelera a sua recuperação e reduz drasticamente o risco de complicações. • Suspender a hidratação endove- nosa quando o paciente estiver hi- dratado, com boa tolerância à so- lução de SRO e sem vômitos. FASE RÁPIDA (FASE DE EXPANSÃO) MENORES DE 5 ANOS SOLUÇÃO VOLUME TEMPO DE ADMINISTRAÇÃO Soro Fisiológico a 0,9% Iniciar com 20ml/kg de peso. Repetir essa quantidade até que a criança esteja hidratada, reavaliando os sinais clínicos após cada fase de expansão administrada. 30 minutos Para recém-nascidos e cardiopatas graves come- çar com 10ml/kg. MAIORES DE 5 ANOS SOLUÇÃO VOLUME TOTAL TEMPO DE ADMINISTRAÇÃO 1º Soro Fisiológico a 0,9% 30ml/kg 30 minutos 2º Ringer Lactato ou Solução Polieletrolítica 70ml/kg 2 horas e 30 minutos Tabela 4. Plano C – Tratamento da desidratação grave na unidade hospitalar. Fonte: Ministério da saúde, 2017. 21DIARREIA 8. DIARREIA CRÔNICA Síndrome da má absorção Má absorção é causada por muitas doenças, medicações, ou produtos nutricionais diferentes que compro- metem a digestão intraluminal, ab- sorção pela mucosa ou transpor- te dos nutrientes até a circulação sistêmica. Esteatorreia (excesso de gordura nas fezes) é a característica principal da má absorção; um exame de fe- zes para gordura é o melhor exame de triagem para má absorção. Nem sempre má absorção causa diarreia. Podem ocorrer sinais clínicos de defi- ciências de vitaminas e minerais sem que haja diarreia. Nutrientes são ab- sorvidos ao longo de toda a extensão do intestino delgado, com exceção do ferro e folato, que são predominante- mente absorvidos no duodeno e je- juno proximal, e sais biliares e coba- lamina, que são absorvidos somente no íleo distal A eficiência da absorção de nutrientes na mucosa é influen- ciada pelo número de células de ab- sorção nas vilosidades, presença de hidrolases funcionais e de proteínas especificas para transporte de nu- trientes na membrana da borda em escova, e pelo tempo de trânsito. O tempo de trânsito determina o tem- po de contato do conteúdo do lúmen com a membrana da borda em esco- va e influencia a eficiência da absor- ção de nutrientes através da mucosa. FASE DE MANUTENÇÃO E REPOSIÇÃO PARA TODAS AS FAIXAS ETÁRIAS SOLUÇÃO VOLUME EM 24 HORAS Soro Glicosado a 5% + Soro Fisiológico a 0,9% na proporção de 4:1 (manutenção) Peso até 10kg 100ml/kg Peso de 10 a 20kg 1000ml + 50ml/kg de peso que exceder 10kg Peso acima de 20kg 1500ml + 20ml/kg de peso que exceder 20kg Soro Glicosado a 5% + Soro Fisiológico a 0,9% na proporção de 1:1 (reposição) Iniciar com 50ml/kg/dia. Reavaliar esta quantidade de acordo com as perdas do paciente. KCl a 10% 2ml para cada 100ml de solução da fase de manutenção. Tabela 5. Plano C – Tratamento da desidratação grave na unidade hospitalar. Fonte: Ministério da saúde, 2017. 22DIARREIA NUTRIENTES QUEM PARTICIPA NA ABSORÇÃO Lipídio Lipase pancreática Sais biliares Carboidrato Amilase pancreática Proteína Pepsina gástrica Tripsinogênio Ferro Absorção direta Ácido fólico Absorção direta Vitamina B12 Ligante R Fator intrínseco Vitaminas K, E, D, A Lipídios Tabela 6. Fatores envolvidos na absorção dos nutrientes. Existem muitos testes para caracte- rizar as síndromes disabsortivas, os gerais e específicos de função pan- creática, de supercrescimento bacte- riano, de doenças de mucosa e tes- te de função ileal. Estes testes estão descritos no quadro abaixo. O primeiro passo nesses pacientes é usualmente excluir doença estrutural com TC do abdome e eventualmen- te teste sorológico para doença celí- aca. A insuficiência pancreática pode ser avaliada pelo teste da secretina e pesquisa de quimiotripsina fecal. Os principais testes para avaliação des- ses pacientes são descritos a seguir: Teste C14-xilose Testes respiratórios Teste quantitativo de gordura fecal Teste de exalação da Lactose-H2 Teste respiratório com H2 Teste qualitativo de gordura fecal Teste da D-Xilose urinária Quantidade de gordura presente nas fezes acumuladas em 72 horas Usa o corante para gorduras Sudan III A hiperproliferação bacteriana e a lesão da mucosa do intestino proximal reduzem a absorção de D-Xilose Teste da Bentiromida Dosagem da tripsina sérica Teste de Schilling É um peptídeo sintético ligado a um ácido, o PABA. Esta ligação é desfeita pela quimiotripsina, enzima pancreática Mais específico e menos sensível do que o teste da bentiromida urinária Se for identificada B12 na urina é sinal que não há má-absorção dessa vitamina 23DIARREIA SAIBA MAIS! TESTE DE SCHILLING Tem como objetivo localizar onde está o problema que causou a deficiência de vitamina B12. É composto por 4 fases. Na primeira, se administra cianocobalamina via intramuscular para repor as deficiências corpóreas de B12 e garantir que a vitamina administrada por via oral para o teste seja eliminada na urina. Esta primeira parte do exame diferencia as causas de deficiência de vitamina B12 por má absorção de outras causas como as carências nutricio- nais. Na segunda parte, repete-se a dose de cianocobalamina, porém agora ligada a fator intrínseco, para descartar anemia perniciosa. Na terceira parte, reposição de extrato pan- creático, caso insuficiência pancreática. Na última etapa, antibioticoterapia por quatro dias com metronidazol (250mg 8/8h) + cefalexina (250 mg 6/6h) e repete-se a administração de cianocobalamina, afastar a presença de supercrescimento bacteriano como causa de má absorção. Caso em nenhuma dessas etapas a excreção se normalize, o mais provável é uma má absorção por doença ileal. de lactase ou disabsorção de gordu- ras; e a osmolaridade diferencia uma diarreia osmótica de uma secretória. Algumas causas podem levar a esse tipo de síndrome, como: Deficiência de lipólise Deficiência na lipase pancreática pode ser decorrente de sua ausência con- gênita ou da destruição da glândula pancreática em função de pancreati- te causada por álcool, fibrose cística ou câncer de pâncreas. A pancreati- te crônica é a causa mais comum de insuficiência pancreática e deficiência de lipólise. Tipicamente, os indivíduos se apresentam com fezes volumosas e carregadas de gordura (comumente > 30 g de gordura por dia), dor abdo- minal e diabetes. Habitualmente, as fezes não estão aquosas, porque os Alguns outros exames podem ser so- licitados. O trânsito intestinal, com- posto por radiografias seriadas após ingestão de sulfato de bário; enteró- clise, também por administração de bário, para detectar calcificações pan- creáticas e doença inflamatória intes- tinal, principalmente; a endoscopia alta e/ou baixa é um exame importan- te para avaliar doenças que cursam com má absorção, como doença de Crohn e permite a coleta de biópsias de delgado para avaliar doença celí- aca, síndrome da imunodeficiência, doença de Whipple. A cultura de del- gado é padrão-ouro para diagnosticar supercrescimento bacteriano. Colhe o fluido intestinal diretamente do intes- tino delgado e em seguida é enviado rapidamente para cultura. Os testes fecais são importantes para avaliar o pH fecal, uma vez que um pH mais ácido fala mais a favor de deficiência 24DIARREIA triglicerídeos não digeridos formam grandes gotículas de emulsão com pouca força osmótica e, ao contrário do que ocorre com os ácidos graxos, não estimulam a secreção de água e eletrólitos no cólon. Deficiência na formação de micelas As concentrações de sais biliares no lúmen intestinal podem cair para ní- veis inferiores à concentração crítica (2 a 3 mmol/L) necessária para a for- mação de micelas, devido à redução da síntese de sais biliares(hepatopa- tia grave), diminuição da liberação de sais biliares (colestase), ou remoção dos sais biliares presentes no lúmen (supercrescimento bacteriano, doen- ça ou ressecção de íleo terminal, tera- pia com colestiramina, hipersecreção ácida). Em geral, a má absorção resul- tante da deficiência na formação de micelas não é tão grave como a má absorção resultante de deficiência de lipase pancreática; presume-se isso ocorra porque ácidos graxos e mono- glicerídeos podem formar estruturas lamelares, que, até certo ponto, po- dem ser absorvidas. Entretanto a má- -absorção de vitaminas lipossolúveis (D, A, K, E) pode ser significativa, por- que a formação micelar é necessária para a absorção dessas substâncias. Deficiência de lactase É a causa mais com um de má ab- sorção seletiva de carboidratos. Tipi- camente, adultos com deficiência de lactase se queixam de gases, disten- são e diarreia após ingestão de leite ou laticínios, mas não perdem peso. A lactose não absorvida é osmotica- mente ativa, arrastando água para o lume intestinal. O diagnóstico de defi- ciência de lactase adquirida pode ser estabelecido pelo tratamento empíri- co com dieta sem lactose, o que re- sulta na resolução dos sintomas; ou pela análise respiratória de exalação de hidrogênio, após a administração oral de lactose. Muitas doenças in- testinais causam, secundariamente, deficiência de lactase reversível, por exemplo gastroenterite viral, doença celíaca, giardíase e supercrescimento bacteriano. Doença celíaca É uma condição inflamatória do in- testino delgado, precipitada pela in- gestão de trigo, centeio e cevada em indivíduos com certas predisposições genéticas. Comumente, a doença ce- líaca se manifesta precocemente na vida do indivíduo, por volta dos 2 anos de idade, depois da introdução do tri- go na alimentação; ou, mais tarde, na segunda até a quarta década de vida. Outras manifestações extrain- testinais da doença celíaca são: rash (dermatite herpetiforme), distúrbios 25DIARREIA neurológicos (neuropatia periférica, ataxia, epilepsia), distúrbios psiquiá- tricos (depressão, paranoia) e distúr- bios da reprodução. Indivíduos com envolvimento significativo da mucosa apresentam-se com diarreia aquosa, perda de peso ou retardo do cresci- mento e com as manifestações cli- nicas de deficiências de vitaminas e sais minerais. Ocorre má absorção para todos nutrientes, mais notavel- mente carboidratos, gorduras, prote- ínas, eletrólitos, vitaminas lipossolú- veis, cálcio, magnésio, ferro, folato e zinco. A diarreia é causada por muitos mecanismos, incluindo a diminuição da área de superfície para absorção de água e eletrólitos, efeito osmóti- co dos nutrientes não absorvidos no lúmen intestinal, aumento da área de superfície para secreção de cloreto (hiperplasia da cripta) e estimulação da secreção de liquido intestinal por mediadores inflamatórios e ácidos graxos não absorvidos. O tratamento consiste em dieta sem glúten que se prolongará pelo resto da vida do pa- ciente. Os cereais de trigo, centeio e cevada devem ser excluídos da die- ta. Arroz e milho são bem tolerados. Aveia (se não estiver contaminada com trigo) é tolerada pela maioria. Trânsito intestinal rápido Aproximadamente 25% dos carboi- dratos presentes em uma dieta nor- mal com 200 g destas substâncias; podem não ser absorvidos pelo in- testino delgado normal. Em seu trân- sito pelo cólon, esses carboidratos são metabolizados pela flora colôni- ca em ácidos graxos de cadeia curta osmoticamente ativos. Dietas ricas em carboidratos e pobres em gordura podem permitir esvaziamento gástri- co rápido, bem como motilidade rápi- da no intestino delgado, levando à má absorção de carboidratos e diarreia osmótica. Em casos de tireotoxicose, também ocorre aceleração do tempo de trânsito orocecal. Considerando que carboidratos também são meta- bolizados em H₂, e CO₂, pelas bacté- rias colônicas, os sintomas de excesso de flatos, distensão abdominal e do- res abdominais em cólicas podem ser indícios importantes para o diagnós- tico de má absorção de carboidratos. Giardíase Infecção por Giardia lamblia, uma das infecções por protozoário mais co- mum, pode causar má absorção em indivíduos infectados com muitos tro- fozoítos, especialmente em hospedei- ros imunocomprometidos ou com de- ficiência de lgA. Má absorção ocorre quando muitos organismos recobrem o epitélio e provocam inflamação da mucosa, que resulta em achatamento das vilosidades e redução da área de superfície absortiva. A infecção assin- tomática é a forma mais comum, prin- cipalmente nas áreas onde o parasita 26DIARREIA é endêmico. Não está claro se porta- dores crônicos têm episódios diarrei- cos transitórios não percebidos ou se a infecção foi adquirida recentemen- te sem produzir sintomas. Um exa- me de fezes para presença de ovos e parasitas neste estágio da infecção é frequentemente negativo devido à fixação dos organismos no intesti- no delgado proximal. O diagnóstico pode ser estabelecido por um teste ELISA de captura de antígeno fecal, mas pode haver necessidade de bi- ópsias e de um aspirado duodenal. O tratamento de eleição é feito com os derivados nitroimidazólicos – metro- nidazol, tinidazol ou albendazol- que têm eficácia elevada. O metronidazol é feito na dose de 15-20 mg/kg/dia, duas vezes ao dia, por sete ou dez dias consecutivos. O tinidazol tem a vantagem de ser usado em dose úni- ca (50mg/kg), mas seus efeitos cola- terais são mais intensos. Amebíase A ameba é um parasita do intestino grosso, onde ela se aloja causando diarreia. Ela pode invadir a parede do intestino e causar diarreia com san- gue, o que já é um caso grave. Tam- bém pode ir até o fígado, pulmão ou cérebro, causando doença nesses locais. Os indivíduos, na sua maioria portadores assintomáticos. Outros podem apresentar sintomas discre- tos, caracterizados por diarreia leve, com fezes líquidas, acompanhada por náuseas e cólicas esporádicas. Entre- tanto, a manifestação clínica obser- vada com maior frequência é a colite amebiana aguda. Em geral, ocorre iní- cio gradual com dor abdominal e diar- reia com fezes líquidas contendo san- gue e muco. Podem estar associados tenesmo, vômitos e flatulência. Os sintomas duram uma a duas sema- nas. Poucos têm febre, contrastando com a disenteria bacteriana. A ame- bíase é diagnosticada pela presença de trofozoítos hematófagos (contêm eritrócitos no seu interior) ou cistos, através de exame a fresco das fezes diarreicas ou após fixação e coloração pelo iodo ou tricrômio. O exame dire- to deve ser feito imediatamente ou até trinta minutos após a eliminação das fezes, pois os trofozoítos mor- rem rapidamente no meio externo. Os testes hematológicos e bioquími- cos raramente são úteis. É importante lembrar que a invasão por E. histoly- tica não causa eosinofilia. A sorolo- gia auxilia no diagnóstico da colite amebiana, sendo positiva em cerca de 90% dos casos. As técnicas mais utilizadas são o ensaio imunoenzimá- tico (ELISA), difusão em ágar-gel e contra-imunoeletroforese. Os casos sintomáticos devem ser tratados com metronidazol (35 a 50mg/kg/dia), três vezes ao dia, devido à sua alta eficá- cia e baixa toxicidade. Se não houver boa resposta ao metronidazol, a alter- nativa é a dehidroemetina (1-1,5mg/ 27DIARREIA kg/dia, máximo de 90mg), duas vezes ao dia, por no máximo cinco dias. Estrongiloidíase O Strongyloides stercoralis é o hel- minto que pode utilizar o maior nú- mero de recursos para que sua trans- missão se efetive. Nos indivíduos imunocompetentes, a estrongiloidí- ase pura, não complicada é, em ge- ral, uma infecção assintomática e não causa diarreia. No entanto, existe a possibilidade de hiperinfecção, que ocorre quando o indivíduo é infectado por um número excessivo de larvas filarióides, cuja instalação é facilitada por situações de imunodepressão. Quando a infecção é disseminada e ocorre dano em todo o trato gas- trintestinal, a diarreiaresultante terá componentes osmótico, exsudativo, motor e bacteriano, sendo, portanto, multifatorial. A maioria das infecções em áreas endêmicas são assintomá- ticas. Podem ocorrer episódios curtos de diarreia intercalados com cons- tipação intestinal. Síndrome de má absorção é associada com parasitis- mo intestinal maciço. O diagnóstico etiológico da infecção é feito com o exame parasitológico de fezes, usan- do-se o método de Baermann, que é mais sensível que a microscopia dire- ta. A larva rabditóide é a forma iden- tificada mais comumente, mas larvas filarióides, parasitas adultos fêmeas e ovos podem ser encontrados. A imunofluorescência indireta detecta anticorpos séricos IgG para antíge- nos de superfície de larvas filarióides, mas o ELISA tem sensibilidade maior, (cerca de 90%). O tiabendazol é a droga de escolha para o tratamento, podendo ser usado na dose única de (50mg/kg) (máximo de 3g) ou 25mg/ kg, duas vezes por dia, dois dias con- secutivos, devendo ser repetido após sete dias. Teníase A tênia é o maior parasita do homem, podendo ocupar todo o intestino do homem, ou seja, chegar a medir até 12 metros. A principal complicação da teníase é a neurocisticercose, que é quando os cistos da tênia vão até o cérebro das pessoas, podendo cau- sar epilepsia em pessoas que nunca tiveram antes. Esse quadro também é conhecido pela sua transmissão pela carne do porco, quando mal passada. Como a maioria dos casos de tenía- se é oligossintomático, o diagnóstico comumente é feito pela observação do paciente ou, quando crianças, pe- los familiares. Isso porque os proglo- tes são eliminados espontaneamente e, nem sempre, são detectados nos exames parasitológicos de fezes. Para se fazer o diagnóstico da espé- cie, em geral, coleta-se material da região anal e, através do microscópio, diferencia-se morfologicamente os ovos da tênia dos demais parasitas. 28DIARREIA Vírus da imunodeficiência humana Diarreia, má absorção e síndrome con- sumptiva são comuns em indivíduos com AIDS, mas são vistas menos fre- quentemente com a melhora da tera- pia antirretroviral. Comumente, a má absorção se deve à infecção por crip- tosporídios, organismos do complexo Mycobacterium avium intracellula- re, Isospora belli ou microsporídios. Pode-se identificar algum organismo pelo exame de fezes ou biópsia in- testinal em cerca de 50% das vezes. Enteropatia da AIDS (denominação empregada quando não há identifi- cação de algum organismo) também pode causar má-absorção. Os me- canismos de má absorção e diarreia são atrofia das vilosidades, aumento da permeabilidade intestinal, trânsito rápido no intestino delgado (em pa- cientes com infecção por protozoário) e dano ultra-estrutural de enterócitos (na enteropatia da AIDS). Em indiví- duos com AIDS e diarreia, frequente- mente os resultados da gordura fecal e dos estudos de absorção de D-xi- lose são anormais. Os níveis séricos de albumina, vitamina B12 e zinco frequentemente estão baixos, acha- dos relatados também em indivíduos infectados por HIV, mas sem AIDS. A deficiência de vitamina B12 se deve principalmente à doença ileal, mas um baixo fator intrínseco e queda da transcobalamina (TC) II podem ser fa- tores contributivos. O tratamento da má absorção deve concentrar-se na restauração do sistema imune pelo tratamento da infecção subjacente por HIV com agentes antivirais. Se possível, o organismo agressor deve ser tratado com antibióticos. Se o or- ganismo não puder ser erradicado, o resultado é diarreia e má absorção crônicas; nesses casos, o tratamento consistirá em em agentes inibidores da motilidade e dieta sem lactose e com baixo teor de gordura. Pode-se tentar uma terapia de reposição das enzimas pancreáticas em pacien- tes com infecção por HIV, em trata- mento antiretroviral altamente ativo (HAART) ou com análogos de nucle- osídeos, e que demonstram má ab- sorção de gordura de origem obscura. Se houver necessidade de suplemen- tação calórica, serão mais bem tole- rados os suplementos orais líquidos pré-digeridos e ricos em triglicerídeos de cadeia média (semielementares). Devem ser verificadas e tratadas de- ficiências de vitaminas e minerais. 29DIARREIA 9. DIARREIAS SECRETÓRIAS Síndrome carcinoide Pacientes com tumor carcinoides me- tastáticos do trato gastrointestinal ou, raramente, tumores carcinoides pri- mários não metastáticos do epitélio brônquico podem desenvolver uma diarreia aquosa e dores abdominais em cólicas, além de outros sintomas. Considerando que um terço desses pacientes não exibe outros sintomas por ocasião do início da diarreia, de- ve-se considerar a possibilidade de carcinoide em pacientes com diarreia secretória. Gastrinoma Ocorre diarreia em um terço dos pa- cientes com síndrome de Zollinger- -Ellison, podendo preceder os sinto- mas de úlcera, e cm cerca de 10% dos pacientes é a principal manifestação fisiopatológica. A diarreia é causada por grandes volumes de secreção de hidrocloretos (que pode ser reduzida pela aspiração nasogástrica ou por terapia antisecretória efetiva) e pela Normal Alterada Normal Alterada Biópsia duodenal Teste de respiração de hidrogênio e de D-Xilose C14 Enteropatia Supercrescimento bacteriano ECO-EDA, elastase fecal, TC de abdome Pancretopatia Diarreia disabsortiva Enteropatia pouco provável Técnicas especiais Avaliar teste terapêutico com antibiótico 30DIARREIA má digestão de gordura, devido à ina- tivação da lipase pancreática pelo pH e precipitação dos sais biliares. Vipoma Tumor raro de pâncreas (adenoma pancreático) das células não-β que produz vários peptídeos secretago- gos, inclusive VIP, que gera todos os sintomas dessa doença. Pacientes com essa doença sofrem diarreia se- cretória; 70% dos pacientes eliminam mais de 3 L de fezes por dia, e quase todos eliminam mais de 700 mL/dia. As perdas de eletrólitos nas fezes ex- plicam a desidratação, hipopotasse- mia e acidose. Outros possíveis agen- tes que causam secreção intestinal e por isso devem ser afastados são: laxantes, drogas (diuréticos, cafeína, metformina e bloqueador de protea- se), toxinas (metais, plantas, toxinas de mariscos e glutamato monossódi- co), enterotoxinas bacterianas, tumo- res produtores de hormônio, condi- ções inflamatórias (alergia, anafilaxia, infecção, doenças celíaca...) 31DIARREIA Patógenos comuns e incomuns DIARREIA SECRETÓRIA Radiografia do intestino delgado Peptídeos plasmáticos Urina Outros testes Teste seletivoExcluir doença estruturalExcluir infecção Sigmoidoscopia ou colonoscopia com biópsia TC de abdome Biopsia de intestino delgado e aspirar para cultura quantitativa Gastrina VIP Somatostatina S-HIAA Histamina TSH Secretina Eletroforese de proteínas Imunoglobulinas 32DIARREIA 10. DIARREIAS INFLAMATÓRIAS Doença inflamatória intestinal Paciente com doença de Crohn ou colite ulcerativa têm diarreia com vo- lume de fezes geralmente inferior a 1 L/24 hora. Pacientes ocasionais com colite ulcerativa grave podem ter diar- reia mais intensa, com secreção de água e eletrólitos no intestino delgado não afetado, sugerindo a presença de secretagogos circulantes oriundos do cólon inflamado. Pouchitis (inflama- ção do reservatório ileal) é uma causa comum de diarreia cm pacientes com colite ulcerativa e com anastomose ileoanal após colectomia. A causa é desconhecida. A antibioticotcrapia é efetiva, mas é comum que ocorram recaídas. Para a prevenção de recaí- das, pode ser efetiva a administração de um composto probiótico contendo lactobacilos, bifidobactérias e Strep- tococcus thermophilus. A retocolite ulcerativa (RCU) acome- te apenas o reto e cólon, diferente da doença de Crohn que pode acometer qualquer parte do trato gastrointesti- nal. Além disso, a RCU, geralmente, é restrita a mucosa superficial, possui um acometimento contínuo e ascen- dente, apresenta urgência, tenesmo e hemorragia. Na biópsia apresenta ab- cessos de cripta.O tratamento é feito com aminosalicilatos, corticoterapia em detrimento de remissão, antibio- ticoterapia (principalmente na doença de Crohn fistulizante) e alternativa com imunossupressores biológicos. Figura 5. Retocolite Figura 6. Doença de Crohn Imagens cedidas pela Divisão de Gastroenterologia HC-FMUSP 33DIARREIA 11. DIARREIAS AQUOSAS FUNCIONAIS Síndrome do intestino irritável Cerca de 25% dos pacientes com síndrome do intestino irritável exi- bem um complexo de sintomas; de diarreia predominantemente indolor, mas constata-se que muitos pacien- tes; sofrem outras condições, como intolerância oculta à lactose, doença celíaca (é recomendado rastreamento com anticorpos), trânsito rápido com diarreia de depleção de carboidratos, má absorção de frutose ou sorbitol, ou mesmo má absorção primária de áci- dos biliares. Muitos destes sintomas dos pacientes se iniciam com uma infecção entérica e muitos destes pacientes apresentam uma síndro- me de supercrescimento bacteriano idiopática. Imagem do intestino delgado Diarreia inflamatória Patógenos comuns Patógenos incomuns Excluir infecçãoExcluir doença estrutural Colonoscopia com biópsia TC ABD Biópsia de intestino delgado Parasitas Vírus Tuberculose Aeromonas Plesiomonas 34DIARREIA DIARREIA OSMÓTICA Ingestão de magnésio, fosfatos e laxativos. Má-absorção de carboidratos DIARREIA DISABSORTIVA Doenças da mucosa intestinal. Síndrome do intestino curto. Doença celíaca. Diarreia pós-ressecção intestinal. Supercrescimento bacteriano no intestino delgado. Insuficiência pancreática exócrina. Diminuição de ácidos biliares em intestino. DIARREIA INFLAMATÓRIA Doença inflamatória intestinal. Diverticulite. Colite pseudomembranosa. Infecções bacterianas invasivas como por Yersínia. Tuberculose intestinal. Infecções virais ulcerativas: citomegalovírus, herpes simples. Amebíase, giardíase e outras parasitoses. Colite por radiação. DIARREIA SECRETÓRIA Uso de laxativos não osmóticos. Síndrome pós-colecistectomia por sais biliares. Fibrose cística (cloridorrreia). Toxinas bacterianas. Má-absorção de sais biliares. Medicações. Alterações da motilidade intestinal: pós-vagotomia e simpatectomia, neuropatia autonómica diabética, hi- pertireoidismo e síndrome do intestino irritável. Tumores neuroendócrinos: Vipoma, Gastrinoma, Glucagonoma, Somatostatinoma, Mastocitose, Síndrome carcinoide, carcinoma medular de tireoide. Neoplasias: colônica, linfoma e adenoma viloso. Doença de Addison. Tabela 7. Causas de diarreias. 35DIARREIA 12. ABORDAGEM DE UM PACIENTE COM DIARREIA CRÔNICA Em 25% a 50%, podem ser suficien- tes uma anamnese detalhada e um exame físico adequadamente realiza- do. A adição de cultura e exame de fezes para ovos e parasitas, a deter- minação da gordura fecal e a sigmoi- doscopia flexível com biópsia elevam a percentagem de diagnósticos para cerca de 75%. Para os 25% restantes dos pacientes com diarreia crônica grave ou indeterminada, talvez haja necessidade de hospitalização e de uma bateria de testes mais extensa. Para o diagnóstico, alguns sinais de alarme devem ser procurados para detecção de diarreia orgânica, são eles: • Idade > 70 anos • Imunodeprimidos • Evolução para desidratação • Presença de febre alta • Características inflamatórias • Mais de 6 evacuações diárias • Dor abdominal intensa em maiores de 50 anos • Na anamnese, as perguntas são mui- to semelhantes aos de diarreia agu- da. Assim, pesquisar: • Volume das evacuações • Frequência das evacuaçãoes • Sangue, muco ou pus nas fezes • Características das fezes (colora- ção, odor, consistência) • Presença de febre • Presença de artralgia (doença de Crohn) • Dor abdominal associada, náuse- as, vômitos ou outros sintomas • Consumo de álcool • Diarreia após consumo de laticíne- os e glúten • Patologia autoimunes prévias A solicitação de exames complemen- tares vai depender muito de caso a caso. Os exames normalmente solici- tados são: • Hemograma: • Eletrólitos • Parasitológico de fezes (3 amostras) • Coprocultura • Pesquisa de leucócitos fecais, san- gue oculto • Teste quantitativo de gordura fecal 36DIARREIA SE LIGA! Anemia poderia sugerir pro- cesso crônico ou sangramento oculto. Além disso, o leucograma pode sugerir também infecções. No caso de infecções crônicas pode cursar apenas com neu- trofilia, sem desvio à esquerda. Trombo- citose em doença de Crohn ou retocolite pode indicar doença ativa e com risco de complicação tromboembólica. Exames mais específicos também po- dem ser solicitados como ASCA para doença de Crohn, p-ANCA para reto- colite ulcerativa; anticorpos anti-glu- taminase, anti-endomísio e anti-gla- dina para doença celíaca; amilase e lipase para pancreatite. Caso suspei- ta de doença funcional, como síndro- me do intestino irritável (SII), pode-se aplicar os critérios de ROMA IV. Os critérios de Roma são critérios pa- dronizados com base em sintomas para o diagnóstico de SII. Os critérios de Roma requerem a presença de dor abdominal durante pelo menos 1 dia/ semana nos últimos 3 meses, junta- mente com ≥ 2 dos seguintes: • Dor relacionada à defecação. • A dor está associada com uma alte- ração na frequência de defecação. • A dor está associada a uma mu- dança na consistência das fezes. Quanto aos exames de imagem, são solicitados para alguns pacientes, como os que apresentam quadros de esteatorreia, diarreia secretória, diar- reia inflamatória com colonoscopia normal. Nesses exames busca-se por anormalidades anatômicas, presença e extensão de inflamação, pancreati- te crônica e neoplasias. O ultrassom de abdome possui limitações técnica para investigação etiológica. Sendo assim, utiliza-se mais frequentemen- te a Tomografia Computadorizada e Ressonância Magnética. Figura 7. Imagem de uma ileíte terminal por doença de Crohn, com hipervascularização dos vasos e densifica- ção da gordura mesentérica. O tratamento é dependente da cau- sa de base, assim pacientes com in- suficiência pancreática deveriam, por exemplo, realizar reposição de enzi- mas pancreáticas, mesmo em pacien- tes em que esse diagnóstico não é definitivo, um teste terapêutico pode ser realizado. 37DIARREIA O tratamento empírico pode ser ten- tado em casos sem diagnóstico de certeza. A loperamida, ou uso de opi- áceos, é a melhor opção para o tra- tamento sintomático, já o octreotide e a clonidina têm uso descrito em diarreia inespecífica, com a clonidina aparentemente apresentando benefí- cio na diarreia associada com a neu- ropatia autonômica do diabetes. O uso de probióticos, por sua vez, tem benefício duvidoso, parecendo haver resultados em pacientes com colite pseudomembranosa. Em locais endêmicos para parasitoses ou para diarreia infecciosa bacteriana pode ser tentada antibioticoterapia empírica ou antiparasitários. Em pa- cientes com hipótese diagnóstica de deficiência de sais biliares o teste com colestiramina é talvez a medida mais custo-eficaz para seu diagnóstico. Em pacientes com diarreia crônica e HIV, uma hipótese sempre a ser considera é diarreia pelas medicações, os testes investigativos devem ser realizados, mas terapia empírica não é benéfica e os pacientes com infecções opor- tunistas frequentemente melhoram com a recuperação da imunidade, em pacientes em que o diagnóstico não se torna claro, o tratamento sintomá- tico com agentes anti-motilidade são possivelmente benéficos. Não se deve esquecer da terapia de suporte com hidratação oral, e se ne- cessário endovenosa, já o uso de nu- trição parenteral é reservado para pa- cientes que não conseguem manter estado nutricional adequado devido à diarreia. 38DIARREIA Duração <14 dias Entre 14 e 30 dias Duração > 30 dias Alta Baixa Osmótica Secretória Invasiva Disabsortiva Doença não orgânica DIARREIA Aguda Persistente Crônica 5% da população Topografia Grande volume Volume menor Frequência menor Frequência maior Presença derestos alimentares Tenesmo Doença orgânica Gap osmolar alto Gap osmolar fecal baixo Inflamação com possível eliminação de muco, pus ou sangue Esteatorreica Fisiopatologia Distúrbio funcional Dx de exclusão História Exame físico completo Exames complementares Colonoscopia Tomografia computa- dorizada Abordagem Interpretação da queixa Características das fezes Duração dos sintomas Medicamentos em uso Histórico de viagens Se falha na terapia empírica Laboratoriais Endoscópicos Imagem Sangue Respiratório Análise fecal pH Gap osmolar fecal Calprotectina Elastase Endo/ Enteroscopia Diário alimentar Alteração na forma das fezes e na frequência de evacuações 39DIARREIA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Clínica Médica, USP, 2ª edição La Rocque, R., Pietroni, M., Approach to the adult with acute diarrhea in resource-limited countries. Dec 06, 2018 Medicina interna- Cecil- 23ª Edição Wald, A., Clinical manifestations and diagnosis of irritable bowel syndrome in adults. Aug 29, 2019 Netter, Frank H. Atlas De Anatomia Humana. Gen Guanabara Koogan. 7ª Ed. 2019 40DIARREIA
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