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Clínica de Pequenos Animais 2 Camilla Teotonio Pereira VALVOPATIAS ADQUIRIDAS - ENDOCARDIOSE Degeneração mixomatosa, doença degenerativa valvar crônica, fibrose valvar crônica ou doença valvar crônica. Cardiopatia adquirida mais comum em cães em torno de 70% dos casos. Em gatos não tem valvulopatias adquiridas, no máximo endocardite (raro). Principal complicação da endocardiose é edema pulmonar. VALVAS ATRIOVENTRICULARES MITRAL Mitral mais acometida. TRICÚSPIDE FUNCIONAMENTO VALVAR NORMAL Diástole ventricular é o afastamento dos folhetos. Relaxamento atrial aumenta gradiente de concentração VE/AE – fechamento valvar. Sístole - ativação dos músculos papilares – fechamento valvar. PREDISPOSIÇÃO Principalmente raças de pequeno e médio porte. A raça Cavalier King Charles Spaniel é o modelo da doença. Na maioria dos cães, com exceção do Cavalier King Charles Spaniel, a prevalência da regurgitação mitral aumenta quase linearmente com a idade, com início por volta dos 5 ou 6 anos de idade. No Cavalier King Charles Spaniel, a regurgitação mitral pode começar aos 2 a 3 anos e geralmente progride muito mais rápido que as outras raças. 30% de cães assintomáticos. Machos > fêmeas. ETIOLOGIA A etiologia é ainda incerta, porém acredita-se que a dissolução do colágeno seja a base o processo conhecido como degeneração mixomatosa em cães. PATOLOGIA As lesões iniciais caracterizam-se por pequenos nódulos nas margens livres dos folhetos valvares, os quais se tornam maiores e mais numerosos, formando placas e deformando a valva. Os folhetos valvares tornam-se espessados e a coaptação de suas margens não ocorre corretamente, causando insuficiência valvar. À medida que as lesões progridem, a insuficiência valvar se torna clinicamente significativa. Conforme o processo progride o folheto valvar pode prolapsar, formando paraquedas ou balão em direção ao átrio. Outras alterações morfológicas incluem: dilatação atrial esquerda, dilatação do anel mitral, hipertrofia excêntrica do VE. FISIOPATOLOGIA As mudanças fisiopatológicas estão relacionadas com a sobrecarga de volume do lado do coração afetado, após a valva ou as valvas se tornarem insuficientes. A regurgitação normalmente desenvolve-se em meses a anos. Na regurgitação mitral, a pressão atrial esquerda mantém-se bastante baixa, a não ser que ocorra aumento súbito do volume regurgitante. O regurgitação mitral de grau leve normalmente não induz nenhuma alteração no tamanho e função do coração. O volume sistólico é mantido e pequenos volumes regurgitantes são facilmente aceitos pelo átrio esquerdo. À medida que o quadro degenerativo progride, o volume regurgitante aumenta, diminuindo com isso o fluxo que deixa o coração através da artéria aorta (volume sistólico). Com isso, há ativação de sistemas compensatórios na tentativa de manter as necessidades vitais do organismo. INSUFICIÊNCIA VALVAR PRESENTE Sobrecarga de volume consequência do volume regurgitante. Tem como consequência remodelamento ventricular como hipertrofia ventricular excêntrica. Insuficiência valvar ICCE ICCD Essas mudanças compensatórias no tamanho do coração e volume de sangue permitem que a maioria dos animais se mantenha assintomática por muitos anos. O átrio esquerdo tem um papel importante quando permite que o volume regurgitante seja absorvido pela cavidade atrial, protegendo a vasculatura pulmonar da hipertensão. Com isso, muitos animais podem desenvolver aumento atrial importante sem sinais de insuficiência cardíaca. A habilidade dos mecanismos compensatórios em manter a homeostase é, geralmente, excedida em muitos cães, levando a aumento da pressão atrial esquerda, com ou sem redução do volume sistólico. O aumento gradual das pressões atrial, venosa pulmonar e hidrostática capilar estimula o aumento compensatório do fluxo linfático pulmonar. O edema pulmonar desenvolve-se quando a capacidade do sistema linfático pulmonar é excedida. O átrio esquerdo aumentado pode induzir tosse por compressão do brônquio principal esquerdo que se localizado dorsalmente a ele. Em virtude da sobrecarga de volume crônica, a contratilidade miocárdica reduz vagarosa, progressiva e inexoravelmente. DIAGNÓSTICO Histórico e sinais clínicos. Assintomático: sopro à auscultação. Queixas principais: tosse. Nos casos mais graves, os animais ficam geralmente ansiosos, não conseguem deitar para dormir, recusando- se a ficar em decúbito lateral e preferindo a posição esternal (posição ortopneica). A tosse acontece principalmente à noite e pela manhã, assim como quando o animal se agita ou durante o exercício. A tosse é para sempre. Aumento da pressão arterial e venosa pulmonar, resultando em angústia respiratória e tosse secundária ao edema pulmonar e à compressão do brônquio principal. EXAME FÍSICO ACP Sopro holosistólico, constante, em intensidade variável (grau I a VI), em frequência e mais audível na região do ápice no lado esquerdo, no nível do 5° EIC, podendo propagar-se dorsal, caudal e cranialmente, bem como para o lado direito. Irradiação para outros focos quando o sopro é de alta intensidade. Ex: sopro alto com maior intensidade em foco mitral irradiando para outros focos. Arritmias: ritmo de galope, extrassístoles, arritmia sinusal expiratória (paciente normal - SNS está em repouso). Os sons pulmonares podem ou não estar normais. Nos casos de ausência de quadro congestivo ou em cães com edema pulmonar de grau leve, não há alterações significativas à auscultação pulmonar. À medida que o edema pulmonar piora, surgem ruídos pulmonares inspiratórios (crepitação pulmonar), especialmente nos campos pulmonares ventrais. Animais com regurgitação mitral podem também apresentar crepitação pulmonar por doença respiratória crônica. Nesses casos, a presença de arritmia sinusal pode indicar ausência de insuficiência cardíaca, já que cães com DC reduzido têm um aumento compensatório da frequência cardíaca. Endocardiose de valva tricúspide, os cães com efusão pleural podem apresentar sons pulmonares abafados, principalmente na região ventral do tórax. COLORAÇÃO DE MUCOSAS As membranas mucosas estão geralmente normais, mesmo em cães com edema pulmonar, mas também podem apresentar-se azuladas (devido à cianose), acinzentadas ou pálidas, em casos avançados de insuficiência cardíaca. PALPAÇÃO / PERCUSSÃO Ascite pode acontecer nos casos de doença valvar crônica com acometimento do lado direito do coração, ou por regurgitação mitral com hipertensão arterial pulmonar associada ou por regurgitação tricúspide primária. Nesses cães, ascite e aumentos hepático e esplênico são achados comuns. PULSO FEMORAL Pode estar normal no caso de ritmo sinusal. Porém o pulso é hipocinético nos casos de insuficiência cardíaca grave, tamponamento cardíaco ou distúrbios do ritmo, sendo que nesse último pode também encontrar-se irregular. Distensão venosa jugular pode estar presente nos casos de insuficiência cardíaca grave, hipertensão pulmonar ou efusão pericárdica. EXAMES COMPLEMENTARES RADIOFRAGIA Pode indicar alguns graus de aumento atrial e ventricular, que progridem em meses ou anos. Porém, o exame radiográfico não permite o acesso das consequências hemodinâmicas da doença valvar crônica, mas pode ajudar a excluir outras causas de cardiomegalia, o que é interessante, especialmente, nos pacientes geriátricos. Ao menos duas projeções radiográficas devem ser obtidas: laterolateral e ventrodorsal ou dorsoventral. Cães com regurgitação mitral discreta geralmente têm coração de tamanho normal, campos pulmonares normais, sem sinais de alterações vasculares. O aumento atrial esquerdo é o achado inicial e maisconsistente na doença valvar crônica de mitral. Campos pulmonares pode identificar edema que acomete mais os lobos caudais, congestão pulmonar e efusão pleural. Aumento de AE e abaulamento do bordo cranial do AD e VD (deita mais no esterno). Cardiomegalia e edema pulmonar cardiogênico. ELETROCARDIOGRAMA (ECG) Exame pouco sensível e somente utilizado em casos de arritmia e síncope. Pode haver indicações de aumento de câmaras cardíacas, principalmente atrial e ventricular esquerdas. Nos casos de doença valvar avançada, pode-se observar a presença de arritmias, especialmente taquicardia sinusal, complexos supraventriculares prematuros, taquicardia supraventricular sustentada ou paroxística e fibrilação atrial. Achados menos comuns são complexos supraventricular sustentada ou paroxística e fibrilação atrial. Nos estágios iniciais da doença cardíaca, o cão geralmente mantém a arritmia sinusal. Já nos casos de insuficiência cardíaca, a perda da arritmia sinusal e o desenvolvimento de taquicardia sinusal são comumente observados. Portanto, animais que apresentam regurgitação mitral e tosse, na presença de arritmia sinusal, devem ser questionados com relação à presença de insuficiência cardíaca. Sobrecarga de AE Sobrecarga de VE. Extrassístole atrial prematura ou extrassístole supraventricular prematura: fusão da onda P no complexo QRS. Taquicardia atrial ou taquicardia supraventricular: + 3 extrassístole. ECOCARDIOGRAMA (ECO) Diagnóstico definitivo da endocardiose e suas consequências para o coração. ECO bidimensional ou modo B. Imagem de ponta cabeça. O AE é uma estrutura importante a ser avaliada, pois o seu tamanho reflete a gravidade da doença; isso significa que quanto maior o AE, maior o grau da regurgitação mitral presente, embora existam exceções. É importante, também, a avaliação do tamanho e da movimentação do ventrículo esquerdo. Os valores dos índices das fases de ejeção ventricular podem estar normais (na regurgitação leve) ou maiores do que o normal (na regurgitação moderada a grave). As características ecocardiográficas incluem As características menos comuns são derrame pericárdico, ausência de hipertrofia, redução dos parâmetros de função, ruptura de cordoalha tendínea e prolapso de folhetos. Nos estágios iniciais da doença degenerativa, os folhetos encontram-se mais espessados do que o normal e mais evidentes geralmente no folheto anterior. A endocardite infecciosa pode apresentar características ecocardiográficas semelhantes no início da doença, sendo praticamente impossível a diferenciação entre doença degenerativa e doença infecciosa nesse estágio. Espessamento nodular do folheto septal. ECO doppler: fluxo de cor azul ou em mosaico indo em direção ao AE e classificação do grau da insuficiência valvar é quanto fluxo invade o átrio. Insuficiência de mitral importante com dilatação do AE. CLASSIFICAÇÃO 1. Estágio A Identifica pacientes com alto risco de desenvolver doença cardíaca, mas que ainda não apresentam alterações estruturais identificáveis no coração. Ex: todo Cavalier King Charles Spaniel sem sopro cardíaco. 2. Estágio B Identifica pacientes com doença cardíaca estrutural, mas que nunca desenvolveram manifestações clínicas de insuficiência cardíaca. Este estágio é subdividido em: a) Estágio B1 Pacientes assintomáticos, que não apresentam evidenciais radiográficas ou ecocardiográficas de remodelamento cardíaco em resposta à doença valvar. b) Estágio B2 Pacientes assintomáticos, que apresentam regurgitação valvar mitral hemodinamicamente significante, evidenciados por achados radiográficos e ecocardiográficos de aumento do coração esquerdo. 3. Estágio C Pacientes com sintomas clínicos prévios ou atuais de insuficiência cardíaca associados à alteração estrutural do coração. 4. Estágio D Pacientes com doença cardíaca em estágio final, com sinais de insuficiência cardíaca que são refratários à terapia principal. Estes pacientes necessitam de estratégias de tratamento especiais ou avançadas para se manterem confortáveis, independentemente da presença da doença. TRATAMENTO A maioria dos esquemas de tratamento de cães com regurgitação mitral é baseada em manifestações clínicas e achados radiográficos. As informações sobre tamanho do coração e grau de regurgitação fornecidas pela ecocardiografia em conjunto com história, exame físico, eletrocardiograma e radiografia de tórax permitem acesso mais cuidadoso à gravidade da doença e à necessidade de tratamento. OBJETIVOS Objetivos principais do tratamento são aumentar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida. FUROSEMIDA Nos casos de insuficiência cardíaca refratária e animais com regurgitação tricúspide e sintomas clínicos de ICC direita como ascite e efusão pleural. VASODILATADORES / IECAS O tratamento da regurgitação mitral moderada a grave com maleato de enalapril pode retardar o surgimento dos sinais de insuficiência cardíaca. Uso do inibidor da ECA em associação a outras medicações, como furosemida e digoxina, promove melhora clínica ou estabilização do quadro por tempo muito maior quando comparado aos cães com regurgitação mitral, cujo protocolo terapêutico não inclui o enalapril. Agem reduzindo a pressão arterial sistêmica, facilitando a saída de sangue do coração pela artéria aorta e reduzindo, portanto, a regurgitação de sangue para o átrio esquerdo durante a sístole. Com isso há redução da pressão atrial esquerda e veias pulmonares, melhorando o quadro congestivo. INOTRÓPICOS POSITIVOS Pimobendan pode melhorar as manifestações clínicas provocadas pela endocardiose de mitral, mesmo quando a função sistólica não está prejudicada. Porém, o pimobendan como monoterapia para pacientes com doença degenerativa crônica mitral assintomática pode causar aumento na área e pico de velocidade do jato regurgitante, hemorragias focais agudas, hiperplasia endotelial papilar e infiltração das cordoalhas tendíneas da valva mitral por glicosaminoglicanos, efeitos esses não observados como uso do benazepril como monoterapia. Seu uso na endocardiose de mitral deve ser criterioso e cuidadoso, reservando-se aos casos mais graves de insuficiência cardíaca congestiva. 1. Estágio A e B1 Nenhuma terapia medicamentosa ou dietética. Os proprietários devem ser orientados com relação ao início das manifestações clínicas de insuficiência cardíaca e, no caso de animais reprodutores, alertar que a doença tem caráter genético importante envolvido. Reavaliação anual do Cavalier King. Estágio B1: reavaliação anual de ECO e radiografia. 2. Estágio B2 Terapia dietética, recomenda-se leve restrição de sódio com dieta de alta palatabilidade e proteínas e calorias adequadas para manter a ótima condição corporal. 3. Estágio C e D agudo Caso de edema pulmonar: estabilizar o animal com oxigênio e furosemida. Furosemida (Lasix®) 2mg/Kg, IV ou IM seguido a cada hora até melhoria do padrão respiratório ou até atingir 8mg/Kg em 4 horas. Furosemida infusão continua 0,66 a 1mg/Kg/h após primeiro bolus no paciente não responsivo à administração em bolus. Manter acesso livre à água assim que iniciar a diurese. Pimobendan 0,25 a 0,3mg/Kg, VO, BID. Paracentese/toracocentese: ascite e efusão pleural. Sedativos para reduzir a ansiedade, podem ser utilizados opioides ou agentes ansiolíticos associados a opioides. Dobutamina 2,5 – 10ug/Kg/min em casos não responsivo a pimobendan. 4. Estágio C e D crônico Furosemida 2mg/Kg, VO, BID. Torsemida 0,1 a 0,3mg/Kg, SID, em casos de resistência a furosemida. IECA: benazepril ou enalapril. Espironolactona 2mg/Kg, SID ou BID para reduzir a fibrose miocárdica. Pimobendan 0,25 a 0,3mg/Kg, BID. Fibrilação atrial: redução da FC < 125bpm para aumentar o tempo de relaxamento do coração. Sildenafil (Viagra):broncodilatadores com o uso em caso de bronquite concomitante. HIPERTENÇÃO ARTERIAL PULMONAR Muitos pacientes podem desenvolver ICCD, por doença degenerativa crônica tricúspide ou por hipertensão arterial pulmonar secundária à doença degenerativa mitral crônica, ou ambos. Também pode ocorrer em cães assintomáticos. Pode acontecer pelo aumento crônico da pressão venosa pulmonar e atrial esquerda, como também em decorrência de doença respiratória crônica, exemplo do colapso de traqueia, que nem sempre é diagnosticado radiograficamente. Fármaco vasodilatador pulmonar e promove poucos efeitos colaterais em cães. Redução da velocidade de pico da regurgitação tricúspide, melhora nos índices de qualidade de vida e redução das concentrações séricas de NT-pró-BNP a curto prazo, com o uso da pimobendan em cães com hipertensão arterial pulmonar secundária à doença degenerativa valvar mitral. Pacientes hipertensos com restrição de sódio, uso de rações sênior ou cardiopata (menos palatável). COMPLICAÇÕES Em casos de aumento agudo da regurgitação mitral, como por exemplo, na ruptura de cordoalha tendínea, o átrio esquerdo é incapaz de se adaptar, resultando em rápida elevação da pressão atrial esquerda. A pressão capilar pulmonar consequentemente aumenta, causando, também, congestão pulmonar e edema pulmonar. Como resultado do aumento crônico das pressões atrial esquerda e venosa pulmonar, pode haver desenvolvimento de hipertensão arterial pulmonar, o que pode, a longo prazo, evoluir ICCD. Aumento exagerado do AE são a ruptura atrial, o que pode levar ao tamponamento cardíaco, além do desenvolvimento de taquiarritmias em virtude das mudanças ultraestruturais do miocárdio e pode causar morte súbita na maioria dos casos.
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