Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Julia Paris Malaco – ambulatório cirurgia Apendicite aguda Apendicite é uma inflamação aguda do apêndice vermiforme, classicamente resultando em dor abdominal, anorexia e dor à palpação abdominal. Essa condição normalmente acontece devido à obstrução do órgão. Epidemiologia A apendicite aguda ainda é a emergência mais comum em cirurgia geral do abdome, com incidência estimada em cerca de 100 a cada 100.000 habitantes-ano na Europa e nos Estados Unidos, ou cerca de 11 casos por 10.000 habitantes-ano. A apendicite ocorre com mais frequência na faixa etária de 10 a 19 anos, embora a média de idade por ocasião do diagnóstico pareça estar aumentando gradativamente, assim como a frequência da doença em negros, asiáticos e nativos americanos. Em termos gerais, 70% dos pacientes têm menos de 30 anos, e a maioria é do sexo masculino. Uma das complicações mais comuns e uma das causas mais importantes de excesso de morbidade e mortalidade é a perfuração, seja ela contida e localizada ou não restrita ao interior da cavidade peritoneal. Ao contrário da tendência observada para apendicite e apendicectomia, a incidência de apendicite perfurada (cerca de 20 casos por 100.000 habitantes-ano) está aumentando. Patogenese Sua etiologia ainda não está completamente esclarecida. Fecálitos, resíduos alimentares parcialmente digeridos, hiperplasia linfoide, fibrose intraluminal, tumores, bactérias, vírus e doença inflamatória intestinal já foram associados à inflamação do apêndice e à apendicite. Resimundo, o que acontece é: obstrução do lúmen do apêndice acumulo de secreção, estase e proliferação bacteriana aumento na pressão intraluminal edema, obstrução linfática e vascular isquemia, necrose e perfuração Embora não haja comprovação, a obstrução do lúmen apendiceal parece ser uma etapa importante da patogênese da apendicite – ao menos em alguns casos. Nesses pacientes, a obstrução provoca proliferação bacteriana excessiva e distensão do lúmen intestinal com elevação da pressão intraluminal, que pode impedir os fluxos de linfa e sangue. Em seguida, pode ocorrer trombose vascular e necrose isquêmica com perfuração do apêndice distal. Qualquer perfuração que ocorra próximo da base do apêndice deve levantar a suspeita de outro processo patológico. Cada vez mais, parece que existem duas categorias gerais de pacientes com apendicite – os que têm doença complicada com gangrena ou perfuração e os que não desenvolvem essas complicações. Quando ocorre perfuração, o vazamento resultante pode ser contido pelo omento ou por outro tecido adjacente, formando um abscesso. A perfuração livre geralmente causa peritonite grave. Esses pacientes também podem desenvolver trombose supurativa infecciosa da veia porta e suas tributárias, bem como abscessos intra-hepáticos. O prognóstico dos pacientes desafortunados que desenvolvem essa complicação grave e temível é muito desfavorável. Os pacientes com sinais e sintomas persistentes, que não melhoraram nas últimas 48 horas, podem ter mais chances de perfurar ou desenvolver outras complicações. A apendicite deve ser incluída no diagnóstico diferencial de dor abdominal em qualquer faixa etária, a menos que se tenha certeza de que o órgão já foi retirado Quadro clinico Tipicamente inicia com dor epigástrica ou umbilical, seguida de anorexia e náuseas. Vomito e febre podem ocorrer (evolução de 24 a 48 horas) Queixas inespecíficas ocorrem inicialmente. Os pacientes observam alterações do hábito intestinal ou mal-estar e dor abdominal difusa, talvez intermitente ou em cólicas no epigástrio ou região periumbilical. Em seguida, a dor migra para o quadrante inferior direito em 12 a 24 horas, onde se torna mais aguda e pode ser bem localizada como inflamação transmural quando o apêndice irrita o peritônio parietal. A irritação do peritônio parietal pode estar associada à rigidez muscular local. Os pacientes com apendicite mais Julia Paris Malaco – ambulatório cirurgia frequentemente observam que a náusea, quando presente, ocorre depois de começar a dor abdominal, o que pode ajudar a diferenciar dos casos, por exemplo, de gastrenterite, em que a náusea ocorre primeiro. Os vômitos, quando presentes, também ocorrem depois do início da dor e costumam ser leves e de pouco volume. Assim, o momento do início dos sintomas e as características da dor do paciente e de qualquer achado associado devem ser rigorosamente avaliados. A anorexia é tão comum que o diagnóstico de apendicite deve ser questionado na sua ausência. Os pacientes com apendicite pélvica têm mais chance de apresentar disúria, frequência urinária, diarreia ou tenesmo. Eles podem apresentar somente dor na região suprapúbica à palpação ou ao exame retal ou pélvico. Nas mulheres, o exame pélvico é obrigatório para descartar condições que afetam os órgãos uroginecológicos e podem causar dor abdominal simulando apendicite, como doença inflamatória pélvica, gestação ectópica e torção de ovário. Os pacientes com apendicite são encontrados deitados e imóveis, a fim de evitar a irritação peritoneal causada pelo movimento, e alguns relatam desconforto causado por um solavanco do carro no caminho até o hospital ou consultório, por tosse, espirros ou outros movimentos que provoquem uma manobra de Valsalva. Todo o abdome deve ser examinado sistematicamente, começando pela área em que o paciente não refere desconforto, quando possível. Classicamente, a dor máxima é identificada no quadrante inferior direito, no ponto de McBurney ou perto dele, que se localiza a cerca de um terço da distância de uma linha que se origina na espinha ilíaca anterior e vai até o umbigo. A compressão suave do quadrante inferior esquerdo pode desencadear dor no quadrante inferior direito quando o apêndice está localizado ali. Esse é o sinal de Rovsing Sinais clínicos: Sinal de rovsing: A palpação do quadrante inferior esquerdo causa dor no quadrante inferior direito. Sinal de Blumberg: dor a descompressão brusca na fossa ilíaca direita. pode estar presente em qualquer presença de irritação do peritoneo Sinal da punho percussão do calcâneo: dor em fossa ilíaca direita a punho percussão do calcâneo Sinal de lapinski: dor a compressão ao elevar o membro inferior direito Sinal de summer: hiperestesia em fossa ilíaca direita Sinal do obturador: A rotação interna do quadril causa dor, sugerindo a possibilidade de um apêndice inflamado localizado na pelve Sinal de psoas: A extensão do quadril direito causa dor ao longo do dorso posterolateral e quadril, sugerindo apendicite retrocecal Diagnóstico O diagnóstico clínico de apendicite é baseado na combinação de dor e sensibilidade localizadas acompanhadas por sinais de inflamação, como febre, leucocitose e aumento na dosagem da proteína C-reativa. A migração da dor da região periumbilical para o quadrante inferior direito também é significativa para o diagnóstico. Quando não há sinais de inflamação, o diagnóstico é mais incerto e, nessa situação, a TC pode ser útil. A melhor estratégia nos casos duvidosos é observar o paciente pelo período de 6 horas ou mais. Neste período, os pacientes com apendicite irão apresentar aumento da dor e sinais de inflamação, enquanto aqueles sem apendicite geralmente melhoram. Os diagnósticos falso-positivos frequentemente ocorrem nos casos em que o cirurgião deu mais importância à dor do paciente do que à presença de sinais de inflamação. Os sistemas de pontuação clínica podem ser efetivos para o diagnóstico de apendicite aguda. Por exemplo, o escore de Alvarado, que utiliza dados do exame físico (anorexia, migração da dor, náusea, sensibilidadeà palpação do quadrante inferior direito, dor à descompressão súbita e aumento da temperatura) e achados laboratoriais (leucocitose, desvio à esquerda), tem excelente valor preditivo positivo, com sensibilidade de 99%. Exames laboratoriais: Hemograma (leicocitose) PCR e VHS (elevados Urinálise Os exames laboratoriais não identificam pacientes com apendicite. A contagem de leucócitos está apenas moderadamente elevada em cerca de 70% dos pacientes com apendicite simples (com leucocitose de 10.000-18.000 células/μL). Um “desvio à esquerda” no sentido das formas imaturas de polimorfonucleares está presente em > 95% dos casos. Julia Paris Malaco – ambulatório cirurgia O exame comum de urina está indicado para excluir condições urogenitais. Contudo, um apêndice inflamado em contato com o ureter ou a bexiga pode causar piúria estéril ou hematúria. Todas as mulheres em idade fértil devem fazer um teste de gravidez. Exames de imagem: TC abdominal USG (alternativa a TC) Radiografia As radiografias simples do abdome raramente são úteis e não devem ser solicitadas como rotina, a menos que o médico esteja preocupado com outras condições, como obstrução intestinal, perfuração de víscera ou ureterolitíase. Nas radiografias simples, observam-se nível hidroaéreo localizado, íleo localizado ou aumento da densidade de tecidos moles no quadrante inferior direito em 50% dos pacientes na fase inicial de apendicite. A tomografia computadorizada (TC) do abdome ajuda no diagnóstico. Um apêndice aumentado com espessamento da parede e acentuação ou borramento da gordura adjacente ao apêndice são os achados mais úteis na apendicite aguda. Outros sinais podem estar presentes, incluindo espessamento focal do ceco, apendicolito, ar extraluminal ou intramural e abscesso pericecal, mas são menos confiáveis. A administração de contraste por via oral não é necessária. Diante de quadro com evolução típica, dor no quadrante inferior direito, sensibilidade à palpação e sinais de inflamação (p. ex., febre e leucocitose), a TC seria supérflua e, se negativa, até mesmo enganadora. Diagnostico diferencial Algumas doenças que “simulam” apendicite são Doença de Crohn Colecistite ou outra doença da vesícula biliar Diverticulite Gravidez ectópica Endometriose Gastrenterite ou colite Ulceração gástrica ou duodenal Hepatite Doença renal, incluindo nefrolitíase Abscesso hepático Diverticulite de Meckel Dor do meio do ciclo ovulatório (Mittelschmerz) Adenite mesentérica Torção de omento Pancreatite Pneumonia de lobo inferior Doença inflamatória pélvica Cisto ovariano roto ou outra doença cística dos ovários Obstrução de intestino delgado Infecção do trato urinário Tratamento Com poucas exceções, o tratamento da apendicite é cirúrgico. A cirurgia pode ser feita com técnica aberta ou por via laparoscópica. A abordagem laparoscópica é preferível quando o diagnóstico pré-operatório for duvidoso. Há indicação de terapia antimicrobiana profilática pré-operatória com esquema usando um único agente, geralmente cefalosporina. Complicações Entre as complicações da apendicite aguda estão perfuração, peritonite, abscesso e pileflebite. Perfuração: A perfuração faz parte da história natural da apendicite aguda, e provavelmente ocorre em razão da busca tardia por tratamento. A perfuração é acompanhada por dor mais intensa e febre mais alta (em média, 38,3 °C) em comparação com a apendicite simples. É raro que um apêndice agudamente inflamado perfure nas primeiras 12 horas. A apendicite terá evoluído com perfuração à apendicectomia em cerca de 50% dos pacientes com menos de 10 ou com mais de 50 anos de idade. Em mulheres jovens, a perfuração aumenta em cerca de 4 vezes o risco de infertilidade tubária. Peritonite: A peritonite localizada resulta de perfuração microscópica de um apêndice gangrenoso, enquanto a peritonite generalizada na maioria dos casos implica perfuração macroscópica para o interior da cavidade peritoneal. Aumento da sensibilidade à palpação e da rigidez da parede, distensão abdominal e íleo adinâmico são evidentes nesses pacientes. Febre alta e toxemia grave assinalam a progressão desse quadro catastrófico. Abscesso do apêndice: Ocorre perfuração localizada quando a infecção periapêndice é isolada pelo omento e vísceras adjacentes. Julia Paris Malaco – ambulatório cirurgia A apresentação clínica consiste nos achados comuns da apendicite, e pode incluir a palpação de uma massa no quadrante inferior direito. Há indicação para ultrassonografia ou TC; se for encontrado um abscesso, o tratamento preconizado é aspiração percutânea guiada por imagem. Pileflebite: É a tromboflebite supurativa do sistema venoso porta. Calafrios, febre alta, icterícia de baixo grau e, tardiamente, abscesso hepático são os sinais característicos dessa grave, porém, felizmente, rara condição, que afeta menos de 1% dos pacientes. Indicam-se cirurgia imediata e terapia antimicrobiana.
Compartilhar