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Programa de Educação Continuada a Distância Curso de Cariologia Aluno: EAD - Educação a Distância Parceria entre Portal Educação e Sites Associados Curso de Cariologia MÓDULO I Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização do mesmo. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos na bibliografia consultada. 2 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 3 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores CARIOLOGIA SUMÁRIO MÓDULO I INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA CARIOLOGIA 1.1 ETIOLOGIA DA CÁRIE 1.2 HISTÓRICO 1.3 TEORIAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE DENTÁRIA TEORIAS ENDÓGENAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE TEORIAS EXÓGENAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE 1.4 SALIVA FUNÇÕES DA SALIVA FLUXO SALIVAR MEDIÇÃO DO FLUXO DE SALIVA ESTIMULADA MEDIÇÃO DO FLUXO DE SALIVA NÃO ESTIMULADA HIPOSSALIVAÇÃO E XEROSTOMIA COMPOSIÇÃO DA SALIVA COMPONENTES INORGÂNICOS COMPONENTES ORGÂNICOS SALIVA E CÁRIE 1.5 BIOFILME DENTÁRIO PELÍCULA ADQUIRIDA COMPOSIÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO ETAPAS DE FORMAÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO FORMAÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO 1.6 PARTICIPAÇÃO MICROBIANA NO PROCESSO DE CÁRIE MICRORGANISMOS E CARIOGENICIDADE ESTREPTOCOCOS BUCAIS 4 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores LACTOBACILOS ACTINOMICES CANDIDA 1.7 PARTICIPAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE NO PROCESSO DE CÁRIE MECANISMOS INESPECÍFICOS DE DEFESA PRESENTES NA CAVIDADE BUCAL MECANISMOS ESPECÍFICOS DE DEFESA PRESENTES NA CAVIDADE BUCAL IMUNIZAÇÃO COM Streptococcus mutans – VACINAÇÃO MÓDULO II FLUORETOS 2.1 INTRODUÇÃO 2.2 HISTÓRICO 2.3 FLÚOR SISTÊMICO FLUORETAÇÃO DA ÁGUA FLUORETAÇÃO DO SAL FLÚOR EM COMPRIMIDOS E GOTAS 2.4 FLÚOR TÓPICO 2.5 O ESMALTE DENTÁRIO 2.6 PH CRÍTICO 2.7 DINÂMICA DO DENTE NO AMBIENTE ORAL 2.8 MECANISMO DE AÇÃO DO FLÚOR TÓPICO 2.9 MECANISMO DE AÇÃO DO FLUORETO NA PREVENÇÃO DA CÁRIE DENTÁRIA 2.10 A AÇÃO DO FLUORETO NO ESMALTE DENTÁRIO 2.11 FLUORETOS NO FLUIDO QUE ENVOLVE OS CRISTAIS DO ESMALTE E DENTINA 2.12 A AÇÃO DO FLUORETO SOBRE O BIOFILME DENTÁRIO 2.13 FLUOROSE DENTÁRIA 2.14 METABOLISMO, ABSORÇÃO E DISPONIBILIDADE DO FLÚOR 2.15 TOXICIDADE DO FLÚOR 5 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores MÓDULO III CARIOLOGIA CLÍNICA 3.1 DIAGNÓSTICO DE CÁRIE CÁRIE OCLUSAL CÁRIE DE FISSURA CÁRIE PROXIMAL CÁRIE RADICULAR CÁRIE EM SUPERFÍCIES LIVRES LESÃO EM ESMALTE LESÃO EM DENTINA LESÃO DE MANCHA BRANCA CÁRIE DE MAMADEIRA CÁRIE DE RADIAÇÃO 3.2 PRINCIPAIS MÉTODOS DIAGNÓSTICOS DE CÁRIE DIFUSÃO OU ABSORÇÃO DA LUZ INSPEÇÃO VISUAL DETECÇÃO RADIOGRÁFICA TRANSILUMINAÇÃO POR FIBRA ÓTICA (FOTI) MÉTODO DA RESISTÊNCIA ELÉTRICA DETECÇÃO ATRAVÉS DE LASER (DIAGNODENT®) 3.3 RISCO DE CÁRIE CONCEITOS EXPERIÊNCIA DE CÁRIE (CPO-D) INDICAÇÕES DOS TESTES DE ATIVIDADE DE CÁRIE REQUISITOS DE UM TESTE DE ATIVIDADE DE CÁRIE TESTES MICROBIOLÓGICOS DE ATIVIDADE DE CÁRIE AVALIAÇÃO DE LACTOBACILOS AVALIAÇÃO DE ESTREPTOCOCOS DO GRUPO mutans AVALIAÇÃO DE LEVEDURAS TESTES SALIVARES DE ATIVIDADE DE CÁRIE 6 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores VELOCIDADE DO FLUXO SALIVAR CAPACIDADE TAMPÃO SALIVAR CARIOGRAMA MÓDULO IV DIETA, NUTRIÇÃO E CÁRIE 4.1 INTRODUÇÃO 4.2 ASPECTOS COMPORTAMENTAIS E SOCIAIS DA SAÚDE BUCAL 4.3 ACONSELHAMENTO DIETÉTICO INDICAÇÕES PARA O ACONSELHAMENTO DIETÉTICO 4.4 MOTIVAÇÃO DO PROFISSIONAL E DO PACIENTE 4.5 MÉTODO DE AVALIAÇÃO DA DIETA ALIMENTAR 4.6 NUTRIÇÃO, DIETA E CÁRIE NUTRIÇÃO CONSTRUTORES – PROTEÍNAS REGULADORES – MINERAIS E VITAMINAS ENERGÉTICOS – LIPÍDEOS E CARBOIDRATOS A DIETA E A CÁRIE DENTÁRIA EM HUMANOS O POTENCIAL CARIOGÊNICO DOS ALIMENTOS (CARBOIDRATOS E ALIMENTOS PROTETORES) A INFLUÊNCIA DE DIFERENTES PADRÕES DE INGESTÃO A INFLUÊNCIA DO FLÚOR NA RELAÇÃO ENTRE OS AÇÚCARES E A CÁRIE DENTÁRIA 4.7 OS ALIMENTOS DIET, LIGHT E ADOÇANTES DIETÉTICOS: CONCEITOS GRUPOS DE ALIMENTOS DIETÉTICOS SUCEDÂNEOS DO SAL ADOÇANTES E EDULCORANTES: CONCEITOS ADOÇANTES E EDULCORANTES NUTRITIVOS EDULCORANTES NÃO NUTRITIVOS 7 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores EDULCORANTES OBTIDOS DE EXTRATOS VEGETAIS MÓDULO V PREVENÇÃO: O USO DE DENTIFRÍCIOS E ANTIMICROBIANOS 5.1 INTRODUÇÃO 5.2 DENTIFRÍCIOS COMPOSIÇÃO ABRASIVOS FLAVORIZANTES DETERGENTE SUBSTÂNCIAS TERAPÊUTICAS DENTIFRÍCIOS E CONTROLE DO BIOFILME DENTIFRÍCIOS ANTIPLACA DENTIFRÍCIOS FLUORETADOS DENTIFRÍCIOS ANTI-TÁRTARO DENTIFRÍCIOS PARA HIPERSENSIBILIDADE DENTIFRÍCIOS E HALITOSE RESUMO 5.3 FIO DENTAL 5.4 ANTIMICROBIANOS PRINCIPAIS MECANISMOS DE AÇÃO DOS ANTIMICROBIANOS VEÍCULOS DE ADMINISTRAÇÃO DOS AGENTES ANTIMICROBIANOS PRINCIPAIS AGENTES ANTIMICROBIANOS AGENTES CATIÔNICOS AGENTES NÃO-IÔNICOS COMPOSTOS FENÓLICOS ALÓGENOS 5.5 SELANTES DE FÓSSULAS E FISSURAS Glossário Bibliografia Consultada 8 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores MÓDULO I INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA CARIOLOGIA 1.1 ETIOLOGIA DA CÁRIE A cárie dentária é a doença infecciosa de maior prevalência e de maior incidência na espécie humana, constituindo-se em relevante problema de saúde pública e individual na maioria dos países. É uma doença transmissível aos tecidos calcificados dos dentes, resultando em uma perda localizada dos tecidos duros. É uma doença multifatorial, que depende da interação de três fatores principais: o hospedeiro, representado pelos dentes e saliva, a microbiota e a dieta consumida. Atualmente, considera-se o tempo como um quarto fator essencial para o desenvolvimento da cárie. Para que a cárie ocorra, os fatores predisponentes devem estar presentes e interagir em condições críticas por determinados períodos: o hospedeiro com dentes suscetíveis, colonizados por microrganismos cariogênicos e consumindo freqüentemente dieta rica em carboidratos (sacarose). Devido a uma série de circunstâncias, com destaque para o aumento da ingestão de sacarose, a incidência de cárie dentária aumentou drasticamente nos séculos XIX e principalmente no XX, a ponto de preocupar a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Federação Dentária Internacional (FDI). 1.2 HISTÓRICO O termo cárie deriva do latim cariosus, que significa destruição ou putrefação. Caracteriza-se pela destruição localizada de tecidos mineralizados do dente. Durante muito tempo se especulou sobre os fatores causais da cárie dentária. Os primeiros achados de cárie foram em fósseis de peixes, há cerca de 280 milhões de anos. Os primeiros relatos a respeito da cárie dentária em nossos antepassados diretos datam de 2 milhões a 800.000 anos a.C. Registrossobre cárie dentária foram encontrados na Ásia e América, nas pinturas em paredes do período Cro-Magnon (22.000 anos atrás). Placas de argila de 400 a.C., na Mesopotâmia, relataram a presença de cárie 9 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores correlacionando sua presença com “vermes”. Ossos de oráculos chineses datando de 1000 a.C. descrevem a idéia de cárie e “vermes”. Hipócrates (460-377 a.C.) deu importância à presença de alimentos na boca, sugerindo que fatores locais e gerais interferiam na presença de cárie. Aristóteles (384-322 a.C.) descreveu que figos macios e doces aderiam aos dentes, apodreciam e causavam lesões de cárie. Desde os babilônios (500 a.C.) até o século XVIII, acreditou-se na existência de “vermes que beliscavam os dentes”. Galeno (Grécia, século II) julgava que a cárie resultava de um processo inflamatório interno, pulpar, causado por discrasias sangüíneas. Guy de Cabuliac (1300-1368), considerado o grande cirurgião da Idade Média, acreditava que a cárie dentária era uma verminose. Antony van Leeuwenhoek (1683), o pai da microscopia moderna, descreveu pequenos microrganismos “extraídos de um dente comprometido”, afirmando que os mesmos causavam desconforto e dor de dente. Em 1843, Erdl descreveu parasitas filamentosos na superfície dos dentes. O primeiro estudioso a colocar essa questão em bases científicas foi W. D. Miller, dentista norte-americano que entre 1880 e 1906 foi discípulo do bacteriologista Robert Koch. Miller, o “pai da Microbiologia Oral”, estabeleceu experimentalmente que a cárie dentária resulta basicamente da ação fermentativa das bactérias da saliva sobre carboidratos da dieta do hospedeiro (teoria quimio-parasitária). Na primeira metade do século XX, ocorreu a “era dos lactobacilos”, além de serem lançadas várias teorias que tentavam esclarecer a etiologia da cárie: teoria acidogênica, proteolítica e proteolítica-quelante, que apresentavam algumas convergências e muitas divergências, portanto geraram muitas dúvidas. O atual conhecimento da etiologia dessa doença está fundamentado nas pesquisas sobre cárie dentária experimental em animais de laboratório, primeiramente desenvolvidas em roedores, da qual se obteve as seguintes respostas: animais isentos de microrganismos não desenvolvem lesões de cárie dentária nem quando recebem altas concentrações de sacarose (dieta cariogênica) durante muito tempo, ou seja, não há cáries sem bactérias, demonstrando assim que a cárie dentária é uma doença infecciosa; além disso, de todas as espécies bacterianas isoladas de lesões de cárie de roedores convencionais, apenas uma era capaz de produzir grandes acúmulos sobre os dentes (placa bacteriana, atualmente chamada de biofilme dentário) e extensas destruições dentais, quando monoinoculadas na boca de animais isentos de microrganismos e alimentados com dieta rica em sacarose. Pesquisas verificaram que essa espécie era um estreptococo cariogênico que apresenta as seguintes características: é anaeróbio facultativo, portanto capaz de fermentar carboidratos; é fortemente acidogênico, produzindo grandes quantidades de ácido láctico quando fermenta a grande maioria dos carboidratos, principalmente a sacarose, fazendo o pH ambiental descer para aproximadamente 4,0; diferente dos estreptococos conhecidos na época, na presença de sacarose, essa espécie sintetiza e armazena extracelularmente um polissacarídeo de reserva chamado glucano, responsável pela capacidade de colonização sobre a superfície dentária e pelo aumento do potencial acidogênico; o estreptococo cariogênico é transmitido tanto entre animais quanto entre seres humanos. O conjunto dessas experiências permitiu uma definição da etiologia da cárie ainda válida: a cárie dentária é uma doença infecciosa (sem bactérias não ocorre cárie), endógena (as bactérias responsáveis fazem parte da própria microbiota bucal), transmissível e trifatorial. O clássico diagrama de Keyes mostra que a cárie só aparece quando ocorre a interação dos seus três fatores etiológicos: a bactéria cariogênica, a dieta cariogênica e a suscetibilidade individual (fatores do hospedeiro e seus dentes). 10 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 11 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 1.3 TEORIAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE DENTÁRIA Várias teorias foram elaboradas com o objetivo de explicar a etiologia da cárie dentária. De início, surgiram as chamadas teorias endógenas (a cárie era causada por fatores internos ao hospedeiro) e, posteriormente as exógenas (a cárie era causada por fatores externos ao hospedeiro). As teorias endógenas foram abandonadas baseando-se na observação de que os dentes tratados endodonticamente, ou seja, sem polpa funcional, eram igualmente afetados pelas cáries. TEORIAS ENDÓGENAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE Hipócrates (456 a.C.) classificou a cárie dentária como uma patologia do tipo humoral, ou seja, que estava relacionada a uma disfunção interna que levava ao acúmulo de fluidos prejudiciais no interior dos dentes ao aparecimento da lesão. Galeno (130 a.C.) e Joudain (1734-1816) também acreditavam que as cáries tinham natureza humoral endógena, que causavam reação inflamatória e levavam à formação de cárie. TEORIAS EXÓGENAS DA ETIOLOGIA DA CÁRIE Posteriormente, apareceram as teorias exógenas que acreditavam que o processo de cárie era exógeno e causava um comprometimento da integridade do esmalte e sua posterior destruição. a. Teoria Parasitária ou Séptica Essa teoria afirmava que os microrganismos filamentosos extraídos de cavidades de cárie, aos quais o pesquisador denominou de denticolae, causavam a decomposição do esmalte e da dentina. No entanto, o mecanismo pelo qual a decomposição ocorria não foi explicado. b. Teoria Quimioparasitária A produção de ácidos e digestão de proteínas pelos microrganismos bucais levaria à formação da cárie. Miller, em uma série de experimentos na Universidade de Berlim, demonstrou que: 12 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores ácidos estão presentes nas lesões de cárie profundas, como demonstrado por meio de indicadores de pH; diferentes tipos de alimentos (pão, açúcar, etc.) misturados com saliva e incubados a 37°C podem descalcificar por completo a coroa de um dente; diferentes tipos de bactérias bucais (no mínimo trinta espécies foram isoladas) são capazes de produzir quantidade suficiente de ácido para causar cárie dentária; ácido láctico é um produto identificável em misturas incubadas de saliva com carboidratos; diferentes microrganismos (filamentosos, bacilos longos e curtos e micrococos) apresentam capacidade de invadir a dentina cariada. Miller (1890) concluiu que os microrganismos causavam cárie, mas certamente o processo era mediado por um microrganismo bucal capaz de produzir ácido e digerir proteína; a cárie era um processo quimioparasitário, que consistia em dois estágios: descalcificação ou amolecimento dos tecidos duros e dissolução dos resíduos moles. c. Teoria Proteolítica Essa teoria afirmava que microrganismos proteolíticos atuando sobre a porção orgânica do esmalte chegariam até o limite amelodentinário (esmalte-dentina). A destruição do suporte físico do esmalte levaria à formação da cavidade de cárie. d. Teoria Proteolítica-Quelante Essa teoria preconiza que microrganismos atuando sobre a porção orgânica do dente formariam quelantesque levariam à dissolução da porção mineral. Perdas da matéria orgânica e inorgânica ocorreriam simultaneamente. e. Teoria Acidogênica Essa teoria afirmava que microrganismos atuando sobre carboidratos formariam ácidos que levariam à formação de cárie. Atualmente, é considerada a teoria mais aceita. 1.4 SALIVA A saliva é o fluido produzido pelas glândulas salivares, atingindo o volume total de 800 a 1.500mL por dia. 13 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FUNÇÕES DA SALIVA Várias funções são atribuídas à saliva. A função digestiva da saliva humana é mínima, a única enzima digestiva importante presente é a amilase. Entretanto, a função da saliva como lubrificante é facilitada pelo seu conteúdo de mucina, que é importante para a criação do bolo alimentar, para a deglutição e para a fala. Como solvente para substâncias com propriedades de sabor, a saliva também influencia na sua percepção, funcionando como referência básica, por exemplo, para o sal. A saliva é importante na defesa contra microrganismos patogênicos que invadem a cavidade bucal, onde as substâncias antimicrobianas de origem salivar mantêm o equilíbrio ecológico. Ela protege a cavidade bucal contra os danos causados por alterações do pH devido à sua capacidade tampão. A secreção salivar funciona como via de excreção para muitas substâncias, tornando possível monitorar a farmacodinâmica das drogas na saliva. FLUXO SALIVAR O fluxo salivar é o parâmetro clínico mais importante da saliva, afetando a suscetibilidade às lesões de cárie. Na prática clínica, a medição do fluxo salivar (sialometria) é indicada: como parte do exame inicial de um paciente novo a receber tratamento para a doença cárie; durante a avaliação de um determinado tratamento profilático e terapêutico da doença cárie, para obter informações de como o procedimento geral afetou a saúde bucal; como parte dos procedimentos de diagnóstico de suspeita de hipossalivação, causada, por exemplo, pela síndrome de Sjögren ou por irritação na região da cabeça e do pescoço. Durante as mesmas consultas também é possível medir a capacidade tampão da saliva, bem como os níveis de estreptococos do grupo mutans e de lactobacilos. 14 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores MEDIÇÃO DO FLUXO DE SALIVA ESTIMULADA Clinicamente, o procedimento usual é medir o fluxo salivar durante o estímulo mastigatório, isto é, mastigando um pedaço de parafina. Para obter confiabilidade, resultados padronizados, devem ser dadas instruções detalhadas ao paciente. Pede-se ao paciente para mastigar a parafina (1g), como se fosse uma goma de mascar, durante 1 minuto para amaciá-la e depois remover toda a saliva por deglutição ou expectoração. A mastigação continua por um período fixo (5 minutos) com o mesmo bolo de parafina. Pede-se ao paciente para expelir a saliva babando em um coletor graduado até o período fixo ter terminado. A espuma pode ser evitada ou reduzida utilizando-se uma proveta resfriada com gelo ou através da adição de gotas de Dimeticona®. O índice de secreção é expresso em mL por minuto. MEDIÇÃO DO FLUXO DE SALIVA NÃO ESTIMULADA Obviamente, é mais ou menos impossível obter “saliva verdadeiramente em repouso”, uma vez que, durante a consciência, o fluxo de saliva é sempre influenciado por algum tipo de estímulo. Entretanto, a saliva coletada sem nenhum estímulo mastigatório ou gustativo, simplesmente salivando passivamente dentro de um coletor, é um indicador mais confiável de fluxo de saliva reduzido e hipossalivação, do que a saliva estimulada. Quando a secreção em repouso é coletada, pede-se ao paciente para sentar-se em uma posição relaxada, com os cotovelos descansando sobre os joelhos e a cabeça abaixada entre os braços. Esta posição também é ideal para a coleta de saliva estimulada. Até mesmo pequenos movimentos da língua, bochechas, mandíbulas ou lábios devem ser evitados. Os lábios são apenas ligeiramente abertos, e o paciente deixa a saliva pingar passivamente por sobre o lábio inferior, dentro do coletor. A saliva não deve ser cuspida dentro do coletor. Nos adultos saudáveis, a proporção de fluxo em repouso deve exceder 0,1 mL/min. Em pacientes com suspeita de hipossalivação, o período de amostragem deve ser de 15 min, de forma a evitar a influência das flutuações no fluxo salivar. O resultado deve ser expresso em mL/min e, para maior clareza, em mL/15min. 15 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Hipossalivação Baixo Normal Saliva em repouso <0,1 0,1 - 0,25 0,25 – 0,35 Saliva estimulada <0,7 0,7 – 1,0 1,0 – 3,0 Índice de secreção de saliva total em repouso e estimulada com parafina, expresso em mililitros por minutos. HIPOSSALIVAÇÃO E XEROSTOMIA É difícil definir o que significa hipossalivação, visto que os valores normais apresentam grande variação biológica. Entretanto, a hipossalivação não é a mesma coisa que xerostomia (palavra derivada do grego significando “boca seca”), que é um sintoma e depende de vários fatores. O nível de evaporação da saliva na boca é muito alto e já foram calculados valores da ordem de 0,25 mL/min. Se o fluxo salivar for baixo, é fácil compreender porque o volume residual de saliva dentro da boca, em um dado momento, pode ser muito baixo. Também é compreensível que pacientes com índices de fluxo semelhantes possam apresentar diferenças na experiência de xerostomia; por exemplo, aqueles que respiram pela boca. Há pouca relação, se é que existe alguma, entre o indivíduo que se queixa de xerostomia e a quantidade real de fluxo salivar, o que reforça a importância de executar sialometria em todos os casos de doença cárie. Para o diagnóstico adequado da hipossalivação, os seguintes pontos devem ser considerados: índice de fluxo estimulado; índice de fluxo em repouso; anamnese: o possível medicação inibidora da saliva (anticonvulsivantes, anti-histamínicos, anti-hipertensivos, antieméticos, antiparkisonianos, anti-espasmódicos, anorexígenos, diuréticos, descongestionantes, expectorantes, relaxantes musculares e psicotrópicos); o dificuldades na deglutição de alimentos secos, por exemplo, biscoitos e pão; o dificuldades de fala; 16 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores o irritabilidade da mucosa bucal; o dificuldades em usar próteses removíveis. irritabilidade das glândulas salivares durante a palpação, ou inchaço das glândulas; alterações inflamatórias na mucosa bucal ou língua; teste indicativo: o espelho do examinador adere à mucosa da bochecha? quadro atípico de lesões de cárie (lesões cariosas nas superfícies lisas ou nas bordas dos incisivos ou caninos); idade do paciente, pois o fluxo salivar diminui fisiologicamente com o aumento da idade, devido a uma diminuição do tamanho das glândulas salivares submandibulares e menores. Se a maioria dos pontos acima apresentar valores positivos e o fluxo em repouso for baixo, o diagnóstico quase certamente incluirá hipossalivação e o paciente deve ser considerado com alto risco de cárie. Muitas doenças influenciam o fluxo salivar de alguma forma. O possível efeito de inibição da saliva devido à medicação do paciente deve ser confrontado com os dados da droga e o médico deve ser consultado sobre as possibilidades de mudança (ou, em alguns casos, até mesmo interrupção) da medicação, tentando outro medicamento ou, talvez, alterando a dose. Existem inúmeras drogasque apresentam a hipossalivação como efeito colateral potencial, sendo que as mais utilizadas são os antidepressivos, diuréticos, anti-histamínicos e narcóticos. Naturalmente, a doença sistêmica é prioritária e a medicação necessária não deve ser alterada apenas por razões odontológicas. Freqüentemente, doenças sistêmicas, combinadas com sua medicação, provocam declínio significativo na secreção salivar. Dentre essas doenças, as mais comuns são as doenças reumatóides e auto-imunes, como a síndrome de Sjögren ou o lúpus eritematoso sistêmico. Visto que não se conhece tratamento curativo, os sintomas orais devem ser aliviados com salivas artificiais e as lesões de cárie devem ser prevenidas com profilaxia adequada. Portanto, os dentistas devem estar capacitados a coletar amostras de saliva meticulosamente, de forma a identificar esses pacientes o mais cedo possível. 17 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores O diabetes mellitus tipo I (dependente de insulina), como tal não danifica as glândulas salivares ao ponto da hipossalivação poder ser identificada como conseqüência normal dessa doença. A secreção salivar reduzida é típica apenas durante períodos de desequilíbrio do diabetes, ou devido ao ataque da doença. Desnutrição, bem como anorexia nervosa, podem, em casos graves e em períodos prolongados, reduzir o fluxo salivar até o ponto do aparecimento de sintomas bucais, como por exemplo, aumento da freqüência de lesões de cárie. Embora o jejum de curto período reduza significativamente o índice de fluxo, não provoca hipossalivação de fato e o índice de fluxo retorna ao normal logo após o término do período de jejum. As mudanças hormonais também podem afetar o fluxo e a composição da saliva humana. Os homens apresentam índice de fluxo maior que as mulheres, mas é provável que isso seja devido ao tamanho menor das glândulas salivares das mulheres e não devido a fatores hormonais. O fluxo salivar sofre um pequeno declínio durante a gestação, porém, isso provavelmente não tem nenhum significado clínico, assim como, durante o ciclo menstrual ou devido ao uso de contraceptivos orais. As mais profundas alterações salivares induzidas por hormônios são encontradas nas mulheres após a menopausa, todavia, as respostas individuais à menopausa variam grandemente, desde secura bucal (com inúmeros sintomas, como “boca queimando”, língua ferida, dificuldades de fala e deglutição, infecções fúngicas etc.) até nenhuma alteração detectável no índice de fluxo salivar. Pacientes com carcinoma de cabeça e pescoço submetidos à radioterapia têm fluxo salivar diminuído. Além disso, a radiação também altera a composição da saliva, que se torna viscosa e branca, também podendo se apresentar como um fluido amarelado ou castanho com pH reduzido, com capacidade tampão reduzida e com conteúdo protéico e eletrolítico alterado. Dentre as alterações na boca induzidas por irradiação, há aumento pronunciado no número de microrganismos acidogênicos e cariogênicos. Clinicamente, as alterações mais significativas são os aumentos dos estreptococos do grupo mutans, lactobacilos e leveduras do gênero Candida. As alterações salivares predispõem o paciente irradiado a vários problemas bucais, como degeneração dentária rápida e extensa, a menos que sejam tomadas medidas preventivas eficazes. 18 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Além do rápido ataque e progressão, as lesões de cárie causadas por radiação geralmente são encontradas nas superfícies de dentes que, normalmente, são relativamente “resistentes” a essas lesões (superfícies lingual e incisal). As áreas logo abaixo dos pontos de contato, normalmente suscetíveis às lesões de cárie, geralmente são as últimas a serem afetadas pelas cáries de radiação. As doses terapêuticas de radiação utilizadas no tratamento de carcinomas de cabeça e pescoço não causam danos diretos aos dentes, porém, as alterações nos parâmetros microbianos, químicos, imunológicos e dietéticos da cariogenicidade, relacionadas à hipossalivação, juntas contribuem para o grande aumento do desafio cariogênico nos pacientes que sofreram irradiação. Levando em consideração que as glândulas salivares em geral estão localizadas dentro dos portais de tratamento para o câncer na cabeça e pescoço e, que até o momento não há nenhuma proteção radioativa clinicamente aceitável, o tratamento da hipossalivação é paliativo, compreendendo medidas de higiene bucal, uso de agentes antimicrobianos, estimulação do tecido da glândula salivar residual através de estímulos mastigatórios e gustativos, bem como alívio sintomático da secura bucal com salivas artificiais. COMPOSIÇÃO DA SALIVA Vários fatores afetam a composição da saliva. Como muitos desses fatores interagem, a composição da saliva apresenta uma variação muito grande. Uma conclusão importante é a que a amostra salivar deve ser rigorosamente padronizada para não invalidar o teste de atividade de cárie. O principal fator que afeta a composição salivar é o índice de fluxo salivar. À medida que o fluxo aumenta, as concentrações totais de proteína, sódio, cálcio, cloreto e bicarbonato aumentam em níveis variados, ao passo que as concentrações de fosfato e magnésio inorgânicos diminuem. A composição da saliva também depende da duração do estímulo. A saliva coletada durante os primeiros minutos possui uma composição diferente da coletada após 15 minutos de estímulo constante. COMPONENTES INORGÂNICOS 19 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Íons de hidrogênio A concentração de hidrogênio nos fluídos bucais pode ser considerada a “principal variável”, visto que ela influencia a maioria das reações químicas que ocorre na cavidade bucal, mais notadamente o equilíbrio entre os fosfatos de cálcio do tecido dentário duro. Normalmente é expressa em unidades de pH. Os íons de hidrogênio nos fluidos bucais têm diversas fontes: são secretados através das glândulas na forma de ácidos inorgânicos e orgânicos, produzidos pela microbiota bucal ou adquiridos pela cavidade bucal, por exemplo, através de bebidas ácidas ou alimentos. Cálcio Participa do equilíbrio entre os fosfatos de cálcio do tecido dentário duro e a saliva adjacente. Fosfato inorgânico O conteúdo de fosfato inorgânico na saliva é um pré-requisito para a estabilidade do mineral do dente dentro do ambiente bucal, assim como o cálcio, possuindo várias funções biológicas, sendo que a mais relevante, do ponto de vista da cariologia, é sua participação na manutenção da estrutura do dente. Fluoreto O fluoreto está presente na saliva em concentrações que dependem do fluoreto do ambiente, especialmente na água potável. Outras fontes também são importantes, como os dentifrícios e outros produtos utilizados na profilaxia da doença cárie. COMPONENTES ORGÂNICOS Glicoproteínas Quase todas as proteínas salivares são glicoproteínas, isto é, contêm quantidades variadas de carboidratos ligados ao seu núcleo protéico. Apresentam várias funções na 20 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores qual se destacam: a capacidade de inibir a precipitação de sais de fosfato de cálcio e mediarem seletivamente à adesão bacteriana nas superfícies dos dentes. Amilase É uma das enzimas salivares mais importantes, tendo como função biológica dividir o amido em maltose, maltriose e dextrinas. A amilase na saliva elimina da boca os fragmentos de alimentoscontendo amido, mas durante esse processo são formados ácidos. Portanto, o amido pode, dessa forma, ter algum potencial cariogênico. Proteínas antimicrobianas Pertencem a esse grupo: imunoglobulinas: o IgA secretora, IgG e IgM. proteínas não pertencentes às imunoglobulinas: o lisozima: função antimicrobiana; o lactoferrina: função bacteriostática e bactericida; o sistema peroxidase: atividade antimicrobiana e proteção da mucosa bucal contra os efeitos do peróxido de hidrogênio; o aglutininas: aglutinam bactérias em grandes agregados que são eliminados com mais facilidade através da saliva e pela deglutição. Além dos componentes orgânicos citados acima, lipídios e carboidratos também são encontrados na saliva, por secreção das glândulas salivares ou adquiridos através da dieta. SALIVA E CÁRIE A saliva é essencial para a saúde dentária. O índice de fluxo salivar reduzido aumenta não apenas a suscetibilidade às lesões de cárie, mas também à erosão dentária. As funções protetoras da saliva contra as lesões de cárie podem ser resumidas da seguinte forma: 21 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores a saliva melhora a limpeza dos fragmentos de alimento e dos carboidratos derivados de alimentos na boca; a saliva reduz a produção dos produtos metabólicos prejudiciais, como os ácidos produzidos pelos microrganismos bucais devido à presença de muitos fatores antimicrobianos salivares. Dependendo do fator, esses compostos protetores podem não apenas prevenir a adesão e o metabolismo da bactéria cariogênica, mas também podem ser bactericidas; o efeito tampão da saliva e alguns componentes salivares alcalinos (uréia, sialina) previnem a redução intrabucal do pH após a ingestão de açúcar; os componentes inorgânicos da saliva aumentam a resistência da hidroxiapatita contra os ataques cariogênicos; a saliva pode remineralizar as lesões cariosas iniciais por meio dos seus íons de cálcio e de fosfato. A remineralização é grandemente melhorada com a presença de íons de flúor; a saliva aumenta o nível de remoção dos microrganismos cariogênicos da boca, não só pelo seu efeito de fluxo, mas também pela sua capacidade de aglutinar bactérias; os componentes derivados da saliva (mucinas, antígenos do grupo sangüíneo, enzimas antibacterianas, IgA secretora) podem prevenir a colonização por bactérias cariogênicas, modificando assim a composição da película adquirida. 1.5 BIOFILME DENTÁRIO Biofilme consiste de uma ou mais comunidades de microrganismos, embebidos em uma matriz, que recobre uma superfície sólida, sendo o termo utilizado para descrever o acúmulo de microrganismos na superfície dos dentes. O termo biofilme (placa bacteriana, placa dental, placa dentária, etc.) define uma comunidade microbiana embebida por uma matriz aglutinante e firmemente aderida sobre os dentes ou outras estruturas bucais sólidas, tais como próteses, aparelhos ortodônticos, 22 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores restaurações, superfície de implantes ou cálculo salivar. Na maioria das vezes, essa estrutura se desenvolve sobre a película adquirida. PELÍCULA ADQUIRIDA É uma biopelícula formada pós-eruptivamente pela adsorção (adesão) de proteínas e glicoproteínas salivares e do fluido gengival na superfície dentária. Essa fina camada forma a base para a subseqüente adesão de microrganismos, os quais, sob certas condições, podem se desenvolver o biofilme dentário. A película, mesmo sendo fina, tem função importante na proteção do esmalte contra a abrasão e o atrito, mas também funciona como barreira difusora, além de influenciar no comportamento de solubilidade da superfície do esmalte. A película adere ao esmalte e a outras superfícies sólidas presentes na boca, sendo normalmente livre de bactérias. Sua espessura varia de 0,1 a diversos micrômetros e sua remoção pela escovação é dificultada pelo fato de ela não só recobrir a superfície dentária como também se adsorver e, algumas vezes, penetrar na superfície do esmalte até 3 µm. A adsorção das macromoléculas, em geral originadas da saliva, para o esmalte é seletiva; isto é, certas macromoléculas apresentam maior afinidade com a superfície mineral do que outras. A composição exata dessa camada será determinada por vários fatores, por exemplo, o pH, a força iônica e os tipos de íons presentes na saliva. Normalmente, a camada hidratante próxima à superfície do esmalte contém principalmente íons de cálcio e fosfato, mas outros íons como sódio, potássio e cloreto podem estar presentes. Quando um dente é totalmente limpo e polido expondo a superfície do esmalte contendo hidroxiapatita ao ambiente bucal, ele será recoberto dentro de pouco tempo pela película adquirida. Esse filme orgânico já estará presente após 15 minutos, apresentando formação mais rápida nas duas primeiras horas, decaindo e continuando a ser formado mais lentamente. A seguir, a película adquirida começa a ser colonizada por bactérias. Treze proteínas específicas foram detectadas e caracterizadas imunologicamente na 23 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores película, incluindo: glicoproteínas, imunoglobulinas/anticorpos (IgA, IgG), albumina, enzimas (lisozima, amilase, transferrina, lactoferrina) e carboidratos. O índice de formação da película é alto durante a primeira hora, após, diminui. Parece provável que a adsorção da primeira camada molecular em uma superfície limpa seja instantânea. O índice de formação varia de indivíduo para indivíduo, provavelmente devido às diferenças da composição salivar A formação da película pode ser considerada como o primeiro estágio na formação do biofilme dentário, embora represente uma entidade distinta até ser colonizada por bactérias. Têm sido atribuídas à película as seguintes ações: proteção da superfície do esmalte: é provável que a película ofereça certa proteção ao esmalte contra ácidos de origem bacteriana; além disso, apresenta relativa resistência à ação de abrasivos. Há necessidade do uso de pedra-pomes e escovas duras para removê-las; influência na aderência de microrganismos bucais: tal aderência aumenta em alguns casos e decresce em outros, dependendo da composição da película e do tipo de microrganismo. Acredita-se que a película confira especificidade ao processo de adsorção e que as proteínas da película tenham maior afinidade com alguns microrganismos do que com outros; substrato (fonte de nutrientes) para microrganismos adsorvidos (aderidos); reservatório de íons protetores, incluindo o flúor. COMPOSIÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO O biofilme dentário é constituído por microcolônias de células bacterianas distribuídas em uma matriz. Estão presentes no biofilme dentário: polissacarídeos, células epiteliais descamadas, leucócitos, enzimas, sais minerais, glicoproteínas salivares, proteínas, pigmentos e restos alimentares. Evidenciou-se a presença de espaços ou canais de água entre as microcolônias bacterianas do biofilme. Esses canais de água permitem a passagem de nutrientes e outros produtos através do biofilme, atuando como um sistema circulatório primitivo. As 24 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores microcolônias podem apresentar um único microrganismo, entretanto, mais freqüentemente, são compostas por várias espécies bacterianas. O biofilme proporciona como vantagens para os microrganismos: proteção frente a fatores ambientaiscomo os mecanismos de defesa do hospedeiro e proteção frente a substâncias potencialmente tóxicas. O crescimento na forma de biofilme também pode facilitar a obtenção de nutrientes, utilização de nutrientes produzidos por outras bactérias, remoção de produtos metabólicos tóxicos, assim como desenvolvimento de um meio ambiente físico e quimicamente apropriado. O componente bacteriano do biofilme dentário tem sido considerado um ecossistema de mudanças contínuas, variando em composição nos diferentes locais da boca. Estima-se que mais de quinhentas espécies microbianas sejam capazes de colonizar a cavidade bucal e que cada indivíduo possa carregar cerca de 150 a 200 espécies. O biofilme dentário é uma mistura de muitos microrganismos, sendo comum isolar muitas espécies bacterianas de uma amostra. A composição bacteriana em uma área não é estática, variando de acordo com a idade do biofilme. ETAPAS DE FORMAÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO a) Comunidade Pioneira Numa fase inicial, 15 minutos a 8 horas após limpeza adequada, o dente é colonizado por estreptococos e por alguns bastonetes Gram-positivos. Se durante essa fase, houver disponibilidade de sacarose proveniente da dieta do hospedeiro, poderá ocorrer implantação de Streptococcus mutans e Streptococcus sobrinus. São necessárias pelo menos 24 horas sem limpeza para que haja a formação de uma camada de biofilme clinicamente evidenciável. b) Comunidade Intermediária Após 24 horas de crescimento, a microbiota torna-se significativamente mais complexa. A proporção de estreptococos diminui, enquanto cocos anaeróbios Gram- negativos aumentam rapidamente. Espécies anaeróbias estritas e facultativas também se tornam predominantes. Bastonetes anaeróbios Gram-negativos e fusiformes representam pequena porção da comunidade intermediária. 25 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores c) Comunidade Clímax Com o crescimento do biofilme no sentido apical e com o aumento de sua espessura, os microrganismos anaeróbios são favorecidos. Os bastonetes Gram- negativos e espiroquetas aumentam em número, principalmente nas camadas mais próximas ao dente. A progressão aceita é que a partir de uma microbiota de cocos Gram-positivos aeróbios, ocorre aumento na proporção de bastonetes Gram-positivos e, então, um aumento na proporção de bastonetes Gram-negativos, em especial bastonetes anaeróbios e filamentos. Eventualmente, depois de estabelecida uma comunidade “clímax”, tornam-se evidentes as espiroquetas anaeróbias. Existem diferenças no tipo de biofilme dentário correlacionado à cárie e à doença periodontal. A ocorrência da doença é devida: aos efeitos nocivos de produtos derivados de microrganismos do biofilme; à existência de microrganismos patogênicos específicos no biofilme e ao aumento de determinados microrganismos indígenas em certos biofilmes. Quanto aos aspectos morfológicos, o biofilme dentário pode ser dividido em: biofilme dentário supragengival ou coronário (formado acima da borda da gengiva) e biofilme dentário subgengival (formado abaixo da borda gengival) a partir da migração apical do biofilme em decorrência do aumento na quantidade e diversidade de espécies bacterianas, sendo mais fino devido às restrições anatômicas. Sua formação é resultante da interação entre fatores físicos (anatomia dos dentes, anatomia dos tecidos, estrutura dentária, higiene bucal, atrito da dieta) e nutrientes (fluido bucal, fluido gengival, constituição do biofilme, células epiteliais, leucócitos) em um período de tempo. O biofilme dentário pode apresentar potencial patogênico, sendo que a cárie e a doença periodontal são as principais enfermidades da cavidade bucal influenciadas pela atividade patológica do biofilme dentário. Nele, podem estar presentes microrganismos que produzem ácidos (fórmico, acético, butírico, láctico e sulfídrico) a partir do metabolismo de açúcares, que provocam desmineralização do dente ou, ainda, enzimas e outros produtos potencialmente tóxicos que lesam o epitélio e penetram no tecido conjuntivo. Os lipopolissacarídeos de bactérias Gram-negativas são capazes de penetrar no epitélio intacto do sulco, ativando o sistema complemento e desencadeando o processo inflamatório agudo. 26 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FORMAÇÃO DO BIOFILME DENTÁRIO FASE INICIAL A superfície da hidroxiapatita apresenta carga negativa. Como a superfície da hidroxiapatita e as bactérias têm cargas negativas, começa a ocorrer atração das bactérias devido às forças de Van der Waals (energia cinética); porém, as cargas negativas livres na célula bacteriana e na superfície do dente se repelem. O microrganismo fica num estado de equilíbrio, resultante, de um lado, dos efeitos repulsivos entre as cargas negativas e, de outro, das forças atrativas de Van der Waals. Nessa fase, a adsorção é reversível e as bactérias estão acerca de 50 a 100 nm de distância da superfície dentária. Tal distância pode ser preenchida ou diminuída, tornando a bactéria fixa à superfície pelos mecanismos da fase de acumulação. FASE DE ACUMULAÇÃO Durante essa fase, o espaço presente entre os microrganismos e a superfície dentária, resultante das forças de Van der Waals, é eliminado e os microrganismos conseguem se aderir ao dente (película adquirida ou hidroxiapatita). a) Camada de hidratação: quando imersa em saliva, a carga negativa da superfície do esmalte é neutralizada por uma camada de íons de cargas opostas, os chamados íons de oposição. Esses íons podem atuar como mediadores da aderência entre bactérias e superfície dentária. b) Glicocálice: conjunto de estruturas de natureza polissacarídica, situadas externamente à parede celular bacteriana. Essa estrutura poderia funcionar neutralizando as cargas negativas da superfície bacteriana. O glicocálice desempenha importante papel na aderência de certos microrganismos patogênicos a seus hospedeiros. c) Pili ou fímbrias: são organelas filamentosas presentes em determinadas bactérias, semelhantes a flagelos, porém, mais curtas e delicadas. Além de serem associadas à patogenicidade em determinadas espécies bacterianas, auxiliam na 27 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores formação de uma ponte que estabelece contato entre as bactérias e a superfície dentária, contribuindo para a adesão microbiana. d) Adesinas: são moléculas encontradas nas bactérias que reconhecem receptores específicos localizados na superfície dentária, nos constituintes da película adquirida ou nas células epiteliais das mucosas. e) Polímeros bacterianos extracelulares: são polissacarídeos formados por carboidratos, que representam parte da matriz do biofilme dentário fortalecendo mecanicamente o mesmo, possibilitando resistência às forças de limpeza e facilitando a retenção e agregação bacteriana na superfície do dente (película ou hidroxiapatita). f) Co-agregação: é a agregação entre microrganismos da mesma espécie ou entre espécies diferentes, favorecendo sua adesão sobre a superfície dentária. g) Constituintes salivares: os constituintes salivares podem funcionar com aglutininas, reagindo com microrganismos bucais e favorecendo sua aglutinação e adesão na superfície dentária. 1.6 PARTICIPAÇÃO MICROBIANA NO PROCESSO DE CÁRIE MICRORGANISMOS E CARIOGENICIDADE Virulência é definida como a capacidade de um microrganismo de superar os mecanismos de defesa do hospedeiro e causar danos aos seus tecidos, sendo que a resistência do hospedeiro e os fatores ambientais também estão envolvidos. Como fatoresintrínsecos da cariogenicidade (virulência) dos microrganismos, podemos citar: mecanismos de aderência à cavidade bucal, capacidade de produzir ácido (acidogenicidade), capacidade de viver em meio ácido (potencial acidúrico), formação e utilização de polissacarídeos intra e extracelulares. ESTREPTOCOCOS BUCAIS 28 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores mutante de estreptococo, essa bactéria e estrep Os estreptococos isolados a partir de lesões de cárie foram associados à etiologia da doença. Devido à sua forma mais oval do que esférica, parecendo ser uma forma foi denominada Streptococcus mutans. Devido às diferenças de virulência e características de sorotipagem, a espécie Streptococcus mutans foi reclassificada em sete espécies, constituindo os estreptococos do grupo mutans, onde se destacam Streptococcus mutans, relacionado com a etiologia da cárie e Streptococcus sobrinus, que tem provável participação no processo de cárie. A relação entre alta contagem d tococos de grupo mutans a alta atividade de cárie já foi estabelecida. Nos estreptococos do grupo mutans, as principais propriedades que podem se relacionadas à sua capacidade de produzir lesões cariosas são: sintetizar polissacarídeos insolúveis da sacarose; formar ácido láctico por meio da fermentação de carboidratos; colonizar superfícies dentárias; possuir acidogenicidade (capacidade de produzir ácidos); apresentar maior potencial acidúrico (capacidade de viver em ambiente ácido) em relação aos outros estreptococos. Outras espécies de estreptococos bucais podem possuir pequena capacidade cariogênica. LACTOBACILOS Os lactobacilos são bactérias e foram os primeiros microrganismos a serem considerados cariogênicos; porém, atualmente, se considera que não são iniciadores, mas sim envolvidos na progressão do processo carioso. Além disso, estão diretamente correlacionados com a alta e freqüente ingestão de carboidratos. Atualmente, sobre a relação entre lactobacilos e cárie, temos as seguintes conclusões: raramente estão ausentes na boca de adultos dentados; aumentam em número nas superfícies do esmalte e no biofilme, antes do aparecimento da cárie; o aumento do número de lactobacilos da saliva precede de 3-6 meses o aparecimento de lesões de cárie; progridem na saliva, quando há aumento na predisposição à cárie; a ingestão de quantidades maiores de carboidratos refinados aumenta a população de lactobacilos na saliva e a atividade de cárie. ACTINOMICES Todas as espécies de Actinomyces fermentam glicose, produzindo, em sua maioria, ácido láctico, e menor quantidade de ácido acético e succínio e traços de ácido fórmico. São bons formadores de biofilme por formarem polissacarídeos extracelulares. Normalmente estão relacionados às lesões de cárie radicular. 29 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores CANDIDA Essas leveduras podem estar associadas à presença de cárie devido a suas propriedades acidogênicas e capacidade de degradação do colágeno presente na dentina. As espécies pertencentes a esse gênero fermentam vários tipos de açúcares e participam da formação do biofilme dentário. 1.7 PARTICIPAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE NO PROCESSO DE CÁRIE Os tecidos da cavidade bucal estão sob a proteção de fatores imunológicos específicos e não-específicos. A função desses fatores é regular a colonização de 30 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 31 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores microrganismos nos tecidos moles e duros da cavidade bucal, assim como prevenir a penetração de substâncias nocivas nessas superfícies, podendo resultar em danos imunológicos aos tecidos bucais. MECANISMOS INESPECÍFICOS DE DEFESA PRESENTES NA CAVIDADE BUCAL A saliva atua como defesa primária contra a cárie. De fato, a diminuição do fluxo salivar pode aumentar o aparecimento de cárie rampante. Vários componentes inespecíficos presentes na saliva (lisozima, lactoperoxidase, lactoferrina, mucinas, histatinas, cistatinas, glicoproteínas ricas em prolina) favorecem a eliminação dos microrganismos bucais através da aglutinação, interferência na co-agregação de microrganismos ou na adesão ao dente, e toxicidade; alguns deles são secretados pelas próprias glândulas salivares, e outros, provenientes do plasma, como por exemplo, as células fagocíticas, principalmente neutrófilos que além da fagocitose liberam várias enzimas que ajudam a controlar o crescimento bacteriano. Esses mecanismos são inespecíficos, pois atuam sobre os microrganismos bucais de forma não seletiva, dessa forma atuam também sobre os microrganismos cariogênicos. MECANISMOS ESPECÍFICOS DE DEFESA PRESENTES NA CAVIDADE BUCAL Como outras secreções das glândulas exócrinas, a saliva possui anticorpos, predominantemente IgA secretora. Os anticorpos são importantes componentes da resposta imune e fazem parte de um grupo de proteínas solúveis chamadas de imunoglobulinas. Os antígenos estreptocócicos podem estimular a secreção de IgA. Uma vez produzidas, as IgA agem como aglutininas específicas impedindo a aderência dos microrganismos a receptores específicos nas superfícies mucosa ou dentária, e levando a sua remoção da cavidade bucal. 32 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Já os anticorpos da classe IgG podem se ligar em células de Streptococcus mutans e facilitar sua destruição pelas células fagocíticas. IMUNIZAÇÃO COM Streptococcus mutans – VACINAÇÃO A imunização contra Streptococcus mutans tem sido estudada e pode ser uma ferramenta importante no controle da cárie dentária. Atualmente, são realizados estudos de imunização contra bactérias do biofilme dentário, principalmente contra Streptococcus mutans. Os resultados obtidos são parcialmente satisfatórios, mas se deparam com as seguintes dificuldades: complexidade microbiana do biofilme; dificuldade de acesso dos anticorpos ao biofilme dentário; microrganismos formadores do biofilme dentário são pouco imunogênicos (pouca capacidade de ativar o sistema imunológico); anticorpos salivares aparecem em níveis baixos na saliva; produção e presença de polissacarídeos no biofilme dentário dificultam a ação de anticorpos e fagocitose. Estudo promissor quanto ao controle biológico da cárie está na modificação genética de Lactobacillus zae para a imunização passiva. Esses lactobacilos passariam a produzir anticorpos antiadesina de Streptococcus mutans, levando à inibição da aderência desse microrganismo e à resistência ao desenvolvimento de cárie, e o iogurte poderia ser utilizado como meio de administração. --------------------------FIM DO MÓDULO I---------------------------
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