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Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez Introdução • De maneira geral, as viroses que acometem o sistema nervoso central são infrequentes. • Normalmente causam doenças autolimitadas e relativamente sem gravidade. Isso é bom, porque geralmente doenças no SNC apresentam potencial risco de morte e danos neurológicos. • Rotas pelas quais os vírus acessam o SNC: - Direto pela barreira hematoencefálica; - Carreadas por leucócitos; - Via nervos espinhais e cranianos. • Há uma série de infecções que esses patógenos inflamatórios podem causar: encefalite, meningite, radiculite, meningoencefalite, encefalomielite, mielorradiculite, meningoencefalorradiculite. • Essas infecções acometem o SNC e podem causar danos neurológicos. De maneira geral, quando complicam, podem causar: - Citólise ou apoptose de neurônios ou células da glia; - Dano à barreira hematoencefálica; - Ataque autoimune de células específicas; - Indução de genes virais e repressão de genes celulares; - Alteração da migração neuronal; - Atenuação da replicação dos progenitores neurais; - Bloqueio da produção e do efluxo do fluido cerebroespinhal. • As viroses neurotrópicas possuem diversos vírus de DNA e RNA que podem causar as infecções. • Quadro com exemplos de vírus de DNA que causam doenças associadas ao SNC dos seres humanos. • Quadro com exemplos de vírus de RNA que causam essas viroses neurotrópicas. • Dentre eles está o vírus da raiva, que pode causar encefalite, encefalomielite. Sua transmissão é pela saliva. • Outra família também importante é a do poliovírus, que causa a poliomielite. Pode causar meningite, encefalite, mielite. Transmissão fecal- oral. • Há vários outros vírus que podem infectar o SNC. Vírus da raiva • Causa uma encefalomielite viral aguda, progressiva e fatal. • Ocorre em mais de 150 países, com maior frequência em África e Ásia. • É uma zoonose. • Grande problema de saúde pública, por causar muitos óbitos por ano. • Tem importância econômica, pois causa impacto na criação de animais. • Transmitida na maioria das vezes através da mordedura de animal infectado. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez • Acomete mais crianças com idade inferior a 15 anos. Histórico • Surgiu em 1800, quando ocorreu um surto na França. • Em 1804 Zinke conseguiu relacionar a doença com a saliva de animais raivosos. • Em 1808 Pasteur relacionou o vírus com uma propriedade neurotrópica. Desenvolveu a vacina. • Em 1903 Remlinger conseguiu filtrar esse agente infeccioso e foram feitos alguns experimentos, que mostraram os corpúsculos de inclusão – efeito citopático* do vírus na célula infectada (em neurônios infectados) Alteração que o vírus causa na célula hospedeira* Classificação e características • É da ordem mononegavirales, da família Rhabdoviridae e gênero Lyssavirus. • Esse gênero possuis 14 espécies virais, dentro das quais há vírus rábicos e não-rábicos. Delas, 12 possuem como reservatório o morcego. • O vírus da raiva, RABV, genótipo 1, está presente em estirpes selvagens e vacinais. • É um vírus de distribuição global, com diferentes sorotipos. • Acomete principalmente mamíferos terrestres e morcegos. • É um problema de saúde pública e veterinária. Morfologia • Possui uma morfologia bem definida, semelhante a um projétil. • Uma das extremidades arredondada e a outra plana. • A partícula completa tem entre 100 e 300 nm de comprimento (180 nm em média) por 75nm de diâmetro, variando de acordo com a amostra considerada. • É possível observar as espículas virais – proteínas de superfície. A glicoproteína G. • É um vírus envelopado (em vermelho), o que quer dizer que ele carrega parte da membrana citoplasmática da célula ao sair. • O capsídeo (em laranja), representado com os capsômeros (proteína M). • Seu material genético é uma fita de RNA linear com proteínas L e P, envolvidas com a síntese viral, entre outras. • O capsídeo do vírus da raiva, juntamente com o RNA, forma o complexo ribonucleoproteico (RNP). • Organização do genoma: fita simples não segmentada de RNA, de polaridade negativa. Possui proteínas estruturais e não-estruturais. • Funções das proteínas do vírus. • É um vírus pouco resistente aos agentes químicos. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez • Inativado por: éter, clorofórmio, sais, ácidos e álcalis fortes, fenol, formol, desinfetantes, detergentes, surfactantes, solventes orgânicos, agentes oxidantes, compostos quaternário de amônio, preparações iodadas, etanol a 70%, beta- propiolactona e tripsina. • É necessário fazer a desinfecção química de instrumentos cirúrgicos quando feito algum procedimento/necropsia em animais infectados. • Os vírus da raiva podem ser inativados por agentes físicos como calor a 80 graus celsius por 2 min, radiação UV, raios X, assim como em temperatura e luminosidade excessivas (luz solar por 14 dias, a 30 graus). • A 4 graus os vírus se mantem infecciosos por dias; a -70 graus liofilizados durante anos. Biossíntese • A primeira etapa da biossíntese viral é a adsorção – as espículas virais se ligam ao receptor específico da célula hospedeira. Um receptor ao qual tem tropismo. • O vírus é endocitado, sai do endossomo e começa sua replicação do material genético no citoplasma da célula. • Primeiro é replicado o material genético, enche a célula desse material; depois começa a traduzir as proteínas envolvidas com a estrutura da partícula – espículas virais, as quais serão traduzidas e direcionadas para a membrana da célula; proteínas do capsídeo. • Após isso tudo, há a montagem da partícula viral e a liberação dela através do brotamento – carregando parte da membrana citoplasmática da célula. Patogênese • A transmissão ode acontecer de algumas formas. A principal delas é através da mordedura de um animal infectado. Um dos lugares onde o vírus está presente e se replica é nas glândulas salivares – tanto dos humanos quanto dos animais. O cachorro infectado apresenta alguns sintomas, dentre eles, uma agressividade maior. • O vírus da raiva pode se manifestar no animal de duas formas: pode atingir o sistema límbico, fazendo com que o animal tenha a chamada raiva furiosa ou pode atingir o neurocórtex, fazendo com que o animal tenha a chamada raiva muda – associada a depressão, coma, parada respiratória e morte. Normalmente, a raiva furiosa está mais associada a animais carnívoros, mas nada impede que tenham a raiva muda. • A mordedura lesiona a pele, permitindo que o vírus presente na saliva entre no organismo. • Existem outras formas de transmissão: a lambedura de mucosas íntegras por um animal com raiva; através de transplante de córnea; aerossóis. • Após a inoculação viral, há a replicação no tecido muscular – na porta de entrada do vírus. Depois de um tempo, com uma grande concentração de vírus no tecido muscular, eles vão invadir as fibras nervosas, através das junções neuro- muscular e se deslocam via SNP até o SNC. • Primeiro, atingem a medula e a raiz do gânglio dorsal. Ali vão se replicar e migram para o cérebro, infectando-o. • Após a infecção no cérebro, o vírus faz o movimento chamado antirretrógrado, pelo qual a partir do cérebro vai para outros sítios anatômicos, incluindo glândulas salivares, rins, córneas e outros tecidos. Manifestações clínicas Raiva humana • O período de incubação é de 2 a 12 semanas. É variável, pois depende do local onde aconteceu a inoculação viral. Quanto mais perto do cérebro, mais rápido a infecção vai progredir para a infecção do tecido cerebral. • O infectado é assintomático noperíodo de incubação. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez • O início da doença – primeira fase, dura de 2 a 10 dias. Sintomas: uma leve alteração de comportamento, cefaleia, sensação de angústia, elevação discreta da temperatura, dor, irritação e prurido no local da lesão. • Fase de excitação e agressividade. Sintomas: Sensibilidade a luz e som, dilatação da pupila, aumento da salivação, com espasmos nos músculos de deglutição, hidrofobia, espasmos dos músculos respiratórios e convulsões. • Fase de paralisia generalizada; • Evolução: óbito. • Depois que começa a desenvolver os sintomas, é muito difícil reverter o quadro clínico. Por causa disso é muito grave. Raiva canina • O período de incubação é de 3 a 8 semanas. • Depois da incubação, provoca uma mudança súbita no comportamento do animal. • Fase raivosa: hiperexcitabilidade, nervosismo, ansiedade, aumento da salivação, sensibilidade a luz e sons, aumento da salivação, tendência a morder. • Fase paralítica: depressão e paralisia progressiva na faringe, laringe e membros. • Termina em coma e morte. • Alguns podem ir da mudança súbita no comportamento para a fase paralítica. Epidemiologia • Distribuição geográfica mundial; • Em algumas regiões permanece epidêmica; • Possui múltiplos reservatórios; • Cães são a fonte da maior parte das infecções humanas, por conviver com humanos nos centros urbanos. • Infecções causam milhares de mortes todos os anos, principalmente na África e na Ásia. • Em 2004 na América Latina os morcegos hematófagos foram principais transmissores. • No Brasil: canídeos, primatas e morcegos hematófagos. Frequente no Norte e Nordeste. • Diversos animais mantêm esse vírus circulando: ciclo aéreo, ciclo rural, ciclo urbano e ciclo silvestre. Pela ampla gama de reservatórios, é difícil exterminar. Diagnóstico laboratorial • Detecção do antígeno viral, através de uma imunofluorescência direta. • Isolamento viral, com cultura de células de neuroblastoma ou camundongos lactentes. • Sorologia com teste de neutralização e ensaios imunoenzimáticos. • Técnicas moleculares são muito importantes. Obrigatórias em caso de raiva humana. Feitas através da amplificação do gene da proteína N; RT-PCR e sequenciamento. • O vírus da raiva, por causar uma doença muito grave e ser de fácil transmissão, é um vírus de notificação compulsória, precisando ser notificado o aparecimento da doença em qualquer lugar. Prevenção e controle • Não há tratamento eficaz após o aparecimento dos sintomas. • É importante a vacinação de animais e o controle de morcegos hematófagos. • O esquema profilático pré-exposição, ou seja, a vacinação sem ter sido exposto ao vírus, está destinado apenas a grupos de risco: veterinários, pessoas que trabalham com criação de animais ou lidam com animais em geral. • O esquema profilático pós-exposição: para as pessoas em geral, caso sejam mordidas por um animal ou submetidas a situações de risco, podem Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez fazer esse esquema. O primeiro passo é a assepsia do ferimento, a avaliação da exposição (local, tamanho) e decidir quais medidas serão tomadas. Se precisar, a pessoa é vacinada ou vacinação e soroterapia. • Quadro com esquema da profilaxia pós exposição. • Deve-se considerar o tipo de exposição/contato que teve. A partir disso, haverá um tratamento específico. • A raiva tem uma importância muito grande, inclusive há o dia da raiva pela OMS – para conscientização sobre o vírus, a gravidade da doença e o que ele pode causar. Dia 28 de Setembro. Começou em 2016. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez Enterovírus • É o vírus da poliomielite. • É da família Picornaviridae, que tem diversos gêneros, entre eles, os enterovírus e hepatovírus. • Dentre os enterovírus, estão os poliovírus – vírus da poliomielite. Classificação e característica • São vírus não envelopados. • Possui capsídeo icosaédrico – capa proteica que protege o material genético do vírus. Formado pelos capsômeros – proteína Vp1, Vp2 e Vp3 principalmente. • O material genético do vírus é de RNA, com proteína ligada ao genoma. • Os EV são estáveis em uma faixa de pH de 3 a 9. • São rapidamente inativados por formaldeído a 0,3%; ácido clorídrico a 0,1N; cloro residual livre na proporção de 0,3 a 0,5 ppm; e glutaraldeído a 2%. • O grau de inativação desses compostos depende da concentração do vírus, do pH, da presença de material orgânico e do tempo de contato. • Os vírus são resistentes a muitos desinfetantes usados nos laboratórios, como álcool etílico a 70%, lisol a 5%, álcool isopropílico (70 a 95%) e compostos quaternários de amônio a 1%, além de solventes lipídicos como éter e clorofórmio. • São termolábeis, sendo destruídos pela exposição a 42 graus. • São estáveis por anos, em temperaturas entre -20 graus e -70 graus. • São inativados pela luz UV ou por dessecação, principalmente em superfícies. • A organização do genoma é uma fita simples de RNA, de polaridade positiva. Biossíntese viral • A primeira etapa é a adsorção, quando o vírus se liga aos receptores específicos da célula hospedeira. Ocorre o desnudamento – dissolução do capsídeo do vírus e a liberação do material genético. • É um vírus de RNA e será processado no citoplasma. Replica o RNA, enche a célula dele e começa a produção de proteínas estruturais. • Ocorre a montagem da partícula e ela é liberada por lise. Ocorre a lise da célula depois que ela está cheia de partículas virais formadas. Vírus da poliomielite • É uma doença infecciosa aguda, que em sua forma grave afeta o SNC. • Ocasiona a destruição dos neurônios motores na medula espinhal, causando paralisia flácida. • A forma paralítica da poliomielite corresponde a menos de 1% dos infectados com o poliovírus. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez • A maioria dos casos são assintomáticos ou com sintomas brandos. • São enterovírus típicos. • Há três sorotipos de Poliovirus: 1, 2 e 3. Patogênese • A fase inicial da poliomielite ocorre na orofaringe e no TGI. Ele possui tropismo pela mucosa da orofaringe e tonsilas e pela mucosa intestinal e placas de Peyer. • A transmissão do vírus é através da ingestão ou inalação dos vírus, levando ao contato com as mucosas e células às quais possui tropismo, fazendo a biossíntese, pela qual acontece a lise das células. Fase inicial. • O vírus está presenta na saliva e fezes. • Quando os vírus chegam no TGI, também replicam, fazendo lise das células. • A partir da infecção, fase inicial, onde o vírus está o TGI e SR, ocorre a replicação dos vírus nos linfonodos cervicais e mesentéricos profundos. Fase chamada de disseminação linfática. • Com essa replicação nos linfonodos, os vírus ganham a corrente sanguínea e a pessoa tem a viremia primária. Disseminação sanguínea. • Essa viremia primária pode dar acesso ao SNC, para que o vírus invada e dá início à fase neurológica. • Outra possibilidade, a partir da viremia primária, é a invasão do sistema retículo endotelial – nódulos linfáticos, medula espinhal e baço. A partir desse SER, ocorre uma viremia secundária, a qual gera invasão do SNC. Manifestações clínicas • Poliomielite abortiva: forma mais comum, com febre, cansaço, sonolência, cefaleia, náusea, vômito, prisão de ventre e dor na garganta. • Poliomielite não-paralítica: meningite viral, com os mesmos sintomas da abortiva e além deles: rigidez e dor nas costas e na nuca. Dura de 2 a 10 dias, com recuperação rápida e completa. • Poliomielite paralítica:a mais grave. Representa menos de 1% das infecções. Nessa manifestação, a doença se manifesta de 4 a 10 dias, que é o tempo de incubação, com paralisia 2 a 5 dias após o aparecimento dos sintomas iniciais inespecíficos. Há inflamação e destruição da massa cinzenta do SNC, especialmente a medula espinhal – 80% dos pacientes têm paralisia residual. • Outros enterovírus também podem causar essa paralisia flácida – EV-71. • Síndrome Pós-polio: décadas após a pessoa ter a poliomielite paralítica, pode haver a síndrome, pela qual o indivíduo apresentará fraqueza, fadiga e dor. Esses sintomas começam nas áreas afetadas. Acontece atrofia muscular progressiva pós-poliomielite. Epidemiologia • Apresentou três fases no mundo: a endêmica – presente em todos os lugares, era uma doença normal. Com as medidas de higiene e saneamento básico sendo desenvolvidas, passou a ser epidêmica – prevalência em alguns locais. Após a chegada da vacina, é a fase pós-vacinal – na qual é erradicada em muitos países. • Ocorria no mundo todo. Em 1955 – Europa, América do Norte e Oceania. E, com a vacina, houve 99% de queda dos casos. • Atinge grupos etários diversos, com crianças mais suscetíveis. • Os humanos são o único reservatório. • No Brasil foi erradicada em 1994, com imunização em massa de todas as crianças menores que 5 anos, 2x ao ano. • Taxa de incidência no Brasil. Era alta até 1980, marcando os dias nacionais da campanha de vacinação em massa das crianças. Essa cobertura vacinal cresceu e como consequente, a incidência da doença, até ser erradicada. Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé Enfermagem Angie Martinez • Os movimentos anti-vacinas representam um perigo de retorno dessas doenças. • Os casos de paralisia flácida – rosa bem clara; • Casos por outras causas. • Desde a erradicação, erradicou-se essa paralisia flácida por poliomielite. É uma doença de notificação compulsória, pela forma de transmissão fácil e por poder causar uma doença grave. Diagnóstico • Aspectos clínicos e epidemiológicos. • Confirmação laboratorial. • Exame de fezes, urina e swab retal. • Cultura de células – observar os efeitos citopáticos. • Teste de Neutralização com antissoro. • RT-PCR. • Sequenciamento. Prevenção e controle • Vacinação: - Vacina Salk (VIP): intramuscular. Possui vírus inativados. Aplicada em crianças de 2 meses, 4 meses e 6 meses, assim como imunocomprometidos. Qualquer pessoa pode tomar, pois ela é muito segura. - Vacina Sabin (VOP): oral. Possui vírus atenuados. A partir dos 15 meses em crianças saudáveis, sem imuno- comprometimentos. Ela deve ser aplicada em crianças mais velhas porque existem casos (raros) de poliomielite associada à vacina. Aplicada nos 15 meses e 4 anos, como reforço. Outros casos por enterovírus • Esses vírus podem causar, além do vírus da poliomielite: - Meningite viral (EV-17); - Encefalite; - Doenças cardíacas; - Doenças musculares; - Diabetes tipo 1; - Infecções oculares.
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