Buscar

antropologia_cultural_2018

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 120 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 120 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 120 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

A
N
T
R
O
P
O
LO
G
IA
 C
U
LT
U
R
A
L
P
riscila R
ezend
e
Código Logístico
57325
Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6428-1
9 788538 764281
Os principais conceitos da área de antropologia, como 
cultura, processo de humanização, inserção do indivíduo 
no grupo social, dominados e dominantes, matrizes étnicas 
formadoras do povo brasileiro, relativismo, intolerância e 
etnocentrismo são discutidos nesta obra.
 
Por meio da reflexão antropológica, esperamos que você 
amplie sua consciência de que todos nós, seres humanos, 
estamos unidos, embora tenhamos maneiras diferentes 
de viver. Para aprender com o diferente é preciso, antes 
de tudo, aceitá-lo. Somente assim poderemos vencer a 
intolerância, fruto do desconhecimento.
Antropologia Cultural
IESDE BRASIL S/A
2018
Priscila Rezende
Todos os direitos reservados.
IESDE BRASIL S/A. 
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
R358a Rezende, Priscila
Antropologia cultural / Priscila Rezende. - [2. ed.]. - Curitiba 
[PR] : IESDE Brasil, 2018.
116 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6428-1
1. Etnologia. 2. Etnologia - Brasil. 3. Antropologia. 
4. Etnocentrismo. I. Título.
18-51039
CDD: 305.898
CDU: 39(81)
© 2006-2018 – IESDE BRASIL S/A. 
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem 
autorização por escrito da autora e do detentor dos direitos autorais.
Capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: brunorbs/iStockphoto.
Priscila Rezende
Mestre em História Social e especialista em História, 
Sociedade e Cultura pela Pontifícia Universidade Católica de 
São Paulo (PUC-SP). Bacharel e licenciada em História pela 
Universidade Cidade de São Paulo (Unicid).
Sumário
Apresentação 7
1. Introdução aos estudos antropológicos 9
1.1 Delimitações da antropologia cultural 9
1.2 Trabalho: atividade humana 10
1.3 Cultura: definição 10
2. Principais acepções do termo cultura 15
3. Mito: elemento da cultura 23
3.1 Folclore 24
4. A conquista da América e a questão do outro 29
4.1 A conquista da Cidade do México 32
4.2 A comunicação como arma do dominador 33
5. A conquista da América e as formas de dominação 
espanhola 37
5.1 Os espanhóis e os signos 37
5.2 A escravidão gerada pelo colonialismo 39
5.3 O indígena como o “alien” (estranho) para os espanhóis 39
5.4 Diego Durán e a cultura asteca 40
5.5 Bernardino de Sahagún 41
5.6 Onde estava o povo civilizado? 42
6. Conquista do Brasil: historiografia e educação 43
6.1 O conflito entre indígenas e portugueses 43
6.2 A conquista e a proteção da “nova terra” 44
6.3 A história dominante nos livros didáticos 46
6.4 O educador e o ensino crítico 49
7. O enfrentamento dos mundos 53
7.1 A chegada do europeu na “Ilha Brasil” 53
7.2 Fontes oficiais 55
7.3 A Carta de Pero Vaz de Caminha 56
8. Composição étnica do Brasil 63
8.1 Os brasilíndios 63
8.2 Os afro-brasileiros: a verdadeira imigração ilegal 65
8.3 Um negócio chamado escravidão 67
9. Os neobrasileiros 71
9.1 Que país é este? 71
9.2 O mito da democracia racial 74
10. Cultura nacional e identidade 79
10.1 A busca da identidade nacional na década de 1920 79
10.2 A configuração da nação 80
10.3 O modernismo e a identidade brasileira 82
11. A intolerância gerada pelo etnocentrismo 89
11.1 Nazismo: um breve relato 89
11.2 A figura de Hitler 93
12. Subculturas 97
12.1 Tribos urbanas 97
Gabarito 105
Referências 113
7
Apresentação
Escrevemos este livro para que você, aluno, tenha aces-
so aos principais conceitos da área de antropologia, como 
cultura, processo de humanização, inserção do indivíduo 
no grupo social, dominados e dominantes, matrizes étnicas 
formadoras do povo brasileiro, relativismo, intolerância e 
etnocentrismo. O livro é composto por capítulos baseados em 
diversos referenciais teóricos das ciências sociais, da história 
e da educação.
A escolha desses teóricos foi proposital, pois não se pode 
entender a complexidade humana – objeto de estudo da an-
tropologia – se não perscrutarmos potencialidades, compor-
tamentos e mentalidades dos seres humanos. Assim, todas as 
áreas de conhecimento precisam unir-se, cada uma dentro do 
seu limite de investigação, para que seja possível compreen-
dermos melhor o grande e enigmático “quebra-cabeça” que 
somos todos nós. Portanto, podemos afirmar: esta obra é in-
terdisciplinar, pois proporciona o diálogo com diversas áreas 
do conhecimento.
Por meio da reflexão antropológica, esperamos que você 
amplie sua consciência de que todos nós, seres humanos, 
estamos unidos, embora tenhamos maneiras diferentes de 
viver. Para aprender com o diferente, é preciso aceitá-lo; 
somente assim poderemos vencer a intolerância, fruto do 
desconhecimento.
Bons estudos!
1
Introdução aos estudos 
antropológicos
1.1 Delimitações da antropologia cultural
A palavra antropologia deriva do grego άνθρωπος – anthropos 
(homem/pessoa) e λόγος (logos – razão/pensamento). Sendo assim, 
ela analisa as características biológicas, culturais e sociais dos seres 
humanos. Por ser um estudo muito complexo, iremos privilegiar 
nesta obra o aspecto cultural. Dessa forma, antropologia cultural é 
o estudo do comportamento humano, das crenças religiosas e dos 
sistemas simbólicos.
Podemos entendê-la ainda como um modo de compreendermos 
quem somos por intermédio da observação atenta do comportamen-
to do outro. Este deixa de ser visto como um indivíduo ameaçador/
assustador, que não tem nada para acrescentar. Esse olhar diferen-
ciado possibilita uma mudança muito relevante: o outro passa a ser 
encarado como alguém com hábitos, costumes e valores diferentes 
dos nossos e, por esse motivo, pode nos ensinar muitas coisas. Assim, 
o outro é o alter (diferente), e não o “alien” (estranho).
A antropologia cultural analisa a essência humana e o que de-
terminados grupos sociais criam historicamente. O ser humano é 
onto-societário, ou seja, um ser social, portanto aprende com outros 
indivíduos e por isso utiliza suas inúmeras habilidades e competên-
cias, perscruta a própria realidade e tenta explicá-la.
Quando descobrimos essa essência coletiva, percebemos, por 
outro lado, o individualismo exacerbado da sociedade – algo his-
toricamente construído –, ou seja, a humanidade não é solitária, 
10 Antropologia Cultural
precisa do outro para poder sobreviver. Se não fôssemos inseridos 
em nenhum grupo social desde o nosso nascimento, poderíamos 
aprender a falar, andar e gesticular? Existe a possibilidade de iniciar-
mos o processo de humanização ao estarmos isolados da sociedade?
Temos características e hábitos essencialmente humanos porque 
fomos inseridos em um grupo social e aprendemos a reconhecer de-
terminados símbolos, expressar os nossos sentimentos, como chorar 
e rir etc.
1.2 Trabalho: atividade humana
O que distingue os seres humanos dos outros animais é a ca-
pacidade de pensar e utilizar a inteligência para satisfazer suas 
necessidades por meio do trabalho.
O trabalho é, na maioria das vezes, entendido como algo penoso, 
cuja finalidade é ganhar um salário no fim do mês para manter-se. 
No entanto, essa conceituação (criada pelos economistas do século 
XIX) não explica a complexidade do termo. Trabalho é toda ação 
humana sensível ao valor de uso, ou seja, todo ser humano trabalha 
quando desempenha qualquer ação com alguma finalidade. Nesse 
sentido, o lazer também é considerado um trabalho, por exemplo: 
se alguém vai ao parque, já está realizando uma atividade que tem 
um objetivo – diversão, entretenimento ou descanso. Assim, a ca-
pacidade de raciocinar está intrinsecamente ligada à de trabalhar, 
e são essas potencialidades humanas que nos diferenciam dos outros 
animais. A humanidade sempre trabalhou, isto é, transformou a na-
tureza para atender às necessidades próprias.
1.3 Cultura: definição
Definir a palavra cultura não é tarefa fácil, pois entre osantro-
pólogos ela assume vários significados. Muitas vezes, ouvimos falar 
que determinada pessoa tem cultura por ter lido muitos livros ou 
Introdução aos estudos antropológicos 11
possuir conhecimento apurado na área artística. Também já ouvi-
mos falar que cultura se refere a manifestações relacionadas ao fol-
clore, como crenças, danças e lendas de determinada região. Além 
disso, na atualidade, é muito difundida a expressão cultura de massa 
como referência ao cinema, à televisão e ao rádio.
O primeiro intelectual a formular um conceito de cultura foi 
Edward B. Tylor na obra Cultura primitiva. Para Tylor (1976), o ter-
mo engloba todos os acontecimentos relativos à humanidade. Já para 
Ralph Linton (1965) a cultura “consiste na soma total de ideias, rea-
ções emocionais condicionadas a padrões de comportamento habitual 
que seus membros adquiriram por meio da instrução ou imitação e de 
que todos, em maior ou menor grau, participam” (LINTON, 1965, 
p. 17-20). Franz Boas (1964) entende cultura como “a totalidade das 
reações e atividades mentais e físicas que caracterizam o comporta-
mento dos indivíduos que compõem um grupo social” (BOAS, 1964, 
p. 166). Malinowski (1962) a define como “o todo global consistente 
de implementos e bens de consumo, de cartas constitucionais para os 
vários agrupamentos sociais, de ideias e ofícios humanos, de crenças e 
costumes” (MALINOWSKI, 1962, p. 43).
São várias as definições, que variam de acordo com o contexto 
histórico. Por exemplo, para Tylor (1976), Linton (1965), Boas (1964) 
e Malinowski (1962), cultura é o conjunto de ideias; já para outros 
pensadores como Kroeber e Kluckhohn (1952), Beals e Hoijer (1918), 
ela é abstração do comportamento; para Keesing e Strathern (2016), 
é comportamento aprendido. Leslie A. White e Beth Dillingham 
(2009), por sua vez, apresentam uma abordagem diferenciada: cultu-
ra deve ser vista não como comportamento, mas em si mesma, fora 
do organismo social. White, Foster e outros entendem cultura como 
elementos materiais e não materiais. A definição de Geertz (2008), 
por sua vez, propõe a cultura como um “mecanismo de controle” do 
comportamento (MARCONI; PRESSOTTO, 2010).
12 Antropologia Cultural
Há diversas concepções do termo cultura e todas a entendem 
como sendo uma construção do ser humano. O elemento funda-
mental das preocupações, nesse caso, foi a constatação da variedade 
de modos de vida entre povos e nações. No fim do século XV e início 
do XVI, os europeus começaram a buscar novos mercados, ou seja, 
lugares onde pudessem explorar as riquezas naturais e levá-las con-
sigo. Os portugueses conquistaram o Brasil e tiveram contato com 
os nativos, assim como os espanhóis com outras áreas da América. 
Os povos encontrados pelos europeus tinham hábitos, costumes e 
valores muito diferentes dos que eram aceitos na Europa, então era 
necessário conhecer as especificidades dessas culturas para explorar 
os nativos com mais facilidade.
Cultura, portanto, é entendida como a variedade de modos de 
vida, crenças, hábitos, valores e práticas de diversos povos. Assim, 
o termo também equivale a modo de produção, já que significa 
o jeito de ser de uma determinada sociedade e o que ela produz. 
O ser humano é coletivo, precisa do grupo para dar início ao seu 
processo de humanização, e, por meio do trabalho e da sua capaci-
dade de pensar, modifica a natureza para sanar suas necessidades. 
Além disso, cria códigos de comunicação que são utilizados pelo 
grupo ao qual pertence.
A história nos mostra inúmeras culturas e modos de vida. 
Ao analisarmos, por exemplo, os rituais dos maias – civilização 
mesoamericana pré-colombiana que existiu por 3.000 anos –, po-
demos perceber que havia entre eles o sacrifício humano. Os es-
panhóis criticaram a crença desse povo com base na doutrina da 
Igreja católica e disseram que tinham por missão ensinar a religião 
“certa” para os “primitivos”. Para os espanhóis, esses rituais eram 
selvagens e demoníacos:
Colombo age como se entre as duas ações se estabelecesse 
um certo equilíbrio: os espanhóis dão a religião e tomam 
o ouro. Porém, além de a troca ser bastante assimétrica, 
e não necessariamente interessante para a outra parte, as 
Introdução aos estudos antropológicos 13
implicações desses dois atos se opõem. Propagar a religião 
significa que os índios são considerados como iguais (dian-
te de Deus). E se eles não quiserem entregar suas riquezas? 
Então será preciso subjugá-los, militar e politicamente, para 
poder tomá-las à força; em outras palavras, colocá-los, ago-
ra do ponto de vista humano, numa posição de desigualda-
de (de inferioridade). (TODOROV, 1999, p. 53)
Assim, criticamos a cultura do outro com base na afirmação de 
ser a nossa cultura a correta. Por não querermos compreender o 
outro – visto como o “alien” (estranho) –, cometemos um precon-
ceito, ou seja, julgamos antes de conhecermos algo ou alguém. Essa 
postura é muito perigosa, pois gera intolerância.
Os maias faziam rituais em favor do grupo, ou seja, o sacrifício 
humano era uma entrega para o bem-estar coletivo, de acordo com 
as suas crenças. Os espanhóis supervalorizaram a cultura europeia e 
rejeitaram a dos indígenas. Isso resultou em assassinatos, exploração 
e crueldades cometidas contra os povos conquistados.
Os espanhóis cometeram crueldades inauditas, cortando as 
mãos, os braços, as pernas, cortando os seios das mulheres, 
jogando-as em lagos profundos, e golpeando com estoque 
as crianças, porque não eram tão rápidas quanto as mães. 
E se os que traziam coleira em torno do pescoço ficassem 
doentes ou não caminhassem tão rapidamente quanto seus 
companheiros, cortavam-lhes a cabeça, para não terem de 
parar e soltá-los. (TODOROV, 1999, p. 169)
Esses exemplos expõem o quão nocivo é pensar que a pró-
pria cultura de vida (valores, crenças, ideologias e práticas) é única, 
correta, e que o outro sempre está errado. É o caso, por exemplo, 
quando nós, ocidentais, julgamos a cultura oriental, principalmente 
do árabe muçulmano. As mulheres ocidentais criticam a forma como 
as árabes muçulmanas se vestem – cobertas por uma burca, deixando, 
muitas vezes, só os olhos à vista. As mulheres árabes muçulmanas, 
por outro lado, criticam a postura das ocidentais, pois, segundo 
elas, essas preocupam-se em demasia com a estética e sofrem diante 
dessa busca desenfreada pelo corpo perfeito, por meio de diversas 
14 Antropologia Cultural
cirurgias, como lipoaspiração e inserção de próteses mamárias. Isso 
significa um choque cultural, mas não se pode fazer julgamentos por-
que cada grupo social constrói seu jeito de viver de acordo com o que 
acha certo; assim, devemos apenas compreender as diversidades cul-
turais e respeitá-las. Portanto, somente por intermédio da tolerância 
podemos construir um mundo melhor, no qual todos terão direito de 
expressar suas verdades.
Atividades
1. Existem várias acepções para o termo cultura, conceito bási-
co para a antropologia. Mas como podemos definir a antro-
pologia cultural?
2. Explique este comentário: 
“uma aranha executa operações que se assemelham às ma-
nipulações do tecelão, e a construção das colmeias pelas 
abelhas poderia envergonhar, por sua perfeição, a um mes-
tre de obras. Mas há algo em que o pior mestre de obras é 
superior à melhor abelha, e é o fato de que, antes de executar 
a construção, ele a projeta em seu cérebro” (MARX, 1994, 
p. 202).
2 
Principais acepções do termo cultura
O conceito de cultura varia no tempo e no espaço. Muitos a 
consideram como ideias ou como a abstração do comportamento, 
até mesmo como comportamento a ser aprendido, ou que ela deve 
ser vista em si, fora do organismo humano. Outros inserem nesse 
conceito elementos materiais e não materiais. Essas definições di-
vergentes permitem assimilar a cultura por meio de seus diversos 
nexos constitutivos:
A cultura, portanto, pode ser analisada, ao mesmo tem-
po, sob vários enfoques: ideias (conhecimento e filosofia); 
crenças (religiãoe superstição); valores (ideologia e moral); 
normas (costumes e leis); atitudes (preconceito e respeito ao 
próximo); padrões de conduta (monogamia, tabu); abstração 
do comportamento (símbolos e compromissos); instituições 
(família e sistemas econômicos); técnicas (artes e habilida-
des) e artefatos (machado de pedra, telefone). (MARCONI; 
PRESSOTO, 2010, p. 24)
Segundo Leslie A. White e Beth Dillingham (2009), cultura 
pode ser classificada em intraorgânica (conceitos, crenças, atitudes 
e emoções); interorgânica (interação social entre os seres humanos) 
e extraorgânica (objetos materiais, ou seja, localizada fora de orga-
nismos humanos).
Assim, para os antropólogos, cultura consiste em ideias (con-
cepções mentais de coisas abstratas ou concretas (crenças religiosas, 
míticas e científicas); abstrações (aquilo que se encontra no campo 
das ideias, da mente – acontecimentos não observáveis, não concre-
tos, não sensíveis) e comportamento (modo de viver comum de um 
determinado grupo humano).
16 Antropologia Cultural
A cultura pode ser classificada em material e imaterial. A cultu-
ra material é composta de coisas concretas, que foram criadas pelo 
ser humano com alguma finalidade. Fazem parte dela, por exemplo, 
vestuários, arcos e flechas, vasos, talheres, alimentos e habitações. 
Já os elementos não concretos da cultura, como valores, hábitos, 
crenças, potencialidades, normas e significados, constituem a cul-
tura imaterial.
A morte é um exemplo de cultura imaterial, pois é um mistério 
e um ponto de questionamento e inquietação na maioria das cren-
ças e superstições. Ela é relatada como algo sobrenatural e temido, 
representando uma sentença eterna em algumas crenças. Os povos 
da Antiguidade, assim como os egípcios, acreditavam que, ao morrer, 
o indivíduo dormiria até o dia do julgamento final. Na mitologia egíp-
cia, Anúbis, o deus mais popular e venerado quarenta e cinco séculos 
antes de Cristo, era filho de Osíris e de Néftis, sua irmã. Segundo a 
mitologia, Anúbis instituiu um culto aos mortos por meio de ritos fu-
nerários e embalsamamento, pois o corpo deveria estar intacto para 
abrigar a alma, que retornaria no dia do julgamento decisivo. Anúbis 
estava presente em todas as celebrações funerárias e dirigia todos os 
detalhes das homenagens prestadas ao falecido. Todos os indivíduos, 
independentemente da riqueza que possuíam, tinham direito sagra-
do a uma morada física, isto é, a um sepulcro, como uma pirâmide 
real, uma cova simples ou uma mastaba rica. Quem fosse contra essa 
regra seria amaldiçoado pelas mãos de Anúbis.
O bem e o mal são forças antagônicas que decidem o destino das 
almas. Na mitologia egípcia, o julgamento das almas era feito por 
Osíris, pai de Anúbis. Ele possuía uma balança de ouro na qual eram 
pesadas as obras do réu.
Vemos a relevância da morte em várias concepções de crenças. 
Passaram-se muitos séculos para que fosse estabelecida em Roma a 
religião cristã. Nela também existe um juiz e um guardião das almas. 
Diante de Deus, São Miguel Arcanjo apresenta as almas pesando 
mastaba: 
jazigo em 
formato de 
pirâmide ou 
quadrangular 
usado pelos 
egípcios na 
Antiguidade.
Principais acepções do termo cultura 17
em sua balança os atos delas. Se as obras más pesarem mais que as 
boas, a alma padecerá no inferno, sofrendo eternamente os flagelos 
impostos pelo senhor do abismo negro – o demônio.
Algumas crenças pregam que as almas voltam ao mundo físico, ou 
ficam vagando, para pagarem pelos males que fizeram. Existem várias 
concepções a esse respeito e as superstições que englobam o sobrena-
tural são tantas que seria impossível relatá-las em sua totalidade.
Em Mariana, cidade de Minas Gerais, por exemplo, o sobrenatu-
ral faz parte do imaginário dos moradores. As superstições se pro-
liferam, como sinal de proteção e aviso aos seres vivos. Entre elas, 
podemos citar:
• Antes de colocar a feijoada no fogo à noite, é preciso adi-
cionar sal, pois ele protege o caldeirão das almas que foram 
assassinadas com arma de fogo. Assim, elas não lavam suas 
enfermidades no caldeirão nem azedam toda a feijoada.
• Para o pai e a mãe não falecerem, o filho não deve pentear os 
cabelos à noite.
• Quando o espelho quebra sem nenhum motivo, uma pessoa 
da casa morrerá dentro de poucos dias.
• Uma pessoa jamais deve olhar seu reflexo nas águas de um rio, 
pois o diabo vem, rouba sua alma e ela morrerá ali mesmo.
• A criança que morre antes de ser amamentada é um serafim1. 
Entretanto, se ela tiver sido amamentada e depois falecer, 
comparecerá ao purgatório para vomitar o leite que tomou 
na Terra.
• Quando entra besouro preto em casa, é sinal de morte em 
breve.
1 É comumente aceito como a primeira posição na hierarquia celestial dos anjos, ou 
seja, os que estão mais próximos de Deus. A palavra hebraica Saraf significa queimar 
ou incendiar, talvez uma alusão às tradições bíblicas em que Deus é comparado a um 
“fogo” ou mesmo “fogo consumidor”. A referência bíblica para serafim está em Isaías 
(BÍBLIA. Isaías, 2018, 6: 1-2).
18 Antropologia Cultural
• Quando a coruja (matintapereira) canta, é sinal que morrerá 
alguém na mesma noite.
• Deve-se lavar os sapatos ao chegar de um cemitério, pois, se 
levar a terra desse lugar nos sapatos, uma legião de almas irá 
buscar o descuidado.
• Ao colocar na criança o mesmo nome do pai, um dos dois 
logo morrerá.
• Se alguém for chamado pelo nome, fora de casa, sem saber 
por quem, não deve responder; pois a morte chama e leva 
quem lhe responde.
• Quando morre uma pessoa, deve-se abrir todas as portas da 
casa para a alma sair. A casa não deve ser fechada antes do sé-
timo dia, pois esse é o tempo para se arrebentar as vísceras do 
defunto. Depois disso, a alma sai de dentro da casa e vai para 
a morada dos mortos.
• Quando uma procissão para em frente a uma casa, é sinal que 
ali morrerá uma pessoa em breve.
• Quando uma pessoa sente um tremor ou um calafrio, é sinal 
que a morte está ao lado e quer levar a alma para o além.
• Quando uma pessoa cobrir o corpo do defunto com terra, 
tem de pedir a ele que lhe arranje um bom lugar no além. Se 
ele for para um bom lugar, estará bem quem pede; se for para 
um mal lugar, azarado é quem pediu.
• Quem amanhece com a boca salivosa e amarga é porque co-
meu o mingau das almas.
• O fantasma se tornará cada vez mais visível para quem tem medo.
• As almas de tradição antiga nunca aparecem para a pessoa 
nua, pois exigem respeito e compostura.
• O espelho não reflete a imagem do corpo, mas da alma, que 
se torna visível.
Principais acepções do termo cultura 19
• O diabo fica atrás do espelho. Por isso, não se deve olhá-lo nas 
horas abertas, ou seja, meio-dia, seis da tarde e meia-noite. 
Se o indivíduo for descuidado, poderá ter sua alma roubada.
Essas são algumas das diversas superstições narradas pelos 
moradores de Mariana. Esses mineiros têm um profundo respeito em 
relação à morte. Todos participam dos velórios que ocorrem na cida-
de, mesmo se o falecido era apenas conhecido. Uma tradição é que 
em todos os velórios deve ser servido às pessoas pão com salame 
e café. Servir refeições nessas ocasiões é uma tradição em Roma, 
na Grécia e no Egito. Foram os colonizadores portugueses que trouxe-
ram esse costume para o Brasil, e poucas regiões ainda conservam-no.
Sendo superstições, costumes, tradições e comportamentos con-
dicionados pelas crenças, percebemos a relevância da observação 
dessas práticas a fim de se conhecer as peculiari dades das sociedades.
Vamos agora definir alguns conceitos importantes para a antro-
pologia cultural.
Cultura real (ação e pensamento)
A cultura real só pode ser percebida parcialmente. Ela representa 
o que todos os membros de uma sociedade praticam ou pensam nas 
suas tarefas cotidianas. A cultura real é subjetiva, por esse motivo os 
estudiosos não podem ter uma única visão da realidade, pois ela é 
apresentada de diversas maneiras e varia de acordo com o ponto de 
vista de cada indivíduo.
Culturaideal (filosofia correta em termos teóricos)
Representa um conjunto de comportamentos propagados 
como corretos, perfeitos; no entanto, não são seguidos por todos 
do grupo social.
Endoculturação
É a aprendizagem e estabilidade de uma cultura, ou seja, cada 
indivíduo recebe da sociedade a que pertence as crenças, os modos 
20 Antropologia Cultural
de vida, o comportamento, os hábitos e valores, o que a permite 
controlar os atos e as atitudes de seus membros.
Aculturação
É a fusão de duas culturas diferentes, ou seja, de dois gru-
pos que entraram em contato. Quando acontece continuamente, 
engendra alterações nos padrões de cultura de ambos os grupos. 
Paulatinamente, essas culturas fundem-se e formam uma sociedade 
e culturas novas.
Subcultura
É um meio peculiar de vida de um grupo menor dentro de uma 
sociedade maior. Por exemplo: a cultura do Nordeste brasileiro; 
o vodu na Jamaica; os punks e os pertencentes ao emocore.
Sincretismo cultural
É a fusão de dois elementos culturais análogos (práticas e cren-
ças), de culturas diferentes ou não. Por exemplo: a cultura africana 
que entra em contato com a cristã.
Raça
A palavra raça foi introduzida há aproximadamente 200 anos 
nos estudos científicos. No entanto, pouco se sabe sobre a sua ori-
gem. Etimologicamente, vem de radix, palavra latina que significa 
raiz ou tronco. Em vários estudos o termo tem sido empregado para 
fazer referência a indivíduos que são identificados como pertencen-
tes a um determinado grupo e que têm a mesma linhagem ancestral 
e os mesmos hábitos, ideais, crenças, costumes e tradições.
Entretanto, essa palavra tem uma conotação muito mais ampla. 
Cientificamente, ela significa o que é único biologicamente. Por isso, 
não existem subdivisões raciais quando falamos em seres humanos, 
pois, nesse caso, só existe uma raça que nos distingue dos outros 
animais, ou seja, a raça humana.
Principais acepções do termo cultura 21
Etnia
A palavra etnia denota um grupo de seres humanos unidos por 
um fator comum (língua, religião, costumes, valores ou nacionali-
dade) e com afinidades culturais e históricas. A ideia de etnia diz 
respeito ao sentimento de pertença, isto é, a sentir-se pertencente a 
uma cultura. É um dos conceitos mais importantes para se entender 
o mundo atual – marcado por diferenças culturais e conflitos gera-
dos pela intolerância em relação à diversidade.
Relativismo cultural
Aponta as particularidades de cada modo de vida. Os indivíduos 
têm modos de vida específicos adquiridos pela endoculturação. 
Assim, possuem suas próprias ideologias e costumes.
Toda a cultura é considerada como configuração saudável 
para os indivíduos que a praticam. Todos os povos formu-
lam juízos em relação aos modos de vida diferentes dos seus. 
Por isso, o relativismo cultural não concorda com a ideia de 
normas e valores absolutos e defende o pressuposto de que 
as avaliações devem ser sempre relativas à própria cultura 
onde surgem. (MARCONI; PRESSOTO, 2010, p. 31)
A figa, por exemplo, é utilizada por algumas pessoas como um 
amuleto da sorte. No entanto, para os antigos romanos, ela signifi-
cava uma relação sexual.
Etnocentrismo
É a supervalorização da própria cultura em detrimento das de-
mais. O etnocentrismo ainda causa muita intolerância, preconceito 
e discriminação. Quando julgamos a cultura do outro, entendemos 
que a nossa se sobressai à dele, sendo que este precisa modificar-
-se e seguir os nossos “ideais perfeitos”. O nazismo é um exemplo 
de etnocentrismo: alguns alemães supervalorizaram o conceito de 
cultura, afirmando pertencerem a uma “raça pura”. Diante disso, 
praticaram atrocidades contra aqueles que não faziam parte do 
22 Antropologia Cultural
mesmo modelo. Inúmeras pessoas, como os judeus, foram assas-
sinadas em campos de concentração durante a Segunda Guerra 
Mundial, vítimas dessa intolerância.
Atividades
1. A antropologia cultural opera com várias definições de cultu-
ra, todas válidas e complementares. Qual o significado desse 
termo para Leslie A. White e Beth Dillingham?
2. O que é subcultura? Dê exemplos.
3
Mito: elemento da cultura
A humanidade, desde sua origem, tenta explicar situações que 
ocorrem ao seu redor. Esta é a obsessão dos seres humanos: saber 
o fundamento da sua existência, como a criação do mundo, a vida 
e a morte – questões não muito fáceis de serem respondidas. De 
certo modo, porém, o ser humano inventa maneiras de esclarecer 
fatos abstratos a fim de ajudar o seu grupo social e fazer com que 
seus membros aceitem situações ainda sem respostas. Ele utiliza, 
para tanto, lendas, mitos e contos – que visam a explicar de maneira 
“mágica” um fato.
O mito revela a busca humana de um autoconhecimento, 
possibilitado por meio da capacidade de se criar e cultivar o que 
há de comum no seio da humanidade; esse tipo de narrativa não 
explica fatos de modo analítico e racional, mas visa a entender o 
sentido genuíno da existência. Em diversos mitos encontram-se 
feitos heroicos, milagres, castigos, amores e lutas, nos quais são 
narradas experiências de vida de determinada sociedade, em um 
recorte temporal específico.
Há um acervo de mitologias que implicam no social, criando pa-
drões de comportamento da sociedade. Podemos citar, como exem-
plo, a mitologia grega, uma das mais afamadas. Ela apresenta deuses 
poderosos, porém envoltos em imperfeições humanas. Os poetas, 
ao escreverem os mitos gregos, expuseram que até mesmo os seres 
aparentemente perfeitos têm limites e desejos como os humanos.
Esses mitos são muito aceitos, inclusive na atualidade, pois 
descrevem essas imperfeições. Falar de seres especiais, mas imper-
feitos ressalta a ideia de que falhar é próprio dos “racionalmente 
24 Antropologia Cultural
pensantes”. Notar isso faz a humanidade sentir-se menos culpada de 
seus “terríveis” pecados.
Todo mito vem carregado de uma essência real de certo grupo. 
Ao entender sua função principal, podemos partir para os saberes 
que o invocam, ou seja, crenças, danças e tradições. Enfim, o folclore 
de determinado grupo social.
3.1 Folclore
A palavra folclore foi usada pela primeira vez pelo arqueólogo 
inglês William John Thoms (1803-1885). Ele solicitou apoio à re-
vista The Athenaeun para auxiliá-lo em pesquisas a fim de conhe-
cer costumes, crenças e hábitos das diversas regiões da Inglaterra. 
Sua carta com esse pedido foi publicada em 22 de agosto de 1846, 
por isso o Dia do Folclore é comemorado nessa data. O termo vem 
de folk-lore – literalmente povo-conhecimento. Thoms sugeriu essa 
denominação substituindo as expressões usadas por alguns eru-
ditos da época, como antiguidades populares e literatura popular. 
Atualmente, considera-se relevante o registro de crenças, costumes, 
hábitos, cerimônias, músicas e superstições não como “antiguidades 
do povo” (expressão que veicula uma ideia de primitivismo), mas 
como conhecimentos adquiridos por um grupo social, ou seja, é a 
sabedoria do povo desprendida de qualquer intenção erudita1.
O folclore é o conjunto de mitos, ritos, crenças religiosas, dan-
ças, linguagem, música e artesanato, portanto vai muito além da 
ideia de tradição popular; está associado à vida do povo, à sua dis-
posição de criar e recriar algo. Não se refere somente às celebrações 
populares, mas é o lastro da vida cotidiana de um grupo. É uma 
criação subjetiva, entretanto sua reprodução tende a ser coletiviza-
da. Ele perdura de uma geração para a outra e é reconhecido como 
1 As influências e o significado do folclore são abordados nas obras de Almeida 
(1974), Brandão (1982), Christensen (1934), Fernandes (1989) e Della Mônica (1982).
Mito: elemento da cultura 25
tradição, e não modismo. É uma identidade do modo de vida de 
uma classe produtora da própria cultura.
O folclore tem sua representação nas tradições e crenças po-
pulares de diversas maneiras. Denomina algo que tenha origem 
anônima e sem cronologia, sendo divulgado e praticado por muitas 
pessoas ao longo do tempo, como é o caso dosprovérbios.
O Brasil é o berço de um riquíssimo acervo folclórico personifi-
cado em crenças, culinária, linguagem, danças e diferenças regionais. 
Ele é composto de distintas etnias que foram protagonistas da nossa 
formação: o negro, os ameríndios e o branco europeu. Cada um des-
ses grupos carregava diferentes crenças, saberes, tradições, religiões e 
costumes. Diante desse amálgama de culturas, surge o saber do povo 
brasileiro. O estudo das diferentes culturas é relevante, pois possibili-
ta conhecer as práticas e os costumes específicos da sociedade.
Nesse ponto, é importante trazer para a discussão outra área do 
conhecimento que de alguma forma também tem o ser humano 
como objeto de estudo. Trata-se da psicologia social, uma ramifi-
cação da psicologia que estuda a influência do ambiente social no 
comportamento dos indivíduos. O ser humano sofre influências dos 
estímulos sociais e essa área de estudo analisa como grupos sociais, 
instituições e cultura afetam o comportamento do indivíduo.
As crenças influenciam significativamente no comportamento 
humano. As pessoas inscritas em um grupo social conservam cren-
ças semelhantes, relacionando-se e agindo socialmente, trabalhando 
coletivamente em favor de intenções conectadas a essas crenças.
O indivíduo, para ser aceito em um grupo, tende a ser acrítico, isto 
é, não analisar os fatos racionalmente e legitimar situações, mesmo 
que sejam irracionais. Se, por acaso, um indivíduo não compartilhar 
crenças semelhantes às do grupo em que está inserido, os membros 
integrantes se unirão para persuadi-lo a mudar de opinião e ajustar-se 
ao coletivo.
26 Antropologia Cultural
As pessoas são submetidas às opiniões coletivizadas, dessa forma 
evitam ser tratadas com desprezo por serem exceção. Chegam ao 
ponto de praticar persuasão subjetiva para se convencerem de ter 
visto o que o restante do grupo aparentemente vê. Para esse tipo de 
persuasão, dá-se o nome de sugestão, ou seja, a influência exercida 
sobre uma pessoa a fim de ela aceitar uma ideologia, crença e ati-
tudes comuns. Entretanto, o indivíduo adota uma crença vigente, 
contribuindo por meio de métodos carregados de emoção.
A crença em superstições também traz influências em ações e no 
modo de vida das pessoas. Fazer um gesto, usar um objeto para a rea-
lização de um desejo, ou até mesmo para evitar desgraças, são situa-
ções comuns para qualquer supersticioso. Ao observar essas práticas 
supersticiosas, conclui-se que não há fundamento científico, pois o 
uso de um objeto não trará mais ou menos sorte para alguém. Essas 
superstições, porém, podem trazer resultados positivos. Pessoas inse-
guras, por exemplo, ao realizarem uma entrevista de emprego, podem 
ficar muito nervosas e acabar tendo um desempenho ruim. No entan-
to, ao acreditarem no poder do objeto que levam consigo, como uma 
figa ou um dente de alho, elas sentem-se protegidas e mais seguras. 
Por isso, não é o pseudopoder do objeto que lhes atribui confiança; 
essas pessoas inconscientemente trabalham a mente e convencem o 
psicológico de não haver mais o temor. A falsa confiança, consciente-
mente, encontra-se no objeto, mas, na verdade, ela sempre esteve na 
mente do indivíduo.
Conclui-se, então, que as crenças condicionam ações concre-
tas que afetam diretamente o modo de vida das pessoas. Assim, 
as crenças de um determinado grupo social pertencem à cultura 
Mito: elemento da cultura 27
imaterial e revelam traços psicológicos, históricos e culturais de 
uma sociedade.
Atividades
1. Em diferentes culturas existem mitos que se diferenciam entre 
si, mas mantêm aspectos em comum. Por que é importante o 
estudo dos mitos?
2. O folclore é uma criação subjetiva e sua reprodução tende a 
ser coletivizada. Ele se mantém e é transmitido de uma gera-
ção a outra; portanto, também é reconhecido como tradição, 
e não modismo. Explique o que é folclore.
4 
A conquista da América e a 
questão do outro
Tzvetan Todorov (1939-2017), filósofo e linguista búlgaro ra-
dicado na França, fez um estudo sobre a conquista da América do 
ponto de vista do dominado (indígena). O estudo trata da conquista 
da América no século XVI, ou seja, cem anos após a primeira via-
gem de Colombo. Delimita também um local – a região do Caribe 
e do México (Mesoamérica). A pesquisa explica o confronto de cul-
turas entre indígenas e espanhóis. Naquela época, muitas eram as 
crenças concernentes aos mistérios infindos do mar. No entanto, 
Colombo lançou-se com o intuito de “descobrir” novas terras e, as-
sim, “encontrar ouro para a realeza”. O navegador usou desse álibi 
para conseguir patrocínio para a viagem, haja vista que seu plano 
seria impossível sem esses grandes investimentos.
A nobreza, no entanto, não investiria em algo que não lhe trou-
xesse lucro. A persuasão de Colombo soava bem aos ouvidos da 
nobreza, suscitando um enaltecimento ambicioso. Dessa maneira, 
o navegador conseguiu o investimento que esperava para ir à pro-
cura de novas terras. Durante as viagens, ele escreveu aos nobres 
dando a entender que estava muito próximo da descoberta de rique-
zas. Esses manuscritos eram dissimulados, pois não reproduziam a 
verdadeira situação. 
Enquanto Colombo escrevia dando esperanças à nobreza, ela 
continuava investindo na aventura. O termo aventura é usado 
porque, segundo Todorov (1999), para Colombo não era o ouro o 
importante, e sim a capacidade de conhecer situações da nature-
za que poderiam ser instigantes. Acima desse espírito aventureiro, 
30 Antropologia Cultural
Colombo intitulava-se como um enviado de Deus, portanto a sua 
suposta missão era propagar a religião católica ao mundo todo.
A expansão do cristianismo é muito mais importante para 
Colombo do que o ouro, e ele se explicou sobre isso, prin-
cipalmente numa carta destinada ao papa [...] Portanto, seu 
objetivo é: “Espero em Nosso Senhor poder propagar seu 
santo nome e seu evangelho no Universo” (“Carta ao Papa 
Alexandre VI”, fevereiro de 1502). (TODOROV, 1999, p. 11)
O objetivo religioso de Colombo era fazer uma Cruzada1, para 
que assim pudesse levar o cristianismo ao mundo todo e acabar com 
as heresias2. A ideia de implementar uma Cruzada já era obsoleta, 
mas ele a tinha como missão. No entanto, algo mais começava a 
chamar sua atenção: para ele, na natureza poderiam existir seres 
diferentes, como ciclopes, homens com cauda e focinho de cachorro. 
Os escritos de Colombo revelam: ele era mais paciente quando ob-
servava a natureza, diferentemente de quando tentava compreender 
os indígenas. Os manuscritos descrevem minuciosamente tudo o 
que havia na terra “descoberta”.
Mosén Jaume Ferrer, um dos correspondentes de Colombo, es-
creveu em 1495 que as regiões muito quentes, com habitantes negros 
e onde havia muitos papagaios, eram locais de riquezas inexauríveis. 
Essas terras já tinham nomes naturais, no entanto os conquistadores 
não se importavam e faziam questão de nomeá-las novamente. Isso 
também era uma forma de se apossar desses locais. Até os indígenas 
eram renomeados por Colombo. A primeira atitude, quando entrou 
em contato com as terras “descobertas”, foi declarar que elas passa-
riam a fazer parte do reino da Espanha.
1 As Cruzadas foram expedições organizadas por reis e militares cristãos que pre-
tendiam retomar a chamada terra santa – Jerusalém –, ocupada pelos árabes muçul-
manos no século XI.
2 Heresia é uma doutrina que se opõe aos dogmas do catolicismo e foi criada 
durante a Idade Média, quando a Igreja católica começou a sentir-se ameaçada por 
pessoas que criticavam seus ensinamentos.
A conquista da América e a questão do outro 31
Colombo não aceitava a cultura dos povos autóctones, por esse 
motivo não considerava hábitos, costumes, crenças e língua dos indí-
genas. O desprezo era exacerbado, por isso não procurava compreen-
dê-los. Podemos perceber que os manuscritos de Colombo falam 
dos indígenas porque simplesmente faziam parte da paisagem. Suas 
menções sobre eles aparecem sempre no meio de anotaçõessobre a 
natureza. A imagem dos indígenas era basicamente física, Colombo 
descrevia seus belos corpos e rostos.
Os indígenas e os espanhóis não se comunicavam verbalmente, 
porém trocavam objetos entre si. Colombo se divertia com esta si-
tuação: os indígenas davam tudo por nada. Isso porque os espanhóis 
só lhes concediam bugigangas sem valor algum.
O sentimento de superioridade fez com que Colombo proibisse 
essas trocas. No entanto, ele mesmo continuou oferecendo “presentes” 
para os indígenas e os ensinou a apreciá-los e exigirem sempre mais.
Os costumes eram distintos: os indígenas viviam em comunida-
de – tudo era de todos – e os espanhóis, por sua vez, vinham de uma 
sociedade individualista, calcada na acumulação de riquezas. Logo, 
essas diferenças causaram embates.
Para os espanhóis, a conquista da América justificou-se pelos 
cristãos que vieram para o “Novo Mundo” imbuídos da religião, 
levando em troca ouro e riquezas.
Colombo agiu como se entre as duas ações se estabelecesse um 
certo equilíbrio: os espanhóis dão a religião e tomam o ouro. Se os 
indígenas se recusassem a entregá-lo, seriam subjugados militar e 
politicamente. Essa relação não era nem um pouco equilibrada, mas 
precursora de grande desigualdade. Encontra-se aí o germe da ideo-
logia escravagista. Os primeiros contatos já revelavam o interesse dos 
espanhóis em escravizar nativos das “terras descobertas”, pois julga-
vam serem eles inferiores. Para Colombo, fé e escravidão estavam 
intrinsecamente ligadas.
32 Antropologia Cultural
A história da conquista da América foi marcada pela recusa da 
alteridade humana. Colombo e seus homens não reconheceram a 
identidade indígena e se opuseram a tudo o que não pertencesse à 
cultura espanhola.
4.1 A conquista da Cidade do México
Colombo abriu caminhos para outras expedições. A conquista 
da cidade do México, feita por Hernán Cortez (1485-1547) e sua 
tripulação, revela ainda mais a intolerância dos espanhóis.
A expedição de Cortez em 1519 foi a terceira que chegou à costa 
mexicana, sendo composta de algumas centenas de homens. Cortez 
se submeteu à Coroa espanhola e foi em nome do rei da Espanha que 
decidiu explorar a Cidade do México. Após algum tempo estabele-
cido na cidade dos astecas (os mexicas), para consolidar seu poder 
sobre eles, Cortez prendeu o soberano daquele povo – Montezuma.
Começou, então, a dominação pelos meios mais torpes. 
Montezuma morreu provavelmente apunhalado por seus carcerei-
ros espanhóis. Os sucessores do líder asteca travaram uma batalha 
feroz contra os espanhóis. 
Mas como os espanhóis, sendo tão poucos, conseguiram do-
minar uma população tão numerosa? Cortez usou-se de todos os 
artifícios para conseguir a vitória. Primeiramente, ele percebeu o 
descontentamento de muitos povos conquistados pelos astecas que 
deveriam pagar impostos a eles. Dessa maneira, fomentou lutas in-
ternas entre facções rivais e conseguiu o apoio de muitos indígenas, 
que foram lutar ao lado dos espanhóis contra os mexicas.
Os espanhóis dominaram os mexicas e impuseram suas nor-
mas. Queimaram livros para apagar a religião estabelecida e des-
truíram monumentos. Cortez e seus homens foram incapazes de 
perceber a importância e riqueza da cultura asteca. Os mexicas 
foram pressionados para aceitarem a religião e os hábitos europeus 
tidos como “civilizados”.
A conquista da América e a questão do outro 33
Outro fator significativo para a dominação dos astecas foi a uti-
lização de armas de fogo, até então desconhecidas pelos indígenas. 
Além disso, os espanhóis trouxeram consigo uma arma muito mais 
devastadora: a bacteriológica. A varíola, por exemplo, matou milha-
res de indígenas.
Além desses fatores que propiciaram a vitória dos espanhóis, 
há outro muito valioso e eficaz: decodificar a cultura asteca para 
dominá-la e destruí-la.
4.2 A comunicação como arma do dominador
Os indígenas e os espanhóis não falavam a mesma língua. Cortez 
se preocupava em interpretar o que diziam e faziam em relação aos 
rituais para que assim pudesse ter domínio maior sobre eles.
Os mexicas buscavam a todo momento interpretar as diversas 
mensagens para obterem respostas, sejam elas do presente ou do 
futuro. As adivinhações eram praticadas pelos sacerdotes, que eram 
muito respeitados.
Os astecas dispõem de um calendário religioso composto de 
treze meses com duração de vinte dias, cada um desses dias 
possui um caráter próprio, propício ou nefasto, que é transmi-
tido aos atos realizados nesse dia e, principalmente, às pessoas 
que nele nasceram. Saber a data do nascimento de alguém é 
conhecer o seu destino; por isso, assim que nasce uma criança, 
procura-se o intérprete profissional, que é, ao mesmo tempo, 
o sacerdote da comunidade. (TODOROV, 1999, p. 76)
Dessa maneira, entende-se claramente que os mexicas preserva-
vam sua religião e ritos quase inexauríveis.
Os sacerdotes decidiam, por meio dos rituais de adivinhação, 
a sorte do indivíduo. Entretanto, isso não era algo subjetivo, mas 
sim conectado com toda a coletividade. As obrigações com o gru-
po eram mais importantes que a relação entre familiares. Por isso, 
quando alguém era entregue para ser sacrificado, isso era feito para 
o bem-estar de todos.
34 Antropologia Cultural
Na sociedade asteca, existiam distinções hierárquicas. 
Montezuma I codificou as leis de sua sociedade já no século XVI e 
a mais importante delas era a distinção hierárquica feita por vestes e 
adornos. Todorov (1999) explica:
É bastante impressionante ver que quando, no meio do sécu-
lo XV, Montezuma I, após ter ganho muitas batalhas, decide 
codificar as leis de sua sociedade, formula catorze prescri-
ções, das quais somente as duas últimas lembram nossas leis 
(punição do adultério e do roubo), ao passo que dez regula-
mentam algo que, a nosso ver, não passa de etiqueta (voltarei 
às duas outras leis): as insígnias, as roupas, os adornos que al-
guém tem ou não o direito de usar, o tipo de casa apropriado 
para cada camada da população. (TODOROV, 1999, p. 81)
Percebe-se que os símbolos eram importantes para Montezuma 
e, consequentemente, para todos os mexicas. Ele colhia todas as 
informações necessárias para manter a paz na Cidade do México. 
Seus informantes lhe relatavam todos os atos dos povos inimigos. 
No entanto, quando os espanhóis invadiram a região, os informan-
tes ficaram atônitos, pois o comportamento dos conquistadores 
era muito imprevisível, chegando a abalar todo o sistema de co-
municação. Em consequência disso, os astecas não conseguiram 
decodificar essas informações para Montezuma.
Os mexicas admiravam a arte do bem-falar, por isso no Estado 
asteca existiam duas espécies de escola: uma onde se preparavam 
para o ofício de guerreiros e outra de onde saíam os sacerdotes, os 
juízes e os dignatários reais que ensinavam aos meninos a retórica. 
A associação entre o poder e o domínio da língua é claramente mar-
cada entre os astecas. A fala privilegiada por eles era a fala ritual.
A ausência da escrita é um elemento importante que explica a 
importância da fala para os mexicas. Os desenhos estilizados e os 
pictogramas usados pelos astecas não são um grau inferior da escri-
ta, pois registram a experiência, e não a linguagem.
Os rituais dos astecas ajudaram os espanhóis a identificar a hie-
rarquização dessa sociedade e como ela se organizava. Os adornos 
A conquista da América e a questão do outro 35
e as vestes que usavam para diferenciar as castas de cada indiví-
duo orientaram Cortez, que facilmente distinguiu os chefes e guer-
reiros, capturando e matando-os para poder dominar sua terra. 
Portanto, havia uma diferença muito significativa entre a comuni-
cação dos espanhóis e a dos astecas, e isso, de certa forma, benefi-
ciou os colonizadores.
Atividades
1. O contato entre os espanhóis e os povos nativos das Améri-
cas foi marcado por muitas dificuldades e conflitos. Os espa-
nhóis foram etnocentristas? Por quê?
2. Quais foram os artifícios utilizados por Cortez para dominar 
osastecas? 
3. Explique, de acordo com as informações que você já possui 
sobre a sociedade asteca, a afirmação: “os mexicas admira-
vam a arte do bem-falar”.
5
A conquista da América e as 
formas de dominação espanhola
5.1 Os espanhóis e os signos
Ao conquistarem a Cidade do México, os espanhóis buscaram 
dominar mais facilmente os astecas. Eles não se importavam com a 
cultura desse povo, pois afirmavam que ele era selvagem e sem cul-
tura. Para o colonizador Hernán Cortez, importava coletar a maior 
quantidade possível de ouro.
Cortez, para conseguir mais ouro, procurava entender os rituais 
astecas para dominá-los facilmente. Sua expedição começou com a 
busca de informações. Para isso, necessitou da ajuda de um espanhol 
que vivia junto com os indígenas, Jerônimo de Aguilar (1489-1531). 
Ele já havia participado de expedições anteriores à de Cortez e, além 
da língua espanhola, falava a língua dos maias.
A segunda personagem, essencial para que Cortez pudesse co-
letar o maior número de informações possível sobre os astecas, foi 
Malinche (1496-1529) – mulher asteca que tinha sido vendida para 
os maias. Cortez falava para Aguilar, que traduzia para Malinche, 
que, por sua vez, dirigia-se para o interlocutor asteca.
Malinche aos poucos aprendeu a língua espanhola e ajudou 
Cortez, ensinando-o tudo sobre seu povo, o que facilitou a conquis-
ta. Foi definitivamente graças ao domínio dos signos astecas que 
Cortez garantiu seu controle sobre essa antiga confederação.
A compreensão da cultura asteca não fez com que Cortez simpa-
tizasse com ela; pelo contrário, suscitou um desejo de aniquilação. 
Para ele, os indígenas não tinham direito a nada, e a escravidão era 
38 Antropologia Cultural
vista como forma de obter grandes lucros. Como os indígenas eram 
considerados mercadorias, e não sujeitos, deveriam submeter-se 
espontaneamente ou por meio de força. Assim, muitos nativos fo-
ram exterminados de maneiras macabras; por isso, hoje podemos 
afirmar: houve um genocídio. As causas da diminuição da popula-
ção indígena, segundo Tzvetan Todorov (1999, p. 159), são três:
1. Por assassinato direto, durante as guerras ou fora delas: 
número elevado, mas relativamente pequeno; responsa-
bilidade direta.
2. Devido a maus-tratos: número mais elevado; responsa-
bilidade (ligeiramente) menos direta.
3. Por doença pelo “choque microbiano”: a maior par-
te da população; responsabilidade difusa e indireta. 
(TODOROV, 1999, p. 159)
Os espanhóis submetiam os indígenas aos mais tortuosos mé-
todos. Cortavam-lhes as mãos, as pernas, os braços e os seios das 
mulheres. Eram mutilados e friamente assassinados, para que ficas-
sem com medo e levassem os espanhóis até o suposto esconderijo 
dos tesouros, ou seja, o lugar onde se guardava o ouro e as pedras 
preciosas. Todorov (1999, p. 170) elucida: “é tudo como se os espa-
nhóis encontrassem um prazer intrínseco na crueldade, no fato de 
exercer poder sobre os outros, na demonstração de sua capacidade 
de dar a morte”.
Para os espanhóis, os indígenas eram inferiores e estavam a meio 
caminho entre os seres humanos e os animais. Isso justifica a sub-
missão que deveriam mostrar diante dos “civilizados”. Se os povos 
nativos recusassem conceder seus territórios, estariam desobede-
cendo a “lei” da Igreja católica, que tinha como objetivo catequizar 
e destruir o “pagão”, por isso esses povos eram dignos da escravidão. 
Os indígenas eram vistos como animais selvagens, seres animados, 
porém sem alma. Essa foi a mesma justificativa usada pelos euro-
peus quando escravizaram os povos africanos.
A conquista da América e as formas de dominação espanhola 39
5.2 A escravidão gerada pelo colonialismo
Os espanhóis sentiam-se superiores também por serem cristãos 
e terem os sacramentos da Igreja. Eles se autorreconheciam como 
instrumentos para a salvação dos indígenas por livrá-los da “barbá-
rie” e das “heresias”.
Frei Bartolomeu de las Casas nasceu em Sevilha, em 1474, 
e foi um frade dominicano, cronista, teólogo, bispo de Chiapas (no 
México) e considerado o primeiro sacerdote ordenado na América. 
Ele “defendeu” os indígenas em nome do cristianismo. No entanto, 
a libertação dos indígenas não foi cogitada, pois adotava-se a seguin-
te teoria: eles não precisavam ser bons cristãos, mas deveriam agir 
como se fossem, porque ser cristão era sinônimo de ser “civilizado”.
Os espanhóis queriam transformar os mexicas tomando como 
base os moldes europeus. No entanto, nunca perguntaram a esses 
povos se eles queriam seus modelos, simplesmente os impuseram. 
Nisso reside a violência cultural.
5.3 O indígena como o “alien” (estranho) 
para os espanhóis
O “descobrir” está relacionado a terras, e não aos homens que 
nela habitam. Isso explica a razão pela qual os espanhóis não bus-
cavam depreender os costumes e as crenças dos nativos; pelo con-
trário, os mexicas tinham de compreender a cultura europeia, pois 
ela era superior. A prova de inferioridade desses povos, de acordo 
com os espanhóis, eram os sacrifícios executados em alguns rituais 
astecas. Para os colonizadores, a crença dos indígenas era um culto 
ao demônio, ou seja, o inimigo de Deus na religião cristã católica. 
Dessa maneira, os espanhóis incorporaram o papel de “guerreiros” 
em defesa da fé cristã contra as “heresias” do mundo.
Os conquistadores não viam os nativos como realmente eram, 
mas como eles queriam que fossem, ou seja, seres prontos para 
40 Antropologia Cultural
abraçar religião, hábitos e costumes europeus. Os espanhóis, padres 
ou não, nunca quiseram entender os indígenas. O mais importan-
te era encontrar riquezas e usar o povo como mercadoria escrava. 
Assim, poderiam ascender na sociedade europeia.
Alguns espanhóis escreveram livros para criticar e abominar as 
práticas dos mexicas. A intolerância era a base da relação entre esses 
dois povos, pois os conquistadores não tinham interesse em saber 
mais a respeito da cultura asteca.
5.4 Diego Durán e a cultura asteca
Diego Durán (c. 1537-1588) nasceu na Espanha, mas, diferen-
temente de muitos outros personagens marcantes dessa época, foi 
viver no México quando tinha aproximadamente seis anos de idade. 
A experiência dele resultou em uma compreensão interna da cultura 
indígena no século XVI.
Durán publicou a Historia de las Indias de Nueva España y Islas 
de Tierra Firme, também conhecida como Códice de Durán. Essa 
obra foi redigida entre 1576 e 1581.
Como dominicano, Durán viu na convivência e intimidade com 
a cultura indígena o ponto vital para o cumprimento de seu objetivo, 
ou seja, propagar a religião cristã. Para conseguir isso, perscrutou 
minuciosamente as práticas “pagãs” dos astecas, a fim de questio-
ná-las e destruí-las. Para Todorov, o que mais irritava Durán era o 
sincretismo incorporado na religião cristã pelos indígenas.
O que mais irrita Durán é que os índios consigam inserir 
segmentos de sua antiga religião no seio das práticas religio-
sas cristãs. O sincretismo é um sacrilégio, e é a este combate 
específico que se atém a obra de Durán [...]. Durán chega 
a se perguntar se os que vão à missa na catedral da Cidade 
do México não o fazem, na verdade, para poder adorar os 
antigos deuses, já que suas representações na pedra foram 
usadas para construir o templo cristão: as colunas da cate-
dral, nessa época, repousam sobre serpentes emplumadas! 
(TODOROV, 1999, p. 248-249)
A conquista da América e as formas de dominação espanhola 41
Durán abominava o sincretismo religioso, entretanto via seme-
lhanças entre a religião cristã e as crenças dos astecas. Segundo ele, 
hipoteticamente, os indígenas já haviam tido contato com outros pre-
gadores cristãos antes dele, ou o demônio os havia persuadido para 
executarem os ritos católicos em sua honra. Ele não suportava essa 
dúvida e, em seu livro, aponta que os astecas eram uma das tribos 
perdidas de Israel. Ao escrever a história do povo asteca, incorporou 
valores pessoais e relatou os fatos de acordo sua percepção do que 
deveria serregistrado. A obra, portanto, precisa ser criticamente ana-
lisada, pois não representa os valores do povo asteca.
5.5 Bernardino de Sahagún
Bernardino de Sahagún (1500-1590) nasceu na Espanha. 
Quando adolescente, estudou na Universidade de Salamanca e de-
pois ingressou na Ordem dos Franciscanos. Em 1529, chegou ao 
México, onde permaneceu até sua morte. Sahagún aprendeu a lín-
gua nahuatl e tornou-se professor de gramática latina no Colégio de 
Tlatelolco desde a sua fundação, em 1536.
Para facilitar a expansão do cristianismo, Sahagún propôs-se a 
descrever em detalhes a antiga religião dos mexicanos. Ao escre-
ver sua obra, desejava preservar a cultura nahuatl. Ele optou pela 
fidelidade integral, pois reproduziu os discursos que ouviu e acres-
centou sua tradução, em vez de substituí-los por ela. Entretanto, 
Sahagún intervinha com seus valores nos textos do livro, “corrigia” 
os costumes astecas dizendo serem eles “pagãos” e condenáveis aos 
olhos de Deus.
Sobre a obra de Bernardino de Sahagún, Todorov reconhece:
a partir dos discursos dos astecas, Sahagún produziu um 
livro; ora, o livro é, nesse contexto, uma categoria europeia. 
E, no entanto, o objetivo inicial é invertido: Sahagún tinha 
partido da ideia de utilizar o saber dos índios para contri-
buir na propagação da cultura dos europeus; e acabou por 
colocar seu próprio saber a serviço da preservação da cultu-
ra indígena. (TODOROV, 1999, p. 288)
42 Antropologia Cultural
5.6 Onde estava o povo civilizado?
Todorov (1999) expõe com clareza tanto os prismas europeus 
quanto as concepções indígenas no processo de conquista espanhola 
do território americano. O autor demonstra como o etnocentrismo 
(supervalorização de uma cultura em detrimento da outra) era regra 
para os europeus e resultou na destruição de muitas culturas locais. 
Infelizmente, os eurocentristas1 ainda não são capazes de perceber a 
cultura do restante do mundo, onde se constituíram povos distintos 
e com diversas especificidades.
Atividades
1. Cortez, para conseguir mais ouro, procurava entender os ri-
tuais astecas para dominá-los mais facilmente. A expedição 
teve início com a busca de informações. Explique como ele 
as conseguiu.
2. Sobre a conquista da América pelos espanhóis, explique a 
expressão “o tomar leva a destruir” em relação à coloniza-
ção asteca.
3. Diego Durán e Bernardino de Sahagún não escreveram obras 
que expressavam a cultura asteca. Por quê?
1 Aqueles que valorizam a cultura europeia em detrimento das outras culturas.
6
Conquista do Brasil: 
historiografia e educação
6.1 O conflito entre indígenas e portugueses
O povo tupi não teve tempo para criar uma confederação como 
os astecas nem um império como os incas. Isso porque houve a con-
quista da “Ilha Brasil” pelos europeus. Os portugueses chegaram 
em 1500 e esse fato mudou profundamente a realidade dessas várias 
tribos indígenas.
O conflito entre indígenas e portugueses se deu em vários cam-
pos, principalmente no biótico, ecológico e econômico-social. No 
campo biótico, os portugueses trouxeram várias patologias desco-
nhecidas pelos indígenas, como o sarampo, o escorbuto, a gripe e 
a varíola. Elas causaram grandes epidemias e chegaram a devastar 
tribos inteiras. Quando notaram a facilidade que os nativos ti-
nham para contrair essas doenças, os portugueses começaram a 
provocá-las, deixando uma peça de roupa de alguém que estava 
com sarampo, por exemplo, próxima à aldeia; dessa forma, alguém 
a encontrava e a vestia. Assim, logo se contaminava e transmitia a 
doença para o restante de sua tribo.
No campo ecológico, os portugueses devastaram florestas intei-
ras para extrair o pau-brasil (madeira de coloração avermelhada que 
era utilizada para tingir roupas na Europa e construir naus).
Na mentalidade europeia dessa época, havia a crença do Eldorado, 
ou seja, uma terra exótica feita de ouro e guardada por lindas mulhe-
res amazonas. Quando os europeus chegaram ao Brasil, não o en-
contraram, e sim uma terra coberta de vegetação e nativos indígenas.
44 Antropologia Cultural
No campo econômico-social, o período foi marcado pela 
mercantilização das relações de produção, articulando os novos 
mundos ao Velho Mundo europeu como provedores de gêneros 
exóticos, cativos, de ouro e da exploração e escravização do indí-
gena (RIBEIRO, 2000).
6.2 A conquista e a proteção da “nova terra”1
A Coroa portuguesa nem se preocupou com essa conquista no 
primeiro momento, posto que essa “nova terra” não oferecia ouro e 
prata. No entanto, outras nações estavam interessadas nesse território, 
por isso os portugueses começaram a povoá-lo o mais rápido possível.
Os primeiros soldados chegaram ao Brasil com o governador-ge-
ral Tomé de Souza, em 1548, no intuito de controlar os domínios da 
Coroa portuguesa. A preocupação em salvaguardar a terra conquis-
tada por Portugal da ambição de outras nações europeias fez com 
que o governador-geral estabelecesse um regimento visando a suprir 
a escassez de homens para a proteção da “nova terra”. Dessa forma, 
o regimento de 1548 estipulava o recrutamento entre os moradores, 
que auxiliariam os soldados.
Outra iniciativa tomada pela Coroa portuguesa foi armar a po-
pulação das colônias. O “alvará das armas”, em 1569, tornava obri-
gatória a posse de armas pelos homens livres que auxiliavam os sol-
dados. Na tentativa de organizá-los, foi criado o Regimento Geral 
das Ordenanças, em 1570. O serviço das ordenanças organizava a 
população de acordo com o corte social existente. A nobreza era 
contra o recrutamento, por isso não queria participar das ordenan-
ças, mesmo estando em seus escalões mais elevados.
1 A expressão “nova terra” é usada para referir-se, sob perspectiva eurocêntrica, 
às terras que deram origem ao atual Brasil – o uso das aspas se justifica porque a 
região encontrada não era uma terra propriamente nova, visto que já existia e era 
habitada antes da chegada dos europeus.
Conquista do Brasil: historiografia e educação 45
No Brasil, com uma hierarquia social que se forjava na presen-
ça determinante do escravismo, o corte social proposto pelas orde-
nanças era uma oportunidade justamente de afirmação social e de 
construção dessas diferenças entre os homens livres (PUNTONI, 
2004, p. 45).
As ordenanças abarcavam muitos indígenas, pois eles eram exí-
mios conhecedores da terra e já tinham familiaridade com a arte 
da guerra. Como a presença do indígena era essencial na força 
auxiliar de defesa da terra, em 1611 promulgou-se a lei que criou 
as chamadas Companhias, destinadas ao recrutamento de nativos. 
O posto de dirigente das Companhias era ocupado por pessoas 
abastadas, indicadas pelo governador-geral, que deveriam fazer o 
juramento de fidelidade à Coroa portuguesa.
Ao longo desse período, o critério para o preenchimento de car-
gos superiores nas ordenanças não era calcado nos conhecimentos 
especializados ou técnicos. No reinado de Dom Pedro II (1825- 
-1891), ocorre uma paulatina formação do exército profissional, 
que sofreu influências de estrangeiros, como de Gastão de Orléans, 
o Conde d’Eu (1842-1922). Esse momento representou a profissiona-
lização e um grande aumento do contingente do exército brasileiro.
No entanto, os primórdios da formação do exército brasileiro 
acontecem na época em que Dom João organizou o seu novo ga-
binete2 em terra brasileira, no qual foi designado para a pasta dos 
Negócios Estrangeiros e da Guerra D. Rodrigo de Souza Coutinho, 
o Conde de Linhares (1755-1812), que se tornou praticamente o pri-
meiro-ministro da Guerra no Brasil. Essa pasta abrangia as atribui-
ções referentes aos negócios estrangeiros do reino. No entanto, até a 
chegada da Corte portuguesa ao Brasil, a administração do exército 
ficava centrada na metrópole.
2 Negócios do Reino – D. Fernando José de Portugal e Castro (depois Marquês de 
Aguiar); Negócios Estrangeiros e da Guerra – D. Rodrigo de Souza Coutinho (Conde 
de Linhares); Negócios da Marinha e Ultramar – D. João Rodrigues de Sá e Menezes(Visconde, depois Conde de Anadia).
46 Antropologia Cultural
As tropas brasileiras eram precárias, os soldados faziam exercí-
cios somente uma vez por mês e seus pagamentos eram realizados 
em atraso, além de serem mal remunerados, o que os fazia traba-
lhar informalmente em outras ocupações, a fim de sustentar suas 
famílias. Porém, ainda tinham de dividir os lucros com os oficiais, 
os quais fechavam os olhos à irregularidade de os soldados serem a 
tropa do rei e, ao mesmo tempo, sapateiros ou pescadores (LOPES; 
TORRES; 1947, p.  33). Essa situação era realmente preocupante 
para D. João, que contava com a possibilidade de uma efetiva defesa 
por parte das forças armadas em caso de perigo ou risco de inva-
são estrangeira, particularmente em decorrência do contexto euro-
peu, que vivia um “desequilíbrio”, cuja solução só foi tomada após o 
Congresso de Viena, em 1815.
6.3 A história dominante nos livros didáticos
Anteriormente, os livros didáticos traziam informações reduzi-
das e ocultavam diversos fatos. Atualmente, por meio da chamada 
história renovada, temos acesso às informações, que passaram a ser 
veiculadas nas escolas e nos livros didáticos após a ditadura militar 
no Brasil, a qual durou vinte e um anos (1964-1985) e calou muitos 
intelectuais, obrigando as escolas a ensinarem um conteúdo patrió-
tico e positivista.
A história era contada destacando os feitos dos chamados “heróis”, 
como Pedro Álvares Cabral, Princesa Isabel e D. Pedro II, banindo 
a participação da população na própria história. Essas concepções 
constituíram-se por muito tempo como “história oficial”. Essa histo-
riografia é muito difundida e influencia em nossa leitura da realidade 
porque se popularizou por meio dos livros didáticos. 
Na obra O saber histórico em sala de aula, Circe Bittencourt 
(2002) discute as concepções e caracterização do livro didático, ins-
trumento que muito corroborou para a ratificação da presença dos 
“heróis” na história brasileira. Bittencourt explica: o livro didático 
Conquista do Brasil: historiografia e educação 47
propaga valores e ideologias de uma cultura. Para ela, “o papel do 
livro didático na vida escolar pode ser o de instrumento de repro-
dução de ideologias e do saber oficial imposto por determinados 
setores do poder e pelo Estado” (BITTENCOURT, 2002, p. 73).
Assim, a história factual é herança desse “nacionalismo oficial” 
no qual o Estado executa, desde o início, uma política consciente de 
proteção dos seus interesses. Dessa maneira, os líderes nacionalistas, 
muitas vezes, projetam sistemas civis, militares, culturais e educa-
cionais em nome da nação, difundindo essas ideologias.
Etimologicamente, podemos dizer que a palavra ideologia vem 
do grego idea, que quer dizer aparência, princípio, ideia, ideograma. 
Marilena Chaui propõe que a ideologia tem como função camu-
flar as diferenças entre as classes sociais e proporcionar às pessoas 
a identidade social, que propõe uma unidade, por padronizar inte-
resses particulares que são anunciados como objetivos comuns da 
nação. Assim,
A ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente 
de representações (ideias e valores) e de normas ou regras 
(de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da 
sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que 
devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sen-
tir e como devem sentir, o que devem fazer e como devem 
fazer. Ela é, portanto, um corpo explicativo (representações) 
e prático (normas, regras, preceitos) de caráter prescritivo, 
normativo, regulador, cuja função é dar aos membros de 
uma sociedade dividida em classes uma explicação racional 
para as diferenças sociais, políticas e culturais, sem jamais 
atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes, 
a partir das divisões na esfera da produção [...] encontrando 
certos referenciais identificadores de todos e para todos, 
como a Humanidade, a Liberdade, a Igualdade, a Nação, ou 
o Estado. (CHAUI, 1981, p. 113-114)
Dessa maneira, há vários significados para a ideologia. Em 
sentido amplo, é uma ciência da formação das ideias; tratado das 
noções em abstrato; sistema ou conjunto articulado de conceitos, 
valores, opiniões e crenças que expressam e reforçam as relações 
48 Antropologia Cultural
que conferem unidade a determinado grupo social (classe, partido 
político ou seita religiosa), seja qual for o grau de consciência que 
disso tenham seus portadores. Também pode ser um sistema de 
ideias dogmaticamente organizado como instrumento de luta polí-
tica e um conjunto de ideias próprias de um grupo, de uma época e 
que traduzem uma situação histórica.
A história do Brasil narrada pelos livros didáticos quase sempre 
ratificou o ideário europeu: os portugueses eram os desbravadores; os 
“predestinados”, aqueles que vieram pregar a salvação aos povos, 
os “civilizados’’; o indígena foi representado como um selvagem, 
omisso e “incivilizado” e o negro3 não passava de uma mercadoria, 
por isso não tinha sentimentos nem resistia à escravidão, corrobo-
rando com a visão do escravizado como um ser estoico4. Ora, nin-
guém se identifica com o mais fraco, quer ser “incivilizado” ou omis-
so. Esses arquétipos, construídos ao longo de nossa história, fazem 
com que a nação exclua da sua formação os indígenas e os negros e 
adote os modelos europeus.
O livro didático é um importante veículo portador de um 
sistema de valores, de uma ideologia, de uma cultura. Várias 
pesquisas demonstraram como textos e ilustrações de obras 
didáticas transmitem estereótipos e valores dos grupos 
dominantes, generalizando temas, como família, criança, 
etnia, de acordo com os preceitos da sociedade branca bur-
guesa. (BITTENCOURT, 2002, p. 72)
3 Somente após a abolição da escravidão no Brasil, em 1888, é que o negro passou 
a ser visto como elemento componente da formação étnica brasileira. Entretanto, a 
ideologia racista afirmou que a miscigenação com os negros fez do Brasil um país 
omisso e estagnado em relação ao progresso.
4 Para saber mais, ver Piratininga Jr. (1991). Essa obra analisa as justificativas 
preconceituosas para a escravidão do negro. Uma delas ratifica a descendência dos 
negros com Cam, filho de Noé, que denunciou aos irmãos que o pai, depois de ter se 
embriagado com vinho, aparecera nu. Noé, ciente do comentário, amaldiçoou-o, de-
sejando que ele se tornasse “escravo dos escravos de seus irmãos”. O termo estoico 
aparece para lembrar essas explicações da escravidão, ou seja, o negro, de acordo 
com essas justificativas, deveria aceitar a exploração como destino.
Conquista do Brasil: historiografia e educação 49
Os livros didáticos serviram como base do nacionalismo ofi-
cial, pois eles vêm sendo utilizados na aprendizagem como principal 
instrumento de trabalho dos educadores e dos educandos desde o 
século XIX. 
As ilustrações mais comuns sobre o passado da nação foram 
reproduzidas, por desenhistas ou por fotógrafos, de qua-
dros históricos produzidos no final do século XIX. Dessa 
galeria de arte que os livros didáticos foram os principais 
divulgadores, dois quadros têm sido os mais reproduzidos 
desde o início do século: o 7 de setembro de 1822, de Pedro 
Américo, e A Primeira Missa no Brasil, de Vitor Meirelles 
de Lima. (BITTENCOURT, 2002, p. 77)
E, como se observa, a história narrada e ilustrada pelos livros 
didáticos sustenta o caráter heroico e missionário dos europeus.
6.4 O educador e o ensino crítico
Atualmente, fala-se muito sobre a educação calcada na crítica (di-
ferentemente do ensino propedêutico e tradicional), voltada ao ensi-
no humanista, ao lúdico, à motivação, à construção e à criatividade. 
Por isso, o educador tem de conhecer a proposta pedagógica da escola 
em que leciona, mas também saber quais são os objetivos da discipli-
na que ministra e qual tipo de formação é melhor para os alunos. Ao 
lutar para não reproduzir o discurso excludente e preconceituoso que 
a cultura de massa veicula, o educador muitas vezes se frustra, pois 
percebeque os meios de comunicação são muito mais atraentes para 
os estudantes que as aulas. Assim, o educador sabe que toda essa cria-
ção da mídia serve para iludir, e não alimentar a sabedoria do aluno.
Na disciplina de História, por exemplo, ainda é comum o con-
teúdo ser extenso e o ensino estar pautado apenas em datas come-
morativas e ressaltando nomes de militares, estrategistas e políticos. 
Ou seja, a história feita por “heróis”. Esse é o legado de uma histo-
riografia que privilegiou os grupos dominantes de uma determinada 
época e excluiu os agentes transformadores (camponeses, indígenas, 
escravos e mulheres).
ensino 
propedêutico: 
ensino 
fragmentado 
voltado 
apenas para 
o vestibular.
50 Antropologia Cultural
O papel do educador em sala de aula é, portanto, o de desmitifi-
car a ideia de heróis que lutam sempre pela maioria e que os ditos in-
divíduos comuns não têm capacidade de realizar grandes mudanças 
por possuírem uma natureza passiva. O educador precisa esclarecer 
aos alunos que eles também são agentes da história e podem trans-
formar a realidade. 
Na década de 1960, houve uma inversão de valores na educação, 
quando o Brasil adotou os padrões mecanicistas dos EUA, ou seja, 
a fragmentação do conhecimento, a análise hermeneuta e superficial 
do mundo e a negação da análise das fontes utilizadas pelos educa-
dores em sala de aula.
A educação fracassou por ser culpada de um estupendo erro cate-
górico. Segundo John Dewey (2008), ela confundia os produtos pron-
tos e refinados da investigação com o tema bruto e não polido e tentava 
fazer com que os alunos aprendessem as soluções, em vez de investi-
gar problemas e envolverem-se nos questionamentos por si mesmos. 
Os cientistas, por exemplo, empregam o método científico para a ex-
ploração de situações problemáticas e assim também deveriam fazer os 
alunos, caso quisessem aprender a pensar sozinhos. Ao contrário disso, 
ainda se pede que estudem os resultados das descobertas feitas pelos 
cientistas, desprezando o processo e fixando a atenção no produto.
Quando os problemas não são explorados em primeiro lugar, 
nenhum interesse ou motivação é criado, por isso chamamos de 
educação o que na verdade é uma charada e um simulacro. Dewey 
(2008) propunha: na sala de aula, deveria acontecer o pensamento 
independente, imaginativo e rico. O caminho por ele proposto – e 
nesse ponto alguns de seus seguidores o abandonaram – é que o 
processo educativo na sala de aula deveria tomar como modelo a 
investigação científica.
Portanto, é necessário construir conhecimento, e não reproduzi-
-lo. O educador que visa a formar pessoas críticas precisa analisar de 
maneira ontológica os conceitos com os educandos e trabalhar por 
Conquista do Brasil: historiografia e educação 51
meio de tarefas lúdicas, propiciando ao aluno criar e saber lidar com 
a própria sensibilidade. Essas atividades podem ser dramatizações, 
música, literatura, viagens imaginárias, danças ou jogos.
Além disso, o educador precisa trabalhar com a pesquisa em sala 
de aula para que os estudantes possam construir o próprio conheci-
mento. A ausência dessa atividade é muito grave, pois não possibilita 
ao aluno fazer a própria análise de determinado objeto de estudo e, 
assim sendo, ele somente reproduz aquilo que o educador disse em 
sala de aula, pois não tem as bases para ser um indivíduo crítico. 
Essas ideias, propagadas por Louis Althusser (1918-1990), ain-
da imperam, ou seja, existe a impossibilidade de transformação 
por intermédio de conceitos trabalhados em sala de aula, já que os 
educadores são “obrigados” a espalhar o discurso de uma classe mi-
noritária e dominante. O preocupante é que muitos deles transfor-
mam os educandos em indivíduos passivos e negam a experiência 
de agirem como agentes transformadores.
Atividades
1. O conflito entre indígenas e portugueses aconteceu em vários 
campos, principalmente no biótico, ecológico e econômico-
-social. Explique cada um deles.
2. Quais foram as medidas tomadas pela Coroa portuguesa 
para a proteção da “nova terra”?
3. A ideologia está presente, mesmo que de maneira não explí-
cita, em várias instâncias da vida social, inclusive na escola 
e nos livros didáticos. Na sua opinião, o livro didático pode 
distorcer muitos fatos da história do Brasil, principalmente 
do Brasil Colônia? Justifique sua resposta.
7 
O enfrentamento dos mundos
7.1 A chegada do europeu na “Ilha Brasil”
Para os indígenas, a chegada do europeu foi algo extremamen-
te danoso. Havia uma curiosidade muito grande em torno de quem 
eram aqueles homens que vieram do mar. Será que eram deuses? 
Eram pacíficos ou ferozes? Amigos ou inimigos? Na concepção mítica 
dos indígenas, os europeus podiam ser enviados do deus Sol – Maíra. 
Assim, provavelmente seriam pessoas generosas. Isso porque, na cul-
tura indígena, tudo era de todos, não havia na tribo quem mandava ou 
explorava seus semelhantes.
O indígena não obedecia a ordens porque na tribo todos desem-
penhavam funções e todas elas eram importantes. Havia o respeito 
mútuo e os indivíduos se reconheciam como onto-societários, ou 
seja, seres coletivos que não vivem apenas para sanar as suas vicis-
situdes, mas para atender às necessidades do grupo (ausência do 
individualismo exacerbado).
Esse povo parece pertencer a dimensões diferentes concomitan-
temente, ou seja, ao mundo espiritual e ao físico. Para o indígena, 
as coisas materiais estão concatenadas à esfera espiritual, como se 
fossem uma extensão dela.
Sabe-se que o mito e as crenças são formas fantásticas de explicar 
a realidade. Então, podemos entender a crença dos indígenas em 
espíritos da natureza: eles interagem a todo momento e perscrutam 
os mistérios dela. Por esse motivo, acreditam que no mundo natural 
há uma força mágica e invisível regendo com perfeição e harmonia 
o todo.
54 Antropologia Cultural
A mitologia indígena é composta pelo deus Sol, espírito das 
águas, das florestas e dos animais. Há uma interação direta entre o 
indígena e essas forças.
O cacique, homem mais velho da tribo, é considerado sábio e, 
por esse motivo, representa uma espécie de energúmeno que recebe 
os ensinamentos dos espíritos. Ele empresta o corpo para esses espíri-
tos o utilizarem para a cura, dar conselhos e em rituais. Esse homem 
é bastante respeitado, no entanto não é o líder da tribo, pois ele não 
manda em tudo e em todos nem explora seus semelhantes, tem ape-
nas a função de sábio e conselheiro.
Quando havia algum problema ou conflito entre membros da 
tribo, o cacique tentava apaziguar ou resolver a situação por in-
termédio de seus conselhos. Entretanto, os indígenas muitas vezes 
ignoravam as palavras do velho e resolviam sozinhos as querelas. 
Portanto, podemos perceber que não há uma pessoa com maior 
relevância, mas sim uma verdadeira comunidade onde todos desem-
penham sua função em favor do grupo.
O europeu era retratado como herói, e o indígena como selva-
gem. As ilustrações mostravam os europeus muito bem vestidos, 
bonitos e limpos descendo de suas naus e os indígenas nus, confusos 
como crianças assustadas assistindo à cena. Contudo, a historiogra-
fia aponta outra visão, diferentemente dessa retratada pelo senso 
comum. A viagem em naus de Portugal ao Brasil demorava muitos 
meses e os alimentos eram escassos, por isso não havia comida nem 
água para todos. Os banhos eram raros e dentro das naus não ha-
via um local específico para a higiene pessoal e para as excreções. 
Assim, os portugueses jogavam ao mar as fezes e a urina.
Diante da alimentação precária e da falta de higiene, muitos ho-
mens adoeciam antes de chegar à “Ilha Brasil”. A principal doença 
era o escorbuto, que tem como primeiros sintomas hemorragias 
nas gengivas, inchaço, dores nas articulações, feridas que não ci-
catrizam, causando a desestabilização dos dentes. Essa doença é 
provocada por carências graves de vitamina C na dieta e, muitas 
energúmeno: 
pessoa 
possuída, 
possessa.
O enfrentamento dos mundos 55
vezes,

Outros materiais