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FACULDADE FUTURA EDUCAÇÃO DO CAMPO VOTUPORANGA – SP 2 1 CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO Inúmeros são os desafios encontrados para a efetivação de uma educação que pensasse as especificidades múltiplas que existem no espaço do campo brasileiro, e nesse contexto, temos a Educação do Campo que nasce junto às lutas sociais por políticas educacionais que atendam os povos do campo. Fonte:www.andes.org.br A educação tem se constituído como um instrumento relevante na sociedade brasileira e às vezes tem sido definida por concepções de educação que no processo histórico tem enviesado para caminhos de natureza cartesiana, pragmática, reprodutivista, crítica-reprodutivista, ou simplesmente crítica, libertadora, liberal, neoliberal, pós-moderna, enfim; uma educação que se desenvolveu acompanhando a trajetória histórica e trouxe avanços à sociedade brasileira principalmente na área da pesquisa, responsável pela inovação tecnológica também para a zona rural. No campo inovaram: no maquinário, no aumento da produção de grão, nos agrotóxicos, alteração dos genes das sementes para exportação em larga escala. Mas os que têm usufruído desses avanços são pequenos grupos de latifundiários, empresários, banqueiros e políticos nacionais e internacionais. Enquanto a outros é negado o acesso à terra para sobreviver e garantir o sustento de outros brasileiros. Em relação à educação do campo, é pertinente ressaltar que a concepção de educação que vem sendo http://faculdadefutura.com.br/ 3 empregada pela cultura dominante e elitista, não tem favorecido satisfatoriamente para combater o analfabetismo, elevar a escolaridade dos sujeitos, sua cultura e seu padrão de vida. Há ainda insatisfação, ocasionada pelo acesso tardio a escola que na maioria das vezes, nas regiões mais pobres do Brasil, são oferecidas sem condições de oportunizar saberes para a criança, o adolescente, os jovens e adultos devido à precariedade de investimentos dessa política pública. Isso representa, sem dúvida, uma das maiores dívidas históricas para com as populações do campo. Enquanto Arroyo critica a sociedade brasileira por não oportunizar políticas públicas de educação para as populações do campo, Durkheim (1998) com uma concepção de sociedade elitista e classista, se refere a uma educação que deveria ser diferente para as classes sociais. “A educação urbana não é a do campo, e a do burguês não é a do operário”. (p. 39). Isso caracteriza, evidentemente, uma postura alienadora que reforça uma educação para privilegiados. Marx também se reporta aos aspectos das desigualdades remetendo essa situação a partir de uma ordem social que submete o mundo ao poderio do capital. Relata que o trabalho humano nunca produziu tantos objetos em toda história humana. A condição de poder da burguesia é o crescimento do capital que submete o homem ao trabalho assalariado, gerando uma base de competitividade e desigualdade entre os trabalhadores. Isso canaliza para um índice absurdo de “pobreza que cresce mais rápido do que a população e a riqueza”. (1998; p.28). O paradigma de produção capitalista permite maior exploração entre as pessoas, causa a marginalização do trabalhador do campo e, a mão de obra humana na fábrica ou no latifúndio, transforma-se numa mercadoria a serviço da burguesia, do capitalismo que também se articula pelo processo educativo. Pensando nesta situação de exploração do trabalhador e nas condições que oportunizam uma educação conscientizadora, Paulo Freire (2007) nos possibilita observar o sistema educacional da sociedade brasileira, dentro do processo de mudança, quando identifica a educação como elemento fundamental para o sujeito do campo ou da cidade. E considera como necessidade primordial dessa mudança, a leitura de mundo com o sujeito que aprende, mas que também ensina. Ele desenvolveu uma metodologia de ensino para a alfabetização e conscientização do trabalhador do campo que partia dessa leitura de mundo. Uma iniciativa surgida na década de 50, que continua presente na ação educativa de muitos professores do campo e da cidade. http://faculdadefutura.com.br/ 4 Fonte: www.al.undime.org.br O camponês, o ribeirinho, o povo da floresta da Amazônia Paraense também tem demonstrado que domina saberes. Conhecem as marés do rio que enche e vaza, do tempo da piracema, sabem que grande área de floresta no chão torna o solo da Amazônia infértil, do período da coleta dos frutos na floresta, entendem a geografia do rio, da mata; trazem consigo a cultura de seus antepassados impregnada em suas cantigas, danças e lendas em seu jeito de ser homem, mulher caboclo sujeito de saberes amazônicas. Mas a incorporação de sua cultura nos currículos escolares se processa por aspectos que envolvem desde políticas públicas para a educação como também, a aproximação do professor com o aluno e sua realidade por meio de situações problematizadoras. Quando os saberes selecionados por especialista de currículo que representam os interesses da cultura dominante, são questionados na escola se evidencia que, o ato de ensinar está relacionado ao outro, como um ser ignorante. Um sujeito que não sabe, precisa saber conhecer, para deixar de ser. Algumas vezes não se compreende o sujeito que aprende como portador de uma outra cultura que domina saberes tão relevantes quanto os saberes do professor. Não se identifica a base do processo educativo como formação da consciência e no estabelecimento da relação dialógica com o sujeito que aprende, interligando a dialética dos seus conhecimentos aos da sociedade que conserva, mas também se modifica. Para Freire (2007) não existe nenhuma estrutura exclusivamente estática, assim como, não há uma, absolutamente dinâmica. Isso vale para a estrutura construída pelas sociedades e também para a educação. Desde a Antiguidade até a contemporaneidade, as concepções de educação sofrem alterações, modificações ou surgem novas. http://faculdadefutura.com.br/ 5 1.1 Antecedentes históricos da educação do campo na sociedade brasileira A partir de 1930, a concepção de educação do campo se configura em um conjunto de políticas com definições elaboradas para este atendimento. No histórico da legalidade educacional, um dos primeiros tratamentos de maior abrangência ocorreu na Constituição de 1934, quando os Pioneiros da Escola Nova que representaram uma nova relação de forças oriundas pelo conjunto de insatisfações de setores intelectuais, cafeicultores, classe média e até massas populares urbanas se instalaram na sociedade solicitando reformas educacionais. A Constituição de 1934 sinaliza para importância de uma concepção de educação profissional voltada para o contexto industrial, e quanto à educação rural artigo 156: Parágrafo único determina: “Para realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará, no mínimo, vinte por cento das quotas destinadas a educação no respectivo orçamento anual.” (POLETTE; 2001, p.169) um relevante acontecimento, mas, omitem outras proposições para educação do campo. Em 1947 a nova Constituição Brasileira propõe que a educação rural seja transferida para responsabilidade de empresas privadas (industriais, comerciais e agrícolas) a obrigatoriedade pelo financiamento como expressa o Capítulo II da educação e cultura, Artigo 166; inciso III: “as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que trabalham mais de cem pessoas, são obrigadas a manter o ensino primário gratuito para os seus servidores e os filhos destes”; (BALEEIRO E SOBRIDINHO; 2001; p. 108). Quanto à obrigatoriedade do ensino, responsabiliza as empresas industriais e comerciais em ministrarem a aprendizagem de trabalhadores menores em forma de cooperação e exime desta responsabilidade as empresas agrícolas. Apartir de 1940 a educação brasileira incorporou a matriz curricular urbanizada e industrializada. Caracterizou interesses sociais, culturais e educacionais das elites brasileiras como fundamentalmente a mais relevante para todo povo do Brasil. Com a Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969, permanece a obrigatoriedade das empresas agrícolas e industriais com o ensino primário gratuito para empregados e os filhos menores de 14 anos. Isso explica, porque o Brasil até 1970 esteve com uma educação do campo, sob o gerenciamento das iniciativas privadas da produção do campo, com a formação profissional próprios para esta realidade e devidamente qualificada. Ocorre que, sucessivamente os governos http://faculdadefutura.com.br/ 6 brasileiros têm implantado uma educação que não atende e não respeita às especificidades de cada realidade regional e muito menos a diferenciação (geográfica, cultural, histórica, social, etc.) do campo. Neste caso, a oferta de educação para o campo em alguns lugares da Amazônia Paraense não tem garantido as alterações propostas pela Constituição de 1988, ou pelos documentos supracitados, uma vez que se recorre a um padrão de educação urbano Centrica. Esse paradigma é marcado por contradições que de certa forma, vem interferindo na implementação de políticas públicas de afirmação para as populações que vivem e trabalham no campo. Segundo Elaine Furtado (2006), para compreender como a sociedade brasileira produziu e reproduziu as desigualdades no campo, precisamos entender três elementos: “O latifúndio, a industrialização e a financeirização da economia”. Ao expor sobre a discussão, retrata Furtado (2006) de que o Brasil desenvolveu uma estrutura fundiária baseada na grande propriedade rural que ainda se configura, mas, se solidificou graças às contingências do mercado mundial favorável a monocultura e também pela exploração da mão de obra escrava. Durando três séculos “produziu-se concentração da terra, exclusão dos trabalhadores do campo, do acesso às condições mínimas de sobrevivência, mesmo depois do término formal da escravidão”. Com o processo da industrialização as necessidades da população do campo foram mais uma vez renegadas, prevalecendo à produção em larga escala de grãos para exportação e consumo, gerando concentração de renda nas mãos de poucos, em relação à maioria. Acrescenta Furtado (2006), como elemento recente a financeirização da economia, que marca essa construção história “somados as desigualdades produzidas pela globalização, o avanço tecnológico e a abertura dos mercados com a financeirização da economia, fundada em taxas de juros mais altas do mundo, fez com que voltasse a exclusão dos trabalhadores” (Ibidem; p. 48). Esses elementos determinaram uma construção história resguardada pela exploração dos trabalhadores e durante séculos fortaleceu a classe dominante do país favorecendo a apropriação e o empoderamento de bens e de riquezas, bem como, o domínio de conhecimentos tecnológicos, culturais, no qual a educação, na maioria das vezes, esteve a serviço dessa estrutura de dominação. A principal preocupação desse período era a formação de mão de obra qualificada que contemplasse os interesses e necessidades do espaço urbano para aceleração do crescimento econômico industrial que gradativamente se fortalecia http://faculdadefutura.com.br/ 7 após Segunda Guerra Mundial. Durante a Guerra Fria, instalou-se uma concepção de mercado que procurava ampliar o número de consumidores, e aos Estados Unidos interessava consolidar essa hegemonia. Por conta dessa disputa entre as potências mundiais (Estados Unidos e União Soviética) que muitos países foram aderindo a uma das posições políticas e junto com a adesão vinha o pacote de proposições educacionais para serem implementadas em cada país. No caso do Brasil, optou-se por uma educação com currículos e metodologias fundamentados no ideário norte- americano, numa perspectiva de afirmação de uma escola essencialmente urbana. Então, a partir dos anos 30, a escolarização para o trabalhador do campo, foi inserido também, com o intuito de conter o êxodo rural, provocado pelo processo de industrialização do país, responsável pela grande massa de migrações rurais de quase todas as regiões do país durante décadas subsequentes. Cláudia Passador (2006) expressa que para os camponeses, a escola não tinha tanto significado, uma vez que, o aprendizado da profissão tinha sido adquirido com os pais e não pela escola. De forma geral, a escola era compreendida como lugar da “contra-educaçãorural”, pautada em apenas instruir o homem do campo, para ler, escrever e contar. Essa ideia de instrução do trabalhador nos remete a uma ideologia de que o sujeito da roça não precisa estudar, pois, trabalhar com a enxada, por exemplo, requer apenas esforço físico, não precisaria raciocinar refletir, questionar e sim, somente manusear os instrumentos e saber utilizar a terra adequadamente.1 2 O DIREITO DOS POVOS CAMPESINOS À EDUCAÇÃO Para que se possa refletir sobre o direito a educação aos homens e mulheres do campo é necessário considerar o conjunto de forças sociais, políticas, econômicas e culturais que foram se engendrando no decorrer da história do Brasil, sob os interesses do capital, e que influenciaram sobre maneira a oferta de educação pública a esses sujeitos. No Brasil, esse contexto é marcado pela educação dos jesuítas que aqui chegaram chefiados pelo Padre Manoel da Nóbrega, com a missão de “educar” a nova colônia portuguesa, instituindo a fase jesuítica da educação colonial, ligada estritamente à política colonizadora europeia a favorecer o capitalismo de acumulação primitiva. O processo de colonização do Brasil tem como marco importante as 1 Texto Extraído de http://www.anpae.org.br/congressos_antigos/simposio2007/289.pdf http://faculdadefutura.com.br/ 8 Capitanias Hereditárias, cujo elemento fundamental é a posse da terra, sustentada pela lógica produtiva das relações sociais sob o tripé latifúndio, religião e escravidão. Em síntese, a educação ou sua negação ao povo, no período supracitado, inscreve- se no objetivo da colonização: lucro, acumulação de riquezas, expropriação e exploração das novas terras descobertas, traçando as marcas históricas daquilo que CHAUÍ (2000) chamou de mito fundador (descobridor) que tem permanecido além daquela época. Diferentemente da formação, a fundação se refere a um momento passado imaginário, tido como instante originário que se mantém vivo e presente no curso do tempo, isto é, a fundação visa a algo tido como perene (quase eterno) que traveja e sustenta o curso temporal e lhe dá sentido. A fundação pretende situarse além do tempo, fora da história, num presente que não cessa nunca sob a multiplicidade de formas ou aspectos que pode tomar (CHAUÍ, 2000, p. 9). O fenômeno colonização é igual a exploração, associada ao submetimento dos povos indígenas e negros às mais cruéis formas de relações sociais, o que trouxe implicações para o modelo de educação a ser ofertado, distintamente, a cada classe social. A educação brasileira passa a existir nesse contexto e dela não se aparta a educação proposta ao trabalhador(a) rural. No Brasil colônia, não se pode falar de educação propriamente, porque “até 1808, época em que aqui chegou a Família Real portuguesa eram proibidos no Brasil: escolas, jornais, circulação de livros, associações, discussão de ideias bibliotecas, fábricas, agremiações políticas e qualquer outra forma de movimento cultural” (LIMA, 1968, p.19), ou seja, 308 anos como porto, fonte de matéria-prima, controlado por feitorias e fortes. Propositalmente, Portugal mantinha a colônia ignorante e analfabeta, condição necessária para manter o avanço do capitalismo nesse país, porém, tendência seguidapelos governantes posteriores, que permitiram constatar-se no final do século XX o baixo padrão de desenvolvimento da educação aos povos do campo. O latifúndio cresceu nesse país fundado nos cem anos de escravidão e extermínio dos povos indígenas e do século XVII ao século XIX (1888) com base na escravidão do negro africano. Portanto, o Brasil podia isentar-se de oferecer educação. Esta não era necessária ao modelo de acumulação de riquezas, apesar das revoltas dos povos indígenas e da luta do povo negro, cuja expressão maior está nos quilombos. Em termos políticos o Brasil “saiu” da condição de colônia, constituiu- se império, fez-se “independente” e proclamou-se república. Tais contextos levaram, http://faculdadefutura.com.br/ 9 por sua própria contradição, à reivindicação da educação, sob a responsabilidade do Estado. Mas, demoraria muito a se configurar uma política de educação efetiva, pois da parte das elites brasileiras, sempre houve um grande receio quanto aos ideais políticos de liberdade e de direitos sociais que poderiam ser estimulados caso fosse ofertada aos trabalhadores. Verifica-se que a educação pública brasileira, até os anos 30 do século XX, não consegue sair do papel, constituindo-se de um leque muito amplo de leis anunciadas e não materializadas como direito. O não assumir da educação como obrigação exclusiva do Estado abriu historicamente o caminho à iniciativa privada, deixando mais distante o acesso à educação, pelo povo. Assim, é que se chega ao século XXI e, ainda, o acesso à educação configura-se como um problema nacional, sem que esta fosse garantida à maioria da população brasileira em seus diversos níveis e modalidades, particularmente à força de trabalho camponesa. É nesse sentido que se ressalta que a luta pela educação do campo ocorre no palco dos conflitos decorrentes da luta pela terra, fato verificado desde a aprovação da lei de terras, em 1850. A referida Lei restringia o direito à terra aos ex escravos, aos brasileiros pobres, posseiros e imigrantes, mas permitia que estes se tornassem mão de obra barata para o latifúndio até os nossos dias quando se aprova o II Plano Nacional de Reforma Agrária, no governo Lula. Casa-se, assim, o capitalismo com a propriedade da terra e, com esse laço de união esta é transformada em uma mercadoria controlada por quem tem dinheiro e poder político. É como se essas leis pudessem ser chamadas de a primeira cerca de arame farpado ou a primeira semente concreta para a constituição do campesinato semterra e sem acesso às políticas públicas, entre as quais a política educacional. 2.1 Educação Para Uma Minoria A introdução da educação rural nas legislações brasileiras data do início do séc. XX, produzindo para o campo políticas de educação que primaram pela contensão. Esse fato expressa a necessidade de acumulação capitalista, naquela época, e uma visão de que para tal modelo de produção não era preciso grandes investimentos em educação, corroborada pela abundância de mão-de-obra. O quadro referente a educação no século anterior já havia indicado que apenas 10% da população em idade escolar se achava matriculada nas escolas primárias e que as primeiras Escolas http://faculdadefutura.com.br/ 10 Normais, visando a formação de educadores, para aquele nível de ensino, só seriam criadas em 1835. As mentalidades dominantes no poder, durante séculos, foram indiferentes à educação popular e feminina. Para eles a educação dos pobres e da mulher devia ser prática e utilitária, daí que ao se chegar a Primeira República (1889), os índices de analfabetismo da população brasileira eram em torno de 85% (RIBEIRO, 2001). Posteriormente, no período pós-guerra (1914/1918) demarcaria o início do surto industrial e a tendência a urbanização do país. Constituiu-se o operariado e aumentaram os movimentos contestatórios: greves, Movimento Tenentista, Coluna Prestes, fundação do Partido Comunista Brasileiro, Semana de Arte Moderna. Contudo, mais da metade da população de quinze anos e mais, em 1920, estava fora da escola. A população do país, em torno de 14.333.915 milhões de habitantes, tinha apenas 250 mil estudantes (RIBEIRO, 2001). A educação, pela primeira vez, passa a ser tratada como uma questão nacional, por meio da edição da Constituição de 1934, que também exigia a elaboração de Diretrizes e Bases para a educação nacional e a elaboração de um Plano Nacional de Educação. Mas, tal anseio não se consolidou em decorrência do Estado Novo de 1937. A Constituição do Estado Novo tomaria a educação rural como fundamento para organizar a juventude no trabalho, promover disciplina moral e adestramento físico “de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus deveres para com a economia e a defesa da Nação”. Essa é a educação para os camponeses porque para os filhos da burguesia agrária e industrial a educação haveria a educação secundária, de caráter propedêutico, que tinha por objetivo educar as futuras elites condutoras. A lei do Ensino primário só seria aprovada em 1946, época em que está no poder o general Eurico Gaspar Dutra. A grande novidade da Lei foi o Artigo n.º 56, Parágrafo Único: Para realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará, no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo orçamento anual. Quanto ao ensino agrícola, a estrutura implantada pelo Decreto-Lei 9613/46 foi a de cursos de nível AURORA ano III número 5 - DEZEMBRO DE 2009 ___ISSN: 1982-8004 www.marilia.unesp.br/aurora médio divididos em cursos de formação e cursos pedagógicos. Os de formação se subdividiam em cursos de 1º e 2º ciclos. O de 1º ciclo, por sua vez, se subdividia em básico (4 anos) e de maestria (2 anos). O de 2º ciclo era constituído dos cursos técnicos (3 anos), tais como: de agricultura, de horticultura, de zootecnia, de práticas veterinárias, de indústrias agrícolas, de laticínios e de mecânica agrícola. Os cursos pedagógicos se subdividiam em cursos de (2 anos) para formar professores nas áreas de educação rural doméstica e em cursos (1 ano) didática do ensino agrícola e administração do ensino agrícola (RIBEIRO, 2001, p. 150) http://faculdadefutura.com.br/ http://www.marilia.unesp.br/aurora http://www.marilia.unesp.br/aurora http://www.marilia.unesp.br/aurora 11 Será que a educação no meio rural passou a ser prioridade? Evidente que não. Porém, interessava ao capitalismo conter e controlar a tensões existentes no campo e a educação rural, assim chamada pelos legisladores, seria um dos instrumentos de correspondência às práticas abusivas de poder. O ano de 1946 demarca a aprovação da Lei Orgânica do Ensino Agrícola para a formação de trabalhadores da agricultura, equiparando esses cursos as outras modalidades, mesmo assim, continuavam as restrições àqueles que faziam opção por cursos profissionalizantes. O período do chamado nacional desenvolvimentismo é marcado por intensas lutas políticas, em que os movimentos sociais (operários e camponeses) passam a exigir reformas de base, econômicas e sociais. Unem-se a eles estudantes, educadores, partidos de esquerda e muitos movimentos populares. Porém, em outro extremo e contrários a estes interesses, os empresários (norte-americanos e brasileiros), militares, latifundiários, partidos de direita (União Democrática Nacional) e diversos segmentos das elites, setores da igreja e da mídia unem-se em contraposição aos ideais socialistas veiculados, às reformas - da reforma agrária à realização da campanha nacional de alfabetização do povo – reivindicadas pelos trabalhadores. A LDB nº. 4.024 foi aprovada em 1961, resultante dessas disputas, num processo conflituoso entre os defensores da escola pública e da escola privada, culminando com o consenso entre os projetos Mariani e Lacerda. Por sua vez, a realidade educacional mostrava que 50% da população em idadeescolar estavam fora da escola. Paralelamente, fatos importantes no campo da cultura, da política e da educação popular ocorreram, trazendo um novo significado para a educação rural e popular: os movimentos políticos culturais no início dos anos 60, com destaque para os Centros Populares de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE); o Movimento de Cultura Popular (MCP), em Pernambuco e o Movimento de Educação de Base (MEB), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Esses movimentos promoviam a Alfabetização da população rural e urbana marginalizadas, a partir dos referenciais teóricos constituídos da unidade entre a política das lutas dos movimentos sociais e dos círculos de cultura idealizados por Paulo Freire, os quais culminariam com a proposta da Pedagogia Libertadora, que tem nesse último o seu maior expoente. Várias comunidades rurais adotaram a educação libertadora como filosofia de luta e resistência ao capitalismo e como ferramenta de http://faculdadefutura.com.br/ 12 apoio à luta pela transformação da realidade social produzida pelo mesmo. Esses movimentos foram alvo de repressão e controle ideológico pelos governos militares, após 64, e suas reformas da Educação a partir de 1968: a Reforma Universitária (Lei nº. 5.540/68), a Reforma do Ensino de 1º e 2º graus (Lei nº. 5. 692/71) que estabelecia a profissionalização do Ensino de 2.º grau e definia o ensino de 1.º grau num ciclo de oito séries. Outras medidas de política educacional arrefeceram e deram nova dimensão ao ímpeto de se ofertar a educação rural em contraposição aos movimentos de base democrática. Os mecanismos mais intensos se deram pela criação, em 1970, do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) - à época o Brasil tinha um percentual 33% de analfabetos. Com os governos militares fecha-se mais um ciclo histórico marcado pelas ações autoritárias e articulado do Estado brasileiro, associado ao capital internacional e nacional, que culminou com o desmonte da educação pública, fortaleceu a iniciativa privada, controlou ideologicamente as lutas sociais desmobilizando-as, caçou as liberdades políticas individuais e coletivas, entre outras ações nefastas à construção da educação no campo e na cidade. É nesse período que se publica o Estatuto da Terra, um instrumento para desarticular os conflitos no campo e abri-lo para a empresa capitalista no campo, numa forte aliança entre o capital internacional, a burguesia nacional, militares e intelectuais a seu serviço2. 3 A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO CAMPO A educação no meio rural, no Brasil, ainda tem muito a desenvolver. A falta de políticas educacionais voltadas para esse fim caracteriza a desvalorização do homem do campo, estabelecendo uma vida limitada aos seus filhos. São grandes as dificuldades encontradas pelas trilhas por onde passam as crianças e jovens desse meio, que procuram adquirir conhecimentos, mas também um lugar para conviver com pessoas da mesma idade, ampliando suas relações sociais. Pesquisas recentes comprovam que o insucesso nesse meio de educação atinge os 40%, além de ter 70% dos alunos em séries incompatíveis com as idades. As escolas do campo normalmente são compostas de apenas uma sala de aula, tendo que se desenvolver um trabalho de sala multisseriada, com mistura de idades e de 2 Texto Extraído de http://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/Aurora/COUTINHO.pdf http://faculdadefutura.com.br/ 13 conteúdo. Sem contar na estrutura dos prédios, muitos deles ainda de taipa, madeira, alvenaria, sem iluminação e circulação de ar adequadas, faltando carteiras e outros materiais. Falta de estrutura no transporte e nas instalações. Fonte: www.educador.brasilescola.uol.com.br Além disso, chegar à escola é um grande problema, as distâncias são quilométricas, faça chuva ou faça sol, pondo em risco a integridade física e emocional dos alunos e funcionários, além do cansaço por ter que acordar muito cedo para chegar à escola depois de horas de caminhada. Os currículos geralmente não são interessantes, não atraem os estudantes, pois fogem à realidade de suas vidas e não adianta incutir a cultura da cidade aos mesmos. Pelo contrário, esses devem ser adaptados à realidade local, valorizando aquilo que faz parte da vida dos alunos e de suas famílias. Os calendários também devem ser adaptados, pois o período de férias coincide com a colheita das safras, o que causa o afastamento de muitos alunos, que precisam ajudar seus pais. Nas faculdades, não temos formação específica em salas multisseriadas, gerando outro ponto controverso nas escolas do campo. Os profissionais que atuam dessa forma buscam alternativas por serem apaixonados pelo processo de ensinar e aprender, mas não contam com apoio das secretarias municipais, muitas vezes adquirindo materiais com recursos próprios. Por mais que o governo lance campanhas de qualificação profissional, construção de novas escolas rurais, como as escolas-núcleo, que possuem uma estrutura melhor, essas se localizam em distintas regiões rurais, ocasionando o problema do transporte, além dos ônibus velhos, sem reparos, sem cintos de segurança, e da falta de verba para o seu abastecimento; pois muitas vezes tais http://faculdadefutura.com.br/ 14 problemas não são solucionados pelo governo municipal. Vemos que os investimentos são baixos, carecendo de maior dedicação, olhares mais voltados para as verdadeiras necessidades dessa população. E por tantos problemas, não há como fugir da evasão escolar nos meios rurais. Triste realidade do Brasil! http://faculdadefutura.com.br/
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