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Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 1 1. INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO 1. Conceito de Direito Administrativo Direito administrativo é ramo do direito público, que cuida da função administrativa e das pessoas, órgãos e agentes públicos que a desempenham. A expressão administração pública pode ser tomada em dois sentidos. No sentido subjetivo, orgânico ou formal Administração Pública equivale a pessoas, órgãos e agentes públicos. No sentido objetivo, funcional ou material a administração pública equivale a função administrativa ou executiva. 2. Fontes do Direito Administrativo Por fonte do direito pode-se compreender o fundamento de validade da ordem jurídica. As fontes do direito administrativo têm sido apresentadas de forma contraditória pela doutrina. Basicamente são: 1. Lei 2. Jurisprudência 3. Princípios gerais do Direito 4. Costume 2.1 Lei A lei, como norma jurídica, deve ser entendida, em seu sentido material, como todo ato normativo imposto coativamente pelo Estado aos particulares, regrando as relações entre ambos e dos particulares entre si. A lei em acepção ampla é fonte do direito administrativo, abrangendo todos os atos normativos resultantes do poder legiferante e do poder normativo. 2.2 Jurisprudência A jurisprudência, ou a reunião organizada de decisões proferidas num mesmo sentido, inspira o direito administrativo. Diversos doutrinadores não a reconhecem como fonte do direito, entendendo-a como mera fonte imediata ou de valor moral. Mas, parece-nos acertado indicá-la como fonte, sendo marcante a sua influência em diversos institutos, tais como a responsabilidade civil do Estado, a intervenção na propriedade privada, na apuração de ilícitos funcionais e, ainda, na dosimetria da sanção disciplinar. 3.3 Princípios gerais do direito Os princípios gerais de direito, ou os postulados que dirigem toda a legislação, Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 2 apresentam-se como fonte do direito administrativo, porquanto atuam como pressupostos de todas as regras jurídicas. Os princípios aplicáveis à Administração, tanto os previstos expressa ou implicitamente na Constituição como os estabelecidos em outros atos normativos, têm tal natureza e são de observância obrigatória. 3.4 COSTUME O costume, desde que não contrário à lei e à moral, pode constituir fonte do direito administrativo, em especial porque não há codificação de todas as normas e pela impossibilidade de estas suprirem as lacunas conhecidas tão só do exercício da atividade administrativa. O costume requisita a prática reiterada, sua uniformidade, continuidade e moralidade, para ser fonte do direito, e não é diferente para o direito administrativo. Não se confunde, porém, o costume com a praxe administrativa, que vem a ser a reiterada forma de condução da máquina administrativa e o modo pelo qual atuam os agentes públicos. 4. SISTEMA ADMINISTRATIVOS OU MECANISMOS DE CONTROLE É o tipo de regime adotado pelo Estado para controle dos atos administrativos ilegais praticados pelo Poder Público. Podemos citar 02 sistemas: 1. Sistema inglês 2. Sistema francês 4.1 SISTEMA INGLÊS Também chamado de sistema judiciário, sistema de jurisdição única ou sistema de controle judicial. Todos os litígios, sejam administrativos ou de interesses privados, podem ser resolvidos pelo Judiciário. Nesse sistema, o Judiciário é o único competente para dizer o direito aplicável ao caso concreto em caráter definitivo. É o sistema adotado pelo Brasil, por disposição expressa contida na CF/88 ("a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão"). Obs.: O termo coisa julgada administrativa é a "decisão administrativa da qual não caiba mais recurso no âmbito administrativo, mas sempre será possível recorrer ao Judiciário. 4.2. SISTEMA FRANCÊS Também chamado de sistema do contencioso administrativo. Aqui, os atos da Administração Pública não podem ser conhecios pelo Judiciário. São controlados pela própria Administração por meio das cortes administrativas. Há uma dualidade de jurisdição: a administrativa e a comum. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 3 Excepcionalmente, o Judiciário pode julgar quando se tratar de atividade pública de caráter privado. II - ESTADO, GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 1. ESTADO O Estado é pessoa jurídica de direito público que atua no campo do direito público ou privado, composto por três elementos (povo, território e governo soberano), e estruturado sobre três poderes independentes e harmônicos entre si (Legislativo, Executivo e Judiciário). Até o CC/16 vigorava a teoria da dupla personalidade do Estado; quando atuava no direito público era pessoa de direito público, e quando atuava no direito privado era de direito privado. 1.1 PODERES DE ESTADO X PODERES DA ADMINISTRAÇÃO Pela tripartição de Montesquieu dos Poderes do Estado, eles são Executivo, Legislativo, Judiciário, criados para a realização de certas funções. Já os poderes da Administração são disciplinar, de polícia, regulamentar (ou normativo), hierárquico. Os Poderes de Estado integram a organização política do Estado, representando uma divisão estrutural internam visando, ao mesmo tempo, (i) à especialização no exercício das funções estatais e (ii) a impedir a concentração de todo o poder do Estado nas mãos de uma única pessoa ou órgão. Na história do constitucionalismo, a idéia inicial de uma separação rígida entre os poderes foi sendo substituída por uma separação flexível das funções estatais, possibilitando uma maior interpenetração, coordenação e harmonia entre eles, de modo que cada Poder termina exercendo, em certa medida, todas as funções do Estado: uma em caráter predominante (sua função típica) e outras de natureza acessória (denominadas atípicas). 1.2 FORMA DE ESTADO O Estado pode ser unitário ou federado (complexo ou composto). Formas de Estado Estado Unitário Estado Federado Quando tiver somente um poder político central que irradia sua competência de modo exclusivo sobre todo o território nacional e população. Marcado pela centralização política. Ex: Uruguai. Quando no mesmo território coexistirem poderes políticos distintos. Marcado pela descentralização política (convivência de entidades políticas autônomas diversas). Ex: Brasil. 1.3 AUTONOMIA Significa ter a entidade integrante da federação CAPACIDADE DE AUTO--‐ ORGANIZAÇÃO (criar seu diploma constitutivo) + AUTOGOVERNO (organizar seu governo e Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 4 eleger seus dirigentes) + AUTO--‐ADMINISTRAÇÃO (organizar seus próprios serviços). 1.4 FORMA DE ESTADO E PODERES DO ESTADO X ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A Constituição de 88 adotou a forma de Estado Federação1 (integrado por diferentes centros de poder político). A União exerce o poder político central, sendo acompanhada pelos poderes políticos regionais (Estados) e locais (Municípios). Porque não existe hierarquia entre os diversos entes federados no Brasil (sua relação é caracterizada pela coordenação tendo, cada um, autonomia política, administrativa e financeira) e a divisão entre os Poderes do Estado (Legislativo, Executivo e Judiciário) é flexível, e não rígida (realizando todos, típica ou atipicamente, a função administrativa), há Administrações Públicas autônomas em cada um dos entes da Federação, em todos os Poderes do Estado. Seja qual for o órgão que a exerça. A atividade administrativa sempre estará sujeita às regrase princípios norteadores do Direito Administrativo. 1.5 FUNÇÕES TÍPICAS E ATÍPICAS DO ESTADO Os poderes exercem função pública, o que significa exercer uma atividade em nome e no interesse de outro, no caso, o povo. Essa função pode ser típica ou atípica, conforme abaixo: a) função administrativa: objetiva realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado, que são aqueles expressos em lei, ou seja, frutos da atividade legislativa. Não inova no ordenamento jurídico. b) função legislativa: objetiva regular comportamentos, traçando o perfil dos direitos e deveres das pessoas e do Estado. A função legislativa inova no ordenamento jurídico. c) função jurisdicional: objetiva compor conflitos de interesses entre as partes. Não inova no ordenamento jurídico, é direta, abstrata e tem aplicação geral. Desta forma, cada um dos poderes rem sua função típica e suas funções atípicas. São as exceções ao princípio da separação dos poderes, baseado na teoria do check and balances: a) Judiciário: função típica é jurisdicional, mas pode exercer função atípica, como a elaboração dos regimentos internos (função legislativa); b) Legislativo: sua função típica é legislativa, mas em determinados casos pode julgar o Presidente da República (função jurisdicional) c) Executivo: função típica é administrativa, mas pode editar medidas provisórias (função legislativa). 2. GOVERNO É a FUNÇÃO POLÍTICA de direção, comando e de fixação de planos e diretrizes de atuação do Estado (denominadas políticas públicas). Representa uma atividade política de Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 5 índole/natureza discricionária. Para que o Estado seja independente, é preciso que o Governo seja soberano. ATENÇÃO: A noção de governo não se confunde com a Administração Pública (que é a execução do governo, ou seja, o aparelhamento de que dispõe o Estado para a execução das políticas públicas de governo). • Soberania: significa INDEPENDÊNCIA/AUTONOMIA na ordem internacional + SUPREMACIA na ordem interna. O governo brasileiro é soberano porque é independente externamente e supremo internamente. • Forma de Governo: é o modo como se dá a instituição e a transmissão do poder na Sociedade. Formas de Governo República Monarquia Caracteriza--‐se pela eletividade e pela temporalidade dos mandatos. Responsabilidade do governante (dever de prestar contas). Caracteriza-‐se pela hereditariedade e vitaliciedade do mandato. Irresponsabilidade do monarca (ausência de prestação de contas). • Sistema de Governo: é o modo como se dá a relação entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo no exercício das funções governamentais. A depender da maior ou menor colaboração entre eles, teremos os sistemas de governo presidencialista ou parlamentarista. Sistemas de Governo Presidencialista Parlamentarista Predomina o princípio da divisão de Poderes (devem ser independentes e harmônicos entre si). O Presidente acumula as funções de Chefe de Estado e de Chefe de Governo. O Presidente cumpre mandato fixo, independente da confiança do Poder Legislativo. Ex: Brasil Predomina a colaboração entre os Poderes Legislativo e Executivo. O Presidente/Monarca é Chefe de Estado. O Primeiro Ministro ou o Conselho de Ministros atuam como Chefe de Governo. Os membros do governo não possuem mandato ou investidura por prazo certo, mas sim investidura de confiança: O Primeiro Ministro é indicado pelo Presidente e sua permanência na função de Chefe de Estado depende da confiança do Parlamento. Da mesma forma, se o Parlamento perder a confiança do povo, o Primeiro Ministro pode dissolvê-‐lo e convocar eleições extraordinárias para a formação de outro Parlamento que lhe dê sustentação. Ex. Inglaterra. 3. ADMINISTRAÇÃO A Administração pode ser conceituada sob 02 ópticas: Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 6 a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico - é o conjunto de pessoas físicas ou jurídicas incumbidas da realização das funções administrativas. Grafada em maiúsculo. b) em sentido material, objetivo ou funcional - o conceito de administração leva em conta a natureza da atividade exercida (função administrativa). Grafada e minúsculo. 4. FUNÇÃO ADMINISTRATIVA OU ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM SENTIDO FUNCIONAL Apresenta as seguintes características: a) atividade direta: independe de provocação. b) atividade concreta: porque se aplica a lei ao caso concreto (ao contrário da função legislativa, que em regra é abstrata). Excepcionalmente, pode existir ato administrativo praticado com obediência direta à Constituição Federal, ex. art. 84, inciso VI, alínea “b” da CF. c) atividade não inovadora inicialmente no mundo jurídico: porque só a lei é quem inova inicialmente a ordem jurídica nos termos do que estabelece o art. 5º, inciso II da CF. d) atividade parcial: porque o Estado-Administração é parte nas relações jurídicas que aprecia, ou seja, ele exerce a função administrativa como parte interessada. e) atividade subordinada: a controle de legalidade, exercido notadamente pelo Poder Judiciário. O art. 5º, inciso XXXV da CF, dispõe que a lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito, de modo que os atos administrativos eventualmente ilegais também podem ser submetidos a controle de legalidade pelo judiciário, o qual atua se invocado. Vige no Brasil o sistema da jurisdição única, ou inglês, onde só o poder judiciário decide com força de coisa julgada. Não vigora o sistema francês ou do contencioso administrativo em que existem tribunais administrativos para decidir as questões envolvendo a administração pública. f) atividade sujeita a um regime jurídico de direito público: o qual é formado pelo binômio ou bipolaridade das prerrogativas e restrições (ou sujeições). As prerrogativas conferem autoridade à administração pública para que ela possa dar atendimento ao interesse público, isso decorre do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular. As restrições visam a assegurar a liberdade dos administrados, impedindo que a administração ofenda indevidamente a esfera jurídica do administrado. A principal sujeição é ao princípio da legalidade. g) atividade exercida de ofício: ou seja, não depende de provocação da parte interessada. Obs.1: Diogo de Figueiredo Moreira afirma que as funções enquadradas como ATIVIDADES-FIM da administração, por atenderem a interesses públicos primários, em direto benefício dos administrados, configuram a administração pública EXTERNA ou EXTROVERSA. Jás as funções classificicadas como ATIVIDADES-MEIO, or atenderem interesse público de maneira apenas mediata e, de maneira imediata, satisfizerem os interesses institucionais da Administração, concernentes ao seu pessoal, bens, serviços, Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 7 configuram a administração pública INTERNA ou INTROVERSA. Obs. 2: A função administrativa abrange o fomento, a polícia administrativa, o serviço público e, para alguns, a intervenção: a) Fomento Fomento é o incentivo às atividades privadas de interesse coletivo e, pode se dar de várias maneiras através de financiamentos, como por exemplo, para aquisição de casa popular, de favores fiscais, como por exemplo, isenção de impostos sobre produtos da cesta básica, através de transferência de recursos públicos, como ocorre com as organizações sociais etc. Aliás, no relacionamento com as organizações não governamentais o estado faz uso da atividade de fomento. b) Polícia Administrativa A polícia administrativacorresponde ao exercício do poder de polícia pelo executivo, ora regulamentando as leis que impõem restrições (ou limitações) administrativas à liberdade e à propriedade, ora expedindo atos administrativos concretos para evitar danos ao interesse público (ex. licenças, autorizações), ora expedindo atos administrativos concretos para fazer cessar o dano ao interesse público (ex. embargos de obra, interdições de atividade, composição de multa etc.). c) Serviço Público Serviço público “é toda atividade que a Administração Pública executa direta ou indiretamente, para satisfazer a necessidade coletiva, sob regime jurídico predominantemente público” (Maria Sylvia Zanella di Pietro). d) Intervenção na Ordem Econômica A intervenção na ordem econômica pode se dar direta ou indiretamente. O estado intervém diretamente na ordem econômica quando exerce atividade típica de particular, e nesse caso ele o faz mediante empresa pública ou sociedade de economia mista. Esta intervenção é excepcional, porque o estado só pode assim agir nos termos dos artigos 173 e 177 da CF. No caso do art. 173 da CF a intervenção se dá em regime de competição com os particulares, é o caso dos bancos, ex. Banco do Brasil (sociedade de economia mista) e a CEF (empresa pública), ambos federais. Na hipótese do art. 177 da CF a intervenção se dá em regime de monopólio, como é o caso da indústria de petróleo. No entanto, alguns autores entendem que a intervenção direta não é função administrativa, porque essa intervenção se submete a um regime jurídico híbrido, aplicando-se o direito privado com derrogações por normas de direito público. Então a função é denominada de função da administração. A intervenção indireta, por sua vez, diz respeito à regulamentação e fiscalização da atividade econômica de natureza privada, que é na verdade polícia administrativa já mencionada anteriormente. 4. FUNÇÃO DE GOVERNO / FUNÇÃO POLÍTICA (CABM) Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 8 Segundo Celso Antônio Bandeira de Melo, alguns atos não se enquadram nas funções clássicas do Estado (de legislar, administrar ou julgar), mas em uma quarta função do Estado, denominada FUNÇÃO POLÍTICA ou FUNÇÃO DE GOVERNO. Ex.: veto administrativo, decretação de guerra, celebração de paz, estado de defesa e estado de sítio (fogem das atividades do dia‐a-dia). A função de governo, de cunho político, traduz a atividade de elaboração de políticas públicas, de determinação das diretrizes de atuação da Administração Pública, e não a mera execução dessas diretrizes e políticas. A função política de governo não constitui objeto de estudo do direito administrativo. O autor destaca que tais atividades diferem da função executiva sob o ponto de vista material (pois fogem da gestão rotineira dos assuntos da sociedade), bem como sob o ponto de vista formal (por não estarem em pauta comportamentos infralegais ou infraconstitucionais expedidos na intimidade de uma relação hierárquica, suscetíveis de revisão quanto à legitimidade). A função administrativa não se confunde com função política, porque está sujeita a regras jurídicas superiores, enquanto a função política não apresenta subordinação jurídica direta. QUESTÃO: Quando um Presidente da República sanciona ou veta um projeto de Lei, que função ele está realizando? Função de governo. Segundo Dirley da Cunha, as funções de governo são aquelas que se relacionam com a superior gestão da vida política do Estado e indispensáveis à sua própria existência. 5. EVOLUÇÃO DO MODELO DE ADMINISTRAÇÃO Modelo Patrimonialista => Modelo Burocrático => Modelo Gerencialista (Império - 1º Gov. GV) (1º Gov. GV - 1998) (1998 - hoje) O primeiro modelo de administração era o modelo patrimonialista, que no mundo vigorou até o século XVIII, e no Brasil se estendeu do período do Império até o 1º Governo Getúlio Vargas. Em seguida, foi adotado o modelo burocrático, que veio substituir o patrimonialista. No mundo vigorou entre os séculos XIX e XX, e no Brasil vigorou do 1º Governo Getúlio Vargas até 1998. Atualmente, vigora o modelo gerencialista, que veio aprimorar o modelo burocrático. No mundo começou em 1978, vigorando até hoje, e no Brasil foi em tese iniciado em 1998. 5.1 MODELO PATRIMONIALISTA No período do absolutismo europeu, a "coisa pública" pertencia ao soberano. Neste modelo, "interesse público" era a vontade do soberano. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 9 A estrutura administrativa de poder é inteiramente voltada para atender o soberano (o poder não é voltado para o povo, não havendo condição jurídica para instituir um órgão que consumirá recursos públicos, voltado ao atendimento exclusivo da população carente - ex: Defensoria Pública). São características que identificam um modelo patrimonialista: a) nepostismo - os cargos e empregos públicos são preenchidos conforme a vontade do soberano, reservando os mais importantes para parentes e familiares. b) gerentologia - é a perpetuação do soberano no poder, criando as dinastias. c) fisiologismo - o Estado só contrata aquele que oferece a melhor vantagem pessoal para o soberano. d) clientelismo - o Estado contrata sempre os mesmos, que pertencem ao círculo de relacionamento do soberano. Ex: pena de inidoneidade à empresa que frauda licitação. 5.2 MODELO BUROCRÁTICO No modelo burocrático, a "coisa pública" passa para o domínio do Estado. "Interesse público" passa a ser as necessidades do Estado. A estrutura administrativa de poder não é voltada para o povo, é voltada para o próprio Estado ("o Estado justifica a si próprio", segundo Seabra Fagundes). Toda a administração passa a ser regida por lei: é a introdução do princípio da estrita legalidade, buscando com isso extinguir o patrimonialismo: a) para preencher cargo precisa de concurso (fim do nepotismo) b) para governar precisa de eleição (fim da gerontocracia) c) para contratar precisa de licitação (fim do fisiologismo e clientelismo) São características de uma gestão burocrática: a) inchaço da máquina pública; b) o modelo orçamentário é um modelo de concentração, cobrando tributos dos contribuintes apenas para sustentar o seu funcionamento; c) é uma administração lenta, cara e ineficiente. Obs 1: Caiu em concurso para dissertar sobre os pontos positivos deste modelo: limitou o poder, instituiu o controle sbre a administração e legalizou o exercício do poder e o funcionamento da máquina pública. Obs 2: No modelo burocrático ainda não faz sentido a criação da Defensoria Pública, pois esse modelo atende as necessidades do Estado. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 10 5.3 MODELO GERENCIALISTA A partir do governo britânico de Margareth Tacher, foi instituído o New Public Management (1978), transferindo a "coisa pública" para o domínio do "povo". O interesse público passa a ser necessidades e interesses do povo e toda a estrutura de poder é voltada para o povo, pois é apenas gestora da coisa pública em nome do povo. Principais características: a) o Estado deve ser mínimo, privatizando tudo aquilo que não seja essencial; b) o orçamento passa a ser distribuído, cobrando impostos de quem tem mais recursos, para investir em fruições e serviços públicos, para aqueles que têm menos recursos. c) é um modelo dinâmico, participativo e eficiente (a eficiência é medida pela satisfação do usuário). GERENCIALISMO NO BRASIL: 1995: Iniciado o Programa Nacional de Desburocratização, que deu origem ao Ministério Administrativo do Estado e os trabalhos desse ministériolevaram à edição da EC 19/98, chamada de Emenda da Reforma Administrativa. Foram realizadas as privatizações possíveis, a redução do número de órgãos e o corte em massa dos agentes públicos não concursados, buscando um Estado Mínimo. A EC 19/98 também tornou a eficiência um princípio expresso dirigente de toda a administração. No modelo gerencialista, passa a ser possível a criação da Defensoria Pública, que é um órgão da administração direta, exclusivamente voltado para a população carente, contra o próprio Estado. III - REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO 1. BREVE CONCEITO É um determinado conjunto de normas e princípios, que irão reger com exclusividade uma determinada relação jurídica, afastando a incidência de outras normas e princípios. O ordenamento jurídico é dividido em 02 grandes regimes: a) Regime privado São as normas e princípios comus que irão reger relações jurídicas que envolvam interesses privados - como são interesses disponíveis, impera neste regime a autonomia da vontade. O regime privado é o conjunto de normas e princípios empregados no atendimento de Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 11 interesses privados. Como estes interesses são, em regra, disponíveis, podem ser renunciados, conforme a autonomia da vontade. Assim, não há exigência de prévia autorização legal. Atenção: Na CF/88, a exploração da atividade econômica é sempre através de regime privado, ainda que explorada pelo Estado. Ainda, segundo a CF, no capítilo de Direito Econômico (que é dirigente), compete ao Estado empregar medidas de combate ao abuso de poder econômico, que provoquem concorrência desleal. Desta forma, para empresas públicas e sociedade de economia mista, que são empresas estatais que em regra exploram atividade econômica em nome do Estado, a incidência do regime privado prepondera no seu funcionamento e atuação. A CF/88 expressamente proíbe que o Estado abuse do seu poder econômico, conferindo (i) vantagens fiscais, (ii) vantagens trabalhistas e (iii) vantagens obrigacionais às suas estatais. Desta forma, empresas públicas e sociedade de economia mista de atividade econômica são preponderantemente de direito privado. Já os elementos de controle e gestão que não implicam em concorrência desleal recaem sobre estas empresas estatais, que são obrigadas a licitar, a fazer concurso e prestar contas ao tribunal de contas (que são normas de regime público, incidindo sobre estas estatais. Desta forma, para parte da doutrina, as estatais de atividade econômica estão sempre sujeitas a um regime misto ou temperado, onde prepondera o privado. Já as empresas estatais exploradoras de serviços públicos (ex: correios) se submetem a regras distintas: como, em regra, serviço público é aquele instituído por lei, sem fins lucrativos e com competência exclusiva do Estado, não há concorrência do mercado, afastando, assim, as restrições impostas pela CF/88. O Estado pode conferir vantagens fiscais e previdenciárias, "trabalhistas" e patrimoniais / obrigacionais às suas estatais de serviços públicos (o STF confirmou recentemente que os correios podem gozar de imunidades e isenções fiscais, regime trabalhista diferenciado, impenhorabilidade patrimonial e até a possibilidade de ser executada através do regime de precatórios); portanto, as estatais de serviços públicos são de regime misto ou temperado, onde prepondera o regime público (porque tem cara de autarquia). b) Regime público São normas e princípios constitucionais que irão reger relações que envolvam interesses públicos - como interesses públicos são indisponíveis, impera nesse regime a obrigatoriedade do cumprimento da lei. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 12 O regime público é o conjunto de normas e princípios empregados no atendimento do interesse público, que por serem em regra indisponíveis não se sujeitam à autonomia da vontade, mas sim à obrigatoriedade do cumprimento da lei (é a obrigatória a prévia autorização legal, para a prática de atos envolvendo estes interesses). Direito Privado Direito Público Interesses privados (disponíveis) Interesses públicos (indisponíveis) Renunciáveis e transmissíveis (pela autonomia da vontade) Obrigatoriedade do cumprimento ds lei (substituindo a autonomia da vontade) Lei como regência mínima (não preciso de autorização legal) Prévia autorização da lei Exemplos: sociedade de economia mista e empresa pública Ex: administração direta, autarquias e fundações públicas 2. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO É o conjunto de normas e princípios especiais empregados no atendimento do interesse público, conferindo à administração maiores poderes de agir (prerogativas) e maiores deveres de agir (sujeições). Para CABM, esse regime deve ser aplicado exclusivamente quando a administração estiver atuando em prol do interesse público primário (interesse da coletividade). Assim, regime administrativo é o conjunto de prerrogativas e sujeições que incidem sobre a administração de direito público, empregados no atendimento dos interesses primários. Para parte da doutrina, as prerrogativas e sujeições encontram-se instrumentalizadas nos princípios administrativos (os princípios são ferramentas) e são materializados (concretizados) através do exercício dos poderes administrativos instituídos por lei (doutrina italiana). 2.1 DIFERENÇA PARA OUTROS RAMOS DO DIREITO Por que as regras do Direito Administrativo são diferentes dos outros ramos? A única finalidade que o Poder Público pode perseguir quando atua é a preservação dos interesses da coletividade (interesse público primário). A Administração Pública nunca atua em nome próprio, mas sempre para preservar interesses de terceiros. Quem são esses terceiros? A coletividade. De outro lado, o particular atua em nome próprio, representando interesses privados e com o seu patrimônio. Onde está positivado na CF que o Poder Público deve perseguir o interesse público? Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 13 Está no art. 1º, CF. CF, art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos (...) A expressão que interessa é “República” (coisa pública). Quem é o titular do poder dessa República? Todo o poder emana do POVO que o exerce através de representantes eleitos (democracia representativa) ou de forma direta (sufrágio, voto, plebiscito, referendo e iniciativa popular – art. 14, CF). CF, art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular. Assim, o administrador público deve preservar o interesse da coletividade, gerenciando o poder do titular de forma temporária. 2.2 REFLEXOS Toda vez que o Poder Público se afastar dessa finalidade única (interesse público primário), caracteriza DESVIO DE FINALIDADE, que é forma de ilegalidade, passível de apreciação pelo Poder Judiciário (finalidade é requisito de validade do ato administrativo). O Judiciário, em homenagem ao princípio da separação dos poderes, somente pode fazer CONTROLE DE LEGALIDADE. Para preservar os interesses da coletividade (interesse público primário), a Administração recebe do ordenamento jurídico PRERROGATIVAS e OBRIGAÇÕES que não se estendem aos particulares. Desse modo, a Administração, a fim de preservar os interesses da coletividade pode tomar medidaspara sacrificar direitos dos cidadãos, ainda que estes estejam na legalidade – incide, portanto, o princípio da supremacia do interesse público sobre o do particular. Nessa situação, não se legitima o Judiciário interferir, pois não há nenhuma ilegalidade. Ex.: desapropriação. Havendo desapropriação com desvio de finalidade, todavia, há ilegalidade, circunstância que legitima o Poder Judiciário apreciar. 2.3 OBRIGAÇÕES a) necessidade de abertura de CONCURSO PÚBLICO para nomeação de pessoas (art. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 14 37, II, CF). b) TETO de remuneração (art. 37, XI, CF) Há uma exceção legal a esta regra: estabelece o art. 37, §9º, CF que empresas públicas (EP) e sociedades de economia mista (SEM), se forem autossuficientes, podem pagar aos seus servidores teto acima do previsto constitucionalmente, uma vez que não dependem de verba orçamentária pública para pagamento de pessoal. Ex.: Banco do Brasil e Petrobrás. CF, art. 37,§ 9º O disposto no inciso XI aplica-se às empresas públicas e às sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que receberem recursos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral c) contratações precedidas de LICITAÇÃO (art. 37, XXI, CF) CF, art. 37, XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. 2.4 PRERROGATIVAS (VANTAGENS) a) atos administrativos – são dotados de atributos para fins de preservação do interesse público (ex.: presunção de legitimidade, imperatividade, autoexecutoriedade). O que significa presunção de legitimidade? Até prova em contrário, os atos administrativos são legítimos (presunção juris tantum). Por outro lado, a imperatividade significa que os atos editados não são meros conselhos de cumprimento facultativo, mas de cumprimento obrigatório, sob pena de sanção. Quanto à autoexecutoriedade, a Administração pode executar de per si seus próprios atos, ou seja, NÃO depende de concordância do Poder Judiciário, nem do indivíduo atingido pelo ato. Ex.: fiscal da prefeitura constata irregularidade na danceteria e lavra auto de infração. b) contratos administrativos – quando os particulares celebram contrato, quem elabora as cláusulas? São as partes envolvidas. Nos contratos administrativos, contudo, quem elabora de forma sozinha as clausulas é a Administração, de forma unilateral (cláusulas exorbitantes: são cláusulas que conferem prerrogativas para a Administração a fim de preservar o interesse público). Nos contratos administrativos, as partes NÃO estão em igualdade, uma vez que a Administração se encontra em patamar privilegiado em razão de prerrogativas. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 15 c) rescisão por razões de interesse público – rescisão de forma unilateral, ainda que o contratado não tenha feito nada de irregular. 3. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS IMPLÍCITOS 3.1 PRINCÍPO DA SEGURANÇA JURÍDICA É um dever da administração preservar relações jurídicas ou efeitos concretos favoráveis aos particulares, desde que a lei nçai preveja o contrário (hoje é corrente majoritária que a administração tem o dever de convalidar atos e decisões administrativas relevantes para a segurança jurídica - na corrente clássica, convalidar, ou não, era discricionário). Questão: Convalidar um ato ou decisão é discricionário ou é um dever? Resposta: Depende; se for relevante para a segurança jurídica é um dever; se não for é discricionário. Teoria do fato consumado (jurisprudencial): esta teoria jurisprudencial aponta nos atos viciados onde não seja possível convalidar (ex: a lei prevê que aquele vício que gera nulidade absoluta), onde os efeitos deste ato sejam relevantes para a segurança jurídica, é possível anular o ato mas preservar seus efeitos (é uma verdadeira nulidade ex tunc; é a mesma lógica da modulação dos efeitos que o STF emprega no controle de constitucionalidade). Na instância administrativa, através desta teoria, vem sendo permitido em casos extraordinários "deixar de anular o ato ilegal", quando a sua retirada prejudicar a segurança jurídica (o ato viciado é mantido até que outro o substitua). 3.2 PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO Hoje, entende-se que todos os atos e decisões da adminstração devem ser motivados, ainda que de forma sucinta. Excepcionalmente, não dependem de motivação: 1) atos de mero expediente (o superior manda o subordinado arquivar documentos) 2) atos e decisões "ad nutum" (são aqueles onde a lei que os prevê admite a decretação independentemente de motivação). Mas o administrador pode espontaneamente motivar e, caso o faça, a validade do ato passará a depender da veracidade e existência dos fundamentos alegados, conforme a teoria dos motivos determinantes. 3) atos de impossível motivação (ex: sinais de trânsito) Motivação aliunde: é uma espécie de motivação sucinta, admitida na instância administrativa, exceto quando a lei exigir a motivação completa. O ato ou decisão aliunde adota como sua a motivação de outro ato ou decisão ao qual faz expressa referência (ex: na decisão do superior, ele motiva assim: "adoto o Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 16 relatório em seus fundamentos para decidir"). Para parte da doutrina, há uma transcendência dos motivos do ato (os motivos de um ato transcendem para o outro). 3.3 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO Trata-se de princípio constitucional implícito porque não está mencionado expressamente no art. 37, caput, da CF/881. Todavia, na Constituição Paulista, é princípio expresso no art. 111. O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular pode ser encarado sob dois aspectos. Pelo primeiro aspecto significa que ele se dirige ao legislador e ao administrador, impondo que na elaboração e na aplicação da lei, respectivamente, leve em conta o interesse público. Pelo segundo aspecto significa que no conflito do interesse público com o interesse particular, prevalece o interesse público. Exemplo: art. 5º, XXII a XIV, da CF/88. A doutrina cita o princípio da indisponibilidade do interesse público como sendo decorrente do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. Assim, por exemplo, não pode deixar de apurar infração cometida por subordinado, não pode deixar de agir do exercício do poder de polícia, etc. Como regra geral, quando interesse privado colidir com interesse público, o público prevalecerá. Com este fundamento, a administração emprega poder de polícia, condicionando ou reduzindo o exercício de direitos individuais, para garantir finalisticamente a supremacia de determinados interesses públicos. Teoria da convivência das liberdades públicas (Ada Pelegrini Grinover): também conhecida como teoria da relativização dos direitos (Lenza, A. Moares), defende que, no Brasil, não existe direito absoluto. Otto Bahoff (ALE), no livro "normas constitucionais inconstitucionais?" trata das gerações de direito, concluindo que os direitos fundamentais são suprapositivos, ou seja, se sobrepõem a qualquer lei escrita. Questão: O interesse público sempre prevalece? Resposta: Não. Para parte da doutrina,conforme o neoconstitucionalismo, os direitos fundamentais, ainda que individuais, se sobrepõem a qualquer norma escrita (são suprapositivos) e, portanto, se soprepõem até mesmo a interesses públicos comuns. 3.4 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO Para parte da doutrina (CABM), o interesse público está dividido em 02 níveis: a. interesses públicos primários Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 17 São aqueles interesses da coletividade em geral, em regra, difusos e coletivos. Estes são indisponíveis e o não atendimento por parte do administrador, em regra, implica em crime de responsabilidade e, no caso do agente público, pode implicar em improbidade (pois competências administrativas de atendimento a interesses primários são irrenunciáveis, como por exemplo, educação, saúde e segurança). b. interesses públicos secundários Estes são interesses da administração, em regra, instrumentais ou operacionais, utilizados para que a administração possa atender aos interesses primários (são considerados como interesses privados da administração, como por exemplo, alugual de imóveis pela administração, contratação de luz, telefone, compra de bens de consumo). Estes interesses podem ser disponíveis e a administração pode renunciá-los ou transigí-los, desde que para melhor atender os interesses primários (ex: o procurador do município pode fazer acordo numa ação de cobrança, por exemplo). Obs: Sobre estes interesses admite-se juízo arbitral (lei 11.079/01 - Lei das PPP's). 3.5 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE É o juízo de adequação e valoração. Conforme a teoria do devido processo legal substantivo, um ato ou decisão administrativo é discricionário pela presença de um elemento normativo de conteúdo jurídico indefinido, que deverá ser preenchido pelo administrador no momento do exercício do ato, conforme critérios de oportunidade e conveniência. O preenchimento do elemento normativo indefinido deve ser em regra motivado, através de fatos e circunstâncias escolhidos pelo administrador, que deverão ser adequados e de valor jurídico correspondente à lei que prevê aquele ato ou decisão. Quando o mérito de um ato ou decisão discricionário estiver baseado em fatos ou circunstâncias não adequadas a esta intenção da lei, será um mérito violando os limites da lei. Logo, ato e decisão discricionário que viola a proporcionalidade e razoabilidade é ilegal no fundamento de seu mérito, permitindo o seu controle pelo judiciário. Através desta teoria, o judiciário aprecia os elementos constitutivos do mérito discricionário, podendo anular o ato quando não razoável ou proporcional. Razoabilidade e proporcionalidade integram a legalidade. 4. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EXPLÍCITOS 4.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (art. 5º, II, CF) CF, art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 18 qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Segundo Helly Lopes Meirelles: “Enquanto que na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na administração pública só é permitido fazer o que a lei autoriza” (vide explicação quanto ao princípio da autonomia da vontade no direito privado e a ideia de função no direito público). A legalidade para os particulares significa que poderão fazer tudo o que a lei não proíbe (há uma relação de não contradição entre particulares e lei). Basta que não exista lei proibindo o comportamento. Será esse o mesmo perfil em relação à Administração? Não. Como ela sempre atua preservando os interesses da coletividade, a Administração só poderá fazer o que a lei expressamente determina. Para o particular editar o ato não precisa de lei, desde que não haja estipulação em contrário. Ao passo que a Administração para editar atos precisa de lei que a autorize (relação de subordinação em relação à lei – assim, a atividade administrativa é sub legem). Essa relação de subordinação entre Administração e lei, quanto à hierarquia, evidencia que os atos da administração são atos infralegais, em razão da necessidade de lei. Na eventualidade dos atos serem editados sem lei preexistente que os fundamente, esses atos serão ilegais e, portanto, passíveis de apreciação do Poder Judiciário (controle de legalidade dos atos da Administração). Obs.: ingresso na estrutura da Administração mediante concurso na forma da lei (art. 37, II, CF) CF, art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; A administração só pode estipular exigência mediante anterior previsão em lei. O Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 19 concurso público é inaugurado com a instauração de edital (lei interna), que estabelece as regras que devem ser cumpridas pelos candidatos e pela Administração Pública. O edital não pode criar nada que não esteja anteriormente previsto em lei, sob pena de ilegalidade. Desde 2004, com a promulgação da EC 45, passou-se a exigir um requisito: tempo de atividade jurídica (3 anos). Essa introdução adveio para as carreiras de Magistratura e MP. Significa que as demais carreiras (ex.: defensoria) podem exigir essa condição, mas desde que tenha previsão em lei (lei esta que disciplina a carreira). Excluindo Magistratura e MP, qualquer outro concurso deve observar a exigência na lei orgânica da carreira. O art. 5°, XIII, CF aduz que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas às qualificações profissionais previstas em lei (instrumento hábil é a lei). Ex.: guarda civil de SP (índice de gordura corporal). Esta exigência era prevista em lei? Não e, portanto, ilegal. É legítimo exigir que o candidato seja submetido à AVALIAÇÃO PSICOTÉCNICA? Sobre esse tema, o STF editou a Súmula 686 que admite teste psicotécnico, desde que tenha expressa previsão em lei. Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público (Súmula 686, STF). 4.2 PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE Pode ser encarado sob dois aspectos: em relação aos administrados e em relação à administração. Pelo primeiro aspecto, ou seja, em relação aos administrados, a impessoalidade significa que o ato deve ser praticado para atender ao interesse público e não para deliberadamente prejudicar ou favorecer alguém, o que ocorreria, por exemplo, se a desapropriação fosse determinada para prejudicar um inimigo político da autoridade. Sob esse enfoque, o princípio da impessoalidade confunde-se com o princípio da finalidade pública. Pelo segundo aspecto, isto é, em relação a administração, a impessoalidade significa que os atos administrativos praticados pelos agentes públicos são imputados, em última análise, ao Estado. Trata-se da aplicação da teoria do órgão (o agente quando age, quem está agindo é o órgão e em última análise oEstado). A administração está proibida de estabelecer discriminações gratuitas, mas apenas aquelas que se justifiquem para a preservação dos interesses da coletividade. Atenção: a administração PODE estabelecer discriminações. O único tipo de discriminação legítimo é aquele que se dirige à preservação dos interesses da coletividade. Mas o que significa discriminar? É tratar alguém de forma diferente das demais. E quando se trata alguém de forma diferente das demais? Quando se prejudica ou se privilegia. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 20 Portanto, a Administração não pode prejudicar ou privilegiar alguém de forma gratuita, salvo se para preservação dos interesses da coletividade. Ex1.: impessoalidade para contratar pessoas: a regra é a abertura de concurso. Ex2.: impessoalidade para contratar serviços (art. 37, XXI, CF): a regra é a abertura de licitação. CF, art. 37, XXI. ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. Ex3.: impessoalidade na propaganda dos atos de governo (envolve impessoalidade e publicidade): veda-se na propaganda a identificação de nomes, imagens e símbolos que representem promoção pessoal do administrador, sob de pena de inconstitucionalidade. CF, art. 37, §1º - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. Ex4.: impessoalidade no pagamento de dívidas: as dívidas da Fazenda Pública são pagas através de precatórios, que devem obedecer a ordem cronológica de sua apresentação. Precatórios são títulos emitidos pelo poder judiciário após o trânsito em julgado de sentença que legitimam os créditos da administração. 4.3 PRINCÍPIO DA MORALIDADE Distinguir a moral do direito não é assunto novo e não é fácil. Normalmente se diz que agir de acordo com a moralidade é agir conforme a ética, a boa-fé e a honestidade. E isso também deve ser feito pela autoridade administrativa em sua atuação. A partir do instante que moralidade se apresenta de forma constitucional, podemos concluir que atos imorais são atos inconstitucionais, passíveis de apreciação pelo Poder Judiciário. O princípio que comanda a atividade do Poder Público é a moralidade administrativa, ou seja, não é a mesma moralidade na vida privada, pois esta se destina a interesses pessoais. Ex.: particular que contrata familiares para sua empresa (não há imoralidade). Administrador público contrata seus familiares (ato imoral, pois a regra é do concurso). A moralidade é intimamente relacionada à preservação do interesse público. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 21 Com efeito, existe uma espécie de imoralidade qualificada designada IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. O que significa improbidade administrativa? Improbidade é sinônimo de desonestidade administrativa. 4.4 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE A Administração está obrigada a manter TRANSPARÊNCIA em relação a todos seus atos e a todas as informações armazenadas em seus bancos de dados. De forma a fortalecer esse princípio, a CF prescreveu no art. 5º, XXXIII, que todos têm o direito de obter dos órgãos públicos informações de interesse particular, coletivo ou geral, no prazo da lei, sob pena de responsabilidade. XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; No final do inciso XXXIII, estabelece-se que a publicidade será ampla, salvo para as informações sigilosas: aquelas que possam comprometer a soberania do Estado e da sociedade. Ex.: informações sobre policiamento das fronteiras (comprometendo a soberania do Estado). No final de 2011, adveio a Lei 12.517 (lei de acesso às informações públicas). Nesta lei, os art. 10 e 11 estabelecem, respectivamente, que qualquer interessado pode requerer informações, bem como o prazo de acesso deve ser imediato, sob pena de responsabilização. Mas, se a informação for de difícil acesso, o prazo será de, no máximo, 20 dias, prorrogável uma única vez. Se a informação solicitada for indevidamente negada pela Administração, a garantia constitucional a ser utilizada dependerá da natureza da informação solicitada: a) se a informação é personalíssima: habeas data (art. 5º, LXXII, CF) b) se a informação for de interesse particular, coletivo ou geral: mandado de segurança. Ex.: informação solicitada ao DETRAN Ex.: aquisição de imóvel (certidão) - plano de desapropriação Dentro da CF, qual dispositivo pode ser elencado? O art. 5º, LXIX estabelece que se concederá mandado de segurança (caráter residual) para proteger direito líquido e certo NÃO amparado por habeas corpus (liberdade de locomoção) ou habeas data (informação de caráter personalíssimo). LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 22 Como a administração nos representa, os atos que ela edita devem ser caracterizados por um amplo acesso, não podendo aparecer nomes, imagens e símbolos do administrador (a propaganda deve ser impessoal). CF, art. 37, § 1º - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. 4.5 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA Este princípio foi acrescentado ao rol do art. 37, caput, pela EC 19/98. Antes dessa EC era princípio implícito da CF/88, podendo ser mencionado o art. 74, II, da CF/88 como exemplo dessa afirmação. A eficiência impõe a otimização de recursos humanos, patrimoniais, tecnológicos, financeiros, etc., para que sejam atingidos maiores resultados em prol do interesse público. A eficiência deve ser buscada na estruturação dos órgãos públicos, na formação dos agentes públicos. Assim, por exemplo, o art. 39, § 2º, da CF/88, que impõe à União, aos Estados, ao DF que mantenham escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, é inspirado no princípio da eficiência. Também em nome da eficiência que ocorre a descentralização dos serviços públicos, que o Estado fomenta as atividades de organizações não governamentais, etc. A Administração Pública está obrigada a manter ou ampliar a QUALIDADE de seus serviços com controle de gastos. Portanto, atos ineficientes passaram a ser sinônimos de atos inconstitucionais, passíveis de controle judicial. Vejamos os exemplos que retratam eficiência: Ex1.: eficiência na contratação de pessoas por meio de concurso, visando selecionar candidatos mais eficientes para os cargos. Ex2.: eficiência na contratação deserviços, porque a Administração é obrigada a abrir licitação (art. 37, XXI, CF). XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações Ex3.: eficiência no pagamento de dívidas. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 23 Ex4.: na fixação de teto de remuneração para a Administração (art. 37, XI, CF). IV - ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO 1. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONCEITOS. Podemos conceituar a Administração Pública de diversas formas: a) sentido formal, subjetivo ou orgânico: refere-se ao próprio Estado, conjunto de órgãos e entidades incumbidos da realização da atividade administrativa, com vistas a atingir os fins do Estado. Envolve pessoas e órgãos dos três poderes. b) sentido material, objetivo ou funcional: representa o exercício da atividade administrativa, exercida por intermédio de seus órgãos e entes, ou seja, é o Estado administrando. Administração Pública (em maiúsculo) é o Estado; enquanto administração pública (em minúsculo) é a atividade administrativa do Estado. 2. ADMINISTRAÇÃO DIRETA É considerado como administração direta todo conjunto de órgãos estatais (dos 3 poderes). 2.1 CONCEITO DE ÓRGÃO Órgãos públicos são feixes de atribuição, centros de competência instituídos por lei para o exercício de determinadas funções públicas por meio dos agentes públicos cuja atuação é imputada a pessoa jurídica a quem pertencem. Órgãos públicos são entes despersonalizados, embora pertençam a pessoa jurídica da administração pública. É por isso que ordinariamente órgão público não figura em juízo, quem o faz é a pessoa jurídica. Todavia, alguns órgãos públicos têm capacidade processual e podem figurar em juízo na defesa de prerrogativas institucionais. Só os órgãos independentes e autônomos é que podem fazer. Exemplo: a câmara de vereadores que impetra mandado de segurança contra ato de prefeito que não repassa o duodécimo. 2.2 TEORIAS Surgiram três teorias para explicar o relacionamento entre pessoas jurídicas da administração pública, órgãos públicos e agentes públicos. b.1 teoria da representação: considerava o agente público um representante do órgão público e consequentemente do Estado. A teoria não vingou porque equiparava o Estado ao incapaz, já que a representação supre a incapacidade. b.2 teoria do mandato: considerava que agente era mandatário do Estado, mas não explicava como o Estado, que não tem vontade no sentido próprio do termo, já que vontade Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 24 quem tem é o ser humano, poderia outorgar validamente o mandato. Além disso, as duas teorias apresentavam outro problema: não explicavam como o Estado poderia responder por ato de seus agentes que atuassem além dos poderes conferidos. b.3 teoria da imputação ou teoria do órgão: considera que a atuação do agente público é imputada, atribuída ao órgão público a que ele pertence e consequentemente a pessoa jurídica a que o órgão pertença. Esta teoria foi desenvolvida na Alemanha por Otto Gierke. É a teoria que prevalece. 2.3 REGIME Todos os órgãos são sempre de regime público. Os agentes lotados em órgãos são sempre concursados e estatutários (isso na administração federal e estadual). Os estatutários contribuem para o regime especial da previdência e goxam de estabilidade funcional, exceto os cargos de direção, chefia e assessoramento, em regra titularizados por comissionados, que são estatutários especiais, contribuem para o regime geral da previdência e não gozam de estabilidade. 2.4 BENS Os bens são de domínio da pessoa jurídica estatal a qual o órgão pertença (órgão não tem patrimônio). Estes bens são afetados aos órgãos em regime de uso especial, sendo impenhoráveis, não oneráveis, imprescritíveis, e para a alienação é necessário primeiro promover a desafetação. 2.5 PERSONALIDADE JURÍDICA Órgão não tem personalidade jurídica própria (são sempre subordinados). Não pode ser parte processual, exceto para mandado de segurança (o órgão pode impetrar sozinho). Podem ser partes: (i) Mp e DP; (ii) Mesa da Câmara. 2.6 MANIFESTAÇÃO São impessoais, de acordo com a teoria da imputação volitiva. O resultado da ação ou omissão não é atribuível ao órgão (o órgão não poderá ser responsabilizado). 2.7 UNIDADE ORÇAMENTÁRIA FINANCEIRA Nos moldes da Lei 4320/64, o órgão (ou frações de um órgão) constituem unidades orçamentárias financeiras. Logo, cada unidade orçamentária detém a atribuição de planejar todas as despesas e Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 25 gastos que pretende executar no próximo exercício. Com a aprovação orçamentária, aquela verba planejada deve ser dedicada à unidade orçamentária que a requisitou, cabendo a cada órgão executar as próprias licitações (mas quem firma o contrato, atendendo ao órgão é a pessoa jurídica estatal a qual pertença, cabendo a ela liberar pagamentos), e cada órgão presta suas contas, que serão reunidas e unificadas nas contas anuais da pessoa jurídica estatal a qual pertença. 2.8 CLASSIFICAÇÃO DOS ÓRGÃOS Os órgãos são classificados em 04 níveis: 1. Órgãos independentes 2. Órgãos autônomos 3. Órgãos superiores 4. Órgãos subalternos 1º) Órgãos independentes: São aqueles que encabeçam cada estrutira ou poder. Não se sujeitam, nem se subordinam a qualquer outro órgão ou poder. Compete a estes órgãos a definição das políticas que serão implementadas. Ex: no Executivo, a Presidência da República). A presidência é um órgão composto por diversas estruturas administrativas (gabinete, Conselhos da República, AGU), mas para expedir atos e decisões, apesar de ser composta, a presidência é um órgão unitário, pois somente o titular do gabinete detém estes poderes. òrgão formado por uma única estrutura é órgão simples, e quando a decisão decorre da opinião da maioria é órgão colegiado. 2º) Órgãos autônomos Formam o 1º escalão de poder. São politicamente subordinados aos independentes, mas gozam de autonomia administrativa e funcional. Compete a estes órgãos o planejamento para a execução das políticas definidas pelos órgãos independentes. Ex: Ministérios, Secretarias. 3º) Órgãos superiores São órgãos de coordenação pública, para todas as ações e execuções do Estado. São plenamento subordinados aos autônomos. Ex: Procuradorias, Inspetorias, Chefias, Delegacias. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 26 4º) Órgãos subalternos São os órgãos de execução, sendo plenamente subordinados aos superiores (ex: Procurador, Auditor, Delegado). ATENÇÃO: MP, Tribunal de Contas e Defensoria são órgãos, porém independentes (não se sujeitam nem se subordinam a outro órgão ou poder e que não integram qualquer estrutura de qualquer órgão ou poder). 3. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA Administração executa atividades (CF, art. 37): a) essenciais: delagadas para dentro da estrutura do Estado, através de desconcentração para órgão da administração direta b) relevante interesse público: delegadas para fora da estrutura do Estado, através de descentralização à pessoa jurídica autônoma, sujeitaao princípio da especialização (só pode fazer aquilo a que foi criada, visando ganho de eficiência - ex: autarquias). Estas pessoas jurídicas são distribuídas no plano horizontal, sem subordinação (o máximo que a Dilma faz é nomear ou exonerar o diretor da autarquia. As atividades de relevante interesse são delegadas pelo chefe do executivo também através de lei especial de propositura exclusiva deste chefe. São as leis de descentralização administrativa. Na descentralização é criada ou autorizada a criação de uma pessoa jurídica autônoma. Esta PJ, que possui personalidade jurídica própria, é dotada de patrimônio próprio e possui capacidade para estar em juízo de forma independente. Essa pessoa jurídica não é alcançada pelo princípio da impessoalidade e, portanto, responde pelos próprios atos e omissões. Estas pessoas jurídicas são organizadas horizontalmente e, portanto, sem subordinação hierárquica. Atuam de forma autônoma, não se sujeitando a ordens diretas, mas só podem agir para executar aquele fim específico previsto na lei de descentralização que a criou. Esta é a norma, regra ou princípio da especialização, e são froçadas a se especializarem para otimizar a eficiência da prestação pública). Compete aos ministérios a fiscalização do respeito a essa especialização, chamada de tutela ou supervisão ministerial. Na CF/88 são previstos como espécies de pessoas jurídicas estatais as (i) autarquias, (ii) fundações públicas, (iii) empresas públicas e (iv) sociedades de economia mista. E com a Lei 11.107/05, foi criado mais um tipo de pessoa jurídica, que são as associações públicas. 3.1. Autarquias Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 27 São prestadoras de serviços públicos não econômicos, sempre sem fins lucrativos. São sempre de regime de direito público, portanto: a) seus bens são bens públicos (impenhoráveis, não oneráveis e imprescritíveis); Para alienar é preciso primeiro desafetar e, no caso de imóveis também é necessária a autorização presidencial em certos casos. b) seus agentes são, em regra, concursados e estatutários, com direito a estabilidade e contribuem para o regime especial da previdência pública. c) os dirigentes são nomeados comissionadamente (sujeitos a estatuto especial e contribuem para o regime geral da previdência) d) cada autarquia é uma unidade orçamentária financeiras e o seu plano orçamentário individual é inserido na lei orçamentária anual pelo chefe do executivo. Quando o orçamento é aprovado, o chefe do executivo, mediante decreto, libera o orçamento da autarquia. Compete a ela executar as próprias licitações, firmar os próprios contratos e realizar os próprios pagamentos, prestando as próprias contas ao tribunal de contas (o tribunal de contas julga diretamente gastos e contratos das autarquias, podendo caçá-los ou sustá-los, quando indevidos). Uma autarquia pode ser convertida em órgão por lei especial, assim como um órgão pode se transformar em autarquia (ex: CADE) e, para se extinguir autarquia a única forma é por lei do mesmo status que a criou (ex: se criou por LO, extingue por LO). Exemplo de autarquia comum: INCRA, INSS. 3.1.1. Autarquias de regime especial Como são autarquias, adotam todas as regras e características das autarquias comuns vistas acima, porém, com algumas diferenças pontuais: a) podem gozar de maior flexibilidade em sua especialização (podem desenvolver atividades correlatas). Ex: USP (ensino + projetos + bolsas) b) seus agentes são sempre concursados, mas em regra, sujeitos ao regime da CLT; c) seus dirigentes são, em regra, eleitos pela classe ou categoria que representam, gozando de estabilidade no mandato (ao contrário do dirigente comissionado das autarquias comuns, que é destituível a qualquer tempo, sem processo ou motivação, chamada de destituição ad nutum). d) exemplos: faculdades e universidades públicas, conselhos de fiscalização profissional (CRM, p. ex) ATENÇÃO: Para o STF, a OAB não é uma autarquia, mas sim um serviço público independente. Trata-se de uma entidade sui generis. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 28 3.1.2. Agências reguladoras São autarquias de regime especial dotadas de maiores poderes e autonomias. Entre as suas atividades, as mais importantes são: a) promover as licitações de privatização da exploração de serviços públicos e bens públicos; b) fiscalização do fiel cumprimento do contrato pelas concessionárias, da eficiência, da economicidade e da tarifa cobrada (compete à agência reguladora fixar a tarifa, aumentos e reajustes). Todas as queixas, reclamações e danos causados por concessionárias serão objeto de processo interno nas agências reguladoras, que passa a ter perfil de tribunal administrativo e, assim como o TCU, a agência reguladora tem a exclusividade para as matérias técnicas a ela submetida (o Judiciário não analisa matéria técnica). c) intervenção pública na concessionária (importante!): quando a concessionária cometer infrações graves, a pedido da agência reguladora o chefe do executivo edita decreto interventivo, que pode até afastar a direção da concessionária, para que o interventor público nomeado possa apurar as irregularidades. Quando essas irregularidades forem insanáveis o interventor propõe a caducidade contratual, que é a rescisão punitiva do contrato. Agentes: são concursados, sujeitos ao regime estatutário, contribuindo para o regime especial da previdência. Dirigentes: são nomeados em ato complexo, sem a realização de concurso (o chefe do executivo indica o nome e o legislativo sabatina e aprova). AO tomar posse, este dirigente passa a gozar de estabilidade política para o exercício do mandato (não é destituível ad nutum, mas apenas por processo). Atos regulatórios: além das atribuições fiscalizatórias, as agências reguladoras editam os atos regulatórios. Em regra, esses atos são voltados para a coletividade em geral (são atos concretos, de matéria técnica, em regra). Questão: Qual a natureza jurídica deste ato? 1ªc) para parte da doutrina, é espécie de ato normativo, por disciplinar um comando impositivo, declarado unilateralmente pela administração, regulamentando certa matéria. 2ª) para outra parte da doutrina, trata-se de ato discricionário de efeitos concretos. Para essa corrente, o ato regulatório não é propriamente ato normativo, pois não disciplina de forma genérica direitos e obrigações para a coletividade e não decorre de prévia lei autorizadora que trate da matéria. 3.1.3. Privilégios das autarquias Todas as autarquias, de todos os tipos, gozam de privilégios públicos, onde os mais importantes são: Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 29 a) imunidade tributária para impostos de qualquer esfera (chamada de imunidade recíproca); b) impenhorabilidade patrimonial c) credora privilegiada: podem inscrever seus devedores diretamente em certidão da dívida ativa, que é título executivo extrajudicial, cobrada diretamente por execução fiscal; d) autarquias integram a Fazenda Pública e, portanto: 1. Não se sujeitam, em regra, ao ônus da impugnação específica (podem contestar por negativa geral e aquilo que não impugnarem, em regra, não se constitui em ponto não controvertido, mantendo o ônus da parte contrária em prová-lo); 2. Quando declaradas em revelia, não haverá presunção de veracidade daquilo alegado pela parte contrária, nem a pena de confissão nas questões envolvendo o interesse público; 3. Quando condenadas acima de certo valor, a sentença dependerá de duplo grau obrigatório(reexame necessario); 4. Quando condenadas acima de certo valor, pagam seus credores através de precatórios; 5. Gozam de prazo especial (em dobro para todas as manifestações) 6. não admitem citação ficta, por edital ou com hora certa. 3.2. Fundações públicas Quando um grupo de pessoas constituir uma PJ para exploração de atividade econômica, criarão uma sociedade empresarial ou uma cooperativa. Quando um grupo de pessoas constituir uma PJ para a prestação de atividades não lucrativas, constituirão uma associação. Quando um conjunto de bens for organizado através de estatuto, para a prestação de atividades nunca lucrativas, será criada uma fundação. O Estado pode constituir uma fundação, sujeita ao regime público, para a exploração de serviços públicos assistenciais ou beneficentes. Esta é uma fundação pública de direito público, integrante da administração indireta, que adota todas as regras, características e benefícios das autarquias comuns, sendo chamadas de "fundações autáquicas". As principais distinções para as autarquias são: a) autarquia é criada por lei, enquanto que fundação é autorizada por lei; b) fundação é regida por estatuto, enquanto autarquia é regida apenas por lei. Fundação constituída pelo Estado, porém submetida ao direito privado, para prestação de serviços assistenciais ou de ensino, são fundações públicas de direito privado Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 30 (doutrina majoritária). Parte da doutrina as incluem na administração indireta, e parte não incluem, entendendo que são privadas. Fundação constituída por particulares, suleita ao regime privado, para as atividades assistenciais ou beneficentes são fundações privadas de direito privado. São regidas pelo CC/02, não integram a administração pública, sua existência decorre de estatuto e são externamente fiscalizadas pelo MP. FUNDAÇÕES - DIFERENÇAS Criação Regime Nome Criada pelo Estado Regime de direito público Autarquia fundacional Criada pelo Estado Regime de direito privado Autarquia pública de direito privado Criada por particulares Regime de direito privado Autarquia privada de direito privado Obs: Para Hely, não existem 3 tipos de fundações (toda fundação é pública - doutrina ultrapassada). Para uma outra doutrina, minoritária, quando uma fundação pertence ao Estado, é na verdade uma autarquia e quando não pertence, é uma fundação privada comum. 3.3. Associações públicas (Lei 11.107/05) A Lei 11.107/05 passou a disciplinar a possibilidade de reunião de esforços entre as pessoas políticas, para juntas explorarem um grande serviço público ou uma grande obra pública, que seja do interesse comum dessas pessoas políticas envolvidas. A lei permite que UNião, Estados e Municípios se associem livremente, proibindo apenas, e de forma expressa, a associação direta da União com Municípios. As pessoas políticas, em primeiro lugar, firmam um "protocolo de intenções", que para a doutrina tem natureza de pré-contrato. Cada um deverá obter uma autorização de seu legistalivo, para então firmarem um "contrato de rateio", que divide os encargos e investimentos de cada um; um "contrato de programa" dividindo responsabilidades e taferas, e a reunião de todos os documentos firmados constituirá um grande contrato de "consórcio público" (para parte da doutrina, será "consórcio" apenas quando as pessoas políticas forem do mesmo nível ou esfera, e quando pertencerem a esferas distintas será convênio). Firmado o consórcio haverá um grande volume de dinheiro, bens e agentes a serem administrados para a execução do serviço ou obra. Para gerir tudo isso, a lei prevê que do consórcio firmado haverá uma nova pessoa jurídica estatal, que será uma "associação pública". A associação pública é dirigida por um representante legal, que em regra será o chefe do executivo de uma das pessoas políticas associadas. As contas e contratos deverão ser Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 31 prestadas para o Tribunal de Contas do respectivo representante legal (ex: se a Dilma for a representante legal, contas ao TCU). Em regra, esta associação pública adotará regime público, integrando a administração indireta de todas as pessoas jurídicas associadas. Neste caso, serão adotadas todas as regras, características e privilégios das autarquias comuns (parte da doutrina - JSCF, chega a entender que nedsse caso trata-se de uma autarquia associativa). Excepcionalmente, a associação pública poderá adotar o regime privado (associação pública de direito privado). E neste caso, parte da doutrina entende que não serão adotadas as regras e privilégios das autarquias e a associação não integrará a administração indireta; enquanto para uma segunda corrente, estas associações públicas de direito privado integrarão a administração indireta, podendo ou não adotar as características das autarquias, caso a caso. Regra licitatória: a associação pública deverá licitar contratos normalmente, mas quando formada por até 3 pessoas políticas os valores previstos na Lei 8666/93 para a definição da modalidade licitatória e a dispensa por ínfimo valor serão dobrados, e quando formado por mais de 3 pessoas políticas os valores serão triplicados. 3.4. Empresas públicas e sociedades de economia mista São "empresas estatais". Nos termos do artigo 173 da CF, a atividade econômica é, em regra, reservada à iniciativa privada. Exceção: o Estado pode exercer atividade econômica, no caso de (i) relevante interesse público, envolvendo (ii) questões de soberania. Neste caso, a exploração será através de empresas públicas e sociedades de economia mista, sempre sujeitas ao regime privado. De forma dirigente, a CF impõe ainda ao Estado o dever de combater abusos de poder econômico. Assim, quando uma empresa estatal explorar atividade econômica o Estado estará proibido de conceder privilégios trabalhistas, tributários, previdenciários e obrigacionais patrimoniais, pois implicaria em abuso do poder econômico. Para conceder tais benefícios deverá estendê-los às demais empresas privadas comuns. Porém, o Estado pode constutuir empresas estatais para a prestação de serviços públicos. Como serviço público é de titularidade exclusiva do Estado, em regra não há concorrente privado. Neste sentido, o STF confirmou que o Estado pode conceder imunidade/isenção fiscal para estas estatais, bem como regimes trabalhistas diferenciados e até vantagens obrigacionais e patrimoniais. 3.4.1. Pontos em comum a) ambas são apenas autorizadas por lei. Direito Administrativo (2018) Guilherme Flaviano Rabelo 32 A existência destas dependerá de contrato ou estatuto social, que serão previstos na lei autorizadora. b) agentes São concursados e celetistas. Estes empregados assinam contratos de trabalho comum regido pela CLT, sendo possível prever o período de experiência, com a possibilidade de dispensa simples caso o agente não se adpate ao emprego. Enquanto que os estatutários pleiteiam seus direitos na vara cível ou da Fazenda Pública, os celetistas pleiteiam na Justiça do Trabalho, sem qualquer prerrogativa ou tratamento diferenciado. E, na corrente amplamente dominante, ainda que o celetista exerça função equiparada à de um estatutário não poderá pleitear equiparação salarial. Estes contribuem para o regime geral da previdência e são demissíveis sem processo, nem motivação (é possível demissão ad nutum, com ou sem justa causa). Excepcionalmente, na empresa pública ou sociedade de economia mista prestadora de serviços prevalece o entendimento que a demissão
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