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1 UNIDADE 6 Acadêmica: Suselle Aires Machado 2 SUMÁRIO Imagens que contam ............................................................................. 3 Oficina o olhar ....................................................................................... 4 Projeto de criação .................................................................................. 4 Conceituando: O conto .......................................................................... 5 O conto .................................................................................................. 5 Lendo um conto ..................................................................................... 6 Estudando o conto ................................................................................. 9 Saiba mais: Estrutura do enredo .......................................................... 10 Conto fantástico ................................................................................... 11 Continuando um conto fantástico ........................................................ 11 Produção escrita ................................................................................... 12 Referências ........................................................................................... 13 Unidade 6: Ensino Fundamental Tantos contos ......................... .............................................................. 3 3 Imagens que contam Quantas vezes você já foi uma pintura de Edward Hopper? Você sentiu-se sozinho, em algum momento, apesar de estar acompanhado? Há um pouco de solidão habitando dentro de cada um de nós. HOPPER, Edward. Automat. Óleo sobre tela,1927, 71.4 × 91.4. 4 1. Observe o ambiente, na imagem da página anterior. a) Em sua opinião, a moça está em uma área mais urbana ou mais rural? b) Em que período do dia essa cena se passa? Comente. 2. Observe os detalhes no interior da construção onde está a persona- gem. a) Que local parece ser esse? b) O que a moça segura em sua mão? O que ela está fazendo com esse objeto? 3. Conclua. a) Em sua opinião, por qual motivo a personagem teria realizado essa ação? Como você acha que a personagem está se sentindo? b) O que é a luminosidade que se alonga através da janela? Qual sensa- ção ela transmite? c) Nessa pintura, o que há de incomum? Ela exige um olhar atento do ob- servador? Explique. Oficina do olhar Você percebeu que imagens também contam histórias? Ao olhar a obra “Automat”, de Edward Hopper, foi possível compreender a situação retra- tada. Do mesmo modo, você e seus colegas escolherão obras de arte, ana- lisarão os elementos presentes e produzirão pequenos contos, de acordo com o que interpretarem. Por fim, realizem uma exposição de imagens e de contos, reunindo as narrativas produzidas em uma antologia de contos. Projeto de criação Como o nome sugere, esse gênero textual está ligado à necessidade de contar histórias, e, provavelmente, você já entrou em contato com vários tipos de conto: conto fantástico, conto social, conto de mistério etc. Gostaria de conhecer um pouco mais? Selecione um livro, de autor brasileiro ou estrangeiro, escolha um conto e leia-o. No dia combinado com a turma, apre- sente-o e exponha as suas opiniões. Sugestão: Edgar Allan Poe. 5 Conceituando: O conto Contar histórias é uma atividade antiga, presente em todas as culturas, que passa de geração em geração. Desde o nascimento, as his- tórias são introduzidas na vida humana, seja por meio de contos de fa- das, de desenhos animados, de canções infantis ou outras mídias. Ouvir e contar histórias é inerente ao ser humano. O conto O conto é um gênero textual narrativo, que, por constituir um texto breve, possui um único conflito a ser solucionado, um número de ações limitado e uma quantidade de personagens reduzida. A natureza dos contos pode variar bastante. Dessa maneira, o conto pode ser classificado como: Conto de suspense, de mistério, de aventura, de ficção científica, de terror, de encantamento, de cos- tumês, romântico, psicológico, fantástico, social, satírico, humorístico etc. Contudo, apesar das classificações, não há conto “puro”, tendo em vista que os contos entrelaçam essas diferentes facetas, podendo ser, por exemplo, um conto trágico e cômico ao mesmo tempo. Leia o miniconto abaixo: Uma vida inteira pela frente. O tiro veio por trás. (Moscovich, 2004, p. 16) A exemplo da autora Cíntia Moscovich, escreva um miniconto com, no máximo, cinquenta letras. Depois, apresente para a turma. Cena do filme “Forrest Gump: O contador de histórias” (Zemeckis, 1994). 6 Lendo um conto Felicidade clandestina Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente cres- pos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como “data natalícia” e “sau- dade”. Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vin- gança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odi- ar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me subme- tia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possu- ía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Cena do filme “Matilda” (DeVito, 1996). 7 Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria. Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu não vivia, eu nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não mo- rava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boqui- aberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava to- da e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo es- tranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pu- lando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez. Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono de livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do “dia seguinte” com ela ia se repetir com meu coração baten- do. E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar queela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu so- fra. Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados. Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, en- 8 trecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler! E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: “E você fica com o livro por quanto tempo quiser. “Entendem? Valia mais do que me dar o livro: pelo tempo que eu quisesse” é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer. Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim re- cebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segu- rava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo. Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o li- vro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificul- dades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Co- mo demorei! Eu vivia no ar… havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada. Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante. (Clarice Lispector, 1981, p.7-10) Ao falarmos de amor, costumamos limitar ao amor às pessoas: pais, irmãos, famili- ares, amigos, amantes etc. Contudo, o ser humano apaixona-se, constantemente, por objetos, por hábitos e, até mesmo, por lugares, na mesma intensidade. Concor- da? Já aconteceu com você? Vamos conversar com a turma sobre isso. 9 Estudando o conto Quem foi Clarice Lispector? 1. Os três primeiros parágrafos constituem a introdução do conto. Por- tanto, neles são apresentadas as características dos personagens que compõem a história. a) Quais são os principais personagens? b) Como é feita a caracterização dos personagens: de modo aprofundado ou de modo superficial? Liste os aspectos que são ressaltados. 2. O que fazia a filha do dono da livraria parecer superior aos olhos da narradora? 3. Observe o seguinte trecho do conto: “Mas que talento para a crueldade.” “Ela era toda vingança.” a) Por que a outra menina tinha talento para a crueldade, na opinião da narradora? b) Qual a explicação para o desejo de vingança da menina? Clarice Lispector (1920-1977) nasceu na Ucrânia veio morar no Brasil com a família, quando tinha 1 ano de idade. Morou em Recife e no Rio de Janeiro, onde se formou em Literatura. Quanto às suas identidades nacional e regional, declarava-se brasileira e pernambucana. Aos 17 anos, estreou na literatura com “Perto do coração selvagem”, obra seguida de muitas outras. Suas obras marcadas por cenas cotidianas e tramas psicológicas, a tornariam uma das mais importantes escri- toras brasileiras. Fo n te: h ttp s://w w w .ro cco .co m .b r/esp ecial/clarice lisp ecto r/ 10 Introdução: Coincide, geralmente, com o início da história; é o momento de apresentação dos personagens, dos fatos iniciais, do tempo e do espaço. Desenvolvimento: É a parte em que o conflito é desenvolvido no enredo. Clímax: É o momento de maior tensão da história; aquele no qual o conflito atinge seu ponto máximo. Desfecho: É a conclusão; momento em que a solução do confli- to é apresentada; corresponde ao final da história, podendo ser cômico, trágico, surpreendente etc. Saiba mais: Estrutura do enredo 4. A posse do livro “As reinações de Narizinho” possibilitou à menina torturar a narradora, em um jogo de promessas e mentiras. a) Quais as consequências físicas dessa tortura? b) Em sua opinião, por que a narradora se submetia ao jogo criado pela menina? Se você estivesse no lugar da narradora, o que faria? 2. O que mais assustou a mãe, ao descobrir o jogo que a menina vinha fazendo com a narradora? O que a decisão da mãe representou para a narradora? 3. Nos últimos três parágrafos do conto, a narradora surpreende com suas atitudes. a) Por que as atitudes surpreendem? b) Que relação há entre essas atitudes e o título do conto “Felicidade clandestina”? c)Interprete a frase final do conto: “Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com seu amante”. Comente sua resposta com a turma. 11 O realismo fantástico é caracterizado pelo fantasioso, pelo miste- rioso e pelo inesperado. Na literatura, as narrativas fantásticas são co- nhecidas por aguçar a imaginação dos leitores e surpreender com suas histórias criativas. A expressão “realismo fantástico” abrangeria toda a literatura em que realidade e fantasia se misturam. Para maior clareza, pode-se dizer que tem o caráter e fantástica toda ação que represente alguma ruptura com as leis naturais e que só nossa imaginação pode conceber. (Paes, 2008) Dê uma breve continuidade ao conto a seguir. O homem que entrou no cano Abriu a torneira e entrou pelo cano. A princípio incomodava-o a estreiteza do tubo. Depois se acostumou. E, com a água, foi seguindo. Andou quilômetros. Aqui e ali ouvia barulhos familiares. Vez ou outra, um desvio, era uma secção que terminava em torneira. Vários dias foi rodando, até que tudo se tornou monótono. O ca- no por dentro não era interessante. No primeiro desvio, entrou [...] (Brandão, 2007) Exponha a continuidade para a turma e debatam sobre as diferenças entre os contos. Você sabia que essas diferenças demonstram a visão de mundo que cada um de nós tem? Conversem sobre as diferenças e semelhanças entre vocês. Conto fantástico Continuando um conto fantástico 12 Produção Escrita 1. Escolha um conto fantástico para dar continuidade. 2. Faça um recorte dos primeiros parágrafos e planeje o modo como as ações irão progredir a partir do ponto em que o conto foi interrompido. 3. Durante o planejamento, atente-se para as características principais dos contos: o número de personagens deve ser reduzido, o espaço deve ser limitado e o tempo deve ser breve. 4. O tempo pode ser distorcido, psicológico ou desvinculadoda realidade. No entanto, o espaço deve ser restrito ao essencial, com todas as ações ocorrendo no mesmo local, se for possível. 5. Evite alterar o foco narrativo. Mantenha o mesmo foco do trecho que você recortou, bem como o tema e os elementos. 6. O conto deve ser ágil e despertar curiosidade, captando apenas um breve momento, um recorte no tempo. 7. O passado e o futuro dos personagens do conto não são relevantes. Portanto, evite detalhes desnecessários e tente caminhar, rapidamente, para o desfecho. 8. Lembre-se que o desfecho não precisa apresentar uma solução defini- tiva, ele pode deixar o final em aberto. 9. A sua produção textual deve causar no leitor sensações como estra- nheza e perplexidade. 10. Após finalizar o conto, avalie os seguintes critérios: a) Os fatos se enquadram na perspectiva do realismo fantástico? b) O conto está composto por um texto essencial e conciso? c) Os personagens estão limitados, mas bem apresentados? d) O lugar e tempo estão restritos? Você preservou o foco narrativo? e) O enredo lida com o fantasioso, provocando estranheza no leitor? 13 BRANDÃO, Ignácio de Loyola. O homem do furo na mão e outros contos. São Pau- lo: Ática, 2007. LISPECTOR, Clarice. Felicidade clandestina. 5. Ed.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981. MOSCOVICH, Cíntia. In: Marcelino Freire, org. Os cem menores contos brasileiros do século. Cotia, SP: Ateliê, 2004. PAES, José Paulo. In: POE, Edgar Allan et al. Histórias fantásticas. São Paulo: Ática, 2008. Referências
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