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OBSESSÃO EM PARIS

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Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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Obsessão em Paris 
Trilogia Paris – Livro Um 
 
 
Copyright © by Veronique Gris 
 
Todos os direitos reservados e protegidos por lei 
 Nº 9610 de 19 de fevereiro de 1998. 
 
É proibida a reprodução total ou parcial, por quaisquer 
meios, sem a autorização prévia por escrito do autor. Os 
infratores serão processados na forma da lei. 
 
 
Responsabilidade pela revisão: o autor. 
 
Capa: Imagem disponibilizada no Google. 
Domínio Público. 
 
 
 
G 150 d GRIS, Veronique 
 Obsessão em Paris/Veronique Gris 
 Porto Alegre: Ed. Autor, 2010 
 
 
 Registrado no EDA 
 Fundação Biblioteca Nacional - 2010 
 
1. Romance Brasileiro – literatura romântica. I. Título. 
 
 CDD: C 455.5 
 CDU: 455.0 (51)-51 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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Leitura On-Line 
 
TRILOGIA PARIS 
 
Obsessão em Paris – Livro Um 
 
http://obsessaoemparis.blogspot.com/ 
 
Luxúria em Paris – Livro Dois 
 
http://obsessaoemparis.blogspot.com/ 
 
Paris Meu Amor – Livro Três 
 
http://parismeuamor.blogspot.com/ 
 
 
A partir de setembro de 2011, novo endereço para 
baixar e-books VG 
Momentos Sensuais 
http://ebookeroticoromantico.blogspot.com/ 
 
 
 
 
 
 
 
 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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Autora 
 
Veronique Gris 
 
 
Eu já publiquei livro impresso (com o meu nome verdadeiro),em 2009. 
Como mudei o gênero literário, achei melhor mudar também o meu nome. 
Escrevo novelas (histórias curtas, como a extinta coleção Momentos Íntimos) e 
romances. Minha linha é a romântica sensual, com muita ação e conflito 
dramático. Nasci e vivo em Porto Alegre, tenho 2 filhos e já morei em todas as 
regiões do Brasil, menos no nordeste. Sou libriana e gremista. 
 
Sintam-se à vontade para escreveram para mim nos comentários: 
Facebook: veronique gris 
Twitter: @veroniquegris 
E-mail: vgveronique@hotmail.com. 
 
Blog 
http://veroniquegris.blogspot.com/ 
 
 
 
 
 
 
 
 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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Sinopse 
 
 
 
AMANDA ROSSI por anos alimentou a ideia de viver um conto de fadas em Paris. Aos 
vinte e três anos, ela enfim deixa o Brasil e parte para uma aventura na França. A cidade que 
lhe promete o amor também lhe proporciona perdas. Sem dinheiro para manter-se, tem de 
vender seu pequeno tesouro da adolescência, os discos do Queen. Cinco anos depois, ela é a 
assistente-executiva de JULES BRIENNE, presidente de uma grande empresa de 
computadores, um workholic cuja esposa encontra-se em estado de coma após acidente 
automobilístico. Ela torna-se seu braço-direito. Jules é um homem de olhar sério e poucas 
palavras. Alguém que aceita a personalidade impetuosa e explosiva da latina. Alguém que a 
protege e é protegido por ela. Alguém que deseja vingança. Ao lado de Jules, Amanda vive 
um caleidoscópio de emoções e sensações. Principalmente, quando se torna vítima do maior 
inimigo de seu chefe. E descobre que toda a proteção tem o seu preço. Toda a paixão tem 
vestígios de obsessão. Todo o prazer, insanidade. Todo o amor, medo. Ela está enlouquecida 
de desejo por aquele que lhe tem na palma da mão. 
 
 
 
 
 
ELE PODE LANÇÁ-LA A UM VOO ALTO E SEGURO. 
ELE PODE ESMAGÁ-LA A QUALQUER MOMENTO. 
 
 
ELA AMA-O LOUCAMENTE. E PAGARÁ UM ALTO PREÇO POR ISSO. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Capítulo I 
 
 
 
O espelho que forrava parcialmente a parede lateral do restaurante enquadrava em 
seu perímetro, pelo menos, três mesas pequenas, retangulares, revestidas por toalhas de 
linho e ornamentadas, cada uma, com um delicado vaso de flores. Debaixo da iluminação 
indireta, estrategicamente disposta ao longo do teto, podia-se ver um casal conversando 
quase em sussurros, ladeados por uma mesa com um grupo de executivas. No canto, numa 
terceira mesa, protegida pelo próprio espaço junto à parede, uma mulher de cabelos escuros 
e curtos. Um penteado sofisticado para alguém que aparentava pouco mais de vinte e seis 
anos. Ela aparentava, também, certa apreensão e nervosismo, expressos nos olhos grandes 
que acompanhavam a movimentação dos garçons e clientes, no maneirismo de cruzar e 
descruzar as mãos sobre a mesa e no gesto de mordiscar o canto esquerdo do lábio inferior. 
Certamente, a moça esperava por alguém. E esse alguém estava atrasado. 
Amanda olhou novamente para o relógio no seu pulso e constatou que já era hora de 
retirar-se do local. Fez um gesto discreto com a mão chamando o garçom de sua mesa e, 
quando este se aproximou elegante e solícito, pediu-lhe a conta. Havia levado um bolo, um 
bolo de um homem que jamais vira na vida. Sentia-se entre aliviada e feliz, por mais incrível 
que isso parecesse. Desde que fora praticamente obrigada por Dorian - sua amiga e uma das 
duas secretárias da diretoria da empresa em que Amanda trabalhava havia cinco anos – a 
dar uma “chance ao destino” (como ela mesma dizia) e conhecer alguém fora do trabalho. 
Dorian acreditava que Amanda era uma compulsiva por trabalho, como o seu próprio chefe. 
Assim, nada melhor que um encontro às escuras com um brilhante contador que fazia o 
Imposto de Renda de celebridades. Amanda desconfiava que talvez esse encontro 
promovido por Dorian, fosse para limpar-lhe a barra com o tal contador e ex-namorado. 
Afinal, a loira sedutora havia-o despachado há poucos meses com a desculpa de sempre 
(que, no caso de Dorian e Amanda eram verdadeiras): excesso de trabalho e falta de tempo 
para viver. Mas o plano da amiga esvaíra-se ralo abaixo, pois desde que Amanda aceitara a 
contragosto participar do encontro (ou teatrinho), sentia-se dominada por uma péssima 
sensação chamada obrigatoriedade. Praticamente fora obrigada a aceitá-lo e somente o 
fizera para livrar-se de amolações futuras. Agora, observando o ponteiro dos minutos 
afastar-se lentamente do horário combinado, ela aproveitou a deixa do destino e avançou 
algumas casas no tabuleiro, na verdade, para fora do tabuleiro. 
Ao passar pelo hall de entrada do restaurante, teve um leve sobressalto e tentou 
esconder-se por detrás de uma planta frondosa. Não sabia como era o contador. O máximo 
que Dorian havia-lhe dito era que passava dos quarenta anos, moreno e elegante. Não 
acrescentara, por exemplo, que usava um relógio do tamanho de um melão, que era calvo e 
arrogante. Quando ela saiu do esconderijo rumo à porta de saída, ouviu-o falar à 
recepcionista para que ficasse de olho nos manobristas porque não se encontravam 
“Mercedes em qualquer esquina” e “que não caíam de árvores”. Amanda nem quis saber a 
resposta da morena sofisticada que, provavelmente, fora contratada de uma agência de 
modelos. De cabeça baixa e o ar preso nos pulmões, encaminhou-se rapidamente para a rua 
a fim de conseguir um táxi. E encontrar um táxi em Paris às oito horas da noite era uma 
façanha ainda maior do que fugir de um encontro às escuras. Sentia-se em apuros, mas tinha 
vontade de rir, de gargalhar, de enfiar as unhas no rosto maquiado de Dorian. Ora, bolas! 
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Como se ela gostasse de homens arrogantes e prepotentes! Como se ela precisasse de um 
homem para viver. Desde a adolescência sempre fora independente e madura, jamais se 
apaixonara ao ponto de entregar-se sem medidas. Dava um passo em frente ao outro, 
tomando cuidado para não se trair. O que lhe importavam na vida, realmente, era o trabalho 
como assistente pessoal de Jules Brienne, presidente-executivo da Societé Brienne 
d’Ordinateurs – uma das maiores empresas de fabricação, venda e distribuição de 
computadores e hardwares do continente europeu – e o seu lar, um apartamentinho 
decorado com objetos compradosem várias partes do mundo, já que, como secretária 
particular de Jules Brienne, tinha de acompanhá-lo nas inúmeras viagens pelas demais 
empresas do grupo. 
Trabalhar para um alto executivo não era tarefa fácil; e, assessorar o presidente de 
uma grande companhia, workaholic até o último fio de cabelo, a dificuldade acentuava-se 
ainda mais. Agressivo nos negócios; sério e introspectivo como pessoa, ele alimentava a 
imaginação de concorrentes e invejosos de plantão. A bem da verdade, Amanda sabia que 
para agradar o chefe bastava apenas entregar a alma à empresa. Nada menos. 
Desde a sua contratação, Amanda jamais vira um sorriso iluminar o rosto 
circunspecto de Jules Brienne. No escritório, comentavam à boca pequena que ele nunca 
mais sorrira desde o acidente com a esposa havia cinco anos e que a tornara praticamente 
um vegetal, definhando lentamente ano após ano, num quarto totalmente preparado para 
mantê-la em sua casa. Havia uma equipe de médicos, enfermeiros e fisioterapeutas de 
plantão à sua disposição e que praticamente moravam com ela, já que, devido as muitas e 
intransferíveis viagens de negócio, era inviável a presença do marido junto ao seu leito. 
Amanda perguntava-se se a vontade de monsieur Brienne não era a de jogar tudo para o 
alto, entregar a presidência ao vice e viver ao lado da jovem esposa inconsciente. Por outro 
lado, ele tinha apenas 37 anos e todo um mundo para conquistar. 
O mais estranho e injusto de tudo era que, no mundo empresarial, ninguém se 
importava com o que se passava na vida das pessoas, se eram felizes ou se o amor de suas 
vidas morria em vida, o que contavam eram os rótulos e a produtividade. E o rótulo de Jules 
Brienne era o de insensível, o homem de gelo. Tal apelido espalhara-se rapidamente até 
mesmo pelos corredores, salas e elevadores da sede das Corporações Brienne. O homem de 
gelo que jamais sorria. E de poucas palavras. 
A noite estava fria e úmida. As nuvens encobriam o céu e o vento gemia por entre os 
galhos mais finos das árvores. Amanda encolheu-se dentro do casaco, apertou a bolsa contra 
o corpo e correu em direção ao meio-fio da calçada. Nada a faria perder o táxi que se 
aproximava. Esticou o braço com os olhos fixos no automóvel, mas, em seguida e de forma 
violenta, viu mesmo foi o chão. 
Morri e estou no céu!, ela quase deixou escapar ao aceitar a mão estendida do 
desconhecido. Se lhe tivesse dito isso, talvez não contivesse uma crise de risos, porém, de 
fato, se aquele loiro de olhos azuis não era um anjo, estava bem perto de sê-lo. Aceitou 
tocar na palma daquela mão macia, de dedos longos e tépidos. E, já de pé, observou que ele 
era alto, pouco mais de 1.80, um corpo esguio protegido pelo casaco azul marinho que 
combinava com a coloração clara e suave de seus olhos. Amanda já havia visto aquele tipo 
de homem, bonito, bem vestido, extremamente cheiroso e irresistível: seu chefe. Mas não 
foi por isso que ela sentiu as pernas moles e trêmulas. Na verdade, o estranho acabou 
decifrando a charada ao dizer-lhe apontando para algo no chão: 
-Acho que é o salto do seu sapato. –agregou à informação um meio sorriso de 
congelar todos os eventos maléficos no mundo. 
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Ele é um príncipe dinamarquês, pensou debilmente, fitando o lugar onde o regente 
havia apontado. O pedaço do seu sapato era a coisa mais fascinante do universo. Nesse 
ponto, olhando para o salto quebrado, ela percebeu que o seu cérebro estava girando mais 
devagar. Mas o resto do corpo não. E como era uma moça educada, disse espontaneamente: 
-Merda de sapato! 
O estranho riu e dois sulcos acentuaram-se ao redor dos lábios. Havia algum defeito 
nesse espécime masculino? Impossível, concluiu Amanda. 
- Desculpa... eu estava tão concentrada em não perder o táxi... é tão difícil... -
começou sentindo a bochechas quentes. 
-O táxi com passageiros? –indagou com expressão divertida. 
-Oh, merda... quer dizer, droga, ah, pardon... 
Os olhos azuis brilhavam divertidos, o sorriso era aberto e franco, transmitia calor, 
aconchego. Ele estendeu-lhe novamente a mão e disse: 
-Jacques Rodin. 
Era agradável tocar naquela mão e ela aproveitou novamente a chance. 
-Amanda Rossi. Posso pagar-lhe um café? 
Assim que a frase escapou-lhe dos lábios, ela sentiu uma quentura forte no rosto. Era 
a primeira vez que cantava alguém de forma tão direta. Normalmente, quando o homem lhe 
interessava insinuava uma brincadeira tola, fazia charminho ou dava a deixa para ELE 
arriscar uma aproximação. Jamais dava a cara à tapa. Naquele momento, diante de um 
desconhecido com a sobrancelha alçada num gesto de surpresa, Amanda havia retirado do 
campo todos os zagueiros e chamado para o jogo os seus melhores atacantes, somente os 
craques. 
-Um café e um punhado de histórias? – perguntou inclinando ligeiramente o corpo 
para frente, um sorriso amistoso e um convite implícito. 
-A gente pode revezar as narrativas. –disse sorrindo, enquanto abaixava-se para 
pegar o salto. 
Jacques segurou-lhe pelo antebraço a fim de lhe dar suporte enquanto ela tentava 
prender novamente o salto ao sapato. O problema era que Amanda somente sentia uma 
parte do corpo, o antebraço. Desistiu de grudar madeira na madeira, sem cola. Ninguém 
precisava dizer-lhe que era uma missão impossível. Voltou-se desanimada para Jacques e 
ensaiou uma despedida: 
- Infelizmente, teremos que deixar o café e as histórias para outro dia. 
Num instante, Jacques tomou-lhe nos braços levantando-a do chão. Soltou uma 
sonora gargalhada ao vê-la assustada. 
-Acha mesmo que um simples sapato arruinará meus planos? 
-Monsieur Rodin, a vida não é um conto de fadas, e eu certamente não sou Cinderela. 
– riu-se. 
-Mas quem disse que sou aquele príncipe apatetado? Ele ficou com o sapato na mão 
enquanto eu, bem, estou com a princesa nos braços. -brincou. 
Adorável! A palavra nascia e explodia dentro de bolhas com cheiro de morango. Ele 
era a- do-rá-vel! E cheirava a colônia cítrica. 
Talvez tenha sido nesse momento, quando seus olhos se encontraram por vários 
minutos, que percebeu que estava completamente encantada por ele, numa calçada 
pública, sem metade de um sapato e vendo passar bem pertinho de si um contador 
arrogante xingando baixinho Dorian. 
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No café, ele disse que era advogado, trabalhava para algumas corporações 
estrangeiras na França, morava em Montmartre e estava sozinho no momento, já que a 
“mulher da sua vida” ainda lhe era apenas um sonho. Um sorriso cativante que formava 
sulcos ao redor dos lábios, dentes perfeitos, olhos azuis claríssimos na tez ligeiramente 
dourada. Cabelos loiros, fios irregulares, selvagens, que não se ajeitavam de jeito nenhum 
no hábito que tinha de ará-los com os dedos toda a vez que ficava sem jeito, ou fingia ficar 
sem jeito. 
Entre um gole e outro de café com uísque, Amanda viajou em pensamento para o seu 
apartamento de solteira-sozinha-sem-muitos-romances. Palavras como frio, silêncio e chá 
morno ressoaram-lhe na mente. Ela não queria voltar. Pelo menos, sem uma companhia 
masculina. E era incrível a sincronia da existência, pois assim que tal ideia perpassou-lhe pela 
cabeça, Jacques alçou uma sobrancelha em desafio e sorrindo – Oui, monsieur, ele sorria 
mel quente – foi direto ao ponto: 
- Quero dormir com você. – ronronou com olhos de predador. 
Ela também queria. O seu corpo o queria. A sua liberdade e independência de mulher 
adulta em Paris o queria. E simplesmente imaginar aquela boca carnuda que exibia a ponta 
dos dentes na sua, sim, queria muito. 
Desceu do táxi e esperou por Jacques enquanto pagava ao motorista. Apertou-se no 
casaco longo, mas não sentia frio. Apesar da neve intensa, dos flocos caindo-lhe sobre a 
roupa e o cabelo, ela não sentia frio. Virou-se para o homem que estava encurvado ao lado 
da janela do taxista e deu uma boa olhada no seu traseiro, pequeno, duro, estufado contra o 
jeans. Voltou-se fingindo importar-se com as luzes dos apartamentose edifícios. O motor do 
táxi chamou-lhe a atenção e ela se virou para ver Jacques guardando a carteira no bolso 
interno do casaco, um sorriso frágil, os olhos baixos numa atitude de quem está pensando 
sobre os próximos passos. E ela também olhou; não para o chão nem para a camada de neve 
que se avolumava na calçada e alcançava o meio-fio. Ela olhou para o volume entre as 
pernas do francês. Sentiu uma fisgada na barriga e as mãos tremerem. Podia desistir e 
inventar que era casada, que a mãe estava hospedada em seu apartamento, que era 
lésbica... Podia fugir, se quisesse. Entretanto, mais do que fugir, ela o desejava. 
Principalmente porque não fazia ideia de quem era ele. A excitação de fazer sexo com um 
completo desconhecido. Uma fantasia antiga. 
Quando a alcançou quase próximo à entrada de seu prédio, Amanda observou o 
quanto ele era alto em relação a ela, forte, ombros largos, viril, o quanto ele era charmoso e 
sedutor. Irradiava uma simpatia que transmitia confiança e acolhimento. Sua última relação 
fora há dois anos, quando conhecera um rapaz de vinte anos, durante uma visita ao Louvre. 
Uma tarde de descobertas. Duas horas de sexo e conversa fiada. Ele pedira-lhe o telefone e, 
para variar, Amanda rabiscou o número de uma creperia. E agora, o loirinho, de pálpebras 
relaxadas e insolentes. 
Girou a chave na fechadura da porta de entrada e a empurrou. O cheiro típico da 
alvenaria antiga, úmida e morna parecia uma benção diante do frio glacial da rua. Ela entrou 
seguida por ele. Caminhavam lado a lado sem se tocarem, porém conscientes demais um do 
outro. Eles sabiam que logo estariam nus na cama. Não havia pressa. Não antes de subirem 
os degraus da escada até o andar de Amanda. À porta, ela foi abraçada por trás enquanto 
tentava enfiar a chave no buraco da fechadura. Não conseguia. Cônscia de seus braços fortes 
apertando-lhe ao redor da cintura e trazendo-a ao encontro da rigidez de seu corpo. 
Impossível abrir a porta. Ele enfiou a língua na parte detrás da orelha de Amanda, que usava 
o cabelo curto e a nuca exposta. O contato quente e molhado traçou-lhe pelo pescoço e 
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nuca rastros de sensações quentes que, imediatamente, conectaram-se ao seu sexo. 
Continuou o passeio até alcançar o lóbulo da orelha e mordiscá-lo ferindo-o levemente, 
provocando dor para atrair o prazer. Ela gemeu quando as mãos de Jacques, acompanhadas 
pela boca entreaberta e voraz no seu pescoço, avançaram por debaixo do casaco e da blusa 
fina de lã, descobrindo a renda suave do sutiã. No minuto em que se apossou do bico, 
apertou-o entre dois dedos, puxando-o suavemente e o soltando. Esfregou o pau duro, 
inchado dentro da calça, contra o corpo magro e pequeno dela. Amanda espalmou as mãos 
contra a porta, como se tentasse empurrá-la para abri-la. Tencionava, outrossim, não se 
estatelar no chão. Principalmente, quando ele fez um movimento atrás dela - sem deixar de 
segurar-lhe um seio com a mão cheia e fechada sobre ele, tomando-o todo possessivamente 
– e em seguida, flexionou os joelhos ao mesmo tempo em que lhe erguia a saia e enfiava 
entre suas coxas o pau grande e duro. A quentura do membro entre suas pernas, excitou-a 
de tal forma que teve sua calcinha umedecida. Aproveitando-lhe a fraqueza, ele ajeitou a 
cabeça do pau por baixo da calcinha dela, na divisão entre as nádegas. Deslizava-o para cima 
e para baixo, observando o corpo da mulher ajustar-se ao seu, voltando-se para trás, 
modelando-se ao vaivém que o seu corpo impingia. 
-Você é gostosa... gostosa demais...- gemeu-lhe ao ouvido numa voz abafada pelo 
rouco de sua respiração irregular. – Abra a porta, ma petit, senão vou gozar aqui mesmo. – 
pediu. 
Na terceira tentativa, ela conseguiu destrancar a porta, e eles entraram meio 
abraçados, meio tropeçando. Com um chute poderoso e agarrado à Amanda, Jacques 
fechou-os no apartamento, no centro da pequena sala. Ela ainda tentou desvencilhar-se a 
fim de oferecer-lhe um café ou convidá-lo diretamente para o seu quarto. Mas o homem 
não lhe dava chance alguma, a boca colada a sua, a língua sugando a sua com desejo, com 
urgência. Desabaram sobre o tapete. Roupas arrancadas. Dois anos sem sexo era tempo 
demais, era falta demais. Sentou-se sobre ele e mordiscou-lhe o tórax com a ponta dos 
dentes, aprisionando um mamilo entre os lábios e sugando-o como uma gatinha sedenta. 
Desceu os beijos pelo seu corpo firme e musculoso, aspirando-lhe o odor cítrico misturado à 
delicada camada de suor que fazia sua pele brilhar, detendo-se pelo caminho, encontrando 
um atalho aqui e ali, um abdômen malhado com pelinhos aloirados, um par de coxas duras, 
um vale com tufos castanhos que emolduravam o pau grande, erguido para trás, pronto 
para disparar. 
- Tente não me matar... – ela gemeu abocanhando-lhe o membro e masturbando-o 
com a boca. Ouviu murmurar algo indefinível, já que todos os seus sentidos despertavam-se 
após dois anos adormecidos, e o cérebro descansava em algum compartimento secreto do 
organismo. Francês, nesse momento, não era uma nacionalidade, e sim um homem com as 
pernas abertas sendo chupado com voracidade, um país secreto desbravado por uma 
selvagem, um navio no porto entre suas pernas, um animal a ser cavalgado. 
- Quero muito de comer, Amanda – afirmou, mas parecia implorar. 
Ela puxou a alça da bolsa sobre o sofá para o chão, abriu-a e retirou a embalagem 
com preservativo. Fêmea precavida que era, cortou uma ponta com os dentes e deu-o para 
o homem fazer a sua parte. O pênis não era dela. Depois ele puxou-a para debaixo de si e, 
pegando o pau na mão, guiou-o para dentro dela, enfiando sem rodeios. Amanda sentiu-o 
como se um cilindro de energia e carne fosse-lhe enterrado na vagina, uma britadeira no 
asfalto quente. A cada arremetida, ela lançava gritinhos, as unhas arranhando-lhe as costas, 
as pernas cruzadas ao redor do quadril dele. Debaixo das suas pernas, percebia a 
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musculatura do traseiro de Jacques sendo forçada, exigida a cada estocada violenta, a cada 
bombeada que alcançava até o fundo dela e voltava à borda, à entrada encharcada e ardida. 
De repente, Jacques fechou a mão e puxou-lhe um punhado de cabelo, fazendo com 
que ela gemesse e lhe segurasse o pulso com força. 
- Aiii – gritou. 
- Pardon, ma petit, pardon... – soltou-lhe o cabelo e observou-lhe a feição constrita 
de dor. – É uma garota sensível. – ironizou lambendo-lhe a ponta do nariz. – Sabe o que é 
uma dor de verdade? – perguntou-lhe numa respiração rápida e rouca. 
Amanda balançou a cabeça negando. Tarde demais, percebeu que era uma pergunta 
retórica. Num gesto brusco e inesperado, ele retirou o pau da vagina e o enfiou com tudo 
atrás, arrancando-lhe um grito de susto e dor ao sentir a queimação, como se estivesse 
sendo penetrada por uma lança de fogo. Tentou escapar, porém isso só aumentou a 
excitação do homem que, após três ou quatro bombeadas firmes, gozou abraçando-se a ela 
com força. 
- Muita dor, passion? – sussurrou numa voz trêmula e cansada. 
Amanda engoliu em seco. Havia sido estuprada por trás? 
- Sim, muita. – respondeu estreitando olhos, intrigada com a mudança brusca de seu 
comportamento; antes acolhedor e em seguida, agressivo. Mal conseguia se mexer, ardida 
em brasa. Temia que ele tivesse lhe ferido de fato. 
 Jacques levantou a cabeça e a encarou, sorriu-lhe de forma travessa: 
- Tem lubrificante? Da próxima vez, você vai gostar e depois vai implorar para eu te 
comer por trás. 
Ela desconfiou das palavras dele. 
- Nem pense em tornar a fazê-lo. – ameaçou-o, alçando uma sobrancelha de forma 
superior. 
Por um momento, ele fitou-a em dúvida, desgostoso com o tom usado por ela; 
entretanto, tinha muita lenha ainda para consumir naquele fogo. Numa fração de segundos 
sua expressão mudou e o sorriso bonito e acolhedor voltou-lhe à face. Amanda constatou 
três coisas: primeiro, Jacques era instável, um caleidoscópio de emoções e sensações; 
segundo, eraum homem para uma aventura erótica e nada além e, terceiro, uma aventura 
erótica de curta duração. 
- Valeu a pena esperar. – murmurou ele, enigmaticamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Capítulo II 
 
 
 
À mesa da cozinha, Amanda tomava o café aos golinhos observando Jacques fazer o 
mesmo. Ambos tinham de trabalhar e encarar a vida que haviam deixado fora do 
apartamento dela. Ele piscou-lhe o olho enquanto entornava a caneca, parecia sossegado e 
bem disposto. Talvez tivessem dormido por duas ou três horas. Amanda sentia-se exausta e 
descansada, esgotamento sexual, por certo, sorriu consigo mesma. E admirando o homem à 
sua frente, de cabelos molhados, dividindo a mesa consigo e paquerando-a 
descaradamente, ela pensava em coisas como “masculinidade”, “beleza” e “fogo”. 
Imaginava também que naquele instante, o chefe estaria encaminhando-se ao escritório. No 
entanto, quando ressoou Killer Queen no celular, percebeu que seus pensamentos eróticos 
dissiparam-se por completo. Jacques fitou-a interrogativamente sem esconder o interesse, e 
Amanda acabou sentindo-se obrigada a dizer que era o toque que escolhera para as 
chamadas do seu chefe. Ele riu com vontade. 
- Bonjour, monsieur Brienne. –disse de olho no relógio da cozinha. Eram 7 horas, o 
expediente na empresa começava às 9 h, e o dela, como assistente pessoal do presidente: a 
qualquer momento. 
- Está atrasada, mademoiselle. – constatou num timbre de voz baixo e incisivo. 
Amanda buscou na mente motivos para tal observação, levantou-se lentamente e, 
antes de sair da cozinha, percebeu a expressão ainda divertida nos olhos do amante. 
-Desculpe, monsieur... mas...- foi então que a ficha caiu!, merda! Havia esquecido que 
deveria passar primeiro em sua casa antes de ir à empresa. Era de praxe que às segundas-
feiras ambos encontravam-se para organizar a agenda da semana. Ocupavam o escritório, 
no segundo andar, ao lado do quarto da madame Brienne cujas portas sempre estavam 
fechadas. Amanda sentava-se diante da mesa de Jules, abria o Excel do seu notebook e 
listavam todos os compromissos e eventos pessoais e profissionais do chefe. Os 
compromissos profissionais eram repassados às secretárias da presidência e ficava a cargo 
delas contatarem os envolvidos. Quanto à parte pessoal, cabia a Amanda resolver. Desde 
buscar o terno na lavanderia até a compra de novos aparelhos celulares para ele ou para a 
governanta, Annie, ou a organização de um jantar beneficente. Tarefas múltiplas e variadas. 
Quase como um casamento, sem sexo. 
-Alô? 
-Pensei em ir à sua casa perto das oito horas, não sabia que monsieur já estava me 
esperando... 
Mentira, ela sabia que Jules Brienne acordava às seis horas da manhã. E mais, 
caminhava na esteira por trinta minutos; tomava uma ducha quente às 06h30min; tinha o 
café preto sem açúcar servido às 06h35min; lia, pelo menos, três jornais durante o desjejum; 
vestia a roupa, escolhida por Amanda, depositada num pequeno sofá no closet quilométrico 
(aliás, a escolha das roupas a serem usadas por ele, ao longo da semana, era determinada 
nas reuniões de segunda-feira; roupas essas para todo e qualquer evento público) e dirigia 
seu Citroën até a empresa. Quando viajavam a rotina era outra; mas ainda assim, uma rotina 
a ser seguida. 
- D’accord, venha agora. 
E desligou. 
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Ela ainda ficou por um tempo fitando o celular. Um pensamentinho teimoso latejava-
lhe dentro da mente: será que lhe faltava ambição? Contentar-se em ficar à sombra de um 
homem poderoso, mas à sombra, era tudo o que mais queria na vida? Não, claro que não. 
Ela também queria casar e ter filhos. Quase gargalhou. Amanda Rossi, você está regredindo 
anos-luz, censurou-se divertida. 
À porta, um semideus do Olimpo varria-lhe com o olhar. Ele desencostou-se 
preguiçosamente do batente e, caminhando devagar, cobriu o espaço entre ambos. Usando 
o próprio corpo, empurrou-a contra a parede sem deixar de desafiá-la silenciosamente. 
Parecia um felino encurralando a presa. Entretanto, a presa precisava imediatamente fugir, 
porque outro felino esperava por ela. Tentou desvencilhar-se dos braços de Jacques sem 
demonstrar grosseria. Na primeira tentativa, ele apenas sorriu e alçou a sobrancelha num 
tom de surpresa. E era como se lhe dissesse: “O que?, acha que pode comigo?” Mas ela não 
estava brincando ou medindo forças, queria realmente encerrar o maravilhoso final de 
semana com um longo beijo e troca de telefones. Jacques, no entanto, tinha outras ideias. 
Prendeu-a contra a parede com o próprio corpo, soltou o nó do cinto ao redor do robe de 
seda e, num movimento ágil, pôs uma mão debaixo de sua coxa e ergueu-a o suficiente para 
que seu pênis a penetrasse. Enquanto ele a penetrava, Amanda tentava desvencilhar-se do 
abraço apertado que os mantinham grudados. Sentia o corpo quente, fraco e trêmulo. A 
selvageria de Jacques excitava-a. Mas a sua cabeça já não estava mais no ato, e a obrigação 
profissional clamava urgência. Estranhamente, queria soltar-se do homem que havia pouco 
se entregara de forma apaixonada. Novamente, não obteve sucesso. Ouvir a voz do chefe 
serviu-lhe como um banho frio. Voltava agora a ser disciplinada, pragmática e responsável. 
Essa era ela, e não a mulher inconsequente que convida para sua casa um estranho que 
conhece na rua. 
-Preciso trabalhar, Jacques. –murmurou, procurando escapar do abraço firme e 
desvencilhando-se do corpo dela. 
-É o que realmente quer fazer? – afastou-se para fitá-la e completou: - Não devo me 
intrometer na sua vida, Amanda, mas esse seu chefe já ultrapassou o limite do bom senso. – 
afirmou, ajeitando o pau duro e inchado dentro da cueca. Fez um careta quando soltou a o 
cós da cueca em torno da cintura, o membro comprimido projetando-se no tecido. 
Amanda não gostou de ouvi-lo falar mal do chefe. De fato, concordava com Jacques. 
O problema era que ele não conhecia Jules Brienne o suficiente para fazer tal observação. 
Soltou-se dele com um gesto brusco, procurou disfarçar a irritação com um sorriso forçado: 
- Nossa dinâmica de trabalho é bastante peculiar. Bom, tenho que trocar de roupa e 
sair. Quer me deixar seu telefone? 
Ele sorriu com charme e beijou-lhe a ponta do nariz. 
- Dei-me o seu, chèri. – esperou que ela o ditasse, mecanicamente, e rabiscou uns 
números no bloco de notas que Amanda deixava ao lado do telefone. Dessa vez, o número 
correto. – Se quiser, podemos jantar logo mais. Que tal? Espero que não seja aquele tipo de 
mulher cheia de regras e que se faz de difícil... – piscou-lhe o olho e brincou: – Sou muito 
preguiçoso. 
-Oh, sim, fui muito difícil mesmo. – debochou. 
No fundo, não estava satisfeita com o seu comportamento. Praticamente jogara-se 
para cima de Jacques. Que dificuldade ele tivera para conquistá-la? Por outro lado, quando 
lhe fora realmente difícil conseguir sexo? E para quê tantas regras de conduta e 
comportamento, se o objetivo final era apenas: sexo. Desencana, Amanda, alertou-se 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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prontamente. Como era mesmo que sua irmã lhe dizia antes de lhe roubar o namorado e 
casar-se com ele? Enquanto o homem certo não chegar, divirto-me com os errados... 
- Ah, puritanismo démodé... –riu-se de forma afetada. - Bien então a gente logo se 
fala... se o seu patrão permitir, claro. –concluiu, dando-lhe as costas e indo para o quarto 
vestir-se. 
 
Parou o automóvel em frente ao portão de ferro e esperou que um dos seguranças 
acionasse-o pelo controle. Cumprimentou o rapaz ruivo, vestido num terno escuro e entrou 
na estrada de pedras, ladeada por um pequeno bosque, até a entrada da mansão. 
Estacionou, desligou o motor e pegou a pasta. Ao descer do automóvel, deu uma boa olhada 
ao redor e disse a si mesma que jamais se cansaria daquele panorama. Não era a imponência 
ou a riqueza daquela construção; era mais a beleza de uma arquitetura antiga e tão bem 
preservada, como quase tudona França. Desde que chegara a Paris, vinda de Porto Alegre, 
deslumbrara-se com a história entalhada nas paredes dos lugares, como se num dado 
momento fosse possível apoderar-se de uma máquina do tempo e visitar outros séculos, 
tanto para o passado quanto para o futuro. E a prova era a mansão do século XIX à sua 
frente, que tinha como proprietário um homem da Era Cibernética. Mas o mais belo naquele 
lugar era a natureza, o bosque, as flores no jardim e o espaço organizado ao redor do 
chafariz antigo com cadeiras e estátuas. Havia cinco anos, pelo menos, que a decoração 
devia ser assim. Amanda presumira ao chegar que madame Brienne fora a responsável pela 
decoração. 
Suspirou profundamente e olhou para o céu azul. Frio e céu azul, novembro em Paris 
prometia castigar a pobre latina. Ajeitou-se no casaco, espichou o tecido da saia justa até os 
joelhos e observou se havia algum fio corrido da meia-calça 7/8 de seda. Usava sapatos cujos 
saltos, invariavelmente, tinham 10 cm. Precisava dessa altura já que seguia por toda a parte 
um homem com quase um metro e noventa. Olhou-se no reflexo do vidro do carro e viu que 
seus lábios estavam inchados, as pálpebras semicerradas com languidez e os olhos 
brilhavam como se tivesse com febre. Tinha a expressão de uma fêmea bem servida. Sorriu 
consigo mesma e pensou: Ah, como é bom ser mulher! 
Seu ânimo mudou radicalmente, quando a governanta abriu a porta. Era incrível, mas 
Amanda sentiu uma borrifada de ar frio na face e um espasmo entre as vértebras. Toda a 
beleza externa desaparecia dentro daquele sepulcro de móveis escuros e pesados, nos 
tapetes persas, no tecido do papel de parede e nas próprias paredes. O ambiente era 
sofisticado e impessoal. Amanda não lembrava, ao longo desses cinco anos trabalhando para 
Jules Brienne, as vezes que entrara ali. Porém, sempre sentia a mesma sensação: frieza. O 
lugar parecia-se mais com um cenário de filme no qual os móveis e os ornamentos eram 
montados e desmontados todos os dias. Estava longe de se parecer com um lar. E a 
atmosfera, úmida e sombria. Talvez até doente. Era como se Rochelle Brienne estivesse em 
cada peça, em cada cômodo como um fantasma que se esquecera de morrer, um fantasma 
vivo preso a tubos. 
Annie conhecera Rochelle antes do acidente. Fora trabalhar com os Brienne assim 
que se casaram, havia sete anos. A governanta era uma mulher que um dia fora bonita e o 
tempo ou a vida se incumbira de marcar-lhe a face. Solteira, na faixa dos cinquenta, cabelo 
grisalho e longo, sempre preso num coque. Comandava a dezena de empregados 
distribuídos em várias tarefas na mansão. Era uma mulher simpática, doce e metida à mãe 
de todos. Usava sempre um vestido azul marinho, justo, até os joelhos e sapatos de saltos 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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baixos, porque – segundo ela – “não lhe atacavam a coluna.” Os demais empregados usavam 
uniformes beges. 
-Como vai tudo por aqui, Annie? 
Chamar-lhe diretamente pelo primeiro nome fora um avanço. Os franceses não eram 
tão comedidos e, como não dizer, retraídos como os ingleses, mas também prezavam a 
distância segura entre subalternos. 
- Esse frio endurece as minhas juntas. -reclamou ao lado de Amanda enquanto 
subiam os degraus da escadaria acarpetada que levava até o segundo andar, onde ficavam 
os quartos, o escritório e o terraço. 
Ao passar pela porta fechada do quarto onde ficava o leito hospitalar com madame 
Brienne em coma, Amanda sentiu um aperto no estômago. Num impulso, virou-se e 
perguntou a Annie: 
-Há alguma chance de madame Brienne sair do coma? 
Annie parou no corredor e, com um gesto discreto, olhou ao redor antes de 
responder-lhe num tom baixo: 
-Cinco anos em coma profundo, os médicos não são muito otimistas. Se ela voltar, 
jamais será como antes. 
-Annie, por que monsieur Brienne nunca entrou nesse quarto? 
Custava-lhe compreender um marido que mantinha tamanha distância da mulher 
doente. Ele havia gasto uma fortuna em equipamentos modernos e numa eficiente e 
caríssima equipe médica e de enfermagem. No entanto, não se aproximava. O simples gesto 
de girar a maçaneta da porta e entrar, não era feito. Que tipo de marido agia assim? 
- O que mantém aquele corpo vivo é o coração, não o cérebro. E monsieur Brienne é 
um homem racional que tem plena consciência de que está fazendo o melhor que pode. 
Independentemente de sentimentalismos inúteis, pode-se dizer que ele é o melhor marido 
do mundo. 
Um marido sensível que evitava ver a decadência da esposa ou um marido frio que 
cumpria com suas obrigações morais? Será que monsieur Brienne pensava em ter seus 
próprios filhos um dia? Mas, como, se era casado com alguém que já não pertencia mais ao 
mundo, conscientemente? 
Consultou o relógio de pulso e pelo horário concluiu que o encontraria no escritório. 
Annie indicou-lhe o terraço e declarou: 
- Hoje o expediente começou bem mais cedo, ele mal tocou nos croissants. Isso é 
raro, vindo de alguém que gosta de comer. 
Maus pressentimentos. 
-É a síndrome de segunda-feira, dia em que os workaholics sentem-se compelidos a 
compensar o pecado de existir o domingo. –brincou. 
Annie pôs as mãos na cintura roliça, franziu as sobrancelhas e disse com aquele jeitão 
de mama italiana que nasceu na França: 
-Fiquei aqui este fim de semana, e monsieur Brienne saiu do escritório apenas para 
almoçar na cozinha comigo. E ainda assim barbeou-se e vestiu uma camisa social para não se 
sentir tão deslocado num domingo em casa. 
Era impossível não rir. 
Annie deu-lhe um tapinha amistoso no ombro e voltou ao seus afazeres, deixando-a 
em frente às portas duplas, de vidro, fechadas do terraço. Abriu-as e atravessou o espaço, 
tomado por inúmeras plantas em vasos de cerâmica, alcançando a mesa redonda para 
quatro lugares onde estava o chefe. Concentrado diante da tela do notebook, Jules Brienne, 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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em princípio, não lhe percebeu a presença. O cabelo preto, úmido do banho, estava 
impecavelmente cortado, com a nuca exposta e as mechas lisas e curtas dando-lhe um 
aspecto do que realmente era, um executivo. A pele nívea pouca vezes recebia o sol e, na 
altura dos maxilares, a eterna marca azulada de quem teimava com a própria barba. Tinha 
um nariz reto que encimava lábios duros, o inferior ligeiramente mais carnudo que o 
superior; abaixo, o queixo másculo. Seu chefe era belo? Sim, sem dúvida. Seu chefe era 
sexy? Amanda procurou varrer tal ideia da mente, mas quando ele desviou os olhos sérios e 
compenetrados do que lia e endereçou-os a ela, numa espécie de interrogação sutil, teve 
certeza de que aquele olhar arrancava alguns vestidos do corpo. 
Por um momento ficaram se olhando, como se alguma coisa estivesse fora do lugar. 
Ela até pensou se a sua maquiagem estava borrada ou inadequada para o horário e isso foi o 
suficiente para abalar-lhe a autoconfiança. O estranho era que o chefe parecia esquadrinhar-
lhe o rosto como se a investigasse ou procurasse algo. Saberia que ela havia transado feito 
uma doida no final de semana? O sangue subiu-lhe à face. 
-Faça reservas para hoje à noite, em um restaurante discreto, no centro. Mesa de 
canto e longe de tumultos. - começou a distribuir tarefas: - Busque o meu terno na 
lavanderia. Preciso de colônia e outro par de sapatos, o tamanho é... 
- 42, monsieur. Cítrica ou amadeirada? 
Deu de ombros, voltando-se novamente para o computador. 
-A de sempre. 
Anotação: Blend amadeirado. Ainda escrevendo, perguntou-lhe com naturalidade, 
apesar de detestar improvisos e imprevistos: 
-Esse jantar é novidade, digo, tão em cima da hora. Eu não o tenho agendado... - 
folheou as páginas da agenda. 
-Não é um jantar profissional. Vamos nos encontrar com o homem que me ajudou no 
início da SBO... 
- François Roche. – interrompeu-o, sorrindo. 
Jules levantou a cabeça e disse com uma dose de ironia, que ela não pôde deixar de 
observar: 
-Pelo visto, fez o dever de casa, mademoiselle Rossi. 
Ele não era um homem irônico.Tudo o que tinha de falar, dizia claramente, sem 
meias-verdades, sem diplomacia ou eufemismo. A ironia surgia-lhe quando estava de mau 
humor. 
-Mesa para três? – Sempre se sentia compelida a lhe fazer tal pergunta, caso ele 
decidisse levar alguma amiga. No entanto, era ela quem tinha de acompanhá-lo, mesmo 
num evento pessoal. Era uma espécie de acordo tácito entre ambos, a assistente não 
perguntava o porquê e o patrão não lhe explicava a necessidade de sua presença. Na 
verdade, uma dinâmica bastante peculiar, como Amanda havia dito a Jacques. 
 -Non, ele levará a esposa. – respondeu com naturalidade e disposto a encerrar o 
assunto jantar. Antes de voltar-se para o computador, fez um gesto com a mão indicando-
lhe a cadeira à sua frente. 
Amanda abriu os primeiros botões do casaco, sentou-se e pôs a agenda sobre a 
mesa. Percebeu que o chefe bebia apenas café preto e, se dependesse dele, ficaria por isso 
mesmo. Pegou uma torrada integral, depositou uma camada generosa de geleia de cereja e 
serviu-lhe no pratinho ao lado de sua xícara. 
-Essa será sua única refeição até às 14 horas. Coma pelo menos uma torrada. – 
sugeriu. 
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Já estava acostumada a pensar pelos dois e nem precisava mais de permissão para 
determinadas coisas, como, por exemplo, servir-se de café à mesa do patrão, ou abrir as 
gavetas e o guarda-roupa dele a fim de fazer um levantamento das roupas para caridade e 
as que deveriam ser substituídas. E, mais do que isso, tinha total liberdade para comprar um 
guarda-roupa inteirinho para ele e para si mesma, caso quisesse. Ela, andando ao lado do 
presidente da empresa, era o cartão de apresentação da SBO e tinha todas as suas despesas 
com lojas e cosméticos pagas pelo seu empregador. E não podia ser de outro jeito, dado o 
padrão altíssimo de Jules Brienne. 
Ele mordeu a torrada sem deixar de se comunicar com a subsidiária de Roma, através 
do serviço de mensagens instantâneas, no notebook. Deu cabo dela rapidamente, parecia 
faminto, mas paralisado diante do computador. Será que se alimentava de trabalho? Serviu-
se de café e observou as anotações na sua agenda, precisava de algumas decisões: 
-Devo confirmar sua presença no jantar de mademoiselle Geneviève? 
Um grupo de senhoras da sociedade havia-o convidado a participar de um centro 
social para vítimas de violência doméstica. Jules enviara-lhes um cheque pessoal bastante 
polpudo. Agora, as socialites queriam-no como presidente de honra, e ele tentava escapar a 
todo o custo. O jantar beneficente seria na sexta-feira e o valor de cada mesa era 
simplesmente astronômico. No entanto, tal dia entrava em conflito com uma reunião no La 
Coupole com um grupo de americanos. 
-Mande outro cheque para mademoiselle Geneviève, valerá bem mais que a minha 
presença. – afirmou taxativo. 
-Aliás, hoje, às duas horas, monsieur almoçará com...- ela leu com certa dificuldade o 
nome finlandês que fora anotado, - monsieur Jarkko Koskinen. Fiz reserva no Les Ombres. 
Caso queira trocar-se, levarei outra camisa para seu escritório. 
- D’accord. Se tiver tempo, compre aspirina. – mandou sem tirar os olhos do 
computador. 
-E faça uma tomografia. – completou ela com naturalidade, sem desviar os olhos do 
que escrevia na agenda. 
Ele fechou o notebook, guardou dentro da pasta executiva e voltou-se curioso: 
-Como...? 
Até onde você pode ir com esse atrevimento?, censurou-se. 
-Em vez de tomar aspirina, por que não vai ao médico? 
Jules Brienne não estava acostumado a ser questionado. Era visível que a indagação o 
incomodara, mas sendo um homem educado, preferiu contornar a situação a fim de evitar 
constrangimentos. 
-Aspirina e café resolvem o problema. – disse categórico; em seguida, emendou de 
forma mais suave: - Agradeço a atenção, mademoiselle. Agora, vá ter com Annie, s'il vous 
plaît. Encontramo-nos no escritório. 
Menos de dez passos, ele atravessou o terraço e saiu. Viu a xícara de Jules vazia. 
Lembrou-se do que ouvira no Brasil, que se bebesse no copo ou na xícara de alguém saberia 
os seus segredos. Riu-se dos próprios pensamentos. Santa bobagem!, diria Robin, pensou 
Amanda dando de ombros jocosamente 
Evitou olhar para a porta fechada do quarto de Rochelle Brienne. Podia-se ouvir o 
barulho dos aparelhos que a mantinham viva. Não devia ser fácil conviver com esses sons 
todos os dias. E ainda estranhavam o fato do executivo não sorrir. Encontrou a governanta 
dando ordens às camareiras e recebeu de suas mãos uma lista de compras. Sim, Amanda 
teve de ir ao mercado fazer compras. 
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Capítulo III 
 
 
 
Dorian possuía estatura mediana, muito magra, fumante e usava o uniforme da SBO, 
criado por um estilista argelino de 20 anos. Um tailleur cinza-chumbo, que favorecia a 
silhueta das magras e também das que não o eram. Os homens, terno e gravata. Somente o 
alto escalão corporativo estava livre para desfilar seus ternos escuros, sobretudo cinza ou 
preto e, constantes e variados, cachecóis. As executivas, saias justas até os joelhos, calças de 
costura reta e casaquinhos. Parecia que feminilidade rimava com fragilidade e, grande parte 
delas, escondia as curvas. Amanda exibia-as sem descuidar da elegância e discrição. 
Pisou no acelerador e adentrou no subsolo, onde se localizava o estacionamento da 
empresa. Quando entrou no elevador panorâmico e apertou o botão da cobertura – o andar 
com a sala da presidência e o auditório para as conferências – viu-se refletida no espelho. 
Quase gritou. Como não havia percebido o chupão quase arroxeado no pescoço? Levou a 
mão à mancha e esfregou-a como se fosse uma sujeira qualquer. Doce ilusão. Só fez irritar a 
pele deixando-a vermelha ao redor do hematoma. Estava tão encantada com a aventura 
erótica com Jacques Rodin, que diante do espelho de casa só vira o que lhe interessara. 
Annie vira o chupão. Que vergonha! Fechou os olhos para apagar a imagem na mente. Quem 
mais? Quem mais? Quase gritou, histérica. Jacques (que ficara quietinho e não lhe avisara), o 
porteiro de seu prédio (que era meio míope e, mesmo se não fosse, discreto como era, nada 
comentaria, nem sequer uma piadinha), os seguranças da mansão de seu chefe... e... o seu 
chefe? oh, céus, por isso aquele olhar estranho, longo e investigativo quando ela entrou no 
terraço! Amanda tinha um outdoor no pescoço gritando: fui chupada, vejam! 
A latina que caminhava sobre saltos altos exalando cheiro de primavera e remexia o 
quadril ligeiramente como se o mesmo tivesse sido deslocado ao nascer, mesmo discreta, 
daria material para as fofoqueiras da rádio-corredor. 
Quando as portas do elevador abriram, Amanda vislumbrou o topo da cabeça de 
Dorian por detrás do balcão alto, de cedro. Bateu com a chave do carro sobre a madeira, e a 
secretária deu um pulo e arregalou os olhos: 
-Nossa, Amanda, se você fosse uma cobra me picava... 
-E se eu fosse o nosso VP? – questionou com a sobrancelha erguida. 
O vice-presidente da SBO chamava-se Victor Marcell Touleause, tinha 44 anos, 
graduado na Sorbonne, casado com uma estilista de moda, três filhos e uma vocação incrível 
para sermões moralistas. Ele exigia a perfeição de todos. Ou seja, devia ter algum problema 
psicológico... 
- Nem me fale!, com a sorte que tenho seria ele mesmo. 
-Calma, Dorian, monsieur Touleause está em Roma e há pouco conversava com o 
monsieur Brienne. Agora, olha bem pra mim... 
A secretária parou de digitar e fitou a colega de trabalho. Num minuto, surgiu-lhe na 
face um olhar malicioso acompanhado por um sorrisinho safado: 
- Qual o nome dele? Calogero? 
Amanda sentiu as bochechas pegarem fogo. Ignorou a brincadeira da outra, deu a 
volta no balcão e pegou-a pelos ombros: 
-Preciso de base, pó compacto, quero dizer, pancake! Balde de tinta também serve! 
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A secretária revirou o bolsão de couro que deveria conter inclusive sua mobília. 
Depois de muito “escavar”, estendeu à Amanda abase líquida, com protetor solar, para 
peles de loiras quase transparentes. O que não era o caso da tez dourada de Amanda. 
Agradeceu e enfiou-se no banheiro de sua sala que, mesmo anexada à de Jules Brienne, 
possuía banheiro próprio e uma outra entrada, lateral, que, caso a porta de comunicação 
entre os dois escritórios estivesse fechada (e isso raramente acontecia), ela não seria vista 
entrando. E nem teria visto a personagem alta, sofisticada, com um longo pescoço e imensos 
olhos verdes, sentada em frente à mesa do chefe. Entretanto, mesmo quase trocando as 
pernas e segurando o pancake como uma menina inocente segura o “sagrado” anel de 
noivado, com sua visão periférica, percebeu o ataque felino àquele que, como sua assistente 
pessoal, deveria zelar, proteger e preservar. 
Depositou uma farta camada de maquiagem sobre o hematoma e, sem cronometrar, 
concluiu que levara vinte segundos para a operação. Ajeitou o cabelo e estufou os peitos. Já 
não era a primeira vez que enfrentava uma mulher com segundas intenções burlar-lhe a 
segurança. A talzinha não aceitava uma negativa em relação ao cargo oferecido a Jules, não 
aceitava apenas o polpudo cheque, ah, não... Vinha pessoalmente revirar-lhe os bolsos? Ou, 
melhor, tirar-lhe as calças? 
Entrou na ampla sala, de móveis modernos, com poltronas em vez de cadeiras, em 
frente à mesa de vidro e aço e observou algumas irregularidades. Primeiro, as cortinas ainda 
estavam cerradas, a máquina do expresso desligada (detalhe: logo que começava o 
expediente, Jules Brienne nem precisava pedir para que ela preparasse o seu expresso. Ele, 
sozinho, nem ligava a máquina) e as canecas de cerâmicas com restos de café do dia 
anterior, esquecidas sobre a estante que ladeava uma imensa planta verde, para variar. 
Antes de qualquer intervenção na cena, Amanda observou os personagens em 
questão. A linguagem corporal falava tudo e era a comunicação mais verdadeira que existia. 
Monsieur Brienne, sentado e com as costas relaxadas contra o encosto da poltrona, exibia a 
atitude de quem ouve um palestrante. Havia em seu rosto uma expressão de alheamento 
lutando bravamente com a concentração, mais como um gesto de educação e polidez do 
que fingimento. A face estava relaxada, sem os sulcos entre os olhos quando os mesmos 
revelavam tensão e reflexão, era mais como se seus pensamentos estivessem brincando no 
playground mas, a qualquer momento, seriam chamados ao trabalho duro. Fosse pelo o que 
a loira tivesse falado anteriormente, ele parecia esperar pela parte “séria” da conversa e 
talvez isso realmente significasse a visita dela logo pela manhã. Os lábios contraídos, o 
queixo duro e os olhos sérios e sagazes investiam diretamente no rosto de Geneviève, sem 
desviar, sem descer para as pernas ou para o notebook aberto à sua frente. 
Amanda podia morar num apartamento de quarto-e-sala, do tamanho de uma 
ervilha, dirigir um automóvel popular russo, ralar num emprego sem direito à liberdade 
condicional, vir de família simples, ter nascido no terceiro mundo, etc., mas ela sabia o que 
tinha de fazer e como fazer. E fez: 
-Bonjour, mademoiselle Geneviève – disse com um sorriso profissional, sem mostrar 
muito os dentes e sem ser arrogante (por um triz!). 
A outra quase pulou da cadeira ao ouvir-lhe a voz, estava tão concentrada na Arte de 
Conquistar que se dissociou do resto do mundo. Ajeitou-se na poltrona, descruzou as pernas 
e adquiriu uma postura mais fechada, ou seja, retraiu-se na expressão de impessoalidade. 
No entanto, ela não sabia que a assistente do presidente já lhe havia pego em flagrante. 
O chefe, por outro lado, parecia aliviado com a sua entrada. Olhou-a de cima a baixo 
e, num gesto silencioso porém bastante significativo, desviou para a máquina do expresso. 
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Amanda assentiu e ligou-a. Ouviu o cumprimento baixo de Geneviève, abriu as cortinas e 
retirou as xícaras usadas. Ao voltar, parou entre ambos e indagou à fulana se gostaria de um 
café. 
- Merci. –emendou com um sorriso educado. 
Boa forma de espichar uma visitinha supostamente profissional. 
Deixou-os por um momento, pois precisava buscar novas xícaras no refeitório, no 
quinto andar. Passou por Dorian e endereçou-lhe um sorriso amarelo. A moça aproveitou 
para chamá-la até o balcão: 
-Dizem que essa aí será a futura madame Brienne. –depois brincou: - Seja boazinha 
com ela, oui! 
- Duvido, ele não gosta de mulher fútil. 
-Não se engane pelas aparências, Amanda. Mademoiselle Geneviève criou esse 
centro social a pedido de monsieur Brienne. Parece que a mãe dele apanhava do marido, 
que, na verdade, era-lhe o padrasto. Ele cresceu vendo a mãe levar uns tabefes, coitado, e 
ainda por cima era filho único. 
-E depois dos 17, completamente órfão. – completou Amanda que sabia, aos 
pedaços, algumas coisas sobre Jules Brienne. Lembrava que sua mãe morrera num acidente 
aéreo, e quem o acolhera em sua casa e lhe pagara a faculdade fora François Roche e sua 
mãe, amiga de Vivien Brienne, mãe de Jules. Vinte anos de diferença entre François e Jules, e 
fora o primeiro que dera todo o suporte para que o segundo se iniciasse no ramo de 
computadores. Amanda sabia também que François era casado havia uma década e meia 
com uma professora universitária. 
- A moça já conseguiu estabelecer um vínculo com monsieur Brienne e quer estreitá-
lo ainda mais. 
- Quanto tempo tem esse centro social?, dois ou três meses, não é? Está me 
parecendo um vínculo bastante recente. - comentou com desdém. 
-É, pode ser, mas alguém tem que dar o primeiro passo. A bem da verdade, Amanda, 
monsieur Brienne não tem ninguém há cinco anos. Ele é homem, um macho alfa, precisa de 
uma fêmea, non? – indagou sorrindo, divertida. 
Amanda não estava gostando do rumo da conversa, deu de ombros e disse já se 
afastando do balcão em direção a um dos elevadores: 
- No momento, ele precisa mesmo é de cafeína, Dorian. – encerrando o assunto. 
Quando voltou, preparou os dois cafés e depositou a xícara na mesa do “macho alfa”; 
em seguida, entregou a outra à Geneviève, que mexeu os lábios simulando um sorriso 
polido. Com aquela aparência e pose podia bem ser a nova madame Brienne. Além do mais, 
o chefe, agora, parecia mais interessado na conversa (ou em Geneviève) e, provavelmente, 
devido ao café forte e quente, uma aura de suavidade atenuava-lhe a feição circunspecta. 
Talvez quando Amanda descera ao quinto andar, a conversa tenha se encaminhado para 
algo mais íntimo. O fato era que ela sorria mais e ele, mesmo sem sorrir, apresentava visível 
prazer em sua companhia. 
Amanda voltou à sua sala, pegou alguns papéis que precisavam da assinatura do 
executivo e não se surpreendeu ao ouvir de lá: 
- Não acredito! Abrirá uma filial em Helsinque? Faz uma semana que voltei da 
Lapônia, esquiei até quase acabar com meus joelhos. – era Geneviève. 
-A Finlândia sempre me interessou, mas somente agora surgiu a oportunidade de ter 
uma subsidiária num país escandinavo. Há um rapaz de lá, Jarkko Koskinen, que fará a ponte 
entre Paris e Helsinque. –disse, bebendo o restinho do café. 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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- Você precisa passar, pelo menos, um final de semana na Finlândia, mas a passeio. 
Podemos combinar e irmos juntos, seria bom relaxarmos um pouco. Aliás, Sonia e François 
também poderiam ir. 
A mocinha quase bateu palmas, parecia que tinha treze anos de idade. Jules sorriu 
polidamente, pois sua atenção desviava-se de Geneviève para Amanda, já que a última 
acabava de voltar à sala segurando apenas duas folhas timbradas com o monograma da SBO. 
-E a aspirina, mademoiselle Rossi? 
Amanda girou nos calcanhares e fitou-o como quem diz: o que eu tenho a ver com 
isso? Mas como ele a olhava duramente, sentiu-se na obrigação de informar que não havia 
comprado os comprimidos. Geneviève, por sua vez, mexeu-se na poltrona ensaiando uma 
retirada. 
-E por que, non? – insistiu, desconfiado. 
-Já disse: faça a tomografia e eu compro aspirinas.Meu tio tinha dores de cabeça 
quase todos os dias e acabou sofrendo um derrame cerebral aos 45 anos. 
 Jules Brienne estreitou os olhos e moveu o lábio inferior ligeiramente para baixo, 
numa expressão de menosprezo, os sulcos entre as sobrancelhas acentuaram-se. O corpo 
não mexeu um músculo, tenso, preparado para ordenar, ignorava a visita e o fio de sol 
riscando-lhe parte do maxilar. Amanda lia tudo isso, porque o conhecia e sabia até onde 
podia ir. Mas tal conhecimento a respeito da sua personalidade não a impedia de fazer o que 
considerava correto. 
- Mademoiselle Rossi, compre as aspirinas agora. – disse com estudada calma. 
- Não quero ser responsável pelo seu derrame cerebral, monsieur Brienne. Caso 
pretenda ser irresponsável para com sua própria saúde, que o faça por si mesmo, sem 
cúmplices. – rebateu com calma, como se falasse com uma criança teimosa. 
Geneviève agitou-se, cruzou e descruzou a pernas, empertigou-se na poltrona 
visivelmente desconfortável. Do outro lado da mesa, uma fera silenciosa e engravatada 
erguia-se sem tirar os olhos da assistente. Ops!, havia ultrapassado a fronteira, Amanda 
concluíra ao perceber que Jules Brienne digeria com dificuldade a insubordinação. 
- Desde quando é a guardiã da minha saúde? – a voz era baixa, controlada. 
- Há cinco anos ouço a mesma bobagem, “cadê a aspirina”?, e há cinco anos sugiro a 
monsieur que faça uma tomografia. Por acaso é uma queda de braço? – ela não só jogou as 
palavras na cara dele, como também empinou o nariz e deu dois passos para frente, em sua 
direção. 
-Cinco anos com dores de cabeça, é perigoso, Jules. – afirmou Geneviève com a voz 
sumida, tentando amainar o felino preparado para pular no pescoço da assistente. 
Ele era um executivo, e não um menino birrento. Trabalhara duro para erguer um 
império que alcançava oito países europeus. Era experiente, culto, pragmático e tinha quase 
quarenta. Amanda provocava-o deliberadamente, porque às vezes precisava polir o SEU 
orgulho, o SEU ego e mostrar-lhe os motivos pelos quais ela ainda trabalhava ali: jamais 
abaixara a cabeça para quem quer que fosse. Além disso, era uma mulher de princípios. E 
Jules Brienne tinha de fazer uma tomografia cerebral antes de merecer um frasco de 
aspirinas, ora! 
De repente, ele desceu os olhos dos seus e contemplou descaradamente o 
hematoma mascarado com o pancake. Um brilho de sarcasmo serpenteou os olhos escuros 
e tão cheios de severidade, havia neles, também, um misto de exasperação. Parecia que ele 
mesmo estava no seu limite e nada tinha a ver com aspirinas e tomografias. Por quê?, ela 
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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perguntava-se sem deixar de enfrentá-lo. Num minuto, admirou a própria derrocada. Ele 
apertou o interfone e ordenou: 
-Compre dez vidros de aspirinas, mademoiselle Cuvier. 
Por um segundo ou dois, Dorian não compreendeu a ordem. Entretanto, quando deu 
por si já sabia que o chefe havia discutido com a subordinada. 
Geneviève aproveitou a deixa e uma vez que Jules estava de pé, fez o mesmo e 
estendeu-lhe a mão. 
-Jules, foi um prazer. Espero a sua visita no nosso centro social, viu? 
Ele apertou-lhe a mão e com um gesto de cabeça assentiu. Resmungou algo e 
indicou-lhe a porta de saída. Amanda acompanhou-a controlando uma crise de risos. Jules 
comportara-se como um menino desafiando a autoridade e, em seguida fora mal-educado 
com Geneviève. Aguentara mais de quarenta minutos de conversa sendo polido para, 
depois, quase jogar a mulher para fora de seu escritório. 
Ao voltar-se o encontrou ainda de pé, a cara amarrada de sempre, os lábios 
constritos. 
-Foi o bom senso que lhe deixou essa marca no pescoço? –apontou-lhe o pescoço. 
Um buraco, por favor! 
-Fui ferida gravemente, monsieur. – mentiu fingindo-se ofendida. 
-Você representa a presidência e não é nem um pouco sensato de sua parte trabalhar 
com um hematoma sexual na face. –afirmou com um leve tom de desprezo. 
Hematoma sexual? 
-Pardon, mas isso é um ferimento causado por...por... -gaguejou e esqueceu todas as 
palavras do vocabulário francês. A única expressão que lhe vinha à mente era “je suis 
désolé”. Hã? Por fim, suspirando exasperada, disse: - Se quiser emborcar os dez vidros de 
aspirina, eu posso ajudá-lo com prazer. 
Dito isso, girou nos calcanhares e encaminhou-se para a sua sala. Sentia todos os 
músculos das suas costas latejarem e era como se os olhos de Jules Brienne os apertassem 
um a um. Fogo na nuca, ácido no estômago, garganta seca. Não era uma mulher covarde, e 
tampouco uma Joana D’Arc. Defendia a si mesma e os seus valores, apenas isso. Havia cinco 
anos que eles discutiam e faziam as pazes sem precisarem pedir desculpas... Epa!, sem que 
ELE pedisse desculpas. Assim, ela voltou à sala do chefe para lhe falar e o encontrou tirando 
o paletó: 
-Retiro o meu pedido de desculpas, monsieur Brienne. 
-Pedido aceito, mademoiselle Rossi. 
Ora, bolas! Alguém ali falava grego? 
Ele ficou um tempo com o paletó na mão, perdido, olhando para os lados. Amanda 
não resistiu, deixou a irritação de canto e aproximou-se: 
-Dê-me aqui, tem um cabide no armário para guardá-lo. 
Como ele podia saber?, Amanda pensou. Toda a vez que chegavam ao escritório pela 
manhã, retirava o paletó, estendia para a assistente que o guardava no armário. Às vezes, 
ela tinha até que ajeitar-lhe a gravata. 
Parecia sem jeito quando lhe indagou: 
-Comprou a colônia certa, pelo menos? 
- Oui, monsieur. 
 
 
 
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Capítulo IV 
 
 
 
O Les Ombres era sofisticado e tinha como um dos atrativos, a vizinhança. Ao seu 
lado, a Torre Eiffel. E esta era admirada através do teto disposto num trançado de ferro e 
vidro e nas paredes envidraçadas. Outro atrativo localizava-se abaixo dele, o Museu Quai 
Branly cuja fachada exibia um dos mais famosos jardins verticais do mundo, Le Mur Vegetal 
,concebido por Patrick Blanc, com mais de cento e cinquenta mil plantas de diversas partes 
do mundo. Diversidade essa que se via também entre as pessoas que frequentavam o 
restaurante na cobertura do museu. Mesas pequenas e quadradas, poltronas confortáveis 
no lugar de cadeiras e atendimento algumas vezes lento. Mas não naquele início de tarde. 
Numa mesa próxima à parede envidraçada, longe de tumultos (como dizia Jules), 
estavam uma brasileira, um francês e um finlandês. Todos degustando a badalada cozinha 
francesa regada por um bom vinho. 
Jarkko Koskinen aparentava uns trinta anos, porém, sendo escandinavo, poderia ter 
vinte e poucos. O cabelo era loiro, cor de trigo, a pele avermelhada e os olhos incrivelmente 
azuis. Parecia-se muito com o chef inglês bonitinho, o Jamie Oliver. Vestia-se com discrição, 
nada mais que um terno cinza quase azul. Comia como um viking, apesar de ser magro. Era 
um homem simpático, comunicativo e inteligente. Anos atrás, começara uma empresa de 
criação e venda de software, vendera a sua parte ao sócio para disputar o rali Paris-Dakar. 
Agora, voltava ao mundo dos negócios na mesma área que tanto conhecia. 
Amanda prestava a atenção em tudo que se dizia nos almoços e jantares. Quando 
Jules esquecia-se de alguma informação ou detalhe, perguntava-lhe e ela o informava sem 
pestanejar. Era por isso que ele levava-a a todos os eventos pessoais e profissionais 
possíveis. No momento, entretanto, mal ouvia a conversa dos dois, tinha algo a ver com 
mercado, bolsa de valores e impostos. Típica conversa de negócios, só mudava o país, a 
burocracia era a mesma. 
Faltavam os sapatos. Pela manhã, Jules havia-lhe pedido que buscasse seu terno na 
lavanderia e que lhe comprasse um par de sapatos. 
- Caso ainda tenha alguma dúvida sobre o potencial do mercado finlandês que, bem 
ou mal, acaba influenciando o sueco e o russo, volta comigo para Helsinque. Fica um tempo 
conosco, conheça os executivos de lá e estude as pesquisas mercadológicas mais recentes. 
Jules assentiu levemente com a cabeça, e Amanda quase podia ver-lhe os 
pensamentos rolando dentro da mente comobolas de bilhar. Por fim, ele tomou mais um 
gole de vinho, olhou ao redor à procura do garçom e disse: 
-Você quer sobremesa ou café, mademoiselle Rossi? 
Antes que respondesse o finlandês sorriu e comentou: 
-Nunca vi um povo que gosta tanto de açúcar como o francês. –em seguida, ainda 
sorrindo voltou-se amistosamente para Jules – Sabe o que podemos fazer? Uma reunião 
entre os executivos escandinavos e o senhor, como uma espécie de dinâmica de 
reconhecimento e troca de experiências. 
No fundo da sua memória, uma burguesia enjoada chamada Geneviève batia palmas 
dizendo: vamos, vamos! 
- Como está minha agenda para os próximos dias? 
Folheou algumas páginas e constatou que a partir do final da semana, haveria 
brechas disponíveis para novos eventos. Jules observou os comentários de Amanda, voltou-
Obsessão em Paris � Veronique Gris 
 
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se para Jarkko e confirmou a ida para Helsinque em três dias. Endereçou um rápido olhar à 
assistente e pediu: 
- Reserve duas passagens na primeira classe para Helsinque, na sexta-feira. – 
voltando-se para Jarkko, indagou: - Até quando fica em Paris? 
-Amanhã pela manhã. Mas tudo estará pronto para quando chegar. Não se preocupe 
com as reservas no hotel, mademoiselle Rossi, eu mesmo as farei. 
-Merci, monsieur Koskinen. –agradeceu incluindo um sorriso. –Agora, devo ir, 
monsieur Brienne. 
-D’accord. –concordou Jules. Fez um sinal com o dedo indicador apontado para baixo 
e avisou-lhe quase num murmúrio: - Italiano, oui? 
Assentiu com a cabeça, pegou a bolsa e saiu do restaurante, desviando das mesas, 
cadeiras e garçons. Temia que a boutique onde sempre comprava os sapatos, meias e 
gravatas preferidas do chefe, já estivesse fechada. O proprietário sofria de transtorno 
bipolar; assim, abrir a loja para ele não era tarefa fácil. Dependia, obviamente, de seu 
humor. Despediu-se dos homens, partiu em disparada e alcançou a calçada entupida de 
gente. Constatou que eram quase três da tarde e não era preciso agitar-se tanto. O 
problema era que ela queria o sapato CERTO, do jeito que escolhera todos os outros, pois 
sempre acertara a preferência do patrão. 
Comprou o sapato, passou na casa de Jules e o deixou com Annie. Estava exausta e já 
passava das seis. Às nove horas seria o jantar com os Roche. Teria tempo para tomar um 
banho, arrumar-se e dirigir até o Marais. Cansava-se só de pensar nessa maratona. Tudo o 
que ela mais queria era ficar em casa à noite, sossegada, com a mão no controle remoto da 
tevê e as pernas espichadas no sofá. 
Preparou para si um longo banho de banheira com sais perfumados. Na verdade, a 
banheira era praticamente do tamanho de uma bacia plástica, já que boa parte de suas 
pernas ficavam para fora do aparelho sanitário. Enxugou-se e foi à cozinha com as 
dimensões de um minúsculo banheiro, preparar algo leve e rápido. Abriu o congelador e 
selecionou uma das dez caixas de comida congelada. Ligou o micro-ondas e voltou ao quarto 
para vestir-se. Havia um tipo de roupa que raramente deixava uma mulher na mão: o 
tubinho preto anos 60. Jogou-o por sobre a cama e escolheu a meia-calça 7/8, de lã; botinha 
preta com salto de 10 centímetros (se monsieur Brienne encolhesse, ela pararia de andar 
sobre andaimes...), uma bolsa de couro, pequena, e um par de brincos de pérola. Diante do 
espelho, retirou o robe, sugou e soltou o ar seguidas vezes, analisando o efeito da gravidade 
nos seios e da comida congelada no abdômen. É, teria de malhar para reduzir uns 
pneuzinhos. Girou lentamente sobre os calcanhares e avaliou o bumbum gordinho. Era uma 
batalha perdida! A tecnologia evoluía tanto que um dia bem que poderia criar um 
photoshop fora do papel, uma máquina na qual se entrava com o bumbum avariado e saía-
se perfeita, refletiu Amanda ajeitando a calcinha. Deslizou a meia-calça pela perna esquerda 
e antes que completasse o mesmo gesto com a outra, a companhia soou veemente e o 
micro-ondas apitou. 
Num átimo e com a prática de um piloto de testes, puxou a meia-calça rapidamente 
para cima, na outra perna, saindo do quarto, aos pulinhos e trombadas. Abriu a porta e 
sentiu o ar frio do corredor eriçar os pelinhos de sua nuca. Apertou-se no robe de seda que 
nada adiantou, pois o tecido delicado também estava por demais gasto. Tentou sorrir e até 
se encantar. Tentou mesmo. No entanto, só conseguiu pensar nos motivos que o traziam à 
sua porta mais uma vez. E mesmo ele sendo lindo, sedutor e com um sorriso espetacular, 
não podia supor que Amanda amava os homens com a profundidade de uma poça d’água. 
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-Hummm, esqueceu o nosso jantar? Ou o final de semana inteiro? 
Jacques Rodin estava escorado no batente da porta com um cachecol ao redor do 
pescoço, o cabelo loiro bagunçado pelo vento, os olhos interrogativos e os lábios num 
sorriso provocador. Amanda havia esquecido aquela beleza toda, o timbre rouco da voz, o 
sotaque ligeiramente arrastado, o cheiro de limão e floresta orvalhada ao amanhecer que 
era exalado de sua pele. Seu corpo ainda o desejava; a alma, não mais. 
-Salut, ma petit brésilienne! –brincou; em seguida, passando por ela e instalando-se 
confortavelmente no sofá, disse: - Liguei para você. Achei que havia acontecido algo, já que 
não retornou minha ligação. 
-Ligou? Quando? – ainda segurava a porta. 
-Hã, deixe-me ver... Ah, perto das quatro. Onde você estava, bébé? –sorriu, batendo 
no sofá chamando-a para perto de si. 
Ela conseguiu soltar a porta e fechá-la, porém manteve-se de pé. A qualquer 
momento teria de sair, jamais se atrasara a um compromisso com o chefe. Pediu licença e 
foi buscar o celular na pasta. Voltou lentamente encontrando-o com as pernas cruzadas 
displicentemente. 
-Acho que perdi meu celular. – balbuciou. 
Provavelmente, deixara-o sobre a mesa do Les Ombres, ou, na pior das hipóteses, 
perdera-o na rua, na lavanderia, no corredor da empresa, no elevador, no quinto andar, 
debaixo do banco do seu carro, do carro do chefe, pois foram no mesmo automóvel almoçar 
com Jarkko. Tantos lugares. Anotação mental: comprar imediatamente um celular. 
Enquanto ela pensava no celular perdido, Jacques levantou-se e pulou em seu 
pescoço, literalmente, mordendo-lhe de forma sensual. Tentou impedi-lo empurrando-lhe o 
tórax com as mãos. Desviou o rosto dos seus lábios, virou a cabeça ostensivamente e cerrou 
os lábios com força. Jacques afastou-se alguns centímetros avaliando-lhe a expressão. 
-Tenho um compromisso, Jacques. Você precisa sair. 
-NÓS temos um compromisso. – enfatizou, as sobrancelhas alçadas num tom de 
escárnio. – Tenho de lembrá-la do nosso jantar? Ou já quer a sobremesa? 
- Por favor, saia da minha casa. – pediu em voz baixa, controlada. 
- O que foi, Amanda? O que a fez mudar em menos de vinte e quatro horas? 
Ele parecia realmente perplexo, como se não estivesse acostumado a ser 
despachado. E era óbvio que não estava. Um homem bonito como Jacques estava 
acostumado a deixar as mulheres, a abandoná-las, a ferir sentimentos e autoestimas. 
Amanda conhecia o tipo, serviam para uma noite, duas, no máximo. Para companheiros de 
vida, jamais. Empurrou-o mais uma vez, impondo força o suficiente para afastá-lo. 
- Já lhe disse, tenho um compromisso... profissional. 
- Ah, entendi, o chefinho controlador, o dono da sua vida? Como se submete a isso? –
indagou com cinismo. 
- Ei, moço, a gente se conhece há três dias... 
-E eu já sei muito sobre você, o suficiente para afirmar que não passa de uma 
inocente idiota que idolatra um assassino. Como pode servir a um homem que perseguiu a 
esposa e a fez sair da estrada, capotando um milhão de vezes até ter a coluna estraçalhada? 
E sabe por quê? Olhe para mim, não tente tapar os ouvidos! Eu sei tudo sobre aquele verme. 
Eu estava com ela minutos antes do desgraçado arruinar-lhe a vida. Ele não ligava a mínima 
para Rochelle, a mínima! Obcecado pelo trabalho, o filho da puta. Já viu um workaholic ter 
ereção? Claro que non. Rochelle era o meu amor, a minha vida – riu-se,irônico. – Escute, 
Amanda, você é descartável, um móvel do escritório que será descartado quando não mais o 
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convier. Me diga, quantas horas por dia você realmente vive e quantas você está servindo-o? 
Salve-se enquanto ainda pode. 
Amanda viu uma intensa dor nos olhos de Jacques, como se dez, vinte anos de sua 
vida fossem-lhe postos nos ombros. Não sabia como reagir, o que dizer, o que sentir. Logo 
que entrara na SBO havia especulado acerca do acidente da esposa do presidente e lera nos 
jornais que fora automobilístico e causado por ela mesma, pois trafegava em alta 
velocidade, à noite, numa estrada perigosa devido às curvas e iluminação escassa. Se Jules a 
perseguira até tirar-lhe da pista, isso, de fato, jamais fora comentado na empresa por 
ninguém... Mas a empresa era dele. Quem arriscaria o emprego ou até mesmo um processo 
por calúnia e difamação? 
-Você tem inveja de Jules Brienne. – disse num fiapo de voz. 
Ele riu com vontade e abriu-lhe o cinto do robe. As mãos deslizaram-lhe por entre as 
pernas de Amanda até encontrar a carne macia e quente de seu sexo. 
-Oui, morro de inveja de um assassino. Ele só não foi preso, porque é rico. Mas eu 
ainda o porei entre as grades, com certeza. –murmurou junto à sua orelha: - Além do mais, 
Rochelle ainda voltará a si e me ajudará na condenação do canalha. 
Afastou-lhe as mãos do corpo. Inutilmente. Empurrando-a contra a parede, arrancou-
lhe a roupa e enfiou a mão por entre seus cabelos. Amanda gritou. Jacques puxou-lhe ainda 
mais os fios, fazendo-a curvar-se diante dele e gemer de dor. 
-Essa sua lealdade é nojenta! 
-E você é um doente, precisa de camisa-de-força! Desde quando me vigia? Aquela 
noite... sábado...estava me esperando, seu psicopata? 
Com a mão livre, Jacques a esbofeteou e jogou contra o chão, ajoelhando-se ao seu 
lado. 
-O que acha? Que sua aparência bizarra me atraiu? Não faz ideia dos sacrifícios que 
fiz, ao longo desses cinco anos, para levantar informação e material contra Jules. Sabe sua 
amiga Dorian? Pois é, somos amantes. A recepcionista da SBO? Hummm, deliciosa, um 
pouco histérica, mas transamos sempre que preciso saber quem foi demitido ou admitido, 
um trabalho de networking, entende, non? Só não traço as mulheres da diretoria, porque 
não caem com facilidade na minha conversa de Don Juan e, como lhe avisei antes, sou 
preguiçoso. Amanda Rossi, ma chérie, esperei o momento certo para me aproximar... Mas 
você me surpreendeu, pensei que fosse me ajudar, afinal cinco anos lambendo os sapatos 
do patrão poderiam ter-lhe afetado a dignidade. – gargalhou e emendou: - E qual é a minha 
surpresa?! Você não tem dignidade! –desferindo-lhe outra bofetada no rosto. 
Sentia a face ferver de dor, enquanto o cérebro girava à procura do entendimento, 
do que estava acontecendo e de como poderia livrar-se do perigo, e o perigo era o 
desconhecido transtornado pelo ressentimento que o tornava um monstro. Teria de forçá-lo 
a bater-lhe ainda mais. A única chance que tinha era fazer com que Jacques se afastasse, 
mas ele somente o faria caso a deixasse desmaiada. A não ser que sua teoria estivesse 
errada e o objetivo do outro lhe fosse tirar a vida para respingar um pouco de sangue em 
Jules Brienne. 
-Como pôde suportar que Rochelle preferisse Jules a você? Ela era ca-sa-da com ele e 
você...um amantezinho de quinta! –gritou com desprezo. 
-Vagabunda! 
Amanda esperava por mais uma bofetada, porém surpreendeu-se com a força do 
golpe. Um punho cerrado acertou-lhe o maxilar. Não foi preciso que simulasse o grito rouco 
de dor, e tampouco a batida da cabeça contra o piso acarpetado. Deixou-se ficar, inerte, de 
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olhos fechados, esperando que ele se afastasse o suficiente para poder fugir e trancar-se no 
quarto. Respirava devagar como alguém inconsciente e via a escuridão dentro de si, 
desprotegida. Pressentiu que ele se erguia, ouviu seus passos distanciando-se. Teria de 
esperar alguns segundos. Nada de precipitação. A dor havia desaparecido. Seus instintos 
estavam em alerta como um animal diante de outro animal, lutando não pela sobrevivência 
e sim pelo controle da situação. Escutou a porta abrir e fechar-se discretamente. Ele não 
queria chamar a atenção da vizinhança. Foi então que tudo mudou. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Capítulo V 
 
 
 
Vestiu o robe e apertou com força o cinto ao redor do corpo. Correu para a cozinha, 
abriu a primeira gaveta do balcão, pegou a faca de cortar pão e saiu para o corredor vazio do 
prédio. Barulhos típicos do cotidiano, televisão, criança chorando, reclamando, ruídos de 
talheres e cachorros latindo. Tudo abafado pelas paredes. Desceu os degraus sem acender a 
luz, segurando-se no corrimão. Aspirava o cheiro dele e já não era mais agradável ou 
sedutor. Era um odor de doença, de obsessão em metástase. Apenas dois andares, cerca de 
vinte degraus, e encontraria Jacques. Apertou o cabo da faca, engoliu a vontade de chorar e 
o medo. Medo de deixá-lo solto pela cidade tal qual se deixava um cão com raiva. Medo que 
voltasse a sua casa. Medo que a loucura o tornasse um homicida. A qualquer momento, 
Jacques de fato atingiria Jules. O cerco começara havia cinco anos, logo após o coma de 
madame Brienne, sua amante, pelo visto. Seduzira as funcionárias da empresa e, agora, 
agredia a assistente pessoal que poderia denunciá-lo à polícia. E talvez fosse isso mesmo que 
ele quisesse. Uma denúncia que chamasse a atenção da mídia e, por sua vez, desenterrasse 
a história do acidente envolvendo o presidente-executivo da SBO e sua jovem esposa. 
Destruir a imagem pública do homem e o seu trabalho. Manipular versões a fim de 
transformar-se no mocinho e Jules, o vilão. Mas o mocinho não batia em mulheres - Amanda 
pensou com os lábios cerrados de ódio e as lágrimas jorrando livremente pelo rosto – o 
mocinho lutava ao lado da heroína para combater o vilão. E a heroína, para se defender e 
defender o mocinho caçava, na escuridão da escadaria entre o segundo andar e o térreo, o 
príncipe que se transformara em sapo. 
Quando as lâmpadas do corredor acenderam-se e Jacques Rodin surgiu diante de si 
sem lhe dar chance de raciocinar ou piscar os olhos, atirou-se contra ele e, gritando como 
nunca havia gritado na vida, enfiou a faca... no ar. A agilidade do homem pegou-a de 
surpresa e, num gesto rápido e preciso, tirou-lhe a faca da mão para, em seguida, sacudir-lhe 
os ombros. Não adiantava mais lutar. Desde a adolescência sabia que nascera para perder, 
para querer e perder, para admirar e não ter. Possuía um instinto persistente, uma 
obstinação que a compelia a desejar viver, fosse como fosse. No entanto, numa situação 
extrema e violenta como a que vivia em nada adiantava ser forte, porque Jacques, agora, 
não precisaria usar os punhos. 
A batalha não estava perdida. Desvencilhou-se das mãos que lhe apertavam os 
ombros e, com a fúria de uma mulher machucada, desferiu um soco acertando-lhe o queixo. 
Sentia os cílios pesados de água, uma cortina de lágrimas turvava-lhe a visão, os espasmos 
do choro sacudiam-lhe os ombros. Acertara o desgraçado. Ouvira-o gemer e descer alguns 
degraus de costas. Aproveitou para chutar-lhe entre as pernas, mas ele foi mais rápido, 
agarrou-a pela cintura e a pôs no ombro. Amanda esperneava e tentava mordê-lo no braço, 
no pescoço, na nuca, enquanto ele procurava esquivar-se de seus ataques, subia 
rapidamente a escada e entrava no apartamento. Não se entregaria tão fácil. Os soluços 
escapavam-lhe dos lábios, intermitentes, roucos. Numa das investidas de seus dentes no 
pescoço do homem, captou o cheiro familiar que lhe acionou na mente palavras como 
segurança e proteção. A fragrância amadeirada avisou-lhe que estava salva. Deitou a cabeça 
em seu ombro, no casaco úmido e gelado, e esvaziou o peito da dor. Sentiu uma mão 
acariciando-lhe suavemente

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