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ELABORAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS Lígia Maria Fonseca Affonso Revisão técnica: Luciana Bernadete de Oliveira Graduada em Ciências Políticas e Econômicas Especialista em Administração Financeira Mestre em Desenvolvimento Regional Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 E37 Elaboração e implementação de políticas públicas / Guilherme Corrêa Gonçalves ... [et al.] ; [revisão técnica: Luciana Bernadete de Oliveira]. – Porto Alegre : SAGAH, 2017. 324 p. il. ; 22,5 cm. ISBN 978-85-9502-194-5 1. Políticas públicas. I. Gonçalves, Guilherme Corrêa. CDU 304 Compreensão do problema Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identi� car os principais tipos e instrumentos de políticas públicas. Reconhecer a importância da compreensão do problema para a elaboração de políticas públicas. Descrever os principais desa� os encontrados pelos gestores nas fases de formulação e tomada de decisão de políticas públicas. Introdução Neste capítulo, você irá estudar os principais tipos e instrumentos de políticas públicas, a importância da compreensão do problema para a elaboração de políticas públicas e os principais desafios encontrados pelos gestores nas fases de formulação e tomada de decisão das políticas públicas. Tipos e instrumentos de políticas públicas O Brasil, apesar de sua grandeza e riqueza, ainda é marcado pela desigualdade e diversidade de suas regiões, apresentando diferentes demandas e problemas. Além das diferenças sociais e econômicas, as sociedades também se diferen- ciam quanto a ideias, valores e interesses, desempenhando diferentes papéis ao longo de sua existência, o que as fazem complexa e dinâmicas, exigindo que as políticas sejam adaptáveis às particularidades de cada local. O Brasil vem ofertando políticas públicas de forma crescente nas últimas décadas, promovendo a melhoria das condições de vida da população por meio de vários programas em áreas como saúde e educação. O Programa Saúde da Família (PSF) é um exemplo de política pública implantado pelo Ministério da Saúde em 1994, e que tem levado atendimento às populações concentradas em regiões mais remotas, principalmente as de áreas mais carentes dos grandes centros urbanos. O programa já beneficiou mais de 130 milhões de pessoas em todo o País (BRASIL, 2013). Você deve saber que existem várias definições de políticas públicas. Au- tores como Mead (1995), Lynn (1980), Peters (1986) e Dye (1984) as veem como ações que influenciam a vida dos cidadãos, promovidas pelo governo. Outra definição conhecida é a de Laswell (apud SOUZA, 2006), que afirma que decisões e análises sobre política pública devem responder às seguintes questões: quem ganha o que, por que e que diferença faz. Outras definições colocam a solução de problemas como papel principal das políticas públicas. Veja, a seguir, os principais elementos extraídos de diversas definições e modelos sobre políticas públicas (SOUZA, 2006): A política pública distingue entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz. A política pública, além de envolver vários níveis de governo, não se restringe a participantes formais, e considera importante a participação de atores informais. A política pública é abrangente, não se restringindo a regras e leis. A política pública envolve ação e possui objetivos a serem alcançados. A política pública é uma política de longo prazo, apesar de apresentar impactos em curto prazo. A política pública envolve processos consecutivos, ou seja, possui um ciclo que envolve várias etapas. Dessa forma, você pode considerar que a política pública possui dois elementos fundamentais (BRANCALEON et al., 2015): intencionalidade pública, que é a motivação para estabelecer ações que tratem ou resolvam um problema; problema público, que é a diferença entre a situação atual (status quo) e a situação ideal, desejada e possível para a realidade coletiva. Compreensão do problema144 Para tornar as coisas mais simples, você pode entender as políticas públicas como um conjunto de ações e decisões do governo, cuja finalidade é solucionar problemas da população, nas três esferas de atuação, buscando promover o bem-estar da sociedade e o interesse público. De forma mais simples, uma política pública envolve: um conjunto de decisões; recursos a serem alocados; um plano geral de ação; um público-alvo ou vários públicos; metas e objetivos a serem atingidos e definidos em função de normas e valores (THOENIG, 1998 apud SARAVIA, 2010). No entanto, dada a complexidade desse universo, as políticas públicas foram classificadas por tipo, com a intenção de facilitar sua análise e interpretação. É importante destacar que as políticas não se encaixam exclusivamente em um único modelo, porque nenhum deles é capaz de dar conta de todos os aspectos que envolvem uma política pública (RUA; ROMANINI, 2013), existindo, portanto, vários tipos de políticas públicas. Veja alguns deles sob a ótica de Theodore Lowi (1964; 1972 apud RUA; ROMANINI (2013): Políticas públicas distributivas: alocam bens ou serviços a uma parcela específica da sociedade utilizando recursos provenientes da coletividade. Dessa forma, privilegiam uma parcela da população e não a sociedade como um todo. Correm o risco de serem clientelistas ou assistencialistas, por exemplo, salário-desemprego, construção de pontes ou estradas. Políticas públicas redistributivas: distribuem bens ou serviços a seg- mentos específicos da sociedade com recursos provenientes de outros grupos específicos. São conflituosas e nem sempre apresentam os resultados esperados, por exemplo, reforma agrária, política tributária, royalties do petróleo. Políticas públicas regulatórias: estabelecem obrigações por meio de ordens, proibições, decretos e portarias. Podem ser distribuídas de forma equilibrada ou atender a interesses restritos, de acordo com os recursos de poder dos grupos de interesse. Variam de regulamentações simples até regulamentações complexas como, por exemplo, Código de Trânsito, Legislação Trabalhista. Políticas públicas constitutivas ou estruturadoras: representam as normas e os procedimentos que servem de base para formulação e implemen- 145Compreensão do problema tação de outras políticas, ou seja, ditam as regras do jogo, por exemplo, Regimento do Congresso Nacional, do Senado, etc. Outros tipos de políticas públicas, sob a ótica de diversos autores, são as clientelistas, as majoritárias, empreendedoras, de sala operatória, de audiência, reais, simbólicas, pseudopolíticas, compensatórias, emancipatórias, estruturais, emergenciais, universais, entre outras. Políticas clientelistas: subsídios, renúncias fiscais, etc. Políticas majoritárias: serviços públicos de saúde, educação, segurança pública, etc. Políticas empreendedoras: reforma administrativa, política ambiental, etc. Política de sala operatória: licenciamento de medicamentos, normas para proce- dimentos complexos de saúde, etc. Política de audiência: descriminalização do aborto e do uso de drogas, etc. Políticas reais: aquelas que os governantes possuem intenção de implementar e conhecimento necessário para isso. Políticas simbólicas: governantes possuem conhecimento, mas não têm intenção de implementar. Pseudopolíticas: aquelas que os governantes querem implementar, mas não têm conhecimento para tal. Políticas compensatórias: política de cotas, demarcação de terras indígenas. Políticas emancipatórias: reforma agrária, qualificação profissional, etc. Políticas estruturais: de geração de empregos, de desenvolvimento produtivo, etc. Políticas emergenciais: redução da fome, etc. Políticas universais: Sistema Único de Saúde (SUS) (RUA; ROMANINI, 2013). Cabe destacar que, para que as políticaspúblicas aconteçam, existem fer- ramentas chamadas de instrumentos de políticas ou instrumentos de governo. Essas ferramentas são divididas em duas categorias, de acordo com o nível de recursos privados, ou conforme a autoridade pública: instrumentos privados e instrumentos públicos (WU et al., 2014). Você pode ver exemplos dessas ferramentas no Quadro 1. Compreensão do problema146 Fonte: Wu et al. (2014). Ferramentas privadas Ferramentas públicas Mercado Organizações sociais voluntárias Família Informação Incentivos e desincentivos econômicos Regulamentos Empresas estatais Provisão direta Quadro 1. Exemplo de ferramentas de políticas públicas. Os instrumentos privados dizem respeito a pouca ou nenhuma participação direta do governo, acreditando que a solução será mais eficiente se for fornecida por atores privados como mercado, família e organizações sociais voluntárias. Quando essas ferramentas são aplicadas, normalmente o trabalho é realizado de forma voluntária pelos atores privados, que são motivados por recompensas financeiras, satisfação emocional, inspiração religiosa ou ideológica. A forma como as ações são executadas e que tipo de bens ou serviços são utilizados dependem da motivação do grupo. Portanto, os formuladores de políticas públicas que optam pelo uso de ferramentas privadas devem ter consciência dos limites e das capacidades do grupo. Os instrumentos públicos, por sua vez, representam a participação sobe- rana do Estado, utilizando instrumentos de dentro do governo e atividades direcionadas pelos formuladores de políticas públicas, de acordo com a resolução esperada dos problemas de políticas. Assim, governos podem se valer do emprego de impostos, regulamentos ou mandados de prisão e multas, visando desencorajar comportamentos indesejáveis, construindo empresas públicas ou fornecendo subsídios capazes de promover o comportamento desejado. Na área de proteção do meio ambiente, por exemplo, o governo pode fornecer subsídios para promover o uso de tecnologias limpas ou tributar tecnologia impura (WU et al., 2014). 147Compreensão do problema Outro potencial instrumento utilizado pelo governo são as vastas informa- ções que ele possui e que podem contribuir para a promoção de comportamentos desejados e evitar comportamentos indesejados. Informações para estimular comportamento desejado: promover a economia de água, em razão do baixo volume nos reservatórios, ou promover o cuidado para evitar o mosquito da dengue. Informações para desestimular comportamento indesejado: desencorajar o tabagismo, a obesidade, a violência, etc. (WU et al., 2014). Compreensão do problema no contexto de políticas públicas O processo de formulação das políticas públicas, também chamado de ciclo das políticas públicas, apresenta diversas fases, todas com suas particularidades e de importância vital para o sucesso das políticas, conforme você pode ver na Figura 1. Figura 1. Ciclo de políticas públicas. Fonte: Meneguin e Ávila (2016). Compreensão do problema148 A política pública tem início com uma demanda da sociedade que, se identificada como um problema, é incluída na agenda pública para a busca de solução. Nessa fase, é importante uma análise detalhada do problema para que alternativas consistentes para sua resolução possam ser apresentadas. Após a escolha das alternativas, é preciso tomar decisões e elaborar o planejamento das ações necessárias para a implementação da política. É importante acompanhar a implementação para verificar se os objetivos traçados estão sendo alcançados e se há ajustes a serem realizados para que a política cumpra seu papel com eficiência. Dessa forma, o monitora- mento possui papel importante, uma vez que possibilita identificar falhas e potencialidades e, ao final do ciclo, comparar se os resultados obtidos estão de acordo com os resultados esperados. Você precisa saber, ainda, que esse ciclo deve considerar a participação de atores públicos e privados na discussão, criação e execução das políticas públicas, como governantes, políticos, trabalhadores, empresas, etc.; o poder que esses atores possuem e como podem utilizá-lo; e a situação social atual do país e a organização de ideias e ações. Para mais informações sobre as políticas públicas, acesse o link ou código a seguir (POLÍTICAS, 2008). https://goo.gl/AerggK Você já parou para pensar que o problema é o elemento principal das políticas públicas? O motivo pelo qual uma demanda passa a ser vista como um problema envolve fatores sociais e políticos complexos e circunstâncias dinâmicas, como uma crise e a dificuldade que os gestores possuem para formar a agenda. Dessa forma, compreender o problema é fundamental para minimizar os efeitos desses fatores e fornecer aos gestores públicos uma base sólida de conhecimento e uma consistente capacidade de análise, permitindo a elaboração eficaz de estratégias com maior flexibilidade. 149Compreensão do problema https://goo.gl/AerggK Você pode pensar em problema como uma situação que causa mal-estar e consequências negativas a alguém, a uma comunidade, a uma sociedade ou instituição, etc. É preciso avaliar corretamente as situações-problema para identificar se realmente é um problema ou apenas uma mera necessidade sem demanda política (DAGNINO, 2009). É preciso diagnosticar uma situação suposta como um problema, mas, como fazer isso? Primeiramente, você deve listar todos os problemas que foram declarados como tal por variados e relevantes atores sociais e avalia-los sob a ótica desses atores. Em seguida, deve situar os problemas no tempo e no espaço, verificar a relação ou contradição entre esses problemas, identificar os fatores que evidenciam a existência desses problemas, bem como realizar levantamento de suas causas e consequências, destacando entre elas as con- sideradas causas críticas, ou seja, que podem sofrer intervenção. Existem três tipos de problema: Aqueles que representam uma ameaça, ou seja, um potencial perigo de agravamento de uma situação ou a possibilidade de perda de uma conquista. Aqueles que representam uma oportunidade, ou seja, que permitem o seu aproveitamento ou descarte, pelos atores sociais. Aqueles que representam um obstáculo, ou seja, dificultam uma con- quista ou outro benefício. Os problemas ainda podem ser classificados quanto ao tempo (atuais ou potenciais); à governabilidade em relação ao controle (se total, baixo ou sem controle); à abrangência (âmbito nacional, local, específico, estadual ou municipal); e à estruturação (estruturados ou quase estruturados). Compreensão do problema150 O problema é estruturado quando há a possibilidade de se enumerar todas as variáveis que o compõem e precisar as relações entre elas, permitindo que todos os envolvidos concordem com a solução proposta. O problema é quase estruturado quando apenas algumas variáveis que o compõem podem ser enumeradas, bem como a relação entre elas. Apenas parte dos envolvidos entendem as soluções como situacionais (DAGNINO, 2009). É importante que você compreenda corretamente um problema para que ele possa ser reduzido ou solucionado. Do contrário, você pode chegar a uma visão distorcida da situação e tomada de decisões equivocadas. Veja que um problema pode ser, por exemplo, uma situação ou um estado negativo, a utilização de recursos de forma indevida, uma ameaça ou uma intenção de não perder uma oportunidade. Por isso, você já viu que é fundamental precisar problemas atuais ou realmente potenciais, evitando “achismos” e imaginação, pois um problema não significa ausência de uma solução (DAGNINO, 2009). Cabe lembrar que os problemas devem ser detalhados em sua indicação e não de forma generalista como saúde, educação, segurança, que dão sentido amplo sem necessariamente indicar qual é a situação que se busca resolver. Tão importante quanto compreender o problema é saber explica-lo, ou seja, os envolvidos no problema devem saber explicar a realidadeem que se inserem e as consequências sofridas pelo problema. A explicação, assim como a compreensão do problema exige reflexão, pois é por meio dela que é possível perceber as possibilidades de transformação ou a manutenção de determinada situação. Portanto, para explicar um problema, é necessário distinguir suas causas, sua descrição e suas consequências, ou seja, a que se deve o problema, como ele pode ser verificado e qual o impacto produzido por ele. Dessa forma, explicar uma situação ou um problema consiste na construção de um modelo explicativo sobre seu fato gerador e suas tendências. Podemos dizer, ainda, que uma mesma realidade pode sugerir variadas explicações, pois carrega consigo uma carga de subjetividade em que é possível obter várias respostas para a mesma pergunta e variadas perguntas sobre a mesma situação. Dessa forma, para que uma realidade seja explicada, é preciso que os envolvidos distingam suas explicações, isto é, para explicar uma situação que os afeta, é preciso que compreendam a explicação do outro e conheçam a percepção dos outros sobre a sua explicação. Quanto maior for a capacidade 151Compreensão do problema de compreensão da explicação do outro, maior será a probabilidade de êxito nas ações adotadas para a resolução do problema. Portanto, você pode concluir que compreender a origem do problema é fundamental para a formulação de políticas públicas, e conhecer as causas do problema permite identificar quais opções têm chance de funcionar. No entanto, muitas vezes, a causa de um problema pode ser interpretada de dife- rentes formas, impedindo a definição concreta de meios que determinem sua validade. Determinados problemas são tão complexos que fica difícil definir com clareza as suas causas. Nesse contexto, os formuladores de políticas devem optar pela seleção de uma interpretação aceitável da origem do problema para, em seguida, tomar providências sobre o assunto. No entanto, em determinadas áreas a necessidade de identificar as causas é fortemente enfatizada. O relatório de países das Nações Unidas, por exemplo, exige análise rigorosa para iden- tificação das causas imediatas e subjacentes e as raízes dos problemas (WU et al., 2014). Você percebeu a importância de se compreender bem um problema que irá se transformar em uma ação maior e afetar a vida de várias pessoas? É possível que muitas vezes os governos não respondam a questões públicas críticas que satisfaçam seus cidadãos, porque muitos deles não chegam de forma adequada às agendas de políticas oficiais, ou seja, nem todos os pro- blemas públicos são reconhecidos como problemas pelos governos e, diante da escassez de recursos e de tempo, somente alguns entram na agenda. Isso quer dizer que a chance de um problema público, que foi priorizado na agenda, não corresponder a sua real importância é grande. Na verdade, o processo de escolha dos problemas pelos formuladores de políticas públicas é bastante complexo e, por isso, a má compreensão e o consequentemente mau enquadramento dos problemas públicos podem levar a soluções ineficazes e/ou inúteis e ao desperdício de recursos e de tempo. Compreensão do problema152 Desafios na formulação e tomada de decisões em políticas públicas Você viu que o problema é o elemento principal das políticas públicas. Além de ser fundamental para formar a agenda pública, é essencial para a formulação das políticas e para a tomada de decisão. O ambiente político nem sempre é propício para a formulação sistemática de políticas públicas e sua ampla variedade de opções. O ambiente é altamente complexo e, muitas vezes, os gestores públicos falham na compreensão sobre quais pistas devem considerar para formular opções de políticas adequadas. Veja alguns desafios que devem ser enfrentados pelos gestores (WU et al., 2014): Oposição de opiniões e interpretações: mesmo cientes de quais problemas querem abordar e utilizando linguagem clara e transparente para expressar suas opiniões, o público pode não ser favorável às possíveis soluções, ou seja, as soluções não agradam a todos igualmente, e isso é um obstáculo à implementação das políticas. Dessa forma, expectativas contraditórias tornam a tarefa de formulação de políticas públicas altamente desafiadora. Para o enfrentamento dos vários desafios, ao propor soluções para os problemas, os gestores devem estar cientes dos pontos de vista e recursos disponíveis que possuem para usuários, metas, público e outros membros das comunidades de política pública, incluindo aqueles que pertencem a outras partes de seu governo. Monitorar regularmente o ambiente político também pode ajudar na definição de um conjunto de escolhas de políticas que abarquem o maior número possível de ideias e interesses conflitantes, evitando, assim, conflitos e atrasos desnecessários na formulação de políticas e demais etapas de sua criação. Barreiras técnicas podem ser os fatores mais desafiadores na formulação de políticas públicas. A primeira delas é a dificuldade de compreender a causa do problema que será abordado. A ausência do entendimento comum sobre a fonte de um problema de política pública dificulta o reconhecimento de objetivos a serem alcançados, como procurar por alternativas e que critérios utilizar para filtrar as opções de políticas. Gestores públicos, com formação em políticas públicas, estão melhor preparados para lidar com questões técnicas na formulação de políticas, apesar de nem sempre ser fácil desempenhar um papel proativo na formulação dessas políticas. Outra barreira pode ser a utilização de informações usadas em experiências anteriores, o que é uma barreira à formulação de opções criativas. 153Compreensão do problema Desafios institucionais como disposições constitucionais e o sistema político são fatores que podem limitar a gama de opções disponíveis para determinada situação. A existência de dois ou mais níveis de governo em sistemas federais também são obstáculos, uma vez que o acordo intergovernamental pode ser impossível, ou levar muito tempo para ser alcançado. Outro obstáculo é a natureza de partidos políticos e do sistema eleitoral que, ao determinar os horizontes de políticas de um governo, limitam os tipos de opções de políticas viáveis, por razões eleitorais ou políticas. Grupos poderosos, com seus interesses e ideias enraizadas, bem como ideias filosóficas ou religiosas também podem limitar o leque de alternativas disponíveis para a formulação de políticas públicas. Dessa forma, gestores públicos precisam se esforçar para superar as difi- culdades e desafios que atrapalham suas atividades na formulação de políticas públicas. Uma das várias formas que pode ser utilizada pelos gestores para participar e aumentar seu papel na formulação de políticas públicas é reunir, com antecedência, todas as informações necessárias sobre vários aspectos dos problemas existentes, desenvolvendo propostas de solução para uso dos principais formuladores de políticas. A tomada de decisão é a função de política pública, em que ações para tratar um problema podem ou não ser traçadas. As decisões devem considerar as análises políticas e técnicas sobre um leque de opções. Existem três modelos principais de decisão (BRANCALEON et al., 2015): Modelo de decisão racional: é construído sobre o pensamento de que as consequências de cada opção de política pública alternativa podem ser conhecidas antecipadamente. Nesse contexto, os tomadores de decisão escolhem a opção que consideram eficaz para o alcance de seus objetivos, valores e metas individuais. Considera-se o modelo racional, pois, pelo menos na teoria, ele é capaz de atingir objetivos de políticas públicas com maior eficiência. No entanto, sua aplicação exige uma grande quantidade de informações precisas a respeito dos impactos e consequências das políticas, o que pode ser impraticável ou impossível de obter no curto período de tempo que os decisores têm para agir. Modelode decisão incremental: tem por base sucessivas comparações limitadas entre as novas propostas que surgem e os resultados de deci- sões anteriores, garantindo que o resultado seja apenas em mudanças incrementais do status quo. Por conta disso, é um processo marcado Compreensão do problema154 pela restrição de tempo e informação e caracterizado por conflitos, negociações e compromisso entre os tomadores de decisão com inte- resses próprios. Modelo de decisão da “lata de lixo” (garbage can): é aplicado quando se tem envolvidos um grande número de tomadores de decisão e grande incerteza sobre as causas dos problemas e suas soluções. Nesse modelo, as ideias de maximização, do modelo racional, e de otimização, do modelo incremental, são em grande parte abandonadas. Em vez disso, considera-se o ambiente propício para o surgimento de um princípio de satisfação, no qual a tomada de decisão envolve satisfazer padrões ou metas, definidos por um grupo de decisores de políticas no momento da decisão. A decisão de políticas públicas é o ponto mais alto do processo de criação de políticas. Apesar de ser uma fase mais política do que as outras que a antecedem, é também uma fase técnica, que deve ser trabalhada por agentes mais experientes. Além de um julgamento político perspicaz, o sucesso da tomada de decisão depende de evidências e de uma análise sólida. As políticas públicas ocupam um lugar de grande importância no universo dos gestores públicos, uma vez que fornecem a eles a legitimidade e os recur- sos necessários para executar suas tarefas em um ambiente de alto nível de inteligência, sofisticação e competência. No entanto, o processo de políticas públicas, em alguns casos, é marcado pela irracionalidade, inconsistências e falta de coordenação, levando à tensão e sofrimento para esses agentes. Gestores pouco familiarizados com a natureza e o funcionamento do processo de políticas públicas podem ter dificuldade para elaborar estratégias eficazes e garantir resultados. Veja, a seguir, exemplos de problemas de políticas acarretadas pela exis- tência de um mundo de políticas fragmentadas (WU et al., 2014): Políticas públicas ineficazes, mas populares, despertam a atenção dos formuladores de políticas, ao passo que outras políticas necessárias, mas impopulares, encontram uma grande resistência. A criação de políticas públicas é impulsionada por crises, nas quais os formuladores de políticas devem agir para apagar incêndios, ao passo que as políticas para evitar crises em primeiro lugar são subvalorizadas. Falhas em políticas públicas ocasionam mudanças na liderança política, no entanto, as principais causas das falhas permanecem inadequada- mente abordadas. 155Compreensão do problema Os efeitos das políticas públicas defendidas por um órgão do governo podem ser corroídos por estratégias empregadas por outro órgão, de forma deliberada ou não. Políticas públicas são formuladas visando o apoio de grupos politica- mente poderosos, em vez de garantir os interesses públicos de longo prazo que são pouco representados no sistema político. Discordâncias entre os diferentes níveis de governo geram políticas públicas contraditórias e mutuamente destrutivas. Políticas públicas com seu objetivo desviado em troca de pagamentos por negligência ou alteração de regras, mesmo em locais onde a corrupção é um problema menor, tais ações podem gerar confusão de regras e regula- mentos, prejudicando a eficiência e a eficácia de muitas políticas públicas. Apesar de ser importante, a avaliação de políticas públicas é raramente utilizada para a maioria das decisões e, quando isso acontece, não contri- bui para a contínua aprendizagem em políticas públicas. Muitos governos ao redor do mundo dificultam o acesso à informação, impedindo que os avaliadores realizem seu trabalho com qualidade e privando-os das oportunidades de aprendizagem e melhoria de políticas. Na verdade, apesar da existência de um ciclo, não existe uma forma padrão para a criação e implementação de políticas públicas, uma vez que elas se dão a partir de diferentes problemas, em diferentes contextos e setores, por isso são marcadas por alta complexidade. Contudo, existem algumas formas pelas quais os gestores podem melhorar suas chances de sucesso na criação e na implementação dessas políticas, como: buscar apoio em grupos favoráveis à mudança de políticas públicas e que ofereçam diferentes recursos e interesses; ter em mente, de forma clara, os objetivos gerais e os parâmetros para as políticas; garantir a disponibilidade de recursos necessários para a condução do processo de políticas públicas e estar envolvidos no seu acompanha- mento e avaliação. Dessa forma, os gestores de políticas públicas interessados em criar e executar políticas que tragam os resultados esperados e, mais claramente, que cumpram com seu papel de beneficiar a população por meio da resolução de um problema ou satisfação de determinada demanda devem se valer dessas e de outras estratégias que venham facilitar a condução do processo como um todo. Compreensão do problema156 Para compreender melhor a metodologia de análise de políticas públicas, acesse o link ou código a seguir: https://goo.gl/Kv3XcZ 1. As políticas públicas foram classificadas por tipo, com a intenção de facilitar sua análise e interpretação, dada a complexidade desse universo. A política pública que distribui bens ou serviços a segmentos específicos da sociedade com recursos provenientes de outros grupos específicos é chama de: a) distributiva. b) regulatório. c) redistributiva. d) construtiva. e) compensatórias. 2. Para que as políticas públicas aconteçam, existem ferramentas também chamadas de instrumentos de políticas ou instrumentos de governo. Tais ferramentas são divididas em duas categorias, de acordo com o nível de recursos privados ou conforme a autoridade pública. O instrumento que quando é aplicado, normalmente acontece de forma voluntária é chamado de: a) instrumento voluntário. b) instrumento público. c) instrumento administrativo. d) instrumento econômico. e) instrumento privado. 3. O processo de formulação das políticas públicas, também chamado de ciclo das políticas públicas, apresenta diversas fases, todas com suas particularidades e de importância vital para o sucesso das políticas. Compreender o problema que dispara o processo de políticas públicas é fundamental para que os próximos passos tenham sucesso. Os problemas podem ser classificados de várias formas. Como é classificado o problema que quando apenas algumas variáveis que o compõem podem ser enumeradas, bem como a relação entre elas, e apenas parte dos envolvidos entendem as soluções como situacionais? a) Quanto ao tempo. b) Quanto a governabilidade. c) Quanto a abrangência. d) Quase estruturado. e) Estruturado. 157Compreensão do problema https://goo.gl/Kv3XcZ 4. O ambiente político nem sempre é propício para a formulação sistemática de políticas públicas e sua ampla gama de opções. O ambiente é altamente complexo e muitas vezes, os gestores públicos falham na compreensão sobre quais pistas devem considerar para formular opções de políticas adequadas. A dificuldade de compreender a causa do problema que será abordado diz respeito a que tipo de obstáculo? a) Barreira técnica. b) Desafio institucional. c) Disposição constitucional. d) Partido político. e) Grupos poderosos. 5. A tomada de decisão é a função de política pública onde ações para tratar um problema podem ou não ser traçadas. As decisões devem considerar as análises políticas e técnicas sobre um leque de opções. Como é chamada a decisão que tem por base sucessivas comparações limitadas entre as novas propostas que surgem e os resultados de decisões anteriores? a) Modelo de decisão racional. b) Modelo de decisão lata do lixo. c) Modelo de decisão incremental. d) Modelo de decisão institucional.e) Modelo de decisão política. BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde da Família será ampliado em 16 estados. Portal Brasil. 2013. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/saude/2013/01/saude-da- -familia-sera-ampliado-em-16-estados>. Acesso em: 27 out. 2017. BRANCALEON, B. B. et al. Políticas públicas: conceitos básicos. 2015. Disponível em: < https://pt.scribd.com/document/356133345/MaterialDidatico-EAD-17-04-2015>. Acesso em: 27 out. 2017. DAGNINO, R. P. Planejamento estratégico governamental. Florianópolis: UFSC, 2009. MENEGUIN, F. B.; ÁVILA, F. A Economia comportamental aplicada a políticas públicas. 2016. 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