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Mecanismos da lesão celular A resposta celular ao estímulo nocivo depende do tipo de lesão, sua duração e sua gravidade. Assim, pequenas doses de toxina ou breves períodos de isquemia podem levar a lesão celular reversível, enquanto altas doses de toxina ou isquemia mais prolongada podem resultar em lesão celular irreversível e morte celular As consequências de um estímulo nocivo dependem do tipo, status, adaptabilidade e fenótipo genético da célula lesada. A lesão celular resulta de alterações bioquímicas e funcionais em um ou mais dos vários componentes celulares essenciais. Os alvos mais importantes dos estímulos nocivos são: (1) as mitocôndrias e sua habilidade em gerar ATP e ERO em condições patológicas; (2) desequilíbrio na homeostasia do cálcio; (3) danos às membranas celulares (plasmática e lisossômica) e (4) danos ao DNA e ao dobramento das proteínas. As múltiplas alterações bioquímicas podem ser disparadas por qualquer lesão nociva. É difícil determinar qualquer mecanismo a uma lesão ou situação clínica em particular na qual a lesão celular seja proeminente. Por essa razão, as terapias que visam mecanismos individuais de lesão celular podem não ser eficazes. DEPLEÇÃO DE ATP As principais causas de depleção de ATP são a redução do suprimento de oxigênio e nutrientes, o dano mitocondrial e as ações de algumas toxinas (p. ex., cianeto). Os tecidos com maior capacidade glicolítica (como o fígado) são capazes de sobreviver melhor à perda de oxigênio e ao decréscimo de fosforilação oxidativa do que os tecidos com capacidade limitada para a glicólise (p. ex., o cérebro). O fosfato de alta energia, na forma de ATP, é necessário para virtualmente todos os processos de síntese e degradação dentro da célula, incluindo o transporte de membrana, a síntese de proteínas, a lipogênese e as reações de diacilação-reacilação, necessárias para a renovação dos fosfolipídios. A depleção significativa de ATP tem amplos efeitos em muitos sistemas celulares críticos: A atividade da bomba de sódio na membrana plasmática dependente de ATP é reduzida, resultando em acúmulo intracelular de sódio e efluxo de potássio. O ganho final de soluto é acompanhado por um ganho iso-osmótico de água, causando tumefação celular e dilatação do RE. Ocorre aumento compensatório na glicólise anaeróbica, na tentativa de manter as fontes de energia celular. Como consequência, as reservas de glicogênio intracelular são rapidamente exauridas e o ácido lático se acumula, levando à diminuição do pH intracelular e à diminuição da atividade de muitas enzimas celulares. A falência na bomba de Ca2+ leva ao influxo de Ca2+, com efeitos danosos em vários componentes celulares, descritos adiante. A depleção prolongada ou crescente de ATP causa o rompimento estrutural do aparelho de síntese proteica, manifestado como desprendimento dos ribossomos do retículo endoplasmático granular (REG) e dissociação dos polissomos em monossomos, com consequente redução da síntese de proteína. Finalmente, ocorre dano irreversível às membranas mitocondriais e lisossômicas, e a célula sofre necrose. DANOS E DISFUNÇÕES MITOCONDRIAIS As mitocôndrias são sensíveis a vários tipos de estímulos nocivos, incluindo hipóxia, toxinas químicas e radiação. Os danos mitocondriais resultam em graves anormalidades bioquímicas: Falha na fosforilação oxidativa levando a depleção progressiva de ATP, culminando na necrose da célula, como descrito anteriormente. Fosforilação oxidativa anormal leva também à formação de espécies reativas de oxigênio, com muitos efeitos deletérios, descritos adiante. A lesão mitocondrial frequentemente resulta na formação de um canal de alta condutância na membrana mitocondrial, chamado de poro de transição de permeabilidade mitocondrial. A abertura desse canal leva à perda do potencial de membrana da mitocôndria e à alteração do pH, comprometendo a fosforilação oxidativa. As mitocôndrias contêm também várias proteínas que, quando liberadas para o citoplasma, informam à célula que há uma lesão interna e ativam a via de apoptose, discutida adiante. INFLUXO DE CÁLCIO A importância do Ca2+ na lesão celular foi estabelecida pelo achado experimental de que o cálcio extracelular depletado retarda a morte celular após hipóxia e exposição a algumas toxinas. A isquemia e certas toxinas causam aumento da concentração do cálcio citosólico, inicialmente por causa da liberação de Ca2+ armazenado intracelularmente e, mais tarde, do cálcio que resulta do influxo aumentado através da membrana plasmática. O aumento do cálcio citosólico ativa várias enzimas, com efeitos celulares potencialmente prejudiciais. Essas enzimas incluem as fosfolipases (que causam danos à membrana), as proteases (que clivam as proteínas de membrana e do citoesqueleto), as endonucleases (que são responsáveis pela fragmentação da cromatina e do DNA) e as trifosfatases de adenosina (ATPases), acelerando a depleção de ATP. O aumento dos níveis de Ca2+ intracelular resultam, também, na indução da apoptose, através da ativação direta das caspases e pelo aumento da permeabilidade mitocondrial. ACÚMULO DE RADICAIS LIVRES DERIVADOS DO OXIGÊNIO (ESTRESSE OXIDATIVO) Os radicais livres são espécies químicas que possuem um único elétron não pareado em órbita externa. Tais estados químicos são extremamente instáveis e reagem prontamente com químicos orgânicos e inorgânicos; quando gerados nas células, atacam avidamente os ácidos nucleicos, assim como uma variedade de proteínas e lipídios celulares. Além disso, os radicais livres iniciam reações autocatalíticas; as moléculas que reagem com eles são, por sua vez, convertidas em radicais livres, propagando, assim, a cadeia de danos. As espécies reativas do oxigênio (ERO) são um tipo de radical livre derivado do oxigênio, cujo papel na lesão celular está bem estabelecido. Em muitas circunstâncias, a lesão celular envolve danos causados pelos radicais livres; essas situações incluem a lesão de isquemia-reperfusão (discutida adiante), a lesão química e por radiação, a toxicidade do oxigênio e outros gases, o envelhecimento celular, a destruição dos micróbios pelas células fagocíticas e a lesão tecidual causada por células inflamatórias. Existem diferentes tipos de ERO produzidos por duas vias principais (ESTUDO DIRIGIDO): • Normalmente as ERO são produzidas em pequenas quantidades, em todas as células, durante as reações de oxidação e redução que ocorrem durante a respiração e a geração de energia mitocondrial. • As ERO são produzidas pelos leucócitos, principalmente neutrófilos e macrófagos, como uma arma para destruição de micróbios e outras substâncias durante a inflamação e defesa do hospedeiro. • O óxido nítrico (NO) é outro radical livre reativo produzido pelos leucócitos e outras células. Ele pode reagir com o O2 e formar um composto altamente reativo, o peroxinitrito, que também participa da lesão celular. O dano causado pelos radicais livres é determinado por suas taxas de produção e remoção. Quando a produção de ERO aumenta ou quando os sistemas de remoção são ineficientes, o resultado é um excesso desses radicais livres que leva a uma condição chamada de estresse oxidativo. A geração de radicais livres aumenta sob várias circunstâncias: • Na absorção de energia radiante (p. ex.,luzultravioleta,raiosX). A radiação ionizante pode hidrolisar a água em radicais livres hidroxila (OH) e hidrogênio (H). • No metabolismo enzimático de substâncias químicas exógenas (p. ex., tetracloreto de carbono – ccl4). • Na inflamação, onde os radicais livres são produzidos pelos leucócitos. As espécies reativas do oxigênio causam lesão celular através de três principais reações: • Peroxidação lipídica das membranas. Ligações duplas de lipídios polinsaturados na membrana são vulneráveis ao ataque por radicais livres derivados do oxigênio. As interações lipídio-radical geram peróxidos, que são instáveis e reativos, e sobrevém uma reação em cadeiaautocatalítica. • Ligação cruzada e outras alterações das proteínas. Os radicais livres promovem ligação cruzada das proteínas mediadas por sulfidrila, resultando no aumento da degradação ou perda da atividade enzimática. As reações radicais livres também podem causar a fragmentação dos polipeptídios. • Lesões do DNA. As reações radicais livres com a timina no DNA mitocondrial e nuclear produzem quebra do filamento único no DNA. Essa lesão no DNA foi implicada na morte celular, envelhecimento celular e transformação maligna das células Além do papel das ERO na lesão celular e destruição de micróbios, baixas concentrações de ERO estão envolvidas em numerosas vias de sinalização celular e em muitas reações fisiológicas. Portanto, essas moléculas são produzidas normalmente, mas, para evitar seus efeitos lesivos, suas concentrações intracelulares são rigorosamente reguladas nas células saudáveis. DEFEITOS NA PERMEABILIDADE DA MEMBRANA O aumento da permeabilidade da membrana, levando posteriormente a lesão franca da membrana, é uma característica consistente da maioria das formas de lesão celular que culmina em necrose. A membrana plasmática pode ser danificada por isquemia, várias toxinas microbianas, componentes líticos do complemento e por uma variedade de agentes químicos e físicos. Vários mecanismos bioquímicos podem contribuir para os danos à membrana: Diminuição da síntese de fosfolipídios. Nas células, a produção de fosfolipídios pode ser reduzida sempre que houver queda dos níveis de ATP, levando ao decréscimo das atividades enzimáticas dependentes de energia. A redução de síntese de fosfolipídios afeta todas as membranas celulares, incluindo as membranas mitocondriais, exacerbando, assim, a perda de ATP. Aumento da degradação dos fosfolipídios. Uma lesão celular acentuada está associada ao aumento da degradação dos fosfolipídios da membrana, provavelmente devido à ativação de fosfolipases endógenas por elevação dos níveis de Ca2+ citosólico. ERO. Os radicais livres do oxigênio causam lesão às membranas celulares através da peroxidação lipídica, discutida inicialmente. Alterações do citoesqueleto. Os filamentos do citoesqueleto funcionam como âncoras que conectam a membrana plasmática ao interior da célula e exerce muitas funções na manutenção da arquitetura, na motilidade e na sinalização celulares normais. A ativação de proteases pelo Ca2+ citosólico aumentado pode danificar os elementos do citoesqueleto, levando a lesão da membrana. Produtos de degradação de lipídios. Incluem ácidos graxos livres não esterificados, acil-carnitina e lisofosfolipídios, produtos catabólicos que são conhecidos por acumularem-se nas células lesadas, em consequência da degradação fosfolipídica. Possuem efeito detergente sobre as membranas. Também se inserem na bicamada lipídica da membrana ou trocam de posição com os fosfolipídios da membrana, causando potencialmente alterações na permeabilidade e alterações eletrofisiológicas. Danos na membrana mitocondrial. Como já discutido, os danos às membranas mitocondriais resultam em decréscimo da produção de ATP, culminando em necrose. Danos à membrana plasmática. Os danos à membrana plasmática levam à perda do equilíbrio osmótico e influxo de fluidos e íons, bem como à perda dos conteúdos celulares. As células podem, também, perder metabólitos que são vitais para a reconstituição do ATP, depletando, então, os estoques de energia. Danos às membranas lisossômicas resultam em extravasamento de suas enzimas para o citoplasma e ativação das hidrolases ácidas, em pH intracelular ácido da célula lesada (p. ex., célula isquêmica). Os lisossomos contêm ribonucleares (RNases), DNases, proteases, glicosidases e outras enzimas. A ativação dessas enzimas leva à digestão enzimática dos componentes celulares, e a célula morre por necrose. DANOS AO DNA E ÀS PROTEÍNAS As células possuem mecanismos que reparam as lesões de DNA, porém se o dano é muito grave para ser corrigido (p. ex., após lesão por radiação ou estresse oxidativo) a célula inicia seu programa de suicídio e morre por apoptose. Uma reação semelhante é iniciada por proteínas impropriamente dobradas, as quais podem ser resultantes de mutações herdadas ou disparadores externos, como os radicais livres.
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