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Definição: Os distúrbios causados por respostas imunes são chamados de hipersensibilidade. Em geral, as respostas imunes erradicam os organismos infectantes sem provocar graves lesões aos tecidos do hospedeiro. No entanto, essas respostas são, algumas vezes, controladas de maneira inadequada, inapropriadamente direcionadas aos tecidos do hospedeiro ou desencadeadas por microrganismos comensais ou antígenos ambientais, os quais geralmente são inofensivos. Nestas situações, a resposta imune, normalmente benéfica, torna-se a causa da doença. Causas da hipersensibilidade: As respostas imunes contra antígenos de diferentes fontes podem ser a causa subjacente de distúrbios de hipersensibilidade. Autoimunidade: reações contra antígenos próprios. A falha dos mecanismos normais de autotolerância resulta em reações contra as próprias células e tecidos. Esse fenômeno é chamado de autoimunidade. As doenças causadas por reações de autoimunidade são denominadas doenças autoimunes. Reações contra microrganismos. As respostas imunes contra antígenos microbianos podem causar doença se as reações forem excessivas ou se os microrganismos forem anormalmente persistentes. As respostas das células T contra microrganismos persistentes podem dar origem a uma inflamação grave, algumas vezes, com a formação de granulomas; esta é a causa da lesão tecidual observada na tuberculose e algumas outras infecções crônicas. Se forem produzidos anticorpos contra antígenos microbianos, eles podem se ligar aos antígenos para produzir imunocomplexos, que se depositam nos tecidos e desencadeiam inflamação. Raramente, os anticorpos ou células T contra um microrganismo apresentarão uma reação cruzada com o tecido do hospedeiro. Em algumas doenças que envolvem o trato intestinal, denominadas doença do intestino irritável, a resposta imune é direcionada contra bactérias comensais que normalmente residem no intestino e não causem danos. Muitas vezes, os mecanismos que uma resposta imune usa para erradicar um microrganismo patogênico requerem a morte das células infectadas e, por conseguinte, causam lesão do tecido do hospedeiro. Reações contra antígenos ambientais. Indivíduos produzem anticorpos imunoglobulina E (IgE) que causam doenças alérgicas. Alguns indivíduos tornam-se sensibilizados a antígenos ambientais e substâncias químicas, que, em contato com a pele, desenvolvem reações de células T que levam à inflamação mediada por citocinas, resultando em sensibilidade de contato. Em todas essas condições, os mecanismos de lesão do tecido são os mesmos normalmente observados na eliminação de agentes infecciosos. Esses mecanismos incluem respostas imunes inatas e adaptativas que envolvem fagócitos, anticorpos, linfócitos T, mastócitos e várias outras células efetoras, além dos mediadores da inflamação. O problema na hipersensibilidade é que a resposta imune não é controlada adequadamente. Como os estímulos para essas respostas imunes anormais são difíceis ou impossíveis de se eliminar (p. ex., autoantígenos, microrganismos comensais e antígenos ambientais) e o sistema imune possui muitas alças de retroalimentação positiva intrínsecas (mecanismos de amplificação), sempre que uma resposta imune patológica é iniciada, é difícil controlá-la ou interrompê-la. Dessa maneira, as doenças de hipersensibilidade tendem a ser crônicas e progressivas. Mecanismos e classificação das reações de hipersensibilidade As hipersensibilidades são geralmente classificadas de acordo com o tipo de resposta imune e o mecanismo efetor responsável pela lesão celular e tecidual. Tutoria 6- hipersensibilidade ! • A hipersensibilidade imediata (hipersensibilidade do tipo I): causada por anticorpos IgE específicos para antígenos ambientais, é o tipo mais prevalente de hipersensibilidade. A hipersensibilidade imediata, comumente chamada de alergia ou atopia, é o exemplo de doença resultante da ativação de células T auxiliares produtoras de IL4, IL-5 e IL-13, classicamente denominadas células TH2, onde as células T estimulam a produção de anticorpos IgE e a inflamação. • Os anticorpos IgG e IgM podem causar lesão tecidual por meio da ativação do sistema complemento, recrutando células inflamatórias e interferindo nas funções celulares normais. Alguns desses anticorpos são específicos para antígenos de determinadas células ou da matriz extracelular e são encontrados ligados a essas células ou tecidos ou como anticorpos livres na circulação; as doenças induzidas por esses anticorpos são chamadas de hipersensibilidade do tipo II. • Outros anticorpos podem formar imunocomplexos na circulação – de modo que os complexos são subsequentemente depositados nos tecidos, particularmente nas paredes dos vasos sanguíneos – e causar lesões. As doenças decorrentes de imunocomplexos também são chamadas de hipersensibilidade do tipo III. • A lesão tecidual pode ocorrer em razão dos linfócitos T que induzem inflamação ou matam diretamente as células-alvo; tais condições são chamadas de hipersensibilidade do tipo IV. Elas são causadas principalmente pela ativação de células T auxiliares CD4 +, as quais secretam citocinas que promovem a inflamação e ativam os leucócitos, especialmente neutrófilos e macrófagos. As células T auxiliares também estimulam a produção de anticorpos que danificam os tecidos e induzem a inflamação. Os CTLs contribuem para a lesão de tecidos em determinadas doenças. Sistema complemento e seus mecanismos de ação: O sistema complemento consiste em várias proteínas plasmáticas que trabalham juntas para opsonizar os microrganismos promover o recrutamento de fagócitos para o local de infecção e, em alguns casos, matar diretamente os microrganismos. A ativação do complemento envolve cascatas proteolíticas nas quais uma enzima precursora inativa, chamada de zimogênio, é alterada para se tornar uma protease ativa que cliva e, assim, induz a atividade proteolítica da próxima proteína do complemento na cascata. As cascatas enzimáticas resultam em significativa amplificação da quantidade de produtos proteolíticos que são gerados. Esses produtos realiz as funções efetoras do sistema complemento. Além do sistema complemento, outras cascatas proteolíticas importantes medicamente incluem as vias da coagulação sanguínea e o sistema cinina-calicreína que regula a permeabilidade vascular. O primeiro passo na ativação do sistema complemento é o reconhecimento de moléculas nas superfícies microbianas, mas não nas células do hospedeiro, o que ocorre de três maneiras, cada uma se referindo a uma via distinta da ativação do complemento: • A via clássica, assim chamada porque foi descoberta primeiro, utiliza uma proteína plasmática chamada de C1q para detectar anticorpos ligados na superfície do microrganismo ou outra estrutura (Fig. 4-11). Uma vez que C1q tenha se ligado à porção Fc dos anticorpos, duas serinoproteases associadas, chamadas de C1r e C1s, se tornam ativas e iniciam uma cascata proteolítica envolvendo outras proteínas do complemento. A via clássica é um dos principais mecanismos efetores do braço humoral das respostas imunes adaptativas.As proteínas solúveis do sistema imune inato denominadas pentraxinas, que serão discutidas mais adiante, também podem se ligar ao C1q e iniciar a via clássica. • A via alternativa, que foi descoberta mais tarde, porém é filogeneticamente mais antiga do que a via clássica, é disparada quando uma proteína do complemento chamada de C3 reconhece diretamente certas estruturas da superfície microbiana, tais como LPS bacteriano. O C3 também é constitutivamente ativado em solução a um baixo nível e se liga às superfícies celulares, mas, então, é inibido por moléculas regulatórias presentes nas células de mamíferos. Pelo fato de os microrganismos não terem essas proteínas regulatórias, a ativação espontânea pode ser amplificada nas superfícies microbianas. Assim, esta via pode distinguir o próprio normal de microrganismos estranhos baseando-sena presença ou ausência das proteínas regulatórias. • A via da lectina é disparada por uma proteína plasmática chamada de lectina ligante de manose (MBL), que reconhece resíduos de manose terminal nas glicoproteínas e nos glicolipídios microbianos, similarmente ao receptor de manose nas membranas dos fagócitos descrito anteriormente (Fig. 4-11). A MBL é um membro da família de colectina (discutido anteriormente) com uma estrutura hexamérica similar ao componente C1q do sistema complemento. Após a MBL se ligar aos microrganismos, dois zimogênios chamados de MASP1 (serinoprotease 1 associada à manose ou serinoprotease associada à lectina ligante de manan) e MASP2, com funções similares ao C1r e C1s, se associam à MBL e iniciam passos proteolíticos na cascata e idênticos à via clássica. O reconhecimento dos microrganismos por qualquer uma das três vias do complemento resulta em recrutamento sequencial e montagem de proteínas adicionais do complemento em complexos de proteases. Um desses complexos, chamado de C3 convertase, cliva uma proteína central do sistema complemento, C3, produzindo C3a e C3b. O maior fragmento C3b se torna covalentemente ligado à superfície microbiana onde a via do complemento foi ativada. Observe como uma opsonina para promover a fagocitose dos microrganismos. O fragmento menor, C3a, é liberado e estimula a inflamação agindo como quimioatraente para neutrófilos. O C3b se liga a outras proteínas do complemento para formar uma protease chamada de C5 convertase, que cliva C5, gerando um peptídio liberado (C5a) e um fragmento maior (C5b) que permanece ligado nas membranas da célula microbiana. C5a também é quimioatraente; além disso, ele induz mudanças nos vasos sanguíneos que os fazem extravasar proteínas plasmáticas e fluidos para os locais de infecções. C5b inicia a formação de um complexo de proteínas do complemento C6, C7, C8 e C9, que são montadas em um poro da membrana denominado complexo de ataque da membrana (MAC) que causa a lise das células onde o complemento é ativado. O sistema complemento é um componente essencial da imunidade inata, e pacientes com deficiências em C3 são altamente suscetíveis a infecções bacterianas recorrentes, frequentemente letais. Deficiências genéticas na formação de MAC (o produto terminal da via clássica) aumenta a suscetibilidade a somente um número limitado de microrganismos, notadamente a bactéria Neisseria, que tem paredes celulares finas que a tornam especialmente suscetível à ação lítica do MAC. Deficiências do Complemento As deficiências genéticas das proteínas do complemento e de proteínas reguladoras são as causas de várias doenças humanas. Foram descritas deficiências herdadas e espontâneas em muitas das proteínas do complemento em humanos. A deficiência de fator H é rara e caracterizada por excesso de ativação da via alternativa, consumo de C3 e glomerulonefrite causada por eliminação inadequada de imunocomplexos e deposição renal de subprodutos do complemento. Uma forma atípica de síndrome hemolítico-urêmica envolve a regulação defeituosa do complemento, e as mutações mais comuns nesta condição ocorrem no gene do Fator H. Variantes alélicas específicas do Fator H estão fortemente associadas à degeneração macular relacionada com a idade. Os efeitos da falta de Fator I ou de Fator H são semelhantes aos de um autoanticorpo, denominado fator nefrótico de C3 (C3NeF), que é específico para C3-convertase da via alternativa (C3bBb). C3NeF estabiliza C3bBb e protege o complexo de dissociação mediada pelo Fator H, o que resulta em consumo desregulado de C3. Os pacientes com esse anticorpo frequentemente apresentam glomerulonefrite, possivelmente causada pela retirada inadequada de imunocomplexos circulantes. ! • Tolerância ao próprio Tolerância imunológica é a não responsividade a um antígeno, induzida pela exposição de linfócitos específicos a este antígeno. A tolerância à auto antígenos é uma propriedade fundamental do sistema imunológico normal; a falha da auto tolerância leva às doenças autoimunes. Pode-se administrar antígenos de forma a induzir tolerância em vez de imunidade, o que pode ser explorado para a prevenção e tratamento de rejeição a transplante e doenças alérgicas e autoimunes. A tolerância central é induzida nos órgãos linfoides centrais (timo e medula óssea), quando linfócitos imaturos encontram autoantígenos presentes nestes órgãos. A tolerância periférica ocorre quando linfócitos maduros reconhecem auto antígenos em tecidos periféricos em condições particulares. Em linfócitos T, a tolerância central ocorre quando timócitos imaturos com receptores de alta afinidade para auto antígenos reconhecem esses antígenos no timo. Algumas células T imaturas que encontram auto antígenos no timo morrem (seleção negativa), enquanto outras desenvolvem-se em linfócitos T regulatórios FoxP3+ que têm função de controlar respostas a auto antígenos em tecidos periféricos. Diversos mecanismos são responsáveis pela tolerância periférica em células T maduras. Em células CD4+, a anergia é induzida pelo reconhecimento do antígeno sem coestimulação adequada ou por envolvimento de receptores inibitórios como o CTLA-4 e o PD-1. Células T regulatórias inibem respostas imunológicas através de mecanismos múltiplos. Células T que encontram auto antígenos sem outro estímulo ou que são estimuladas repetidamente podem morrer por apoptose. Em linfócitos B, a tolerância central é induzida quando células B imaturas reconhecem auto antígenos polivalentes na medula óssea. O resultado é a aquisição de uma nova especificidade, chamada edição de receptor, ou a morte por apoptose das células B imaturas. Células B maduras que reconhecem auto antígenos na periferia (na ausência de ajuda de célula T) podem tornar-se anérgicas, morrendo por apoptose ou tornando-se funcionalmente não responsivas por causa da ativação de receptores inibitórios. A autoimunidade resulta da falência da autotolerância. Em indivíduos geneticamente suscetíveis, reações autoimunes podem ser disparadas por estímulos ambientais como infecções. A maioria das doenças autoimunes é poligênica, e numerosos genes suscetíveis contribuem para o desenvolvimento das mesmas. A maior contribuição é dos genes MHC; acredita-se que outros genes contribuam para influenciar a seleção ou regulação de linfócitos autorreativos. Infecções podem predispor à autoimunidade através de diversos mecanismos, incluindo expressão elevada de coestimuladores nos tecidos e reações cruzadas entre antígenos de microrganismos e autoantígenos. Algumas infecções podem proteger indivíduos da autoimunidade através de mecanismos desconhecidos. • Resumo: O sistema imune tem a capacidade de distinguir o próprio do não-próprio, ou seja, de tolerar os antígenos do hospedeiro e responder a antígenos estranhos. Para isso, existem vários processos adquiridos ativamente, em que linfócitos autorreativos são excluídos do plantel ou inativados após encontrar antígenos próprios. Esses processos podem ser induzidos nos órgãos linfóides centrais ou nos tecidos periféricos. -Tolerância central: É necessário que haja um equilíbrio no reconhecimento dos antígenos próprios para evitar autoreatividade ou anergia. Linfócitos T Ocorre no timo durante o desenvolvimento fetal e por pouco tempo após o nascimento. Baseia-se na deleção clonal de linfócitos T autoreativos. Antígenos próprios são apresentados aos LT, que já possuem receptores específicos. Esses linfócitos podem ter 3 tipos de comportamento quanto ao reconhecimento de antígenos junto ao MHC dos timócitos: − não reconhecem e sofrem apoptose por falta de estímulo − reconhecem avidamente e sofrem apoptose por serem autorreativos − reconhecem pouco e são selecionados para maturação nos órgãos linfóides periféricos Linfócitos B Se o LB em algum momento da maturação encontrar o antígeno na ausência de estimulação pelo LTh o processo provavelmente será abortado. Ocorre na medulaóssea quando antígenos multivalentes (proteínas de membrana) ou antígenos presentes em altas concentrações induzem a morte das células B. Por outro lado, a baixa concentração de antígenos próprios solúveis induzem anergia por decréscimo de Ig de membrana ou por falta de sinais de ativação intracelulares. -Tolerância periférica Alguns linfócitos potencialmente autoreativos podem escapar da deleção clonal. Existem algumas maneiras de o sistema imune evitar autoimunidade: - Sequestração antigênica Existem antígenos que se encontram em sítios que o sistema imune não entra em contato (ex: cérebro, câmara anterior do olho, ovário, placenta, testículo e útero gravídico). Assim, nesses locais, não há resposta imune em condições normais. - Anergia e deleção clonal ocorre pela ausência de moléculas co-estimulatórias nas APCs, pois o reconhecimento TCR-MHC-II induz anergia ou apoptose na falta de tais moléculas. Processo semelhante ocorre com as células B: na falta de estímulo da Th, ocorre down regulation dos receptores de superfície (IgM). - Regulação por T supressoras: Existem linfócitos T que secretam citocinas imunosupressoras tais como TGF$ e IL-10. -Alteração da resposta Th1 para Th2 e vice-versa -Tolerância a antígenos estranhos: Em geral, antígenos solúveis tendem a induzir tolerância, enquanto antígenos particulados ou agregados induzem imunidade. Células T podem desenvolver tolerância rápida e duradoura a pequenas doses de antígenos solúveis enquanto células B necessitam de repetidas doses em alta concentração e ainda assim a tolerância não dura muito tempo. Antígenos administrados por via oral, intravenosos ou, às vezes, inalatória podem induzir tolerância. Administração oral de antígenos induz o desenvolvimento de linfócitos T secretores de TGF $ e IL-10 ou podem alterar o padrão da resposta imune (Th1-Th2). Repetidas doses de antígenos durante muito tempo podem diferenciar todo o clone de linfócitos esgotando o pool de células de memória. Febre reumática: O que é a Febre Reumática? A Febre Reumática é uma doença inflamatória que pode comprometer as articulações, o coração, o cérebro e a pele de crianças de 5 a 15 anos. O que causa a Febre Reumática? A Febre Reumática é uma reação a uma infecção de garganta por uma bactéria conhecida como estreptococo. Essa infecção de garganta é caracterizada clinicamente por febre, dor de garganta, caroços no pescoço (gânglios aumentados) e vermelhidão intensa, pontos vermelhos ou placas de pus na garganta. A criança, geralmente maior de 3 anos de idade, poderá apresentar a infecção de garganta como qualquer outra criança e, geralmente, uma a duas semanas depois começa a apresentar as queixas da Febre Reumática. Qualquer criança que tem infecção de garganta pode apresentar Febre Reumática? Não. Somente aquelas com predisposição para apresentar a doença. Inúmeras crianças apresentam frequentes infecções de garganta, especialmente nos primeiros anos de vida, porém isto não é suficiente para predispô-las a apresentar a Febre Reumática. A predisposição necessária para apresentar a doença é herdada dos pais e já nasce com a criança. Quais são as manifestações da Febre Reumática? A manifestação mais frequente é a artrite que se caracteriza por dor intensa, que dificulta o caminhar, e por inchaço e calor discretos. As articulações mais acometidas são os joelhos e tornozelos. É comum a dor e as outras alterações passarem de uma articulação para outra, permanecendo de dois a três dias em cada uma. A simples presença de dor em uma ou mais articulações ou nas pernas, e sem as outras alterações (inchaço e calor), não é um sinal da doença. A segunda manifestação da Febre Reumática é o comprometimento do coração (cardite) caracterizado por inflamação nas três camadas (na membrana que o reveste, no músculo e no tecido que recobre as válvulas). Clinicamente nós identificamos esse comprometimento pelo sopro cardíaco, pelo aumento da frequência dos batimentos do coração e pelas queixas de cansaço e batedeira aos esforços. Este é o comprometimento mais importante porque pode deixar sequelas e limitar a vida do paciente. A terceira manifestação é a coréia, que se caracteriza por fraqueza nos braços e nas pernas, por sensibilidade emocional (a criança torna-se mais irritada e chorona) e por movimentos dos braços e das pernas que pioram quando a criança fica tensa e desaparecem durante o sono. É importante saber que esta manifestação da febre reumática pode vir isoladamente (sem a artrite e/ou cardite) e meses após o quadro da infecção de garganta. A criança com Febre Reumática sempre tem febre? Não. Embora o nome seja sugestivo, nem todas as crianças apresentam febre como manifestação da doença. Ela aparece com maior frequência durante a infecção de garganta e não necessariamente quando ela começa a apresentar as manifestações da Febre Reumática. Fisiopatologia da Febre Reumática (FR) Até a presente data, admite-se que a FR ocorra através de um mecanismo de hipersensibilidade. A origem da doença parece estar associada a uma reação cruzada de anticorpos produzidos originalmente contra produtos e estruturas dos estreptococos, porém passam a reconhecer também as células do hospedeiro, que se tornam alvos dos anticorpos produzidos contra o antígeno infeccioso, processo chamado mimetização molecular. Sabe-se que ambas as respostas imunes mediadas por linfócitos B e T estão envolvidos no processo inflamatório da FR. Além disso, também há produção de citocinas inflamatórias que exacerbam a reação autoimune, sendo responsáveis pela progressão e manutenção da lesão valvar crônica. O processo inflamatório cardíaco está associado a uma reação cruzada entre a proteína M do Streptococcus pyogenes e as proteínas miosina, queratina e outras proteínas do tecido cardíaco humano. A reação inflamatória desencadeada em reação ao Streptococcus pyogenes induz uma inflamação no miocárdio e no endotélio da valva cardíaca que é facilitada a infiltração de células T. A lesão articular surge devido à semelhança do ácido hialurônico do estreptococo com o ácido dos tecidos humanos, ocorrendo a formação de anticorpos que atuam contra a cartilagem das articulações. De modo semelhante, anticorpos que reagem de forma cruzada com a membrana dos estreptococos citados, atuam contra o citoplasma de neurônios localizados nos núcleos caudados e subtalâmico do cérebro, resultando na coréia de Sydenham. A única sequela em longo prazo é a cardiopatia reumática. No início ocorrem lesões como a fragmentação das fibras colágenas, edema da substância intercelular, infiltração celular e degeneração fibrinoide. No coração, as lesões iniciais surgem nas valvas cardíacas sob a forma aparente de pequenas verrugas ao longo da linha de fechamento, podendo posteriormente, as valvas tornarem-se espessadas e deformadas, com as cordoalhas encurtadas, resultando em estenose ou insuficiência valvar. A valva mitral é mais frequentemente envolvida, vindo a seguir a aórtica, a tricúspide, e, raramente a pulmonar. Pode ocorrer degeneração difusa e até necrose das células musculares cardíacas, com lesões inflamatórias perivasculares, formando os nódulos de Aschoff, que são formados por área central fibrinoide circundada por linfócitos, plasmócitos e grandes células basofílicas. Os nódulos subcutâneos se assemelham aos nódulos de Aschoff. Glomerulonefrite Pós-estreptocócica A GNPE caracteriza-se, fundamentalmente, por processo inflamatório, de origem imunológica, que acomete todos os glomérulos de ambos os rins. É considerada, juntamente com a febre reumática, seqüela tardia, não supurativa, de estreptococcia. É rara em menores de dois anos, sendo mais frequente no período pré-escolar e escolar, com pico de incidência ao redor dos sete anos. A incidência no sexo masculino em relação ao feminino é de 2:1, nos casos associados à infecção de vias aéreas superiores; enquanto nos casos de piodermite observa-se equivalênciaentre os sexos. Fisiopatogenia e Fisiopatologia A relação com infecção estreptocócica precoce está bem estabelecida e existem fortes evidências de que o antígeno desencadeante da nefropatia correlaciona-se com raças nefritogênicas do estreptococo beta- hemolítico do grupo A (SβGA). O SβGA é a bactéria que com maior freqüência causa infecções no homem, realçando-se que, durante a vida, praticamente todos os seres humanos sofrem múltiplas agressões por este microorganismo. O estreptococo é constituído por três partes: cápsula, parede celular e citoplasma. A parede celular é formada por uma camada protéica e, a proteína M, constituinte desta parede, permite que os estreptococos sejam tipados por técnica de precipitação de 1 a 61 e, também, representa o antígeno responsável pela indução da imunidade na infecção estreptocócica. Portanto, no soro de indivíduos adultos, comumente encontram-se anticorpos contra vários tipos de estreptococos. Além da imunidade antibacteriana, existe também a imunidade antitóxica, que é transplacentária e protege a criança no primeiro ano de vida. Relaciona-se com a toxina eritrogênica e quando adquirida por infecção provavelmente persiste por toda a vida. A fisiopatogenia da GNPE não está totalmente definida. Pesquisa inicial de McIntosh demonstra que a neuraminidase produzida pelo estreptococo nefritogênico atuaria sobre a imunoglobulina G (IgG) autóloga, removendo o ácido siálico e tornando-a antigênica. Esta IgG modificada depositar-se-ia inicialmente na região subendotelial da membrana basal glomerular, ativaria o sistema do complemento, liberaria as frações C5a e C5b com atividades quimiotáxicas, provocaria a migração de polimorfonucleares que, por sua vez, liberariam proteases e/ou ativariam substâncias oxidantes que iniciariam o processo inflamatório na membrana basal glomerular. A partir do processo inflamatório, que acontece ao nível dos capilares glomerulares, ocorre redução no ritmo de filtração glomerular (RFG) devido à redu- ção do coeficiente de ultrafiltração. Esta redução aguda do RFG leva à retenção de sódio, enquanto a função tubular praticamente normal causa um desajuste do balanço glomerulotubular. Tal fato, associado à ingestão de água e sódio, resultará na expansão do volume extracelular (edema e hipertensão) e na conseqüente supressão do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Além do aumento do volume circulante, acredita-se que nos capilares sistêmicos ocorram alterações das forças determinantes da lei de Starling, contribuindo para o aparecimento do edema. Na fisiopatologia da hipertensão arterial , além da já citada hipervolemia por retenção de água e sódio, encontra-se vasoespasmo generalizado. AUTOMUNIDADE: • É definida como uma resposta imune contra antígenos próprios (autólogos). • A autoimunidade pode ser uma importante causa de doença, quando por esse mecanismo se desenvolve lesão tecidual . • Os principais fatores de autoimunidade são a herança de genes suscetíveis e os estímulos ambientais (por exemplo as infecções e lesão tecidual). FATOR GENÉTICO 1) A associação entre os alelos do HLA e as doenças autoimunes em humanos foi reconhecida há vários anos, sendo uma evidência de que as células T possuem importante papel nestas doenças uma vez que a única função conhecida das moléculas do MHC é apresentar antígenos peptídicos à células T. A presença de determinado alelo do HLA em um indivíduo pode levar à uma maior probabilidade de desenvolver a doença HLA associada (razão de probabilidade ou risco relativo), entretanto a existência do alelo HLA não é, por ele mesmo a causa da doença. Na verdade em indivíduos doentes a existência desse alelo é reconhecida, entretanto o alelo pode aparecer em indivíduos que nunca virão a manifestar a doença. 2) Polimorfismo de genes não HLA também são associados a doenças autoimunes podendo contribuir com a falha de autotolerância ou ativação anormal de linfócitos. Por exemplo a variante de polimorfismo do Gene NOD2 confere suscetibilidade à Doença de Crohn, entre outras… F A T O R E S A M B I E N T A I S Agentes agressores externos principalmente as infecções podem ativar os linfócitos autorreativos e levar ao d e s e n v o l v i m e n t o d e d o e n ç a s a u t o i m u n e s . 1) A infecção de um tecido pode induzir resposta da imunidade inata,ocasionando o aumento da expressão de coestimuladores e citocinas pelas células apresentadoras de antígenos teciduais ,estas são responsáveis pela estimulação de células T autorreativas (infecção quebrando a tolerância de cels.T autorreativas). 2) Algumas infecções podem produzir peptídeos antigênicos que são semelhantes e reagem de maneira c r u z a d a c o m a n t í g e n o s p r ó p r i o s - M I M E T I S M O M O L E C U L A R . Uma lesão tecidual pode desencadear a exposição de um autoantígeno antes desconhecido ativando linfócitos autorreativos ocasionando resposta autoimune. Mecanismos de autoimunidade A possibilidade de que o sistema imunológico de um indivíduo pudesse reagir contra antígenos autólogos e causar dano tecidual foi observada por imunologistas ao mesmo tempo que estes reconheceram a especificidade do sistema imunológico para antígenos estranhos. No início da década de 1990, Paul Ehrlich cunhou a expressão melodramática “horror autotóxico” para as reações imunológicas prejudiciais ao próprio indivíduo. A autoimunidade é uma causa importante de doenças em humanos, e estima-se que estas afetam, no mínimo, 2%a 5%da população dos Estados Unidos. Frequentemente, usa-se erroneamente o termo autoimunidade para qualquer doença na qual as reações imunológicas acompanham dano tecidual, embora seja muito difícil (ou quase impossível) estabelecer um papel para as respostas imunológicas contra autoantígenos como causa para esses distúrbios. Já que a inflamação é um componente importante nessas doenças, costuma-se agrupá-las como doenças inflamatórias mediadas pela imunidade, o que não implica que a resposta patológica seja direcionada contra autoantígenos (Cap. 19). As questões fundamentais a respeito da autoimunidade são (1) como a autotolerância falha e (2) de que forma os linfócitos autorreativos são ativados. Precisa-se de respostas para essas perguntas, a fim de compreender a etiologia e a patogênese das doenças autoimunes, que consistem no desafio principal da Imunologia. Nosso entendimento sobre autoimunidade melhorou bastante durante as duas últimas décadas, principalmente por causa do desenvolvimento de modelos animais informativos dessas doenças, da identificação dos genes que podem predispor à autoimunidade e de métodos mais aprimorados para a análise das respostas imunológicas em humanos. Diversos conceitos gerais importantes surgiram a partir de estudos sobre autoimunidade. Os fatores que contribuem para o desenvolvimento da autoimunidade são a suscetibilidade genética e os gatilhos ambientais, como infecções e lesão local no tecido. Genes de suscetibilidade podem prejudicar os mecanismos de autotolerância; a infecção ou necrose nos tecidos promovem o influxo de linfócitos autorreativos e a ativação dessas células, resultando em lesão tecidual (Fig. 15-11). Infecções e lesão tecidual também podem alterar a forma como os autoantígenos são apresentados para o sistema imunológico, levando à falha da autotolerância e à ativação dos linfócitos autorreativos. Os papéis desses fatores no desenvolvimento da autoimunidade serão discutidos posteriormente. Outros fatores como mudanças namicrobiota do indivíduo e alterações epigenéticas nas células imunológicas podem desempenhar papéis importantes na patogênese, mas os estudos nesses tópicos ainda estão muito no início. Características Gerais das Doenças Autoimunes Doenças autoimunes apresentam diversas características gerais que são relevantes para a definição de seus mecanismos subjacentes. • Doenças autoimunes podem ser sistêmicas ou órgão-específicas, dependendo da distribuição dos autoantígenos que são reconhecidos. Por exemplo, a formação de complexos imunológicos circulantes (compostos de autonucleoproteínas e anticorpos específicos) produz tipicamente doenças sistêmicas, como o lúpus eritematoso sistêmico (SLE, do inglês systemic lupus erythematosus). Ao contrário, respostas de autoanticorpos ou células T contra autoantígenos com distribuição tecidual restrita levam a doenças específicas dos órgãos, como miastenia grave, diabetes tipo 1 e esclerose múltipla. • Vários mecanismos efetores são responsáveis pela lesão do tecido em diferentes doenças autoimunes. Esses mecanismos incluem complexos imunológicos, autoanticorpos circulantes e linfócitos T autorreativos e serão discutidos no Capítulo 19. As características clínicas e patológicas da doença geralmente são determinadas pela natureza da resposta autoimune dominante. • Doenças autoimunes tendem a ser crônicas, progressivas e de autoperpetuação. As razões para essas características são: (1) os autoantígenos que disparam essas reações são persistentes e, uma vez que a resposta imunológica se inicia, muitos mecanismos amplificadores que são ativados perpetuam essa resposta; (2) uma resposta iniciada contra um autoantígeno que lesiona tecidos pode resultar na liberação e alteração de outros antígenos teciduais, na ativação de linfócitos específicos para esses outros antígenos e na exacerbação da doença. Este fenômeno, conhecido como propagação de epítopo, pode explicar por que uma vez desenvolvida a doença autoimune, esta pode se prolongar ou se autoperpetuar.
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