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■ DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO ■ 1. CONCEITO DE DIREITO DO TRABALHO Direito do Trabalho é o ramo da ciência do Direito composto pelo conjunto de normas que regulam, no âmbito individual e coletivo, a relação de trabalho subordinado, que determinam seus sujeitos (empregado e empregador) e que estruturam as organizações destinadas à proteção do trabalhador. ■ 1.1. Evolução histórica do Direito do Trabalho A origem do Direito do Trabalho está vinculada à Revolução Industrial, nome pelo qual é conhecida a longa série de mudanças tecnológicas, econômicas, sociais e políticas ocorridas no século XIX. O Direito do Trabalho nasce, assim, com a sociedade industrial e o trabalho assalariado, por razões de ordem econômica, política e jurídica. A principal causa econômica foi a própria Revolução Industrial (fins do século XVIII, início do século XIX), que trouxe mudanças tecnológicas que incluíram o uso de novos materiais básicos, tais como o ferro e o aço, a descoberta de novas fontes de energia, tais como o carvão, a máquina a vapor, a eletricidade, os motores de combustão, a máquina de fiar, o tear mecânico. Também o desenvolvimento dos transportes, como a locomotiva a vapor e o navio, e das comunicações, como o telégrafo e o rádio. Essas modificações tecnológicas levaram às modificações econômicas, que ocorreram em virtude da transformação da produção artesanal em uma produção em larga escala, o que levou ao desenvolvimento do comércio e à definição dos conceitos de lucro e acumulação de riquezas. Com a expansão da indústria e do comércio, houve a substituição do trabalho escravo, servil e corporativo pelo trabalho assalariado em larga escala, do mesmo modo que a manufatura cedeu lugar à fábrica e, mais tarde, à linha de produção. A principal causa política foi a transformação do Estado Liberal (da plena liberdade contratual) em Estado Neoliberal (o Estado intervém na ordem econômica e social, limitando a liberdade plena das partes). As formas extremadas de intervenção do Estado foram o corporativismo e o socialismo, com características fortemente autoritárias, transferindo a ordem trabalhista para o âmbito das relações de natureza pública. A principal causa jurídica foi a justa reivindicação dos trabalhadores, de um sistema de direito destinado à sua proteção, passando alguns direitos básicos a ser reconhecidos, com o reconhecimento da necessidade de se assegurar uma igualdade jurídica a uma relação (entre empregado e empregador) na qual não há uma igualdade natural. Uma consequência importantíssima dessa causa jurídica foi o surgimento do sindicalismo, como forma de união dos trabalhadores para conseguirem melhores condições de trabalho. Começa a surgir uma legislação em condições de coibir os abusos do empregador e preservar a dignidade do homem no trabalho, ao contrário do que ocorria com o proletariado exposto a jornadas diárias excessivas, salários extremamente baixos, exploração de menores e mulheres e desproteção total diante de acidentes no trabalho e riscos sociais como a doença, o desemprego etc. Essas modificações contribuíram decisivamente, como uma reação contra a QUESTÃO SOCIAL, pois traziam a ideia de justiça social. ■ 1.1.1. Constitucionalismo social Constitucionalismo social é o movimento que se caracteriza pela inserção de direitos trabalhistas e sociais fundamentais nos textos das Constituições dos países. A Constituição mexicana de 1917 foi a primeira a construir uma estrutura significativa de direitos sociais dos trabalhadores, seguida pela Constituição alemã (Constituição de Weimar) de 1919. Aos poucos, as Constituições modernas dos Estados democráticos foram reproduzindo os princípios das Constituições do México e da Alemanha. ■ 1.2. Direito do Trabalho no Brasil Pode-se afirmar que o Direito do Trabalho no Brasil inicia-se a partir da Revolução de 1930, quando o Governo Provisório chefiado por Getúlio Vargas criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e deu início à elaboração de uma legislação trabalhista ampla e geral. Em 1943 é aprovada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estruturando a legislação trabalhista e assegurando direitos muito importantes aos trabalhadores. Com a Constituição Federal de 1988, os direitos dos trabalhadores são elevados a categoria de direitos fundamentais. ■ 2. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO Os princípios do Direito de Trabalho se constituem nas linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das relações de trabalho. A doutrina identifica as seguintes funções dos princípios: Função informadora – servem de fonte de inspiração ao legislador e de fundamento para as normas jurídicas. Função normativa – servem como fonte supletiva, nas lacunas ou nas omissões da lei. Função interpretativa – servem como critério orientador para os intérpretes e aplicadores da lei. De acordo com o art. 4º da LINDB, quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. O art. 8º da CLT disciplina claramente que, na falta de disposições legais ou contratuais, o intérprete pode socorrer-se dos princípios do Direito do Trabalho. Evidencia-se, pois, o caráter informador dos princípios de orientar o legislador na fundamentação das normas jurídicas, assim como o de fonte normativa, para suprir lacunas ou omissões da lei. A Constituição Federal de 1988 não enumerou expressamente os princípios do Direito do Trabalho. No entanto, é inquestionável a existência no texto constitucional de princípios que são aplicáveis no âmbito do Direito do Trabalho (art. 1º, III e IV; art. 193; art. 170, caput, III e VIII; art. 5º, caput, I, X, XIII, XVII a XX, XLI e XLII). ■ 2.1. Princípios específicos do Direito do Trabalho ■ 2.1.1. Princípio protetor Refere-se a um critério fundamental orientador do Direito do Trabalho: em vez de inspirar-se num propósito de igualdade, baseia-se em um amparo preferencial a uma das partes da relação de emprego: o trabalhador. O fundamento deste princípio está ligado à própria razão de ser do Direito do Trabalho: nivelar desigualdades. O princípio protetor é desmembrado em três regras: a) Regra da norma mais favorável – é regra de aplicação de norma jurídica: sempre que existirem várias normas aplicáveis a uma mesma situação jurídica, deve-se aplicar a norma mais favorável ao trabalhador. No Direito do Trabalho não se considera uma ordem hierárquica de normas, mas, no caso concreto, deverá ser aplicada a norma mais favorável ao trabalhador. Assim, por exemplo, admite-se a prevalência de cláusula mais favorável de uma convenção coletiva de trabalho sobre uma lei trabalhista que regule a mesma matéria. Admite-se a prevalência de cláusula mais favorável de um acordo coletivo de trabalho sobre o quanto previsto na Constituição Federal 1. Mas como comparar as normas para saber qual delas é a mais favorável? Adotando-se a chamada teoria do conglobamento, as normas devem ser comparadas em conjunto, ou seja, na sua integralidade, não sendo possível fazer a comparação extraindo-se de cada uma das normas apenas as disposições mais favoráveis2. b) Regra do “in dubio pro operario” – é regra de interpretação de norma jurídica: entre duas ou mais interpretações viáveis de uma norma jurídica, o intérprete deve optar pela mais favorável ao trabalhador. 2 Este é o critério que o intérprete deve levar em conta todas as vezes que uma norma possuir vários sentidos diferentese uma escolha tiver de ser feita: deve prevalecer aquele sentido que for o mais favorável ao trabalhador. c) Regra da condição mais benéfica – pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que for mais favorável ao trabalhador do que a nova norma aplicável. A nova regulamentação deverá respeitar, com situações concretas reconhecidas em favor do trabalhador, as condições que lhe resultem mais benéficas do que as estabelecidas para a matéria tratada pela nova regulamentação. Neste sentido, em relação ao regulamento de empresa, a Súmula 51 do TST estabelece: I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento; II – Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. ■ 2.1.2. Princípio da irrenunciabilidade Refere-se à impossibilidade de o empregado abrir mão voluntariamente dos direitos que lhe são concedidos pela legislação trabalhista. Quais são os efeitos da violação do princípio da irrenunciabilidade? Tendo em vista que as normas trabalhistas são, em sua maioria, de ordem pública e, portanto, inderrogáveis, as renúncias que ocorrerem carecem de qualquer efeito no mundo do direito: são absolutamente ineficazes, ou seja, nulas de pleno direito 3. Importante é a diferença no Direito do Trabalho entre renúncia e transação. Renúncia é ato unilateral e voluntário através dos qual o titular de um direito certo desiste do referido direito, ou seja, abre mão do mesmo. A renúncia pelo empregado de direitos que lhe são assegurados pelas normas de ordem pública não é permitida. Transação é ato bilateral através do qual as partes de uma relação jurídica, fazendo concessões recíprocas, extinguem obrigações litigiosas ou duvidosas. A transação no Direito do Trabalho é permitida, mas apenas de forma restrita, tendo em vista que sua validade depende da inexistência de qualquer prejuízo ao empregado. Neste sentido dispõe o art. 468 da CLT: Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia. ■ 2.1.3. Princípio da continuidade da relação de emprego Expressa a tendência atual do Direito do Trabalho de atribuir à relação de emprego a mais ampla duração, sob todos os aspectos. Através deste princípio presume-se que o contrato de trabalho terá validade por prazo indeterminado. Tudo o que vise à conservação da fonte de trabalho e a dar segurança ao trabalhador gera um benefício não só a ele, mas também para a empresa e para a sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e a melhorar o clima social das relações entre as partes. O ônus de provar o término do contrato por iniciativa do obreiro é de iniciativa do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado (Súmula 212, TST). ■ 2.1.4. Princípio da primazia da realidade Significa que, em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência aos fatos (contrato- realidade). O significado que deve se atribuir a este princípio é o da prevalência dos fatos sobre as formas, formalidades ou as aparências. Isto significa que, em matéria de trabalho, o que vai importar é o que ocorre na prática, muito mais do que aquilo que conste em documentos, formulários e instrumentos de controle. É claro que não se pode concluir absolutamente que esta primazia dos fatos sobre os documentos pactuados significa que as estipulações contratuais carecem de qualquer valor. O que não se pode fazer é invocar um texto escrito para pretender que ele prime sobre os fatos. Como exemplos de prevalência dos fatos sobre a formalidade de documentos, podemos citar: a) – contrato expresso escrito: autônomo / – contrato-realidade: empregado; b) – vínculo de emprego – Carteira Profissional – data de ingresso: 15-9-2000 / – data real de ingresso: 15-9-1999; c) – Aviso e recibo de férias: assinado pelo empregado / realidade: não recebeu, nem gozou de férias; d) horas extras: cartões de ponto: não registram horas extras / – depoimentos de testemunhas: comprovam horas extras. Assim, com fundamento no art. 9º da CLT, verifica-se que, se o documento foi formalmente elaborado com o intuito de, encobrindo a realidade dos fatos, fraudar as normas trabalhistas, será nulo de pleno direito. ■ 2.1.5. Princípio da razoabilidade Consiste na afirmação de que o ser humano, em suas relações trabalhistas, procede e deve proceder conforme a razão. Trata-se de um limite ou um freio formal a ser aplicado naquelas áreas do comportamento onde a norma não pode prescrever limites muito rígidos e onde a norma não pode prever a infinidade de circunstâncias possíveis. No Direito do Trabalho, este princípio tem duas grandes formas de aplicação: a) em alguns casos serve para medir a verossimilhança de determinada aplicação ou solução; b) em outros casos atua como obstáculo, como limite de certas faculdades cuja amplitude pode prestar-se à arbitrariedade. ■ 2.1.6. Princípio da boa-fé O trabalhador deve cumprir o contrato de boa-fé, enquanto o empregador deve cumprir lealmente suas obrigações. Trata-se de princípio que abrange ambas as partes do contrato, e não apenas uma delas. Este princípio é visto como um princípio geral que deve ser levado em conta para a aplicação de todos os direitos e obrigações que as partes adquirem como consequência do contrato de trabalho e que informa a totalidade de regulamentação, com características de postulado moral e jurídico. A boa-fé se refere à conduta da pessoa que deve cumprir realmente com seu dever, pressupondo uma posição de honestidade e honradez na relação jurídica, porque contém implícita a consciência de não enganar, não prejudicar, nem causar danos. ■ 3. FONTES DO DIREITO DO TRABALHO O ordenamento jurídico trabalhista é composto de disposições que provêm de diversas fontes. A expressão “fontes do Direito” é utilizada em sentido metafórico4 e significa origem, manancial de onde surge o Direito do Trabalho; são os modos de formação ou de revelação das normas jurídicas. As fontes do Direito do Trabalho classificam-se em fontes materiais (todos os elementos que inspiram a formação das normas jurídicas trabalhistas; os fatos verificados em uma sociedade em determinado momento histórico e que contribuirão para a formação e a substância das normas jurídicas trabalhistas) e fontes formais (os diferentes meios pelos quais se estabelecem as normas jurídicas trabalhistas; são as próprias normas jurídicas trabalhistas). As fontes formais podem ser divididas em heterônomas (são as elaboradas por terceiros, alheios às partes da relação jurídica que regulam; o comando normativo vem de fora) e autônomas (aquelas elaboradas pelos próprios destinatários da norma, ou seja, as partes da relação jurídica; são também chamadas de normas contratuais). ■ 3.1. Fontes formais heterônomas Como normas jurídicas elaboradas por terceiros, alheios à relação jurídica regulada, são: a) as normas jurídicas de origem estatal, entre as quais destacam- se a Constituição Federal, as leis, os atos administrativos; b) as sentenças normativas da Justiça do Trabalho, que constituem uma peculiaridade deste ramo do Direito; e c) asentença arbitral, como norma jurídica decorrente da solução de conflitos coletivos de trabalho. ■ 3.1.1. Constituição Federal É a principal fonte do Direito e, consequentemente, do Direito do Trabalho. Dela emanam todas as normas, independentemente de sua origem e formação, sendo certo que todas as demais normas devem estar em estrita consonância com suas regras e princípios. Em relação aos direitos trabalhistas estabelece os limites mínimos e máximos, entre os quais as demais normas podem estipular direitos e garantias. ■ 3.1.2. Lei É o preceito comum e obrigatório, emanado dos poderes competentes e provido de sanção (MAGANO, 1993, p. 97). No sentido material, é toda regra de direito geral, abstrata e permanente, tornada obrigatória pela vontade da autoridade competente para produzir direito e expressa numa fórmula escrita, enquanto, no sentido estrito, é a norma jurídica emanada do Poder Legislativo, sancionada e promulgada pelo Presidente da República (SÜSSEKIND, 2003, p. 154). Especificamente em relação ao Direito do Trabalho, a CLT elenca o maior contingente de normas imperativas, mas existem diversas leis esparsas que tratam de matéria trabalhista (por exemplo, Lei n. 8.036/90 – FGTS; Lei n. 605/49 – DSR; Lei n. 4.090/62 – 13º salário). ■ 3.1.3. Ato administrativo O art. 84, IV, da Constituição Federal prevê que compete privativamente ao Presidente da República expedir decretos e regulamentos que permitam a fiel execução das leis. Trata-se de poder regulamentar, no exercício do qual a Administração Pública estabelece normas jurídicas que, em sentido material, revestem-se de características de lei. ■ 3.1.4. Sentença normativa Constitui a exteriorização do poder normativo da Justiça do Trabalho, previsto no § 2º do art. 114 da Constituição Federal. Decorre do julgamento pela Justiça do Trabalho de conflito coletivo, estabelecendo regra geral e abstrata aplicável a todos os trabalhadores e empregadores integrantes das categorias envolvidas no litígio. ■ 3.1.5. Jurisprudência Formada pelas interpretações dos tribunais acerca da ordem jurídica, exerce inegável papel de criação do Direito. O art. 8º da CLT reconhece a jurisprudência como fonte normativa do Direito do Trabalho. ■ 3.1.6. Sentença arbitral É a decisão de caráter normativo tomada por um árbitro escolhido por sindicatos e por empresas para a solução de um conflito coletivo de trabalho, na forma indicada pelo § 1º do art. 114 da Constituição Federal. ■ 3.2. Fontes formais autônomas Originam-se da atuação dos sindicatos representantes de trabalhadores e empregadores na busca de soluções para os conflitos coletivos de trabalho, ou seja, decorrem da atuação direta dos próprios destinatários da norma, através da negociação coletiva de trabalho. Através dos instrumentos de negociação coletiva (convenção coletiva de trabalho e acordo coletivo de trabalho), os próprios interessados estabelecem a disciplina das suas condições de vida e de trabalho de forma democrática e dinâmica. ■ 3.2.1. Convenção coletiva de trabalho É o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho (CLT, art. 611). Aplica-se a todos os trabalhadores e empregadores integrantes das respectivas categorias profissional e econômica no âmbito da base territorial de representação dos sindicatos. ■ 3.2.2. Acordo coletivo de trabalho Pactuado entre uma ou mais empresas e o sindicato representativo dos trabalhadores na base territorial respectiva. Aplica-se apenas às empresas signatárias e aos seus respectivos empregados (CLT, art. 611, § 1º). ■ 3.2.3. Costume Prática reiterada e espontânea de certo modo de agir de conteúdo jurídico por determinado grupo social. Os costumes constituem fonte do Direito do Trabalho à medida que, enquanto não se promulga uma lei relativamente a uma determinada prática, são utilizados como fonte informativa das relações entre empregados e empregadores. ■ 3.2.4. Regulamento de empresa É um ato jurídico que, no âmbito interno da empresa, cria regras a serem adotadas nas relações jurídicas mantidas entre o empregador e seus empregados. ■ 3.3. Hierarquia das fontes no Direito do Trabalho No Direito do Trabalho, tal como ocorre em relação às fontes do Direito em geral, as diversas fontes compõem uma unidade coerente, havendo uma hierarquia entre elas. Como é óbvio, a Constituição Federal é a norma fundamental e, nesta condição, coloca-se no topo da ordem hierárquica das fontes formais do Direito do Trabalho. Abaixo da Constituição, alinham-se, em ordem hierárquica decrescente, as leis, os atos do Poder Executivo, as sentenças normativas, as convenções e acordos coletivos de trabalho, os costumes. No entanto, apesar da existência de uma ordem entre as fontes do Direito do Trabalho, a hierarquia existente entre elas é bastante peculiar, podendo ser chamada de flexível, e difere da regra de hierarquia rígida e inflexível aplicável no Direito Comum. Assim, no Direito do Trabalho deve ser aplicada sempre a norma que oferecer maiores vantagens ou benefícios ao trabalhador, ou seja, será considerada hierarquicamente superior a norma mais favorável ao trabalhador. ■ 4. RELAÇÃO DE EMPREGO A relação de emprego é a relação jurídica que tem como fato social original o trabalho humano não eventual e subordinado, prestado com pessoalidade, mediante remuneração e que tem como disciplina jurídica o conjunto de normas que compõem o Direito do Trabalho. Na relação de emprego, o vínculo jurídico é estabelecido entre empregado e empregador e é regulado pelas normas jurídicas trabalhistas. Assim, como objeto do Direito do Trabalho, a relação de emprego deve ser analisada a partir do estudo das suas características, de seus sujeitos e de sua natureza jurídica. ■ 4.1. Características Ao contrário da relação de trabalho, que é genérica e que se refere a todas as relações jurídicas fundadas em uma obrigação de fazer consubstanciada no trabalho humano, a relação de emprego, embora também tenha por fundamento o trabalho humano, é específica, possuindo características próprias que a distinguem das demais formas de prestação de serviço. A relação de trabalho é, deste modo, gênero, que tem, entre uma de suas espécies, a relação de emprego. Os elementos característicos da relação de emprego decorrem do disposto nos arts. 2º e 3º da CLT e são: a) pessoalidade – na relação de emprego o trabalho prestado tem caráter infungível, pois quem o executa deve realizá-lo pessoalmente, não podendo fazer-se substituir por outra pessoa. A relação de emprego é, pois, uma relação intuitu personae, sendo tal característica derivada do fato de que neste tipo de relação jurídica o que se contrata não é o serviço como resultado final, mas sim o serviço prestado pessoalmente por alguém. O empregado obriga-se a prestar pessoalmente os serviços contratados, não podendo, por sua iniciativa, fazer-se substituir por terceiros. b) não eventualidade – na relação de emprego a prestação de serviço é habitual, repetitiva, rotineira. As obrigações das partes se prolongam no tempo, com efeitos contínuos. O trabalho deve, portanto, ser não eventual, o que significa dizer que o empregado se obriga a prestar serviços com continuidade, da mesma forma que as obrigações do empregador em relação aos benefícios trabalhistas assegurados ao empregado permanecemenquanto durar a relação de emprego. Importante ressaltar, porém, que não é necessário que os serviços sejam prestados diariamente. O importante é que haja a expectativa de retorno do empregado ao serviço, isto é, já se sabe que os serviços serão desenvolvidos em determinado dia, por determinada pessoa, e sua ausência acarretará prejuízos. O que caracteriza a habitualidade não é a prestação diária de trabalho, mas sim o sentido de permanência e de prolongamento no tempo que a prestação dos serviços tem. c) subordinação – a subordinação deriva da própria estrutura da relação jurídica de emprego, que se baseia na transferência pelo empregado ao empregador do poder de direção sobre o seu trabalho. É a sujeição do empregado às ordens do empregador, é o estado de dependência do trabalhador em relação ao seu empregador. Com a transferência do poder de direção, o empregador assume os riscos da atividade econômica e passa a estabelecer os contornos da organização do trabalho do empregado (poder de organização), a fiscalizar o cumprimento pelo empregado das ordens dadas no exercício do poder de organização (poder de controle), podendo, em caso de descumprimento pelo empregado das determinações, impor-lhe as sanções previstas no ordenamento jurídico (poder disciplinar). d) remuneração – a relação de emprego não é gratuita ou voluntária, ao contrário, haverá sempre uma prestação (serviços) e uma contraprestação (remuneração). A onerosidade caracteriza-se pelo ajuste da troca de trabalho por salário. O que importa não é o quantum a ser pago, mas sim o pacto, a promessa de prestação de serviço de um lado e a promessa de pagamento do salário de outro lado. Ressalte-se que o fato do empregador deixar de pagar o salário não afasta a existência de onerosidade e, portanto, não descaracteriza o contrato de trabalho, pois a obrigação de pagar o salário existe, apenas não está sendo cumprida. A existência de relação de emprego somente se verifica quando todas estas características estiverem presentes ao mesmo tempo. A ausência de um ou de alguns destes elementos caracterizadores pode implicar a existência de uma relação de trabalho, mas jamais de uma relação de emprego. Observação: Além das quatro características acima apontadas, alguns autores ressaltam ser a alteridade um outro traço distintivo que pode ser atribuído à relação de emprego. A alteridade decorre do fato de que na relação de emprego os serviços são prestados por conta alheia, ou seja, o empregador é quem assume os riscos da atividade econômica. ■ 4.2. Sujeitos Os sujeitos da relação de emprego são empregado e empregador. O conceito legal de empregado está expresso no art. 3º da CLT: toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. A definição de empregado deve ser completada por mais um requisito expresso no art. 2º da CLT, qual seja, a prestação pessoal de serviços. O conceito legal de empregador está expresso no art. 2º da CLT: Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços. ■ 4.3. Natureza jurídica A natureza jurídica da relação de emprego é discutida a partir de duas teorias: a) teoria contratualista – afirma a natureza contratual da relação de emprego, ou seja, a relação entre empregado e empregador decorre de acordo de vontades e, portanto, é fundada em um contrato. A relação de emprego é um negócio jurídico que se insere no âmbito da autonomia privada. Tendo origem na autonomia da vontade das partes, a relação de emprego tem inegável natureza contratual. Por esta razão, o art. 442 da CLT estabelece que contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso correspondente à relação de emprego. b) teoria anticontratualista – nega a natureza contratual da relação de emprego. Para os anticontratualistas a autonomia da vontade não tem qualquer influência ou relevância na formação e no desenvolvimento deste tipo específico de relação jurídica denominada de relação de emprego. ■ 5. RELAÇÃO DE TRABALHO Podem ser consideradas como relação de trabalho todas as relações jurídicas fundadas em uma obrigação de fazer consubstanciada no trabalho humano, enquanto somente existirá relação de emprego quando o trabalho humano se desenvolver de forma não eventual e subordinada, sendo prestado com pessoalidade e mediante remuneração. A relação de trabalho é gênero, sendo a relação de emprego uma de suas espécies. Entre as diversas espécies de relação de trabalho, analisaremos as seguintes, buscando identificar suas características específicas que as diferenciam da relação de emprego: ■ 5.1. Trabalho autônomo É aquele que se desenvolve por conta própria, sem subordinação, ou seja, o trabalhador autônomo exerce suas atividades com independência, não se subordinando às ordens e ao controle do tomador dos serviços. Considera-se autônomo o prestador de serviços que desenvolve sua atividade sem estar subordinado a horário, livre de fiscalização do destinatário dos serviços e, eventualmente, com auxílio de terceiros. O autônomo tem ampla liberdade quanto à forma e ao modo de execução dos serviços, estabelece o preço dos serviços e assume os riscos do empreendimento. O trabalho autônomo insere-se no âmbito do Direito Civil, sendo o trabalhador contratado mediante contrato de prestação de serviços regido basicamente pelos arts. 593 a 609 do Código Civil. ■ 5.2. Trabalho eventual É aquele exercido de forma esporádica, descontínua, fortuita. O trabalhador eventual presta serviços de curta duração para vários tomadores de serviço, sem habitualidade ou continuidade, não se fixando a uma fonte de trabalho. ■ 5.3. Trabalho temporário É disciplinado pela Lei n. 6.019, de 3-1-19745, e corresponde a uma relação composta por três pessoas (relação triangular), que gera, entre elas, vínculos jurídicos distintos e independentes, inconfundíveis entre si. A relação de trabalho temporário é desenvolvida entre uma empresa tomadora de serviços (ou empresa cliente), uma empresa de trabalho temporário e o trabalhador temporário. Há, portanto, uma intermediação de mão de obra, que rompe com a tradicional simetria da relação mantida entre empregado e empregador. O trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades- meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços (art. 9º, § 3º). A relação jurídica entre a empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviços (ou cliente) é de natureza civil (prestação de serviços de fornecimento de mão de obra). No que tange à relação entre o trabalhador temporário e a empresa de trabalho temporário, embora haja certa divergência na doutrina, é majoritariamente considerada relação de emprego, sob o argumento de que há previsão expressa na lei de que existe contrato de trabalho entre as partes. O trabalho temporário somente é admitido para atender (art. 2º): a) à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente do tomador de serviços (ex.: empregado está em licença médica por dois meses; nesse período é contratado um trabalhador temporário para o exercício da função); ou b) à demanda complementar de serviços (ex.: empresa recebe, excepcionalmente, encomenda muito grande e para atendê-la contrata trabalhador temporário). Considera-se complementar a demanda de serviços que seja oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, tenha natureza intermitente, periódica e sazonal (§ 2º, art. 2º). É proibidaa contratação de trabalho temporário para substituição de trabalhadores em greve, salvo nos casos previstos em lei (§ 1º, art. 2º). Assim, a empresa de trabalho temporário, que a Lei exige seja registrada como tal no Ministério do Trabalho (art. 4º), é contratada pela tomadora de serviços para colocar à disposição desta trabalhadores sempre que houver acréscimo complementar de serviço ou quando seja necessária a substituição transitória de pessoal permanente. A contratação do trabalhador temporário deve ser feita necessariamente através da celebração de contrato escrito firmado entre a empresa de trabalho temporário e a tomadora dos serviços, que ficará à disposição da autoridade fiscalizadora no estabelecimento da tomadora de serviços. Do contrato deve constar expressamente a qualificação das partes, o motivo justificador da contratação, o prazo da prestação de serviços, o valor da prestação de serviços e disposições sobre a segurança e a saúde do trabalhador, independentemente do local da realização do trabalho (art. 9º). É responsabilidade da empresa contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local por ela designado (§ 1º, art. 9º), devendo, ainda, estender ao trabalhador da empresa de trabalho temporário o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas suas dependências, ou em local por ela designado (§ 2º, art. 9º). Qualquer que seja o ramo da empresa tomadora de serviços, não existe vínculo de emprego entre ela e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário (art. 10). A duração do referido contrato não poderá, em relação a um mesmo empregador, exceder o prazo de cento e oitenta dias, consecutivos ou não, podendo ser prorrogado por até noventa dias, consecutivos ou não, quando comprovada a manutenção das condições que o ensejaram (§§ 1º e 2º, art. 10). Após o término do período de contratação, o trabalhador temporário somente poderá ser colocado à disposição da mesma tomadora de serviços em novo contrato temporário, após noventa dias do término do contrato anterior, sendo que a nova contratação em período inferior caracteriza vínculo de emprego com a tomadora (§§ 5º e 6º, art. 10). Não se aplica ao trabalhador temporário o contrato de experiência previsto na CLT (§ 4º, art. 10). O contrato de trabalho celebrado entre o trabalhador temporário e a empresa de trabalho temporário também deverá ser necessariamente escrito, com indicação expressa dos direitos assegurados ao trabalhador pela Lei (art. 11). O art. 12 da Lei n. 6.019/74 assegura ao trabalhador temporário os seguintes direitos: ■ anotação do contrato temporário na CTPS (na parte “anotações gerais”); ■ remuneração equivalente à do empregado substituído ou o mesmo salário do grupo no qual trabalhou em caso de acréscimo extraordinário de serviços; ■ indenização ao final do contrato (hoje equivalente a 40% dos depósitos do FGTS – CF, art. 7º, I); ■ férias proporcionais (hoje acrescidas de um terço – CF, art. 7º, XVII); ■ jornada de 8 horas diárias e 44 horas semanais (CF, art. 7º, XIII); ■ horas extras, com adicional de 50% sobre a hora normal (CF, art. 7º, XVI); ■ adicional noturno; ■ seguro contra acidente do trabalho; ■ proteção previdenciária. Além desses direitos, também são assegurados ao trabalhador temporário: ■ FGTS (art. 15, § 2º, Lei n. 8.036/90); ■ vale-transporte (art. 1º, Decreto n. 95.247/87); ■ seguro-desemprego (art. 3º, Lei n. 7.998/90). O trabalhador temporário é remunerado pela empresa de trabalho temporário, a quem também cabe a responsabilidade pelos direitos assegurados ao trabalhador (art. 4º). No entanto, caso não sejam observados os requisitos exigidos pela Lei n. 6.019/74, o vínculo de emprego se formará com o tomador dos serviços, que passará, neste caso, a ser o responsável pelos salários e direitos do trabalhador. A contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer o trabalho temporário (art. 10, § 7º). ■ 5.4. Trabalho avulso É o trabalho prestado de forma esporádica, de curta duração e a diversos tomadores, sem se fixar a qualquer um deles. No entanto, o trabalho avulso é realizado necessariamente através da intermediação feita por entidade específica, o que faz com que a relação também seja necessariamente triangular, envolvendo o fornecedor de mão de obra (entidade intermediária), o trabalhador avulso e o tomador do serviço. Nesta modalidade de trabalho é vedada a contratação direta do trabalhador pelo tomador dos serviços. Por muito tempo, embora fosse possível o exercício de trabalho avulso em diversas atividades específicas, o ordenamento jurídico brasileiro regulava apenas a modalidade de trabalho executada tipicamente nos portos. No entanto, a partir da promulgação da Lei n. 12.023/2009, passou a haver regulamentação também para a atividade urbana ou rural de movimentação de carga, exercida por trabalhador avulso. Nessa modalidade, a contratação de movimentador de carga avulso é feita mediante intermediação obrigatória do sindicato da categoria, por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho, não havendo vínculo de emprego entre o tomador de serviços e os trabalhadores, nem entre estes e o sindicato (art. 1º). Na modalidade de trabalho avulso portuário, que é regulado pela Lei n. 12.815/2013, os tomadores de serviço são basicamente os navios, armazéns, as empresas importadoras e exportadoras e os operadores portuários em geral. Os trabalhadores avulsos portuários são, como regra, trabalhadores de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações (art. 40). A intermediação do trabalho portuário avulso é exercida por um órgão gestor de mão de obra (OGMO), cujas funções são definidas pela Lei n. 12.815/2013 (art. 32). O órgão gestor de mão de obra é reputado pelo legislador como de utilidade pública, não podendo ter fins lucrativos e sendo-lhe vedada a prestação de serviços a terceiros ou o exercício de qualquer atividade não vinculada à gestão da mão de obra (art. 39). A Constituição Federal de 1988 confirmou de maneira inequívoca a proteção dos trabalhadores avulsos antes assegurada por diversas leis esparsas, garantindo-lhes os mesmos direitos previstos para os empregados urbanos e rurais (art. 7º, XXXIV). ■ 5.5. Trabalho voluntário É a atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou instituição privada sem fins lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos, ou de assistência social, inclusive mutualidade (art. 1º, Lei n. 9.608/98). O trabalhador voluntário presta serviços com intenção ou ânimo de caridade, de benemerência e não espera uma retribuição pecuniária pelo trabalho. Ao contrário, o trabalhador tem intenção, ânimo de trabalhar de forma graciosa, fundado em motivos de convicção pessoal, inexistindo qualquer expectativa por parte dele em receber um salário pelo trabalho executado. O serviço voluntário não gera vínculo empregatício ou previdenciário. A formalização do trabalho voluntário se dá através da assinatura pelas partes de “Termo de Adesão” (art. 2º). A contratante do trabalhador voluntário pode ressarcir as despesas devidamente comprovadas que o mesmo tenha realizado na prestação do serviço, sem que isto caracterize remuneração (art.3º). ■ 5.6. Estagiário Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, visando à preparação para o trabalho produtivo de alunos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de ensino superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos (art. 1º, Lei n. 11.788/2008). O objetivo do estágio é, essencialmente, a complementação do ensino teórico recebido nas escolas, com a experiência prática obtida junto à pessoa jurídica de direito privado ou ao órgão público concedente do estágio. O estágio não cria vínculo empregatício, desde que preenchidos os seguintes requisitos: a) matrícula e frequência regular do estudante na escola; b) celebração de um termo de compromisso; c) interveniência da instituição de ensino; d) compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas previstas nos termos de compromisso. O descumprimento de qualquer obrigação contida no termo de compromisso também caracteriza o vínculo de emprego entre o estudante e o concedente do estágio (art. 2º, caput e § 2º), exceto quando se tratar a parte concedente de ente da Administração Pública direta ou indireta (OJ SDI-1 366, TST). Parte concedente – podem oferecer estágio (art. 9º): ■ pessoas jurídicas de direito privado; ■ órgãos da Administração Pública direta, autárquica e fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; ■ profissionais liberais de nível superior devidamente registrados em seus respectivos conselhos de fiscalização profissional. A jornada de trabalho do estagiário será, no máximo (art. 10): ■ 4 horas diárias e 20 horas semanais no caso de estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos; ■ 6 horas diárias e 30 horas semanais no caso de estudantes do ensino superior, da educação profissional de nível médio e do ensino médio regular; ■ 40 horas semanais no caso de estudantes de cursos que alternem teoria e prática, nos períodos em que não estão programadas aulas presenciais, desde que haja previsão neste sentido no projeto pedagógico do curso e da instituição de ensino. No período em que ocorrerem verificações de aprendizagem periódicas ou finais, a carga horária do estágio será reduzida pelo menos à metade, a fim de assegurar o bom desempenho do estudante nas provas. A duração do estágio na mesma entidade concedente não poderá ser superior a dois anos, exceto quanto se tratar de estagiário portador de deficiência (art. 11). Remuneração: o recebimento de bolsa ou outra forma de contraprestação é: ■ facultativa, nos casos de estágio obrigatório; ■ compulsória, nos casos de estágio não obrigatório. Observação: A eventual concessão de benefícios relacionados a transporte, alimentação e saúde, entre outros, não caracteriza vínculo empregatício. Recesso: sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 ano, ao estagiário é assegurado um período de recesso de 30 dias, a ser gozado preferencialmente durante suas férias escolares (art. 13). Os dias de recesso serão concedidos de forma proporcional quando o estágio tiver duração inferior a 1 ano. Quando o estagiário receber bolsa ou outra forma de contraprestação, o recesso deverá ser remunerado. Limite do número de estagiários: o art. 17 estabelece uma proporção que deve ser seguida quanto ao número máximo de estagiários em relação ao quadro de pessoal das entidades concedentes. ■ 5.7. Cooperativa de trabalho Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro (art. 3º, Lei n. 5.764/71). A Constituição Federal de 1988, no Título que trata da ordem econômica e financeira, fixa como comando ao legislador infraconstitucional o apoio e o estímulo ao cooperativismo. Neste sentido, a Lei n. 5.764, de 16-12-1971, estabelece a política nacional de cooperativismo e institui o regime jurídico das cooperativas. Por fim, também o Código Civil de 2002 também contém disposições sobre as sociedades cooperativas (arts. 1.093 a 1.096). Nos termos do parágrafo único, do art. 442 da CLT, independentemente do ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo de emprego entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela. Assim, desde que a prestação de serviços ocorra efetivamente por cooperativa, constituída nos termos e para os fins previstos na Lei n. 5.764/71, não haverá relação de emprego. Todavia, ainda que sob a forma de trabalho cooperado, se constadas na prática as características da relação de emprego, esta será reconhecida, sendo a contratação por meio da cooperativa considerada nula nos termos do art. 9º da CLT. ■ 5.8. Terceirização de serviços É a contratação de trabalhadores por interposta pessoa, ou seja, o serviço é prestado através de uma relação triangular da qual fazem parte o trabalhador, a empresa terceirizante e a tomadora dos serviços. O trabalhador presta serviços para a tomadora, mas sempre por intermédio da empresa terceirizante, não havendo contratação direta neste caso. Trata-se, portanto, de uma subcontratação de mão de obra. Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos (art. 4º-A, Lei n. 6.019, de 3-1-19746), sendo quem contrata, remunera e dirige o trabalho prestado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para a realização desses serviços (§ 1º, art. 4º-A). São requisitos para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros: prova de inscrição no CNPJ; registro na Junta Comercial; capital social compatível com o número de empregados, de acordo com os parâmetros estabelecidos pela Lei (art. 4º-B). Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços determinados e específicos (art. 5º-A, Lei n. 6.019, de 3- 1-1974), a ela sendo vedada a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços (§ 1º, art. 5º-A). Os serviços contratados poderão ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local, de comum acordo entre as partes (§ 2º, art. 5º-A). A distinção entre terceirização em atividade-fim e atividade-meio feita pela Súmula 331 do TST não foi prevista pela Lei n. 13.429, de 31-3-2017, que, ao contrário, dispõe que não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja seu ramo, e a empresa contratante (§ 2º, art. 4º-A, Lei n. 6.019, de 3-1- 1974). É responsabilidade da empresa contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local previamente convencionado em contrato (§ 3º, art. 5º-A), podendo, ainda, estender ao trabalhador da empresa de trabalho temporário o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas suas dependências, ou em local por ela designado (§ 4º, art. 5º-A). O contrato de prestação de serviços conterá a qualificação das partes, a especificação do serviço a ser prestado, o prazo para realizaçãodo serviço, quando for o caso, e o valor (art. 5º-B). As disposições da Lei n. 6.019, de 3-1-1974, sobre contratação de serviços terceirizados, incluídas pela Lei n. 13.429, de 31-3-2017, não se aplicam às empresas de vigilância e transporte de valores, permanecendo as respectivas relações de trabalho reguladas por legislação especial, e subsidiariamente pela CLT (art. 19-B). A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços (art. 5º-A, § 5º). Os contratos de prestação de serviços terceirizados que estavam em vigor na data da publicação da Lei n. 13.429, de 31-3-2017, puderam ser adequados aos termos da referida Lei (art. 19-C, Lei n. 6.019, de 3-1-1974). ■ 6. EMPREGADO Empregado é a pessoa física que pessoalmente presta serviços não eventuais, sob a dependência de empregador e mediante remuneração (arts. 2º e 3º da CLT). Assim: a) o empregado é sempre pessoa física. Isto decorre da natureza do contrato de trabalho, pelo qual se contrata a prestação pessoal de serviços (intuitu personae), o que afasta, logicamente, a possibilidade de ser o empregado pessoa jurídica. A pessoa jurídica jamais poderá executar o próprio trabalho, fazendo-o por meio de pessoas físicas. b) os serviços contratados são prestados de modo não eventual, isto é, a utilização da força de trabalho, como fator de produção, corresponde às necessidades normais da atividade econômica em que é utilizada e se prolongam no tempo. A duração da prestação não importa; pela própria natureza da atividade do empregador, o serviço pode ser prestado apenas durante poucas horas diariamente, bastando que não seja excepcional ou transitório em relação à atividade do estabelecimento. c) a prestação do serviço é realizada de forma subordinada às ordens do empregador e não se dá sob forma autônoma, isto é, o trabalhador não exerce, ele próprio, uma atividade econômica. É preciso, portanto, para ser empregado, que o trabalhador se limite a permitir que sua força de trabalho seja utilizada na atividade econômica e produtiva exercida por outrem, a quem fica, por isso, juridicamente subordinado. d) o trabalho prestado é remunerado, ou seja, não se dá a título gratuito, porque o contrato de trabalho é oneroso. Não é a falta de estipulação do quantum do salário ou o seu pagamento sob forma indireta que desfiguram a condição de empregado, e sim a intenção de prestar o serviço desinteressadamente, por mera benevolência. Não há distinção entre o trabalho intelectual, técnico e manual (art. 3º, parágrafo único, CLT), sendo proibida a distinção entre essas formas de trabalho e os profissionais respectivos (art. 7º, XXXII, CF). ■ 7. EMPREGADOR O legislador define empregador como “a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços” (art. 2º, caput, CLT). Também podem ser empregadores os entes não dotados de personalidade jurídica (condomínio, massa falida, espólio), desde que admitam trabalhadores como empregados. A lei equiparou ao empregador, “para os efeitos exclusivos da relação de emprego” (art. 2º, § 1º, CLT), desde que admitam empregados: ■ os profissionais liberais; ■ as instituições de beneficência; ■ as associações recreativas; ■ outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. Assim, empregador é o tomador dos serviços; aquele que contrata o trabalho prestado de forma pessoal, subordinada, contínua e mediante remuneração pelo empregado. A noção de empregador está essencialmente relacionada ao conceito de empregado, ou seja, se de um dos polos da relação jurídica existir trabalho prestado por alguém com pessoalidade, não eventualidade, subordinação e remuneração, do outro lado haverá um empregador. Portanto, o empregador: a) pode ser pessoa física ou jurídica, e, ainda, ente despersonalizado; b) pode ter ou não finalidade lucrativa; c) assume os riscos da atividade econômica (alteridade); d) exerce o poder de direção, subordinando o empregado às suas ordens; e) é responsável pelo pagamento dos salários e pelo cumprimento de todos os direitos do empregado estabelecidos pelas normas trabalhistas. ■ 7.1. Poder de direção do empregador Ao ser contratado, o empregado transfere para o empregador o poder de direção sobre seu trabalho, passando a ser subordinado ao mesmo. Assim estrutura-se a relação jurídica objeto do Direito do Trabalho: de um lado, o poder de direção, reconhecido pela ordem jurídica ao empregador e exercido como contrapartida aos riscos da atividade econômica inerentes à própria atividade empresarial; de outro lado, o estado de subordinação do empregado, que se submete às regras de caráter hierárquico e técnico impostas pelo empregador. O poder de direção se divide em poder de organização (ou de comando), em poder de controle (ou de fiscalização) e poder disciplinar. O poder de organização consiste na faculdade que tem o empregador de determinar as atividades que serão exercidas pelo empregado e de definir as condições concretas e as regras gerais de trabalho a serem obedecidas pelo empregado, tais como jornada e horário de trabalho, processos de trabalho adotados no estabelecimento e na empresa etc. O poder de organização permite que o empregador utilize a força de trabalho do empregado da forma que melhor atenda aos interesses da empresa. Formas de exteriorização do poder de organização são o regulamento de empresa, que contém regras gerais, abstratas, impessoais e de cumprimento obrigatório no âmbito da empresa, e o quadro de carreira (ou plano de cargos e salários), prevendo promoções alternadas segundo critérios de antiguidade e de merecimento (art. 461, §§ 2º e 3º, CLT). O regulamento de empresa tem natureza contratual e, como consequência, adere ao contrato de trabalho, aplicando-se a ele, portanto, a regra da inalterabilidade das cláusulas contratuais insculpida no art. 468 da CLT. Súmula 51, TST I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. II – Havendo a coexistência de dois regulamentos de empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. Súmula 288, TST I – A complementação dos proventos de aposentadoria, instituída, regulamentada e paga diretamente pelo empregador, sem vínculo com as entidades de previdência privada fechada, é regida pelas normas em vigor na data de admissão do empregado, ressalvadas as alterações que forem mais benéficas (art. 468 da CLT). Quanto ao quadro de carreira, a existência do mesmo impede o reconhecimento do direito a equiparação salarial (art. 461, § 2º, CLT e Súmula 6, I, TST), mas não obsta a reclamação fundada em preterição, enquadramento ou reclassificação (Súmula 127, TST). O poder de controle é aquele através do qual o empregador verifica o exato cumprimento pelo empregado das determinações relativas à prestação do trabalho, ou seja, fiscaliza a atuação do empregado em relação ao cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de trabalho. A atividade do empregado, sendo subordinada ao poder de direção do empregador, não é exercida da forma ou do modo pretendido pelo empregado, mas sim da maneira como foi determinada pelo empregador. O poder disciplinar é o direito do empregador de impor sançõesdisciplinares aos seus empregados, em caso de descumprimento das obrigações contratuais. No direito brasileiro, as sanções disciplinares que podem ser aplicadas aos empregados em geral são a advertência, a suspensão e a dispensa por justa causa. ■ 7.2. Grupo econômico Existe grupo econômico, para fins trabalhistas, sempre que duas ou mais empresas, embora cada uma delas com personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra. Caracterizado o grupo econômico, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas, pelos direitos trabalhistas dos empregados de todas elas (art. 2º, § 2º, da CLT). Assim, são elementos componentes da estrutura do grupo econômico: a) existência de duas ou mais empresas; b) autonomia das empresas (personalidade jurídica própria); c) relação de dominação entre as empresas, através da direção, controle ou administração da empresa principal sobre as filiadas; d) atividade industrial, comercial, ou qualquer outra de caráter econômico; e) vínculo de solidariedade entre as empresas para o fim de garantir os direitos trabalhistas dos empregados; f) efeito incidente apenas na relação de emprego. Assim, como efeito jurídico do grupo econômico está a caracterização de um vínculo de solidariedade passiva entre as empresas componentes do grupo, ou seja, todas as empresas são responsáveis em igualdade de condições pelos créditos trabalhistas derivados dos contratos de trabalho de todos os empregados. Trata-se de hipótese de solidariedade decorrente de lei, nos exatos termos do art. 265 do Código Civil, e que tem como consequência o fato de o credor ter o direito de exigir e de receber qualquer um dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum (art. 275 do Código Civil). Súmula 129, TST A prestação de serviços a mais de uma empresa integrante do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário. Súmula 239, TST É bancário o empregado de empresa de processamento de dados que presta serviço a banco integrante do mesmo grupo econômico, exceto quando a empresa de processamento de dados presta serviços a banco e a empresas não bancárias do mesmo grupo econômico ou a terceiros. ■ 7.3. Sucessão de empregadores Decorre da alteração subjetiva do contrato de trabalho, havendo a modificação do sujeito empregador, mantendo-se intacta a relação de emprego. A sucessão de empregadores é prevista pelos arts. 10 e 448 da CLT, que preveem que: Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa ou na sua propriedade não afeta os contratos de trabalho dos respectivos empregados nem os direitos adquiridos pelos mesmos. A sucessão decorrente de alteração na estrutura jurídica da empresa abrange hipóteses como mudança de sociedade para firma individual ou vice-versa, alteração do tipo societário, fusão, incorporação, cisão etc. Essas modificações formais são irrelevantes para os contratos de trabalho que seguem normalmente seu curso. A sucessão decorrente da alteração na propriedade do empreendimento é representada pela alienação total ou parcial do empreendimento, com a continuação da prestação de serviços, pelos empregados, para o novo titular. Para que exista a sucessão de empregadores, dois são os requisitos indispensáveis: a) que um estabelecimento, como unidade econômico-jurídica, passe de um para outro titular (sucedido e sucessor); b) que a prestação de serviço pelos empregadores não sofra solução de continuidade. Fundamento – funda-se essa proteção no princípio da continuidade do contrato de trabalho e no princípio da despersonalização do empregador. Os contratos de trabalho são mantidos com a organização de trabalho e não com as pessoas que estejam eventualmente à frente dessa mesma organização → a intangibilidade dos contratos é preservada pelo Direito do Trabalho. Efeitos da sucessão de empregadores: a) sub-roga-se o novo proprietário em todas as obrigações do primeiro, desenvolvendo-se normalmente o contrato de trabalho, sem qualquer prejuízo para o trabalhador; b) a contagem de tempo de serviço não é interrompida; c) as obrigações trabalhistas vencidas à época do sucedido, mas ainda não cumpridas, são exigíveis do sucessor, porque a responsabilidade trabalhista existe em função da empresa; d) as sentenças judiciais podem ser executadas (embora não tenham sido na época do sucedido), desde que não prescritas, respondendo o sucessor, diretamente, por seus efeitos, inclusive reintegração de estáveis; e) os empregados cujos contratos de trabalho por ocasião da sucessão estiverem suspensos ou interrompidos têm o direito de reassumir os cargos → a sucessão não extingue as relações de emprego transitoriamente paralisadas por causas legais ou convencionais; f) os contratos a prazo devem ser respeitados pelo sucessor, persistindo o direito do empregado de cumpri-los até o fim; g) contagem dos períodos aquisitivos de férias dos empregados prossegue normalmente; h) débitos previdenciários assumidos pelo sucedido passam para o sucessor. Observações: A sucessão não é justa causa para que o empregado dê por rescindido o contrato de trabalho, nem para que pleiteie indenizações. Podem sucedido e sucessor, no contrato de transpasse, prever ação regressiva do segundo contra o primeiro, o que será decidido na Justiça Comum, mas em nada afetará os empregados, ou seja, essa pactuação de natureza civil entre as partes não gera efeitos para afastar a responsabilidade trabalhista do sucessor. ■ 8. EMPREGADO DOMÉSTICO Empregado doméstico é “aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana” (art. 1º, Lei Complementar n. 150/2015). Assim, são fatores que diferenciam o doméstico dos demais empregados: ■ trabalho para pessoa ou família; ■ trabalho no âmbito residencial; ■ inexistência de fins lucrativos no trabalho que exerce. Finalidade não lucrativa – o trabalho doméstico não visa lucro para o empregador. Não pode ser prestado na exploração de atividade comercial ou industrial, devendo ser realizado tão somente para o desenvolvimento da vida do lar, da vida familiar. Âmbito residencial da família – relaciona-se com o âmbito da prestação do trabalho, que abrange todo o local onde há o desenvolvimento da vida do lar, incluindo não só a moradia permanente (motorista, jardineiro, mordomo, babá etc.), como também suas extensões, como a chácara recreativa, o sítio de lazer, casa de praia (caseiro). O trabalho doméstico, como ocorre em qualquer tipo de relação de emprego, é prestado com pessoalidade, de forma contínua, subordinada e com onerosidade, ou seja, o empregado doméstico presta serviços pessoais, não eventuais e remunerados, sob as ordens do empregador. É vedada a contratação de menor de 18 anos para desempenho de trabalho doméstico (art. 1º, parágrafo único, Lei Complementar n. 105/2015). A Constituição Federal de 1988 foi um marco na proteção trabalhista dos domésticos, à medida que assegurou aos mesmos um leque de direitos muito mais extenso dos que lhe eram conferidos pela legislação existente até então. No entanto, muito embora fosse inegável a melhoria das condições de proteção trabalhista do doméstico a partir da Constituição de 1988, é inescusável a constatação de que o constituinte adotou um critério desigualentre os trabalhadores domésticos e os trabalhadores urbanos e rurais, à medida que o art. 7º previa uma proteção ampla e integral a estes últimos em detrimento da proteção assegurada aos primeiros, que restringia-se apenas aos direitos previstos em alguns dos incisos do referido dispositivo. Em resposta às discussões sobre a desigualdade de tratamento constitucional entre os trabalhadores urbanos e rurais e os trabalhadores domésticos, e atendendo aos anseios dessa última categoria, a Emenda Constitucional n. 72/2013 estabeleceu uma nova ampliação aos direitos do empregado doméstico. Assim, mantendo os direitos já originalmente previstos pela Constituição Federal de 1988 (salário mínimo, irredutibilidade de salário, décimo terceiro salário, repouso semanal remunerado preferencialmente aos domingos, férias anuais remuneradas com pelo menos um terço a mais do que o salário normal, licença-gestante de 120 dias sem prejuízo do emprego e do salário, licença- paternidade, aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 dias, aposentadoria e integração à Previdência Social), o parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal passou, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 72/2013, a garantir à categoria dos trabalhadores domésticos os seguintes direitos: ■ garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; ■ proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; ■ duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; ■ remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; ■ redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; ■ reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; ■ proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; ■ proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; ■ proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos. Além disso, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, também se assegurou aos trabalhadores domésticos: ■ relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, entre outros direitos; ■ seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; ■ fundo de garantia do tempo de serviço; ■ remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; ■ salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; ■ assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; ■ seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa. Os direitos assegurados constitucionalmente aos domésticos foram regulamentados pela Lei Complementar n. 150/2015. ■ 9. EMPREGADO RURAL Empregado rural é o trabalhador que presta serviços subordinados, em propriedade rural ou prédio rústico, continuamente, mediante remuneração. O que caracteriza o empregado rural é, basicamente: a) o local da prestação de serviço – propriedade rural ou prédio rústico; e b) o exercício de atividade agroeconômica pelo empregador – atividade agrícola ou pecuária, com finalidade lucrativa. A lei pressupõe, como sujeitos do contrato de trabalho rural, de um lado, o empregador, assim entendida toda pessoa que exerce atividade agroeconômica, inclusive a exploração industrial em estabelecimento agrário, e, de outro lado, o empregado rural (art. 2º, § 4º, Decreto n. 73.626/74). Portanto, empregador rural é aquele que explora atividade agrícola ou pecuária com fins lucrativos. Destinando-se a atividade econômica à transformação da matéria-prima em industrializada, com vistas à comercialização (por exemplo: laranja – suco concentrado; cana de açúcar – álcool/açúcar), a relação de emprego não será rural (art. 2º, § 4º, Decreto n. 73.626/74). Equipara-se a empregador rural “a pessoa física ou jurídica que, habitualmente, em caráter profissional, e por conta de terceiros, execute serviços de natureza agrária, mediante utilização do trabalho de outrem” (art. 4º, Lei n. 5.889/73). A Lei n. 8.212/91, art. 25-A, equipara ao empregador rural pessoa física o consórcio simplificado de produtores rurais, formado pela união de produtores rurais pessoas físicas, que outorgam a um deles poderes para contratar, gerir e demitir trabalhadores para a prestação de serviços exclusivamente aos seus integrantes, mediante documento registrado em cartório de títulos e documentos. Os produtores rurais integrantes do consórcio serão responsáveis solidários em relação às obrigações previdenciárias (§ 3º) e também em relação às obrigações trabalhistas. A Constituição Federal, em seu art. 7º, “caput”, equipara o trabalhador urbano e o rural, estando este favorecido por todas as normas genéricas das relações de trabalho subordinado, igualando os direitos trabalhistas. Assim, a Constituição Federal estabelece os direitos do empregado rural, que são regulamentados pela Lei n. 5.889/73, como norma especial, e pela CLT e outras leis esparsas, que, de forma supletiva, são aplicáveis aos trabalhadores rurais. Os produtores rurais integrantes do consórcio serão responsáveis solidários em relação às obrigações previdenciárias (§ 3º) e também em relação às obrigações trabalhistas. ■ 10. CONTRATO DE TRABALHO Nos termos do art. 442 da CLT, contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego. O art. 443 da CLT prevê que o contrato de trabalho pode ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito. Portanto, a lei não estabelece forma especial para a celebração pelas partes do pacto que vai reger a relação de emprego: o mesmo pode ser fruto de uma manifestação expressa de vontade, assumindo a forma escrita ou verbal, mas pode, ainda, decorrer de uma manifestação tácita de vontade. Neste último caso, estando presentes as características da relação de emprego haverá contrato de trabalho (contrato-realidade). ■ 10.1. Características do contrato de trabalho O contrato de trabalho é um contrato: ■ de direito privado (celebrado entre particulares, envolvendo, portanto, interesses privados); ■ “intuitu personae” (desenvolve-se de forma pessoal em relação a um dos sujeitos, o empregado); ■ consensual (nasce da manifestação da vontade livre das partes e não depende de forma prevista em lei); ■ sinalagmático (trata-se de pacto de natureza bilateral que gera obrigações recíprocas às partes contratantes, resultando um equilíbrio formal entre as prestações ajustadas); ■ sucessivo ou continuado (as obrigações dele decorrentes se prolongam no tempo; o contrato é de débito permanente, à medida que as obrigações renascem após cada cumprimento); ■ oneroso (previsão de perdas e vantagens econômicas para ambas as partes no âmbito do contrato); ■ principal (admite a existênciade contratos acessórios a ele – ex.: contrato depósito = mostruário para vendedores). ■ 10.2. Elementos do contrato de trabalho Como negócio jurídico que é, o contrato de trabalho tem os seguintes elementos (ou requisitos) – (art. 104, Código Civil): a) capacidade das partes – as partes do contrato de trabalho devem ser capazes. Capacidade do empregador: regida pelo Direito Civil, ou seja, é capaz para celebrar contrato de trabalho como empregador quem é capaz na forma da lei civil. Qualquer pessoa natural, jurídica ou ente despersonalizado a quem a ordem jurídica reconheça aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações na vida civil, tem capacidade para assumir direitos e obrigações trabalhistas na condição de empregador. Capacidade do empregado: as regras sobre capacidade do empregado decorrem do art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal. A capacidade plena para celebrar contrato de trabalho na condição de empregado é alcançada aos 18 anos. Entre 16 e 18 anos situa-se a incapacidade relativa, sendo necessária a assistência dos pais ou responsáveis na celebração do contrato de trabalho (embora o menor entre 16 e 18 anos tenha capacidade para praticar por si mesmo alguns atos decorrentes do contrato de trabalho, como, por exemplo, assinar recibo de salário (art. 439, CLT). O menor de 16 anos é incapaz para celebrar contrato de trabalho. Tratando-se de aprendiz, a capacidade também é atingida aos 18 anos, sendo possível celebrar contrato de aprendizagem até os 24 anos (art. 428, CLT). Entre 14 e 18 anos é verificada a capacidade relativa para celebrar contrato de aprendizagem (necessidade de assistência dos pais ou responsáveis). Por fim, é incapaz para celebrar este tipo de contrato o menor de 14 anos. Tratando-se de trabalho insalubre, perigoso ou noturno o contrato de trabalho só pode ser celebrado por maior de 18 anos. O menor de 18 anos é incapaz para celebrar contrato que tenha por objeto trabalho nestas condições. A contratação de empregados sem a observância de tais regras relativas à capacidade caracteriza irregularidade que torna o trabalho proibido. b) objeto lícito – o trabalho executado por força do contrato de trabalho não pode ser caracterizado como atividade criminosa ou como contravenção legal, ou seja, não pode ser enquadrado em um tipo penal. O trabalho que seja enquadrado como crime ou contravenção penal leva à caracterização da ilicitude do objeto. c) forma – não é rígida. O contrato de trabalho não é formal (não é solene), podendo ser verbal e até tácito (arts. 442 e 443, CLT). O contrato de trabalho corresponde à relação de emprego. Portanto, estando presentes as características da relação de emprego (pessoalidade, não eventualidade, subordinação e remuneração), existe contrato de trabalho (contrato- realidade). Observação: O registro do contrato de trabalho na CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social) do empregado não é requisito para a validade do contrato. A CTPS é documento de identificação do trabalhador e dela devem constar todos os dados relativos ao contrato de trabalho, tais como indicação do empregador, da data de contratação, da função e da remuneração (art. 29, CLT). É vedado ao empregador efetuar anotações desabonadoras à conduta do empregado em sua CTPS (§ 4º). ■ 10.3. Nulidade do contrato de trabalho Tratando-se de trabalho proibido (como é o caso de contratação irregular de menores) o contrato de trabalho será nulo. Tal nulidade tem efeito “ex nunc”, ou seja, não retroage. Apenas a partir da decretação da nulidade é que o contrato vai ser suprimido do mundo jurídico; os efeitos trabalhistas decorrentes do contrato são verificados e assegurados até a decretação da nulidade. Também será nulo o contrato de trabalho quando seu objeto for ilícito. Neste caso, a nulidade tem efeito “ex tunc”, atingindo o contrato desde sua origem, razão pela qual os direitos trabalhistas não são assegurados até a data da decretação da nulidade. O efeito retroativo da nulidade fundamenta-se na proteção do interesse público (não permitir a prática de crimes ou de contravenções penais). OJ SDI-1 199, TST Jogo do bicho. Contrato de trabalho. Nulidade. Arts. 82 e 145 do Código Civil. Situação especial de nulidade do contrato de trabalho diz respeito à contratação pela Administração Pública direta ou indireta de empregados sem prévia aprovação em concurso público, conforme exigido pelo art. 37, II, da Constituição Federal. A contratação de empregados públicos sem prévia aprovação em concurso público encontra óbice no art. 37, II e § 2º, da CF e gera a nulidade do contrato de trabalho, apenas conferindo ao trabalhador direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo e dos valores referentes aos depósitos do FGTS (Súmula 363, TST). Súmula 386, TST Preenchidos os requisitos do art. 3º da CLT, é legítimo o reconhecimento de relação de emprego entre policial militar e empresa privada, independentemente de eventual penalidade disciplinar prevista no Estatuto do Policial Militar. Neste caso existe o vínculo estatutário militar entre o policial e a corporação e um vínculo trabalhista entre o policial, que trabalha em atividade outra que não a policial em seus horários de folga, e a empresa privada que contrata tais serviços. ■ 10.4. Prova do contrato de trabalho A prova do contrato de trabalho será feita pelas anotações constantes da Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) do empregado ou por instrumento escrito e suprida por todos os meios permitidos em direito (art. 456, CLT). As anotações feitas pelo empregador na CTPS do empregado geram presunção apenas relativa de veracidade (Súmula 12, TST), podendo ser elididas por prova em sentido contrário. ■ 10.5. Efeitos do contrato de trabalho Do caráter sinalagmático do contrato de trabalho originam-se duas obrigações essenciais atribuídas aos seus sujeitos: a) a obrigação do empregado de prestar serviços; e b) a obrigação do empregador de pagar remuneração como contraprestação pelos serviços prestados. A obrigação do empregado de prestar serviços deve ser cumprida pessoalmente (pessoalidade). A prestação de serviços deve ser condizente com a função para a qual o empregado foi contratado, ou seja, ele tem de exercer todas as atividades decorrentes da função prevista no contrato e, ainda, exercê-las de forma diligente e com a fidelidade e boa-fé que decorrem necessariamente do cumprimento de qualquer contrato, inclusive do contrato de trabalho. Ao lado da principal obrigação do empregador, que é o pagamento da remuneração como contraprestação pelos serviços, existem obrigações complementares, como, por exemplo, a obrigação de proporcionar trabalho e fornecer ao empregado os meios que permitam a execução do mesmo. Além disso, o empregador deve exercer o poder de organização, o poder de fiscalização e o poder disciplinar dentro dos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico, principalmente no que tange ao respeito à dignidade humana do trabalho (abrangendo, entre outros aspectos, a honra, a imagem, a intimidade e a privacidade). O desrespeito a essas obrigações complementares por parte do empregador pode gerar o direito do empregado ao recebimento de indenização por danos morais (um dos efeitos conexos do contrato de trabalho). Também são considerados efeitos conexos do contrato de trabalho os chamados direitos intelectuais, que são vantagens
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