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A abolição do tráfico negreiro e a escalada da repressão britânica​ - Luan Azevedo

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 
 
 
 
 
Luan de Souza Azevedo – USP 9766237 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Relatório individual referente ao trabalho: 
A abolição do tráfico negreiro e a escalada da repressão britânica​: análise das 
correspondências diplomáticas entre Brasil e Grã-Bretanha (1845-1850) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
História do Brasil Independente I – Vespertino 
Professor Doutor Rafael de Bivar Marquese 
São Paulo, 2018. 
 
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 
 
Durante longos séculos a força motriz da economia brasileira foi escrava. O 
comércio transatlântico de africanos escravizados perdurou por mais de trezentos 
anos, findando apenas em 1850. As influências e fatores que levaram ao fim do 
tráfico negreiro são diversos, provocando inúmeros debates na vasta historiografia 
produzida no decorrer das últimas décadas. O presente ensaio busca relacionar e 
analisar algumas das obras que são primordiais para compreensão desse episódio 
tão importante e significativo para a história do país. 
Alguns autores afirmam que o fim do tráfico só foi alcançado graças à 
repressão britânica, outros apontam para diversos elementos que proporcionaram o 
seu fim. Porém, de certo modo, é consenso na historiografia a importância britânica 
para o fim do ​comércio infame​ . Partindo desse pressuposto, a análise terá como 
foco a cronologia da repressão feita pelos ingleses, quando foi iniciada e como foi 
se tornando mais firme com o passar dos anos. De qualquer modo, torna-se 
necessário analisarmos as razões para que a repressão existisse. 
I. 
O império britânico passou por inúmeras mudanças durante a primeira 
metade do século XIX. Fazendo a transição para uma política livre cambista, “o 
poder hegemônico global procurava reajustar seu Estado e redesenhar a divisão 
internacional do trabalho” (PARRON, 2015, p. 361). A ​orientalização idealizada pela 
administração da Grã-Bretanha tornava a Índia produtora de artigos tropicais e 
competidora direta do Brasil e de Cuba. A principal dificuldade enfrentada pelo 
império era a baixa arrecadação indiana, levando em consideração a enorme 
dificuldade em rivalizar com os artigos escravistas da América. O governo tentou, de 
todas as formas possíveis, baratear o seu açúcar à nível competitivo. Contudo, uma 
vez abolida a escravidão nas suas possessões, ficou praticamente impossível 
competir com regiões que ainda utilizavam o braço escravo. A partir dessa questão, 
a sua única alternativa possível era a supressão do mercado escravista destinado 
ao continente americano (PARRON, 2015, p. 381-392). 
A repressão teve início em 1807. A invasão napoleônica na península ibérica 
desembocou na fuga da corte portuguesa para o Brasil, sob a proteção da marinha 
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DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 
 
britânica. Como moeda de troca, a Grã-Bretanha impôs a assinatura de um tratado 
no ano de 1810, em que D. João VI, príncipe regente, se comprometeu a adotar 
uma política gradual na abolição ao tráfico de escravos (SILVA, 2008, p. 2-3). A 
medida, entretanto, não tinha validade dentro de territórios portugueses, ou seja, 
permitia a transferência de escravos das possessões portuguesas na África para o 
seu território na América. 
Cinco anos mais tarde, no Congresso de Viena, o governo inglês impôs à 
Coroa portuguesa a assinatura de mais um tratado que firmava o compromisso de 
extinguir o tráfico acima da linha do Equador. Posteriormente, em 1817, através de 
uma Convenção Adicional, D. João VI concedeu permissão para que os navios 
britânicos vistoriassem as embarcações que se encontrassem fora dos portos e 
ancoradouros portugueses autorizados ao comércio de escravos (BEIGUELMAN, 
1967, p. 13; SILVA, 2008, p. 3). A medida, embora restritiva, não impedia a 
continuidade do comércio. O impacto foi sentido pelas províncias do Maranhão, 
Pernambuco e Bahia, mas não afetava a região sudeste, principal importadora de 
mão-de-obra escrava à época. 
Em 1822, o Brasil necessitava do reconhecimento internacional para firmar 
sua independência política em relação à Coroa de Portugal, fator que propiciou 
novas condições para que a Grã-Bretanha pudesse reivindicar mais energicamente 
o fim do comércio de escravos. As negociações foram demoradas, mas a posição 
brasileira no cenário internacional não permitia barganhar, de modo que a nova 
nação aceitou assinar um novo tratado em 1826. Ratificado em 13 de março de 
1827, o acordo entre os dois países determinava que o comércio internacional de 
escravos seria ilegal três anos após sua assinatura, sendo considerado crime de 
pirataria a partir de então. O pacto também prescreveu o direito de visita e busca em 
embarcações, assim como também a criação de duas comissões mistas, uma em 
Serra Leoa e outra no Rio de Janeiro, encarregadas de julgar as capturas e garantir 
a liberdade dos africanos apreendidos (BEIGUELMAN, 1967, p. 14-15). No mesmo 
ano, segundo Ricardo Caires Silva, a Grã-Bretanha conseguiu a renovação de outro 
tratado que “garantia a tarifa máxima de 15% sobre as mercadorias importadas da 
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DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 
 
Inglaterra, reforçando ainda mais sua preeminência sobre a economia brasileira” 
(SILVA, 2008, p. 5). 
Uma das consequências da assinatura foi o aumento significativo no mercado 
negreiro. Os anos precedentes ao acordo tiveram uma média de aproximadamente 
50.000 escravos traficados a cada ano, valor que condiz com a importação referente 
à década anterior. Contudo, quando analisamos os dados que abrangem o intervalo 
que vai de 1827 a 1830, notamos o crescimento da média para um montante 
superior a 68.000 escravos, com ápice no ano de 1829, em que o número de 
africanos traficados ultrapassa os 82.000. Como era de se imaginar, a crença de 
que negociação de escravos iria se tornar ilegal provocou uma movimentação por 
parte dos traficantes, que buscavam embarcar o maior número possível de escravos 
enquanto o comércio ainda era permitido. 
 
Dados em: ​http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates 
A diplomacia imperial foi duramente criticada pela Câmara de deputados, que 
argumentava que os acordos assinados eram conflitantes com os interesses 
nacionais. Apesar disso, a validade do tratado era inquestionável e após o término 
do prazo firmado a Grã-Bretanha impõe a assinatura de novos termos em que torna 
permitida a apreensão de navios que contenham indícios de tráfico negreiro. A partir 
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http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates
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de então, a pressão esbarra, porém, no artigo 20 da lei regencial de 14 de junho de 
1831, em que fica negada à regência a assinatura de novos tratados internacionais 
sem aprovação prévia da Assembleia-Geral. Deste modo, o Legislativo criou ummecanismo “capaz de corrigir a maior vulnerabilidade do Executivo à pressão para 
ampliar compromissos internacionais na questão do tráfico” (BEIGUELMAN, 1967, 
p. 15). 
Ainda assim, a insistência inglesa continuou a incomodar os parlamentares 
brasileiros. Para evitar constrangimentos de repressões mais duras, o parlamento 
aprovou, em 07 de novembro de 1831, a lei proposta pelo Marquês de Barbacena 
em que ficou proibido o tráfico de escravos para o Brasil. Firmou-se que todos os 
africanos chegados em território nacional a partir de então seriam considerados 
livres. A lei, entretanto, não significou a abolição do mercado negreiro, visto que a 
elite nacional ainda defendia o comércio de negros, já que a “economia cafeeira, em 
expansão, dependia cada vez mais do braço escravo” (SILVA, 2008, p. 6). 
A legislação previa duras penas para aqueles que tivessem relação com o 
contrabando de escravos, tanto os que transportavam e vendiam, quanto os que 
compravam. Paula Beiguelman defendeu que a forma como ocorriam os 
julgamentos dava brechas para a impunidade e que a lei tinha como principal 
função, por conseguinte, servir de argumento para evitar a ampliação dos tratados 
anglo-brasileiros. Também é sustentado que a administração dos africanos livres foi 
facilitada em 29 de outubro de 1834, quando passaram a ser distribuídos para o 
serviço público e privado. Em 19 de novembro do ano seguinte tal distribuição foi 
estendida para o interior do território brasileiro, cuja vigilância era menor e a 
reescravização dos africanos, por consequência, ficava muito mais fácil 
(BEIGUELMAN, 1967, p. 16). Ricardo Silva assinalou que a descentralização política 
do período impediu que medidas mais enérgicas fossem aplicadas, legitimando, de 
certa maneira, a continuidade do tráfico (SILVA, 2008, p. 6). A constatação pode ser 
feita a partir da análise dos dados referentes aos anos que vão de 1831 até 1840, 
período em que notamos um crescimento significativo dos número de almas 
traficadas para o Brasil. 
 
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DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 
 
 
Dados em: ​http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates 
Curiosamente, a média de escravos transportados durante os primeiros anos 
(1831-1834) é relativamente baixa - cerca de 16.000 escravos por ano. A explicação 
dada por Silva apoia-se num discurso ao senado proferido pelo Marquês de 
Barbacena, em 1837, em que o parlamentar afirma que a queda do contrabando nos 
primeiros anos posteriores à Lei de 1831 ocorre porque os traficantes ainda não 
haviam encontrado métodos para burlar o sistema repressivo (SILVA, 2008, p. 6). No 
segundo recorte estipulado para o período (1835-1840), por sua vez, notamos um 
grande crescimento no comércio transatlântico, cuja média anual de africanos 
importados alcança a casa dos 70.000. Uma das hipóteses levantadas para o 
aumento é a prosperidade da economia cafeeira durante a década de 1830 e os 
baixos preços dos escravos na costa africana, que “oferecia possibilidades de lucros 
muito altos [...], mesmo para os que realizavam operações mais simples” (SILVA, 
2008, p. 7). 
As brechas para a impunidade, a conivência da fiscalização brasileira e o 
número de escravos traficados durante a década de 1830 foram responsáveis pela 
crença comum de que a Lei de 07 de novembro de 1831 seria ​para inglês ver​ . É 
nesse ponto que entra a tese defendida por Beatriz Mamigonian em ​Africanos Livres​ . 
Segundo a historiadora, a lei proposta pelo Marquês de Barbacena foi responsável 
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http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates
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por inúmeros impasses entre Brasil e Grã-Bretanha, uma vez que o “tratamento dos 
africanos livres [...] ocupou os funcionários da Foreign Office quase tanto quanto os 
assuntos relacionados à captura e condenação dos navios negreiros” 
(MAMIGONIAN, 2017, p. 165). A constante reescravização dos africanos servia 
como argumento na intervenção britânica, posto que “os africanos emancipados do 
tráfico eram incorporados à mão de obra imigrante das colônias [britânicas] [...] para 
suprir a necessidade de trabalhadores para o cultivo de cana-de-açúcar” 
(MAMIGONIAN, 2017, p. 175). 
A repressão ganha nova força durante os anos de 1837 e 1839. Em 1837, o 
projeto proposto pelo Marquês de Barbacena determinava a alteração na forma dos 
julgamentos à respeito do tráfico, passando-os do foro comum para a alçada dos 
juízes de direito. No mesmo ano, a Inglaterra tentou extinguir as comissões mistas 
para ocupar-se diretamente do mercado negreiro brasileiro (BEIGUELMAN, 1967, p. 
19). Dois anos depois um novo tratado foi assinado, no qual a marinha britânica 
passou a ter o direito de vistoria, apreensão e julgamento de todos os navios sob 
bandeira brasileira empregados no tráfico, sendo os africanos capturados em alto 
mar de total responsabilidade inglesa, enquanto os que desembarcassem em solo 
brasileiro ficariam sob a tutela do ​Conselho de Superintendência dos Africanos 
Livres (MAMIGONIAN, 2017, p. 180; SILVA, 2008, p. 8). Paula Beiguelman e Tâmis 
Parron também abordam o tratado de 1839, porém, um conflito de narrativas é posto 
em torno da questão. A autora aborda o tratado como uma concessão dada pelo 
governo imperial brasileiro a partir de uma política liberal do ministro de 
Estrangeiros, Cândido Batista de Oliveira; ao passo que o historiador afirma que os 
problemas internos enfrentados pela Grã-Bretanha levaram a potência a aplicar “​na 
marra​ a cláusula de equipamentos contra navios brasileiros” (BEIGUELMAN, 1967, 
p. 19; PARRON, 2015, p. 412, grifo meu). 
Faltava ao governo britânico o poder de interferência mais direta no território 
brasileiro. O tratado assinado entre as nações firmava o direito de vistoria em 
embarcações sob bandeiras brasileiras. A solução encontrada pelos traficantes, a 
mais óbvia possível, foi camuflar seus navios sob a bandeira de outras nações 
(SILVA, 2008, p. 8). Tâmis Parron afirma que grande parte dos escravistas 
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brasileiros tentavam usar a bandeira dos Estados Unidos como escudo contra a 
repressão. Os Estados Unidos era o único país capaz de enfrentar o poderio 
britânico, por isso, ainda não havia liberado o direito de fiscalização da ​Foreign 
Office​ , possibilitando indiretamente a continuidade do tráfico brasileiro. A atitude 
norte americana era de extrema importância para o fim do tráfico, de modo que um 
contra-almirante inglês reporta à Londres que "não poderá haver esperança razoável 
de desafiar permanente e efetivamente o tráfico negreiro [...] a menos que uma linha 
de conduta diferente da atual seja adotada pelo governo norte-americano" 
(PARRON, 2015, p. 375). 
A repressão marítima exercida pela Grã-Bretanha, ao longo do tempo, foi 
mostrando-se ineficaz. Segundo Mamigonian, em 1845 os britânicosfizeram um 
balanço da repressão até o momento, cujo resultado foi desanimador: somente 
“2,8% dos africanos embarcados na África para a travessia atlântica foram 
resgatados e, fora os que morreram, o resto foi efetivamente escravizado” 
(MAMIGONIAN, 2017, p. 213). ​A decisão tomada pelo poder hegemônico foi a 
instituição do ato ​Bill Aberdeen​ , em 1845. Unilateral, o decreto concedia aos navios 
 
Dados em: ​http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates 
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http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates
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britânicos o direito de capturar as embarcações brasileiras destinadas ao comércio 
de escravos, mesmo os que estivessem em águas brasileiras. O emprego do ato foi 
baseado no tratado de 1826, em que ficou determinado que a negociação de 
escravos passaria a ser considerado pirataria, independente do lugar em que 
estivessem. A aprovação do ​Bill Aberdeen​ , contudo, não diminuiu o número de 
escravos traficados. Assim como os tratados anteriores, o que notamos é o aumento 
do comércio de escravos, cuja média anual é a maior de todo o período em análise 
(74.000 escravos). 
O ápice da importação de braço escravo levou a Grã-Bretanha a agir de 
forma mais enfática no território brasileiro. É nesse período, que vai de 1845 até 
1850, que a historiografia mais se distancia quanto aos métodos repressivos 
empregados pela administração inglesa. ​De acordo com Mamigonian, a população 
inglesa começou a aderir ao discurso de que a campanha naval era descabida e 
altamente custosa aos cofres públicos. A ​British and Foreign Anti-Slavery Society 
(BFASS) reagiu às críticas acerca do alto custo e baixo resultado da repressão ao 
contrabando atlântico com uma diversificação de estratégias. Dentre as alternativas 
encontradas, situou-se a dissolução dos tribunais mistos entre os dois países e a 
aplicação de uma nova metodologia de repressão por parte dos britânicos. Uma 
tentativa de revolta escrava ocorrida em 1848 contou, segundo a historiadora, com 
escravos que sabiam da crise diplomática entre as duas nações e depositavam 
esperanças de apoio inglês na luta pela liberdade. Havia, concomitantemente, por 
parte dos deputados, a crença de que os escravos não poderiam armar um 
movimento tão articulado sozinhos e que, por conseguinte, parcelas da população 
livre agia com o propósito de incitar a movimentação escrava. Baseando-se no 
relatório da Comissão Especial da Assembleia do Rio, Mamigonian aponta para a 
possibilidade de influência britânica na articulação da revolta, uma vez que a 
documentação aponta o comportamento de mascates que encorajaram os escravos 
dizendo “que tantos negros não devem estar sujeitos a tão poucos brancos” 
(MAMIGONIAN, 2017, p. 217-225). 
Sidney Chalhoub também defendeu que o medo de rebelião pairava sobre o 
império. O historiador apoiou-se num censo realizado em 1849 que aponta a 
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presença de 78.855 cativos num total de 205.906 habitantes das paróquias urbanas 
do município do Rio de Janeiro, número que equivale a 38,2% da população. Esses 
dados, segundo o autor, fizeram da capital do Império a cidade com a maior 
população escrava urbana das Américas, fato que “deixava os administradores da 
Corte apreensivos” (CHALHOUB, 1990, p. 186-187). Sidney deu prosseguimento à 
sua obra afirmando que os contemporâneos sabiam perfeitamente que enfrentavam 
um grande problema de controle social, entretanto, numa diferenciação substancial 
do que Beatriz Mamigonian defenderia em ​Africanos Livres​ , o medo que havia em 
reação às insurreições escravas “não levava a maiores questionamentos a respeito 
da própria instituição da escravidão. Não se concebia, na realidade, outra forma de 
organizar as relações de trabalho” (CHALHOUB, 1990, p. 194). 
Parcela da academia defende que o medo de insurreições não foi a causa da 
abolição e que a radicalização das ações britânicas deu-se por meio de invasões 
aos portos brasileiros. A Grã-Bretanha passava por um período de forte 
instabilidade política dentro do seu próprio território, motivada pelo aumento de 
impostos para equilibrar suas finanças públicas . Conforme exposto, a única chance 
de continuar liderando a política internacional era frear as concorrentes escravistas 
produtoras de artigos tropicais. A proximidade territorial entre Cuba e Estados 
Unidos, aliada à posição geopolítica norte americana, dificultava a ação inglesa na 
ilha caribenha, tornando a intervenção naval direta no Brasil a melhor alternativa 
(PARRON, 2015, p. 413-414; SILVA, 2008 p. 10). Beiguelman aponta para a 
concomitante ascensão dos conservadores ao poder em 1848, que representava 
um recuo da corte nas medidas para o fim do tráfico, de modo que agravou ainda 
mais as relações diplomáticas anglo-brasileiras, “refletindo na operação dos 
cruzeiros ingleses em águas territoriais brasileiras” (BEIGUELMAN, 1967, p. 27). 
Essa soma de fatores internos e externos no final da década de 1840 gestou 
o ambiente para a formulação da Lei Eusébio de Queiroz, em 1850. A principal 
diferença dessa lei para a de 1831 é a separação jurídica feita quanto aos 
julgamentos. Os traficantes de escravos foram sujeitos à pena de prisão e ao 
pagamento das despesas na reexportação de africanos para a África. Enquanto os 
compradores de escravos passaram a ser julgados pela justiça comum, muito mais 
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branda. Tal medida isentava os proprietários de escravos do crime de contrabando 
e pirataria, além de isolar “os traficantes como os principais responsáveis pelo 
comércio ilícito bem como legava aos mesmos todos os riscos da transação” 
(SILVA, 2008. p. 10-11). De todo modo, a lei viria a encerrar um comércio que 
durou mais de três séculos e foi responsável pela expropriação da liberdade de 
quase seis milhões de almas africanas que foram trazidas para o Brasil. 1
1 Cf, ​http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates​ . 
10 
http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates
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Referências 
BEIGUELMAN, Paula. ​A extinção do tráfico negreiro no Brasil, como problema 
político​. Revista de Ciência Política, n. 1, pp. 13-34, 1967. 
CHALHOUB, Sidney. ​Visões da Liberdade​: uma história das últimas décadas da 
escravidão na corte. SP: Companhia das Letras, 1990, p. 186-198. 
FERRARO, Marcelo. ​Entre cativeiros​: africanos livres na formação do Estado 
imperial e na economia-mundo oitocentista. Revista Almanack, Guarulhos, n. 17, p. 
476-485, Dez. 2017. 
MAMIGONIAN, Beatriz G. ​Africanos Livres​: A abolição do tráfico de escravos no 
Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, pp.165-283. 
PARRON, Tâmis. ​A política da escravidão na era da liberdade​. Estados Unidos, 
Brasil e Cuba, 1787-1846. 2015. Tese (Doutorado em História) - Departamentode 
História da Universidade de São Paulo, São Paulo, pp. 349-451. 
SILVA, Ricardo Tadeu Caires.​O fim do tráfico atlântico de escravos e a política 
de alforrias no Brasil​. VI Seminário do trabalho. 2008. 
SLAVERY VOYAGES. ​http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates Acesso 
em: 22 de maio de 2018. 
11 
http://www.slavevoyages.org/assessment/estimates

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