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Anos Iniciais do Ensino Fundamental LAURO IGOR METZ Metodologia do Ensino de Matemática A n os In iciais d o En sin o Fu n d am en tal M etodologia do Ensino de M atem ática LA U R O IG O R M ETZ Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6659-9 9 7 8 8 5 3 8 7 6 6 5 9 9 Código Logístico 59496 Esta obra foi elaborada com o intuito de propor- cionar reflexões a respeito do processo de ensino e aprendizagem da Matemática nos primeiros anos do ensino fundamental. Por meio de uma linguagem acessível, buscou-se apresentar a relação entre o conhecer Matemática e o ensinar Matemática. São abordadas, entre outros assuntos, as estra- tégias metodológicas para o ensino da Matemáti- ca, utilizando-se de diferentes materiais didáticos, tais como: material dourado, ábaco, quadro valor de lugar, tangram, geoplano e blocos lógicos, além da utilização de jogos digitais e de outros jogos, que podem ser adquiridos ou confeccionados com os alunos. O intuito é provocar o interesse do leitor em conhecer mais sobre determinados materiais didáticos, de modo a enriquecer a relação teórico- -prática dos conhecimentos matemáticos. Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Lauro Igor Metz IESDE BRASIL 2020 © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: BlueRingMedia/ Morphart Creation/ iconsoul em Gráficos/Shutterstock Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ M555m Metz, Lauro Igor Metodologia do ensino de Matemática : anos iniciais do ensino fundamental / Lauro Igor Metz. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2020. 98 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6659-9 1. Professores de matemática - Formação. 2. Prática de ensino. I. Título.. 20-64300 CDD: 370.71 CDU: 37.026 Lauro Igor Metz Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Especialista em Educação Matemática pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) e em EAD e Novas Tecnologias pela Faculdade Educacional da Lapa (Fael). Licenciado em Matemática pela PUCPR e em Pedagogia pela Fael. Integrante do Grupo de Pesquisa de História da Educação Matemática – Paraná (GHEMAT/PR). Professor no ensino superior, ministrando as disciplinas de Matemática Aplicada, Matemática Financeira e Comercial e Pesquisa Operacional. Tem experiência nas áreas de matemática, administração de empresas e gestão escolar e financeira. SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! 1 O pensamento matemático e o ensino de Matemática 9 1.1 A teoria piagetiana e a matemática 9 1.2 Vygotsky e a matemática 15 1.3 Influência da teoria montessoriana no ensino de matemática 16 1.4 Documentos oficiais e o ensino de Matemática no Brasil 18 1.5 Orientações da BNCC para o ensino da Matemática 23 2 A criança e o ensino de Matemática 28 2.1 A origem e a representação do número 28 2.2 A representação numérica e o valor posicional 32 2.3 O sistema de numeração 34 2.4 Concepção geométrica nas experiências das crianças 39 3 Estratégias metodológicas para o ensino de Matemática 43 3.1 O quadro valor de lugar e o ensino da Matemática 43 3.2 O ábaco na compreensão do sistema decimal 47 3.3 O material dourado no ensino do sistema decimal 49 3.4 Operações básicas com o material dourado 52 3.5 O tangram como apoio no ensino da Matemática 55 3.6 Explorando geometria utilizando o geoplano 56 4 O lúdico no processo de ensino e aprendizagem da Matemática 63 4.1 Os jogos no ensino da Matemática 63 4.2 O laboratório de Matemática 66 4.3 Os blocos lógicos e a Matemática 69 4.4 Jogos de percurso e o ensino da Matemática 72 4.5 Grandezas e medidas por meio de jogos 74 5 As tecnologias e o ensino da Matemática 81 5.1 O livro didático e a Matemática 81 5.2 Perspectivas e contribuições da tecnologia 85 5.3 A calculadora nos anos iniciais do ensino fundamental 87 5.4 A relevância dos jogos virtuais e da gamificação na aprendizagem 90 6 Gabarito 96 Esta obra foi elaborada com o intuito de proporcionar reflexões a respeito do processo de ensino e aprendizagem da Matemática nos primeiros anos do ensino fundamental. Por meio de uma linguagem acessível, buscou-se apresentar a relação entre o conhecer Matemática e o ensinar Matemática. O primeiro capítulo apresenta aspectos relacionados à evolução do pensamento lógico-matemático na criança, destacando as influências de diferentes teorias. Também são propostas discussões sobre o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática para as séries iniciais e a Base Nacional Comum Curricular. O segundo capítulo aborda a origem e a construção do número e apresenta conceitos relativos à representação numérica e ao valor posicional. Além disso, exemplifica a evolução do sistema de numeração decimal e suas características. Por fim, tece uma reflexão sobre a importância do ensino de geometria nos anos iniciais. No terceiro capítulo, abordam-se as estratégias metodológicas para o ensino da Matemática, utilizando-se de diferentes materiais didáticos, tais como: material dourado, ábaco, quadro valor de lugar, tangram e geoplano. O intuito é provocar o interesse em conhecer mais sobre determinados materiais didáticos, de modo a enriquecer a relação teórico-prática dos conhecimentos matemáticos. No quarto capítulo, destaca-se a utilização dos jogos para o ensino da Matemática, que podem ser adquiridos ou confeccionados com os alunos. Também são abordadas as potencialidades dos blocos lógicos. No último capítulo, busca-se refletir sobre o livro didático, ressaltando que o professor não pode se limitar apenas a esse instrumento em sua prática pedagógica. Ainda, discute-se a importância da inserção das diferentes tecnologias na escola, incluindo os jogos digitais. Esperamos que este livro incentive os professores a refletirem sobre o ensino de Matemática, principalmente nos anos iniciais do ensino fundamental, despertando o interesse na busca constante de aprimoramento profissional. Boa leitura! APRESENTAÇÃO O pensamento matemático e o ensino de Matemática 9 1 O pensamento matemático e o ensino de Matemática O presente capítulo propicia uma reflexão a respeito do pro- cesso do ensino e aprendizagem da Matemática. Apresentaremos uma abordagem sucinta da evolução do pensamento lógico matemático na criança, buscando esclarecer procedimentos re- lacionados à construção de número e ao desenvolvimento das quantidades numéricas. Para o entendimento desse processo, nos guiaremos ten- do em vista os principais contributos pedagógicos oriundos das teorias piagetiana e vygotskyana. Também, neste capítulo, discu- tiremos a influênciados estudos da italiana Maria Montessori no processo de ensino e aprendizagem da Matemática. Serão feitas reflexões pertinentes sobre os principais documentos que influen- ciam o currículo de Matemática no Brasil, tais como: o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Matemática para as séries iniciais e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). 1.1 A teoria piagetiana e a matemática Vídeo Os estudos de Jean William Fritz Piaget (1896-1980) 1 nos remetem a reflexões acerca do ensino e da prática pedagógica da matemática. Em suas suposições, Piaget critica a escola tradicional, a qual tratava a criança como um ser passivo e acreditava na possibilidade de imprimir os conhecimentos que o docente selecionasse aos alunos. Na teoria 1 Nascido na Suíça, Piaget era psicólogo, biólogo e filósofo. Defendia que o desenvolvimento do indivíduo acontecia como consequência de sua ação sobre o meio. É mundialmente conhecido por seu trabalho sobre a inteligência e o desenvolvimento infantil, sendo base para inúmeros estudos em psicologia e pedagogia até os dias atuais. 10 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental piagetiana, o ensino deve enfatizar o raciocínio e conduzir à compreen- são, e não apenas à memorização, valorizando o criativo em vez do repetitivo. Tais métodos considerados ativos no processo de desenvol- vimento da criança remetem a situações de experimentação e à neces- sidade de motivação no processo de aprendizagem. Sobre esse processo, Sousa (2005) destaca que, para haver a cons- trução de novos conhecimentos, com base na teoria piagetiana, existe a necessidade de manipulação de materiais, cooperação social, traba- lho em grupo e interajuda, exigindo um papel crucial do docente na criação de programas e métodos de avaliações flexíveis. Com relação à figura e à participação do docente, ainda, Morgado (1986, p. 90) explica: o papel do professor é fundamental na perspectiva de uma pe- dagogia piagetiana, uma vez que lhe cabe a tarefa de criar os programas adaptados ao nível operatório dos alunos, bem como encontrar métodos de avaliações flexíveis que procurem analisar o desenvolvimento intelectual e autônomo da criança. Com base nessas reflexões, você pode estar se perguntando: en- tão, cabe ao professor encontrar alternativas metodológicas que ofe- reçam sucesso ao processo de aprendizagem das crianças? É ele o agente responsável por fazer a criança aprender? A teoria piagetiana busca descrever o modo como se processa a aquisição de novos conhecimentos por parte da criança, sendo importante ao docente refletir sobre tais considerações para aprimorar suas concepções e, consequentemente, suas práticas profissionais, tornando o ensino de matemática significativo ao aluno. Outro requisito fundamental ao docente é identificar em seus alu- nos as experiências e os conhecimentos já adquiridos para, com isso, elaborar seu plano de trabalho. Sabemos que existe uma legislação e uma série de conteúdos a serem explorados em cada etapa do ano leti- vo, mas é necessário ao docente agir com autonomia, sendo de sua res- ponsabilidade verificar se processos anteriores e fundamentais para o progresso da aprendizagem já foram conquistados por seus alunos. Antes de iniciar atividades que envolvam as quatro operações bá- sicas (adição, subtração, multiplicação e divisão), nos primeiros anos do ensino fundamental, por exemplo, é essencial verificar se os alunos têm solidificados em suas concepções o que vem a ser um algarismo e como é estruturado o sistema de numeração decimal. O pensamento matemático e o ensino de Matemática 11 A origem dos números Na Antiguidade, o ser humano não necessitava contar ou criar símbolos para registrar quantidades. Seu senso numérico já era suficiente para atender às necessidades. Porém, com o passar do tempo, ao deixar de ser nômade e ao aprender a cultivar a terra para se sustentar, ocorre um marco que produz mudanças no que diz respeito aos números e a todas as suas formas de representação antes do atual sistema de numeração. Com a necessidade de controlar seu rebanho e a produção de alimento que aumentava, o ser humano iniciou suas primeiras relações entre quantidades e símbolos. O pastor, quando saía com suas ovelhas, por exemplo, fazia marcações em ossos ou madeiras para controlar a quantidade de animais que o acompanhavam pela manhã e retornavam à tarde, a fim de conferir se não teria perdido alguma delas. Esse controle era feito, também, utilizando-se de pedras: para cada ovelha que saía, uma pedra era guardada em um saco; ao entardecer, fazia a conferência. Fonte: Adaptado de Borges; Bonfim, 2012,. Saiba mais Ainda nos referindo aos preceitos piagetianos, é primordial com- preender que o pensamento lógico-matemático está na base de todo o desenvolvimento cognitivo do sujeito. Segundo Sousa (2005), a assi- milação e a acomodação são elementares para o desenvolvimento da criança, sendo ambas processos regulados pela equilibração. A assimi- lação vincula-se ao despertar do imaginário da criança, e a acomodação relaciona-se à adaptação da criança ao ambiente. Para Raposo (1980), a acomodação é a intervenção do meio sobre o sujeito. Em concordância, Cavicchia (2010, p. 2) afirma: “esta adaptação do ser humano ao meio ambiente se realiza através da ação, elemento central da teoria piage- tiana, indicando o centro do processo que transforma a relação com o objeto em conhecimento”. No construtivismo piagetiano, o progresso do conhecimento não ocorre por meio da simples adição de informação, mas é resultado de diversas reestruturações cognitivas, nas quais os processos de argu- mentação e de contra-argumentação são facilitadores para soluções de Saiba mais sobre o pro- cesso de assimilação e acomodação acessando o vídeo Piaget (3): construti- vismo na escola, publicado no canal didatics. Disponível em: https://www.you- tube.com/watch?v=z-FfrQLVyN8. Acesso em: 1 jul. 2020. Vídeo 12 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental problemas (FERREIRA, 2008). Nesse sentido, a valorização do conheci- mento intuitivo e espontâneo das crianças é instrumento relevante em benefício do progresso da aprendizagem. Para o objetivo desta seção (apresentar brevemente a teoria pia- getiana e relacioná-la com a Matemática), é fundamental abordarmos o aspecto da construção do número. Você já parou para pensar em como acontece, aos olhos da criança, o processo de quantificar? Será que esse processo exige relações? 1.1.1 A construção do número A fim de estabelecer relações entre a construção do número e a criança, precisamos conhecer um pouco a respeito de como Piaget defi- niu a evolução cognitiva. Para ele, a criança, de acordo com seu amadu- recimento, passa por quatro estágios: sensório-motor, pré-operacional, operações concretas e operações formais. Quadro 1 Estágios cognitivos de Piaget Estágio Idade Descrição Estágio da inteligência sensório-motora Até 2 anos A inteligência surge antes da linguagem e do pensa- mento. Trata-se de uma inteligência prática, sustenta- da pela manipulação de objetos. Envolve as primeiras formas de pensamento e expressão da criança. Estágio da inteligência sim- bólica ou pré-operatória 2 a 7 anos Período em que a criança desenvolve um sistema re- presentacional e usa símbolos, ou seja, ocorre a transi- ção entre a inteligência sensório-motora, com base na percepção, e a inteligência representativa. Estágio da inteligência operatória concreta 7 a 12 anos Período de equilíbrio de trocas cognitivas entre a crian- ça e a realidade. A criança é capaz de resolver proble- mas voltados para o presente de maneira lógica, mas ainda não consegue pensar hipoteticamente. Estágio da inteligência formal A partir dos 12 anos A pessoa pode pensar em termos abstratos, lidar com situações hipotéticas e pensar em possibilidades. O adolescente chega aconclusões por meio de hipóte- ses, sem ter a necessidade de observação e manipu- lação reais. Fonte: Adaptado de Cavicchia, 2010. O pensamento matemático e o ensino de Matemática 13 Como notamos no Quadro 1, a evolução da crian- ça passa por uma série de transformações, sendo essencial para nós, professores, entendermos esse processo. Somente assim, torna-se possível eleger metodologias para o ensino da Matemática de acordo com a capaci- dade de cada criança. Sobre isso, é válido considerar os preceitos apresentados por Morgado (1986), que defende que a cons- trução do número tem início no primeiro estágio piagetiano, quando a criança desperta para ações de separar, reunir e ordenar obje- tos, e termina no estágio das operações concretas, quando ela compreende o conceito de números inteiros. A concepção de número é, assim, estabelecida por meio da ação do sujeito e tem como base duas estruturas lógicas chamadas classificação e seriação (ordem), resultantes do ato de reunir e ordenar objetos. Isso ocorre na criança por volta dos 7 a 8 anos, no início do estágio das ope- rações concretas, quando ela, intrinsecamente, compreende a transiti- vidade e reversibilidade (PIAGET; SZEMINSKA, 1975). Em matemática, entende-se transitividade como a relação entre três elementos de um conjunto. Por exemplo: havendo três irmãos com idades distintas, o primogênito é mais velho que o segundo; logo, também é mais velho que o terceiro. A reversibilidade se trata da capacidade de realizar uma ação simultânea em dois sentidos, ou seja, a possi- bilidade de verbalizar a volta ao começo em determinada operação. Com relação aos critérios de construção dos números, você pode estar se perguntando: qual é a real diferença entre classificar e seriar? Que atividades produzir com as crianças para o desenvolvimento lógi- co de tais estruturas? É essencial, primeiramente, estabelecer a diferenciação entre os dois processos. Quando tratamos de estratégias de classificação, nos referimos à separação de objetos em grupos. Na formação de subcon- juntos, portanto, classificar é separar por categorias percebidas por meio de semelhanças ou diferenças entre objetos. No processo de classificação, a espontaneidade prevalece, não há respostas erradas, todas estarão corretas segundo a lógica de quem está classificando. New Afri ca/ Shu tte rst oc k O entendimento da teoria piagetiana é essencial para a formação do professor. Para aprofun- dar-se um pouco mais, assista ao filme Coleção grandes educadores Jean Piaget, conduzido por Yves de La Taille, psicólogo e professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo que, desde a década de 1980, se dedica ao campo da psicologia moral, ciência que investiga os proces- sos mentais que levam alguém a obedecer ou não a regras e valores. O filme foi dirigido por Régis Horta e publicado em 17 de junho de 2015. Disponível em: https://www.you- tube.com/watch?v=rRLukE2HGzA. Acesso em: 1 jul. 2020. Filme 14 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental A classificação, de acordo com Toledo e Toledo (1997, p. 30), “é uma operação lógica de importância fundamental em nossas vidas, pois nos ajuda a organizar a realidade que nos cerca”. O processo de seriação está relacionado com agrupamentos, con- siderando uma ordem linear de grandezas de seus elementos. Ativida- des que envolvem a construção de relações do maior para o menor, do menor para o maior, do mais grosso para o mais fino, do mais fino para o mais grosso, do mais pesado para o mais leve e assim por diante se enquadram no processo de seriação. 1.1.2 Quantificação A capacidade de enumerar uma série de elementos não garante que a criança compreenda a relação entre o nome do número e a quantifica- ção. Isso é perceptível quando vemos a criança brincar, ainda na fase da alfabetização. Ela pode contar até dez, mas não relaciona o que diz com a quantidade de dez elementos. De acordo com Piaget (1987), a nume- ração falada auxilia a criança nos números, mas não basta por si só. A capacidade de enumerar oralmente, portanto, não assegura que a crian- ça compreenda a relação entre o nome do número e sua quantificação. No que se refere ao processo de quantificar objetos, Kamii (1987) afirma que esse procedimento só é possível por meio da sistematiza- ção de ordem e inclusão hierárquica. Isso implica colocar os objetos em uma relação de inclusão hierárquica na qual a criança, mentalmente, inclui o “um” no “dois”, o “dois” no “três” e assim por diante. Para o entendimento da inclusão hierárquica, vamos relatar a expe- riência conduzida por Kamii (1987) com crianças. Ela entregou oito obje- tos com forma de animais, seis cães e dois gatos, a um grupo de crianças com menos de 4 anos e perguntou a elas se havia maior número de cães ou animais. As crianças afirmaram que os cães estavam em maior nú- mero, revelando que escutaram mentalmente uma questão diferente. Para elas, o todo não existia. Naquele momento de seu desenvolvimen- to, mostravam-se incapazes de realizar simultaneamente duas opera- ções opostas: dividir o todo em partes e colocar novamente as partes no todo. As crianças de 7 a 8 anos já são capazes de responder a essa questão por possuírem um raciocínio móvel, isto é, reversível. Desse modo, vemos a diferença entre a construção do número e a quantificação de objetos: a primeira não é observável, e a segunda Pensando em explorar o pro- cesso de seriação na educação infantil, o professor pode pedir aos alunos para que se organi- zem, por exemplo, em uma fila do mais alto para o mais baixo; depois, do mais baixo para o mais alto. Pode, também, dispor diferentes caixas de papelão e orientar os alunos para que percebam a diferenciação entre tamanhos e, em seguida, encaixem as menores dentro das maiores. Na prática Em uma turma da educação infantil, o professor pode dis- tribuir uma série de tampinhas plásticas de garrafa PET coloridas e pedir aos alunos para agrupá- -las por cores, a fim de exercitar o processo de classificação. Na prática O pensamento matemático e o ensino de Matemática 15 pode ser observada em seu comportamento. De acordo com Kamii (1987, p. 35), “para comparar o todo com a parte, a criança tem que fazer duas ações mentais opostas ao mesmo tempo: cortar o todo em duas partes e colocar outra vez as partes no todo”. No relato apresen- tado anteriormente, referente aos seis cães e dois gatos, a criança ne- cessariamente precisa compreender que tanto gatos quanto cães são subclasses, ou seja, estão incluídas na classe dos animais. Para a criança compreender a noção de número, então, é neces- sário que o professor explore propostas metodológicas relacionadas ao processo de contagem. Assim, as crianças são levadas a fazerem agrupamentos de objetos observando diferenças e semelhanças, ativi- dades que favorecem sua compreensão no processo de classificação, seriação e inclusão hierárquica. Separe bolas plásticas, aquelas utilizadas em piscina de bolinhas, em uma caixa. Em seguida, distribua bambolês ao redor das crianças e, dentro de cada bambolê, insira a represen- tação de um algarismo em uma folha de papel sulfite. Provoque as crianças para colocarem, no círculo formado pelos bambolês, a quantidade de bolinhas correspondente ao que se pede em cada folha. Na prática 1.2 Vygotsky e a matemática Vídeo De acordo com a teoria piagetiana, a criança precisa ser um agente ativo no processo de aprendizagem da matemática. Agora, conhecere- mos um pouco as influências vygotskyanas nesse processo de aprendi- zagem para as crianças. Desenvolvida por Lev Semenovitch Vygotsky (1896-1934) 2 , nessa teoria, a aprendizagem da criança acontece em todo lugar e a todo instante, antecedendo, até mesmo, a sua entrada na escola, perspectiva que apresenta uma nova compreen- são da criança e do papel do professor (SANTOS; CARDOSO; OLIVEIRA, 2017). Para Vygotsky (1991), a aprendizagemé o processo de apropriação dos conhecimentos his- tóricos que fazem parte do nosso patrimônio cultural e social. Nesse sentido, o indivíduo não é apenas ativo, mas também interativo, pois aprende com o outro. O aprendizado e o desenvolvimento estão, por- tanto, inter-relacionados desde o primeiro dia de vida das crianças. O enfoque sócio-histórico da teoria vygotskyana apresenta os fato- res sociais e culturais influenciadores diretamente do desenvolvimento intelectual. Isso implica dizer que a aquisição de conhecimentos ocor- re pela interação do sujeito com o meio. Por isso, a importância de aprender a utilização de novos instrumentos para atender e desenvol- Advogado, médico e psicólogo bielo-russo. A centralidade de seus estudos estava na aquisição de conhecimentos que ocorre pela interação do sujeito com o meio. 2 16 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental ver ações que satisfaçam às nossas necessidades (SANTOS; CARDOSO; OLIVEIRA, 2017). Na teoria vygotskyana, o papel do professor ganha destaque, visto que é o agente responsável por interferir e provocar avanços no processo de aprendizagem. Conforme destacam Santos, Cardoso e Oliveira (2017, p. 61): como mediador entre o conhecimento adquirido socialmente pela criança e o conhecimento escolar, a função do professor que ministra aulas de Matemática é possibilitar ao aluno a apro- priação da forma sistematizada de pensamento e de linguagem que é a Matemática, partindo das experiências vividas pela crian- ça para atingir níveis mais complexos de abstração. De acordo com Moysés (1997), o docente, em sua tarefa de media- dor, precisa, ainda, apropriar-se de estratégias de ação para explicar, questionar, corrigir e fazer com que a criança descreva seu próprio pensamento. Nessa perspectiva, é essencial que o professor apresente a relação entre o que está sendo estudado e a realidade. Levando em conta que a interação social é fundamental para o proces- so de ensino e aprendizagem, a sistemática do trabalho focando a resolu- ção de problemas e a utilização dos jogos é importante por proporcionar a contextualização e as discussões entre alunos (NOGUEIRA, 2007). Pro- porcionar experiências matemáticas trabalhando com a realidade, como discussões e atividades concretas, é fundamental para o aprimoramento do processo de aprendizagem – sem essas experiências, o que foi ensina- do torna-se irrelevante (SANTOS; CARDOSO; OLIVEIRA, 2017). Propostas de ensino vinculadas à teoria vygotskyana devem levar o aluno a uma reflexão e a uma interação com o ambiente que o cerca. Para que isso se concretize, a expertise do professor é essencial no planejamento das aulas. 1.3 Influência da teoria montessoriana no ensino de matemática Vídeo Maria Montessori (1870-1952) 3 é considerada uma das pioneiras da educação infantil. Em seus trabalhos, buscou estabelecer a relação do processo de ensino e aprendizagem tendo em vista as especificidades das crianças (MACHADO, 1986). Para Montessori, o ambiente educacio- nal deve ser um espaço acolhedor que gere a espontaneidade da criança. Pedagoga, pesquisadora e médica italiana, criou o método Montessori, que revolucionou o ensino na educação infantil. Esse método estabelece uma enorme diversificação das tarefas e a máxima liberdade possível, de modo que a criança aprende por si mesma e seguindo o ritmo de suas próprias descobertas. 3 O pensamento matemático e o ensino de Matemática 17 Sua teoria fundamenta-se na liberdade, atividade e independência da criança. A liberdade refere-se à libertação de obstáculos que impedem o desenvolvimento normal da vida. A atividade, para ela, está focada no desenvolvimento integral da criança, na manipulação dos materiais e na preparação do ambiente. A independência é orientada por meio das manifestações ativas da própria liberdade (MONTESSORI, 1965). Mas qual será a relação específica da teoria montessoriana com a Matemática? Qual será a relação entre materiais manipuláveis, Maria Montessori e a Matemática? Essas são indagações que precisam ser esclarecidas a você, que, no futuro, pretende ensinar essa disciplina. Montessori desenvolveu vários materiais manipulativos desti- nados à aprendizagem da matemática, que, primeiramente, foram adotados com crianças excepcionais e, pos- teriormente, estendidos às classes normais. Os materiais do método montessoriano têm forte apelo tanto à percepção visual quanto à tátil (AZEVEDO, 1979). Nessa didática, a aprendizagem da matemá- tica acontece por meio da utilização de materiais; por isso, Montessori confeccionou diversos deles para o desenvolvimento do raciocínio mate- mático. Entre os materiais considerados montessorianos destacam-se o material dourado e os triângulos construtores. A caixa sensorial é um tipo de recipiente que contém objetos diferentes. Pode ser uma caixa de sapatos ou qualquer outro recipiente grande o suficiente para que a criança possa colocar as mãos sem dificuldade. Com esse instrumento, você pode, por exemplo, trabalhar formas geométricas com as crianças. Basta inserir triângulos, quadrados, retângulos, círculos e propor o desafio de as crianças, por meio do tato, identificarem as figuras e suas características. Na prática É importante que o professor, ao ensinar Matemática, entenda que o material manipulativo medeia a liberdade e a aprendizagem, de modo que conceitos abstratos se tornem concretos. Com base na ma- nipulação, as descobertas da criança desenvolvem os sentidos, a me- mória, a imaginação e o raciocínio lógico. No sistema montessoriano, são consideradas três realidades fun- damentais, que estão intimamente relacionadas: a criança, o ambiente Tatyana Abramovich/Shutterstock 18 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental e o educador (BARRETO; ALMEIDA, 2009). Com relação ao ambiente, a proposta de Montessori tem como base uma variedade de recursos com diferentes níveis de dificuldade, incentivando a interação social e respeitando as diferentes formas de aprender com cooperação mútua, trocas e experiências (RIBEIRO; CARNEIRO, 2019). O professor, por sua vez, é o responsável pela determinação de um material didático em sala; porém, conforme destaca Serrazina (1990), todo material deve ser utilizado cuidadosamente. O mais importante não é sua utilização, mas a experiência significativa que ele vai proporcionar ao aluno. O material por si só não é garantia de aprendizagem e, por isso, na teoria montessoriana, os professores têm um papel fundamental. São os responsáveis pela preparação de ambientes propícios para a apren- dizagem de Matemática e pela utilização de estratégias apropriadas voltadas ao uso de materiais manipuláveis. O uso do material concreto em sala de aula é uma forma de apre- sentar ao aluno uma maneira mais fácil e palpável de aprender a Mate- mática, tornando as aulas mais significativas e prazerosas, superando seu caráter formalista. Esse recurso pedagógico estimula o interesse e a criatividade do aluno, tornando a aula participativa e proveitosa (SILVA, K. C. J.; SILVA, V. G., 2017). 1.4 Documentos oficiais e o ensino de Matemática no Brasil Vídeo Ao tratarmos de documentos oficiais que orientam o ensino da disciplina de Matemática, é importante diferenciarmos duas etapas: educação infantil e primeiros anos do ensino fundamental. Quanto à primeira, nos prenderemos às orientações do Referencial Curricular Na- cional para a Educação Infantil (RCNEI). Acerca da segunda etapa, aten- taremos aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Matemática. 1.4.1 O RCNEI e a Matemática Em 1998, o Ministério da Educação lançou o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998) como um guia de re- flexões aos profissionais que atuam nessa etapa de ensino. É um ins- trumento de apoio ao planejamento, ao desenvolvimento e à avaliação das práticas educativas. O pensamento matemático e o ensino de Matemática 19 ORCNEI não se constitui legalmente como parâmetro curricular obrigatório, porém, é um documento que representa grande avanço na organização da educação infantil, representando uma primeira tenta- tiva de conferir uma sistematização curricular a essa etapa. No RCNEI, encontra-se um modelo de ensino que afirma assegurar a construção de uma proposta pedagógica para cada faixa etária (de 0 a 3 e de 4 a 6 anos), com o objetivo declarado de orientar sobre os aspectos mais importantes para um atendimento de qualidade na educação infantil para cada área do conhecimento (ARAÚJO, 2010). Os conteúdos matemáticos apresentados no RCNEI estão divididos em duas partes relacionadas com a idade das crianças, conforme ve- mos no quadro a seguir. Quadro 2 Objetivos dispostos pelo RCNEI Crianças de 0 a 3 anos Crianças de 4 a 6 anos • Estabelecer aproximações com algumas noções matemáticas presentes no seu cotidiano, como contagem, relações espaciais etc. • Reconhecer e valorizar os números, as ope- rações numéricas, as contagens orais e as noções espaciais como ferramentas necessá- rias no seu cotidiano. • Comunicar ideias matemáticas, hipóteses, processos utilizados e resultados encon- trados em situações-problema relativas a quantidades, ao espaço físico e à medida, utilizando a linguagem oral e a linguagem matemática. • Ter confiança nas suas próprias estratégias e na sua capacidade para lidar com situações matemáticas novas, utilizando seus conheci- mentos prévios. Fonte: Adaptado de Brasil, 1998, p. 215. O entendimento dessa divisão nos remete a uma reflexão primor- dial: explorar matemática na educação infantil não se trata de formali- zar conteúdos, e sim de propor experiências aos alunos. Nesse sentido, o professor que atua com crianças de 0 a 3 anos pre- cisa dar ênfase a atividades que explorem a utilização da contagem oral, noções de quantidade, de tempo e de espaço em jogos, brincadeiras e músicas. Por isso, a manipulação planejada de objetos é fundamental para as crianças terem a oportunidade de perceber características e propriedades entre uma variedade de objetos. Atividades vinculadas a É importante destacar que, em termos legais, foi a resolução CEB n. 1, de 7 de abril de 1999, que instituiu as Diretrizes Curri- culares para Educação Infantil, substituída posteriormente pela Resolução CNE/CEB n. 5/2009. Importante 20 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental empilhar, rolar e encaixar objetos, por exemplo, não podem ser descar- tadas (BRASIL, 1998). Entre as situações que o professor pode planejar com as crianças de 0 a 3 anos, destaca-se a criação de circuitos por onde as crianças possam engatinhar ou andar (subir, descer, passar por dentro). No que diz respeito à representação do espaço, são relevantes brincadeiras de construção de pistas, torres e cidades. Brincadeiras de faz de conta tam- bém são enriquecedoras. Atividades de representação da passagem do tempo, utilizando datas de aniversário e celebrativas são igualmente recomendáveis. Atividades relacionadas com o folclore brasileiro, que envolvem contagem e números, também podem ser utilizadas para um despertar da sequência numérica oral (BRASIL, 1998). Já os professores que atuam na educação infantil com crianças de 4 a 6 anos precisam compreender que os conteúdos matemáticos estão organizados em três blocos: números e sistema de numeração; gran- dezas e medidas; e espaço e forma. Essa organização é uma maneira de dar visibilidade às especificidades, mas são blocos que precisam ser trabalhados de maneira integrada. Quadro 3 Blocos de conteúdos matemáticos para crianças de 4 a 6 anos Números e sistema de numeração Grandezas e medidas Espaço e forma • Utilização da contagem oral nas brin- cadeiras e em situações nas quais as crianças reconheçam sua necessidade. • Utilização de noções simples de cál- culo mental como ferramenta para resolver problemas. • Comunicação de quantidades, uti- lizando a linguagem oral, a notação numérica e/ou registros não conven- cionais. • Identificação da posição de um ob- jeto ou número em uma série, expli- citando a noção de sucessor e ante- cessor. • Identificação de números nos diferen- tes contextos em que se encontram. • Comparação de escritas numéricas, identificando algumas regularidades. • Exploração de diferentes procedimentos para com- parar grandezas. • Introdução às noções de medida de comprimento, peso, volume e tempo, pela utilização de unidades con- vencionais e não conven- cionais. • Marcação do tempo por meio de calendários. • Experiências com dinhei- ro em brincadeiras ou em situações de interesse das crianças. • Explicitação e/ou representação da posição de pessoas e objetos, utilizan- do vocabulário pertinente nos jogos, nas brincadeiras e nas diversas situa- ções em que as crianças considerarem necessária essa ação. • Exploração e identificação de proprie- dades geométricas de objetos e figu- ras, como formas, tipos de contornos, bidimensionalidade, tridimensionalida- de, faces planas, lados retos etc. • Representações bidimensionais e tridi- mensionais de objetos. • Identificação de pontos de referência para situar-se e deslocar-se no espaço. • Descrição e representação de peque- nos percursos e trajetos, observando pontos de referência. Fonte: Adaptado de Brasil, 1998, p. 219-229. O livro Chá das Dez, de Celso Sisto, com ilustra- ções de Duke, descreve a história de dez velhinhas bem arrumadas que saí- ram juntas para um chá. É um excelente artifício para explorar os primei- ros conceitos numéricos no processo de alfabeti- zação matemática. Belo Horizonte: Aletria, 2009. Livro O pensamento matemático e o ensino de Matemática 21 Explorar os conteúdos, divididos em blocos, não quer dizer que o professor deve trabalhar de modo linear cada um deles. Em seu plane- jamento, é essencial promover a integração deles. Diante desse contex- to, a organização do trabalho pode se direcionar em atividades que relacionem números de telefones, placas de carros e números de cami- sas de jogadores, por exemplo, para dar ênfase ao bloco números e sistema de numeração. No que se refere ao bloco grandezas e medi- das, podem ser propostas atividades de comparação de compri- mentos, pesos e capacidades, explorando conceitos sobre características opostas das grandezas, como grande/pequeno, comprido/curto, longe/perto, muito/pouco, quente/frio. No bloco espaço e forma, são bem-vindas as ativida- des de desenhos em perspectivas variadas (dife- rentes ângulos), para se trabalhar a percepção de espaço. É fundamental explorar representações tridimensionais na prática pedagógica, propondo construções com blocos de madeira, maquetes e painéis (BRASIL, 1998). O professor é o responsável por identificar se o conhecimento foi aprendido ou não por meio das respostas dos alunos. A atividade de ensino deve conter: uma sínte- se histórica do conceito, o problema desencadeador do processo de construção e a síntese da solução coletiva mediada pelo educador (MOURA, 1996). Nesse sentido, de acordo com a proposta do RCNEI, é necessário que o professor, sendo o mediador do conhecimento, defi- na uma metodologia que garanta a apropriação dos conteúdos e res- peite as diferenças entre os alunos. 1.4.2 Os PCNS de Matemática A elaboração dos PCNs foi consequência da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/1996. Os PCNs são documentos norteadores para o trabalho dos professores, pedagogos e gestores na promoção de diferentes habilidades aos alunos, entre elas, a autonomia e a reflexão. Segundo esses documentos, não existe um único caminho para o ensino das disciplinas curriculares, porém, é importante ao professor conhecer as diversas possibilidades de traba- lho para construir a sua prática (BRASIL, 1997a). Africa Studio/Shutterstock Atividades simples e planejadas pelo professor, como dispor caixas de papelão para que os alunos tenham a oportuni-dade de entrar, favorecem a construção do conhecimento matemático, exploram a imagi- nação e atendem de uma forma interativa a dois blocos distintos: espaço e forma e grandezas e medidas. Na prática 22 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Os PCNs permitem ao docente refletir sobre propostas curriculares di- ferenciadas, promovendo uma flexibilização curricular que considere a di- versidade dos alunos (CONCEIÇÃO, 2017). Para uma melhor organização, a respeito do ensino fundamental, os PCNs foram divididos em quatro ciclos, sendo o primeiro e o segundo ciclos destinados aos anos iniciais do ensino fundamental, e o terceiro e o quarto ciclos destinados aos anos finais. Os PCNs destinados aos anos iniciais do ensino fundamental são nosso foco de reflexão e estão divididos em dez volumes: 1) Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais; 2) Língua Portuguesa; 3) Matemá- tica; 4) Ciências Naturais; 5) História e Geografia; 6) Arte; 7) Educação Físi- ca; 8) Apresentação dos Temas Transversais e Ética; 9) Meio Ambiente e Saúde; e 10) Pluralidade Cultural e Orientação Sexual. Os PCNs de Matemática dos primeiros anos do ensino fundamen- tal dividem-se em duas partes. A primeira apresenta princípios nortea- dores da disciplina e sua evolução ao longo dos tempos, destacando os objetivos gerais para o ensino fundamental, os conteúdos a serem explorados e os aspectos relacionados ao processo de avaliação. A se- gunda parte destina-se aos aspectos ligados ao ensino e à aprendiza- gem de Matemática para essa etapa. Para uma melhor organização e sintetização, os conteúdos matemáticos dividem-se em quatro blocos: números e operações; espaço e forma; grandezas e medidas; e trata- mento de informação (BRASIL, 1997b). Ao professor que ensina Matemática nos primeiros anos do ensino fundamental, é importante esclarecer que essa divisão é uma forma de organização, não se trata de explorar um conteúdo específico com foco apenas em um dos blocos. É essencial que o professor faça a interação dos blocos ao explorar os conteúdos, e isso depende das concepções e da criatividade de cada profissional. É essencial ao professor ler na íntegra os Parâmetros Curriculares Nacionais 1ª a 4ª Séries, pois favorecerá a sua compreensão a respeito da organização do ensino dessa disciplina nos anos iniciais. Acesso em: 1 jul. 2020. http://portal.mec.gov.br/busca-geral/195-secretarias-112877938/ seb-educacao-basica-2007048997/12640-parametros-curriculares-nacionais-1o-a-4o-series Leitura O pensamento matemático e o ensino de Matemática 23 De acordo com as orientações propostas nos PCNs, a Matemá- tica deve ser vista pelo aluno como um conhecimento que favorece o desenvolvimento de seu raciocínio, sua capacidade expressiva, sua sensibilidade estética e sua imaginação. Por isso, um dos princípios norteadores dessa disciplina é a utilização dos recursos didáticos em uma perspectiva problematizadora: recursos didáticos como livros, vídeos, televisão, rádio, calcula- dora, computadores, jogos e outros materiais têm um papel im- portante no processo de ensino e aprendizagem. Contudo, eles precisam estar integrados a situações que levem ao exercício da análise e da reflexão, em última instância, a base da atividade matemática. (BRASIL, 1997b, p. 19) É importante destacar que os PCNs foram editados antes da criação das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para o ensi- no fundamental de nove anos, de 2010, que servem de referência e orientação para a elaboração, implementação e avaliação dos proje- tos político-pedagógicos das escolas. Entendemos que os Parâmetros e as Diretrizes são instrumentos que estimulam a busca coletiva de soluções para o ensino de Matemática. 1.5 Orientações da BNCC para o ensino da Matemática Vídeo A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de referência para a formulação dos currículos dos sistemas e das redes escolares dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Com cará- ter normativo, define as aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação básica (BRASIL, 2017). Com relação ao ensino de Matemática no ensino fundamental, a BNCC propõe cinco unidades temáticas correlacionadas, que orientam a formulação de habilidades a serem desenvolvidas: 24 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Figura 1 Unidades temáticas para o ensino de Matemática no ensino fundamental BNCC Números Álgebra Geometria Grandezas Probabilidade e estatística Unidades temáticas para o ensino de Matemática Fonte: Adaptada de Brasil, 2017. Vamos compreender um pouco as características de cada uma dessas unidades com foco nos anos iniciais do ensino fundamental. A unidade temática Números tem como finalidade desenvolver o pensamento numérico. O aluno precisa quantificar e interpretar resul- tados com base em quantidades. A expectativa é que os alunos resol- vam problemas com números naturais e racionais. Espera-se, assim, “que os alunos desenvolvam diferentes estratégias para a obtenção dos resultados, sobretudo por estimativa e cálculo mental, além de al- goritmos e uso de calculadoras” (BRASIL, 2017, p. 666). Com o intuito de os alunos perceberem padrões, sejam em ativida- des numéricas, sejam em outras circunstâncias, como uma sequência de figuras geométricas, estabeleceu-se a unidade temática Álgebra. Na perspectiva dessa temática, os alunos precisam ser levados a comple- tar sequências com a pretensão de descobrir as regras de formação delas (BRASIL, 2017). É essencial que o professor, ao explorar conceitos algébricos nos primeiros anos do ensino fundamental, estabeleça, tam- bém, relações com a unidade temática Números, explorando proces- sos de equivalência, como fazer com que a criança reconheça que se 1 + 3 = 4 e 2 + 2 = 4, então 1 + 3 = 2 + 2. Na Geometria, é essencial a atenção do docente na exploração tan- to de figuras tridimensionais quanto planas, fazendo com que o aluno perceba que as figuras espaciais são constituídas por figuras planas. A percepção, por exemplo, de que um cubo (hexaedro) é formado por seis quadrados é fundamental. O professor também precisa atentar para a elaboração de situações que levem o aluno a perceber a posição de objetos no espaço, como explorar a perspectiva de vistas frontal, laterais e superior de objetos. O pensamento matemático e o ensino de Matemática 25 No desenvolvimento da temática Grandezas, espera-se que o aluno diferencie medidas de comprimento, massa e capacidade e saiba utili- zar instrumentos de medida. É essencial que essa temática seja explo- rada de maneira integrada com as noções de número, com a geometria e com a construção do pensamento algébrico (BRASIL, 2017). Na temática Probabilidade e estatística, o professor precisa apresen- tar aos alunos como funcionam os processos de estimativa, utilizando, para isso, as diferentes tecnologias que estão ao alcance dos alunos, como calculadoras e planilhas eletrônicas. Provocações são fundamen- tais para que os alunos argumentem a favor de diferentes possibilida- des de resolução de um problema (BRASIL, 2017). É importante ao professor fazer a leitura na íntegra da Base Nacional Comum Curricular para compreender com mais clareza os objetivos e as finalidades do ensino de Matemática em cada etapa de ensino. Acesso em: 1 jul. 2020. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/ Leitura Nesta seção, fizemos apenas uma análise generalizada de cada área temática proposta na BNCC com relação à Matemática, apresentando algumas insinuações a respeito de procedimentos a serem adotados na prática pedagógica. Vale ressaltar que encaminhamentos metodo- lógicos referentes às temáticas propostas pela BNCC, em cada etapa de ensino, precisam sempre levar em conta as experiências adquiridas pelo aluno na fase anterior e sua realidade. O professor também deve sempre buscar promover a interação entre osconteúdos programáveis. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este capítulo apresentou diferentes teorias, buscando explicar como a criança aprende a Matemática e qual é o papel do professor nesse pro- cesso. Conduziu, também, a uma reflexão dos principais documentos que norteiam o ensino da Matemática na educação básica brasileira. Como futuro professor que ensinará Matemática, é essencial, além de preocupar-se com o conteúdo a ser ensinado e com a legislação a ser seguida, dedicar atenção ao potencial de cada aluno e respeitar suas di- versidades e limitações. Na prática pedagógica, um bom trabalho só será realizado por meio de atitudes e escolhas de estratégias metodológicas que encantem os alunos. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/ 26 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental ATIVIDADES 1. Entre os documentos que contribuem para a organização do ensino da Matemática, estão o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, os Parâmetros Curriculares Nacionais e a Base Nacional Comum Curricular. Elabore um texto de, no máximo, dez linhas refletindo sobre cada um deles. 2. A Base Nacional Comum Curricular divide os conteúdos matemáticos em cinco grandes temáticas: Números; Álgebra; Geometria; Grandezas; e Probabilidade e estatística. Isso significa que o professor precisa explorar uma área de cada vez? Argumente sua resposta em, no mínimo, cinco linhas. 3. Para o entendimento da noção de número pela criança, é essencial que o professor proporcione atividades relacionadas com os processos de classificação e seriação. Qual é a diferença entre esses processos? REFERÊNCIAS ARAÚJO, E. S. Matemática e infância no “referencial curricular nacional para a educação infantil”: um olhar a partir da teoria histórico-cultural. Zetetike, v. 18, n. 1, p. 137-172, 23 dez. 2010. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/zetetike/ article/view/8646696. Acesso em: 1 jul. 2020. AZEVEDO, E. D. M. Apresentação do trabalho montessoriano. Ver. de Educação & Matemática, n. 3, p. 26-27, 1979. BARRETO, R. de L.; ALMEIDA, V. L. M. Maria Montessori e sua contribuição para o ensino-aprendizagem de matemática. In: CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA. São Paulo: Unesp, 2009. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/139601/ ISSN2175-7054-2009-7970-7985.pdf?sequence=1. Acesso em: 1 jul. 2020. BORGES, L. R.; BONFIM, S. H. 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Como a criança aprende o significado dos números? Quaissão as características do sistema de numeração decimal que utilizamos? Essas são dúvidas que, muitas vezes, assombram o profissional que atua nos primeiros anos do ensino básico e que, na maioria das vezes, não possui mui- tas habilidades com o ensino da disciplina de Matemática. A pretensão desta seção é dar apoio a você no que se refere a conceitos e abordar aspectos relacionados a como ensinar a Matemática, buscando, assim, quebrar preconceitos relacionados a esse processo. As palavras número e numeral representam conceitos distintos, sendo numeral um símbolo (gráfico ou não) que representa um nú- mero. Existe, também, a diferenciação entre os termos numeral e algarismo, uma vez que esse último corresponde às unidades consti- tuintes de um numeral escrito. Em analogia com o alfabeto, os alga- A criança e o ensino de Matemática 29 rismos correspondem às letras com que escrevemos os numerais (RODRIGUES; DINIZ, 2015). De acordo com essa descrição, podemos afirmar, por exemplo, que o número 324 é composto pelos algarismos 3, 2 e 4, e o número 542 é composto pelos algarismos 5, 4 e 2. Aprenda a diferenciar número, numeral e algarismo: Número: está relacionado com a ideia de quantidade; utilizamos esse termo quando precisamos contar, ordenar ou medir. Numeral: trata-se da representação dos números, ou seja, é a representação gráfica de um número (palavra ou símbolo). Por exemplo: o número vinte e três é representado pelo numeral 23 e formado pelos algarismos 2 e 3. Algarismos: são os símbolos numéricos utilizados para formar os numerais. No nosso sistema de numeração, utilizamos dez algarismos: 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. As crianças, nos seus primeiros anos escolares, trazem consigo al- gum tipo de vivência relacionada com números presenciados em jogos, músicas, roupas ou em diferentes situações. Desde pequenas, são mo- tivadas por seus familiares a contarem e fazerem representações de quantidades nos dedos – fato que precisa ser levado em conta e valo- rizado pelo docente que atua nos primeiros anos da educação básica. Entre as experiências observadas no processo de contagem, é co- mum, por exemplo, que a criança, ao expressar-se para contar até tre- ze, fale oralmente: um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, “dez e um”, “dez e dois” e “dez e três”. Isso é normal, pois, nes- sa etapa, a criança ainda não consegue relacionar a sua fala (oralida- de) com quantidades. Mas o que fazer para a criança começar a fazer correspondências entre oralidade e quantidade? De acordo com Moretti e Souza (2015), o aprendizado do conceito dos números é complexo e exige do professor atenção ao desenvolvi- mento de uma série de noções que precisam ser compreendidas pelas crianças. Noções essas que não podem ser exploradas separadamente ou em uma ordem cronológica, mas com propostas que as articulem. Dentre as noções, destacamos: Figura 1 Noções matemáticas que precisam ser compreendidas pelas crianças. Senso numérico Correspondência um a um Ordenação e sequência numérica Numeração Cardinalidade Relação entre nome do número, quantidade e símbolo numérico Fonte: Moretti e Souza, 2015, p. 63. O senso numérico relaciona-se com as primeiras comunicações das crianças e pode ser explorado em atividades que envolvam a contagem. Já a ordenação e a sequência numérica podem ser exploradas por meio de brincadeiras, como pular corda, amarelinha, esconde-esconde ou, até mesmo, por músicas e cantigas populares. O próprio Referencial Curricular Nacional para a Educação In- fantil (BRASIL, 1998) apresenta a música como uma forma uni- versal de expressão e enfatiza os brinquedos cantados como legítimas expressões da infância. Da mes- ma maneira, os autores Smole (2000), Lorenzi e Chies (2009) defendem que a música con- tribui no desenvolvimento da inteligência lógico-matemática. Entregar duas caixas cheias de tampinhas ou brinquedos e perguntar às crianças qual possui maior quantidade é uma experiência interessante. Com essa atividade, o professor pode identificar se as crianças con- seguem fazer correspondência um a um ou apenas verbalizar o número. Na prática Ju st d an ce /S hu tte rs to ck Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental30 A criança e o ensino de Matemática 31 É importante ao professor compreender que apenas a apropriação da sequência numérica não garante a aprendizagem do número e da contagem. A criança pode recitar corretamente os números, mas sem estar fazendo relações com o seu valor numérico. Por isso, é importan- te o professor propor atividades relacionadas com a inclusão hierár- quica, levando a criança a perceber que cada numeral representa o seu antecessor acrescido de uma unidade (MOURA, 1996 apud MORETTI; SOUZA, 2015). Recitar e contar são procedimentos vinculados, mas não representam a mesma coisa (DEHEINZELIN; MONTEIRO; CASTANHO, 2018): • Recitar: está voltado a dizer oralmente uma sequência de números fora de uma situação de enumeração. • Contar: implica utilizar uma série numérica em uma situação de enumeração, colocando em ação o procedimento de correspondência termo a termo entre o que está sendo contado e os nomes dos números. Dentre as atividades que podem ser desenvolvidas para explorar as noções de numeração, cardinalidade e relações entre nome do número e símbolo, podemos citar, por exemplo, a brincadeira da amarelinha. Com ela, é possível, de uma forma lúdica, contribuir para o entendimento do con- ceito de número. Sugerimos apresentar às crianças a cantiga popular Indiozinhos, publicado pelo canal Bob Zoom, para explorar o conceito de ordenação e sequência numérica. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=vOQvZKGo8m0. Acesso em: 1 jul. 2020. Vídeo brgfx/S hutte rstoc k Leitura Para aprofundar suas concepções do ensino de Ma- temática na educação básica, é essencial a leitura de Educação Matemática nos anos iniciais do Ensino Funda- mental: princípios e práticas pedagógicas, das professoras Vanessa Dias Moretti e Neusa Maria Marques de Souza. O material explora conceitos e apresenta uma série de práticas pedagógicas que podem ser desenvolvidas pelos profissionais de educação. São Paulo: Cortez, 2015. 32 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental 2.2 A representação numérica e o valor posicional Vídeo O sistema de numeração decimal que utilizamos é fundamentado no que chamamos de valor posicional de um algarismo, o que permi- te representar qualquer número utilizando apenas os dez algarismos. Questões relacionadas ao valor posicional estão inseridas no currículo do ensino da Matemática desde os primeiros anos do ensino funda- mental, porém, as crianças conseguem se apropriar totalmente desses saberes apenas próximo aos 10 anos de idade. Para a criança perceber as relações apresentadas e características envolvidas no valor posicio- nal, é necessária a clareza do conceito de unidades, pois é a base para a evolução do entendimento de dezenas, centenas e demais classes (TRACANELLA; BONANNO, 2016). De acordo com Kamii (1992), quando a criança não compreende o valor posicional dos números, ela apresenta dificuldade, por exem- plo, de perceber que o número 32 corresponde a três dezenas e duas unidades. É essencial que o professor, antes de iniciar conceitos rela- cionados com as operações básicas, tenha certeza de que seus alunos compreenderam o sistema de numeração decimal e suas proprieda- des. Portanto, explorar atividades relacionadas com noções de quan- tidade é fundamental no processo de alfabetização matemática. Mas como fazer a criança desenvolver a noção de quantidade? A noção de quantidade é apropriada pela criança primeiramente a nível perceptual, por meio da comparação de objetos. Como já visto, não se pode confundir a contagem com a recitação dos números, uma vez que esta se relaciona com o processo quantitativo. Para contar, a criançaprecisa classificar os objetos a serem contados dos que não serão con- tados; ordenar os objetos para serem contados um de cada vez sem pu- lar nenhum; ordenar os nomes aprendidos para a numeração; associar cada objeto com um só nome (correspondência termo a termo); reco- nhecer que o último número falado durante a contagem remete à quan- tidade total de objetos, e não apenas ao último deles (SMOLE, 2008). De acordo com Lorenzato (2011), há sete processos mentais básicos para a aprendizagem da Matemática: correspondência, comparação, classificação, sequenciação, seriação, inclusão e conservação. A criança e o ensino de Matemática 33 Quadro 1 Processos mentais para a aprendizagem de matemática Correspondência Trata-se da relação entre objetos. O que corresponde, por exemplo, a quantidade a um número ou uma posi- ção a um número ordinal. Comparação É a percepção de características semelhantes ou dife- rentes vinculadas à análise de propriedades físicas. Classificação Relaciona-se com a capacidade de separar objetos com características semelhantes. Possibilita à criança identifi- car as partes de um todo. Sequenciação Significa ordenar uma sequência; está vinculada à orga- nização de objetos Seriação Trata-se da organização de uma sequência segundo al- gum critério estabelecido. Por meio da seriação, a crian- ça tem a oportunidade de compreender conceitos rela- cionados à ordem crescente e decrescente. Inclusão É a capacidade de observar um conjunto dentro de ou- tro. A inclusão hierárquica proporciona à criança o en- tendimento de incluir o “um” no “dois”, o “dois” no “três”, ou perceber, por exemplo, que se, em uma cesta, há dez laranjas e cinco maçãs, nessa cesta, existem 15 frutas. Conservação É a capacidade de perceber que as quantidades de ob- jetos não mudam conforme a arrumação espacial ou posição. Se, em um carro, há cinco indivíduos, se houver o rodízio do motorista, continuarão existindo cinco pes- soas dentro dele. Fonte: Elaborado pelo autor com base em Lorenzato, 2011. Uma ferramenta que pode ser explorada para o desenvolvimento dessas noções é a literatura infantil. Segundo Zilberman (2003), a litera- tura infantil é uma ferramenta que permite à criança estabelecer rela- ções entre ficção e realidade. Ela se organiza diferente da linguagem do cotidiano, o que leva a criança a solicitar a repetição da mesma história. A literatura infantil tem o potencial de criar um ambiente favorável para o desenvolvimento do número, facilitando a construção formal desse aprendizado. Por isso, ela precisa ser encarada como uma ferramenta fundamental no processo de aprendizagem da Matemática (CAMPOS; MONTOITO, 2010). 34 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Quadro 2 Processos mentais inseridos em contos clássicos infantis Obra Processos mentais Cachinhos Dourados Correspondência, comparação, seriação Branca de Neve Correspondência, comparação, seriação, conservação Três Porquinhos Correspondência Pinóquio Comparação, seriação O Pequeno Polegar Correspondência, comparação, classificação, inclusão, conservação Soldadinho de Chumbo Classificação, inclusão Fonte: Adaptado de Montoito e Cunha, 2020, p. 176-177. Percebemos, portanto, que a literatura pode ser uma excelente fer- ramenta para o professor no processo inicial da construção do número, visto que noções básicas essenciais para a apropriação desse conceito podem ser encontradas em diferentes obras. 2.3 O sistema de numeração Vídeo Denominamos como sistema de numeração um conjunto de sím- bolos e regras para escrever números. Com o desenvolvimento de atividades relacionadas ao comércio e à agricultura, houve a neces- sidade de contar objetos e de uma simbologia para fazer represen- tações; essa foi a origem dos números que utilizamos até hoje. Por isso, quando falamos em sistema de numeração, é essencial fazer- mos relações com fatos históricos e conhecermos sua importância em outras épocas para a evolução da humanidade. Apresentaremos a seguir alguns sistemas de numeração, relatando sua importância, representações e características até o surgimento do atual sistema indo-arábico que utilizamos. A criança e o ensino de Matemática 35 2.3.1 Sistema de numeração egípcio (4.000 a.C.) No sistema de numeração egípcio, os primeiros nove números intei- ros eram anotados pela repetição de traços verticais, não obedecendo a um valor posicional. Nesse sistema, há símbolos para representar os números um, dez, cem, mil, dez mil, cem mil e um milhão (BORGES; BONFIM, 2012). Figura 2 Representação do sistema de numeração egípcio Fonte: Borges e Bonfim, 2012, p. 40. No sistema egípcio, cada símbolo poderia ser repetido até nove vezes, não importando sua posição na escrita, e sim o valor de cada símbolo, por isso ele não era posicional. Nesse sistema, não importa- va se as representações acontecessem da direita para a esquerda ou vice-versa (PAIVA, 2018). Figura 3 Igualdade no sistema de numeração egípcio Fonte: Paiva, 2018, p.13. 2.3.2 Sistema de numeração romano (séc. III a.C.) Os romanos utilizaram letras do próprio alfabeto para constituírem seu sistema de numeração. Esse sistema é utilizado para representar, hoje, séculos, capítulos de livros, marcadores de relógios, entre outras possibilidades. Foi criado para fazer representações de quantidade, e não para operacionalizações aritméticas. 36 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Figura 4 Simbologia do sistema de numeração romano Ve ct or M in e/ Sh ut te rs to ck Figura 5 Exemplo de uso de numerais romanos em relógio Zs sc hr ei ne r/ Sh ut te rs to ck 2.3.3 Sistema de numeração maia (250 d.C. a 900 d.C.) De acordo com a história, a civilização maia estava localizada na América Central e na América do Sul, sem contato com civilizações orientais na época. Os maias desenvolveram um sistema com base no uso dos dedos das mãos e dos pés, desse modo, seu sistema é vige- simal, ou seja, de base vinte. A simbologia do sistema de numeração maia é representada por pontos e barras, e o zero é representado por uma concha (BORGES; BONFIM, 2012). A criança e o ensino de Matemática 37 Com relação à simbologia do sistema de numeração maia, os va- lores de 1 a 19 eram representados por barras e pontos: cada ponto representava uma unidade e cada barra, cinco unidades (PAIVA, 2018). Figura 6 Simbologia do sistema de numeração maia Fonte: Borges e Bonfim, 2012, p. 45. 2.3.4 Sistema de numeração indo-arábico A história revela que o sistema de numeração indo-arábico foi cria- do pelos hindus, mas recebeu fortes influências do árabes em con- sequência de suas transações comerciais pela Europa. É um sistema posicional decimal: posicional por representar valores diferentes de acordo com sua posição, e decimal por ser agrupado de dez em dez (BORGES; BONFIM, 2012). O sistema de numeração indo-arábico é utilizado na maioria dos países e, por ser decimal, nós o chamamos de sistema de numeração decimal (SND). A palavra decimal tem sua origem no latim decem, que significa dez (CENTURIÓN, 1994). A evolução desse sistema até nossos dias é representada na Figura 7. 38 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Figura 7 Evolução do sistema de numeração indo-arábico Hindu 300 a.C. Hindu 500 d.C. Árabe 900 d.C. Italiano 1400 d.C. Atual Árabe (Espanha) 1000 d.C. Fonte: Borges e Bonfim, 2012, p. 47. O trabalho didático com o sistema de numeração decimal não é fácil. Ao explorar esse sistema, é importante que as ações planejadas não se limitem a explicações verbais sobre os valores referentes a de- zenas, centenas e milhares. É necessário, também, levar em conta que as crianças podem estar aplicando mecanismos sem entenderem os princípios do sistema, o que as leva a fazer apenas aplicações mecâni- cas (LERNER, 1995). Dentre os aspectos essenciais para o entendimento do sistema de numeração decimal,destacamos os princípios de cardinalidade e ordi- nalidade, assim como o princípio de posicionalidade (IFRAH, 1997). Quando tratamos do aspecto da cardinalidade, estamos relacio- nando o número com uma quantidade absoluta. Os números ordi- nais, por sua vez, envolvem a representação de uma série (ordem). Quadro 3 Exemplo de correspondência entre números cardinais e ordinais Números cardinais Números ordinais 1 – um 1o – primeiro 2- dois 2o – segundo 3 – três 3o – terceiro 4 – quatro 4o – quarto 5 – cinco 5o – quinto 6 – seis 6o – sexto 7 – sete 7o – sétimo Fonte: Elaborado pelo autor. A criança e o ensino de Matemática 39 Assim, cardinal e ordinal são aspectos comple- mentares enraizados na concepção da noção de número. O primeiro deles está baseado mais no princípio da equiparação, e o segundo exige pro- cessos de agrupamento e sucessão (IFRAH, 2005). Quando se planeja atividades de classificação, está se estabelecendo relações com os números cardinais; e quando se estabelece processos rela- cionados com a seriação, explora-se os números ordinais (RAMOS, 2009). Já a posicionalidade está relacionada com a posição ocupada por cada algarismo em um número, pois ela altera o seu valor. No número 23, por exemplo, o algarismo 2 representa duas dezenas e o algarismo 3, três unidades (20 + 3 = 23). O número 32 é representado por três dezenas e duas unidades (30 + 2 = 32). Se pensarmos no número 237, vemos que ele é formado por duas centenas, três dezenas e sete unidades (200 + 30 + 7 = 237). Com re- lação à potência de 10, o número 237 pode ser assim representado: 2 · 102 + 3 · 101 + 7 · 100. Leitura De autoria de Georges Ifrah, o livro Os números: história de uma grande invenção retrata a origem, as contribuições e representações dos números na história da humanidade. É uma leitura instigante, que traça a evolução dos números, desde a pré-história até os egípcios, babilônios, fenícios, gregos, romanos, entre outros. São Paulo: Globo, 2005. 2.4 Concepção geométrica nas experiências das crianças Vídeo Entre as causas do insucesso dos alunos com relação à Mate- mática, temos o processo de ensino e aprendizagem que, mui- tas vezes, limita a criatividade, a sensibilidade e a descoberta (FAINGUELERNT; NUNES, 2006). Por essa razão, ao pensar em explorar conceitos geométricos, se faz necessário ao professor preparar novas experiências, novas descobertas. De acordo com Pontes (2017), a base da construção de novas técni- cas para a aprendizagem de Matemática fundamenta-se em quatro pi- lares: raciocínio lógico, criatividade, disposição e vontade de aprender. Vejamos esses conceitos no Quadro 4. 40 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental Quadro 4 Pilares da aprendizagem de matemática Raciocínio lógico Criatividade Disposição Vontade de aprender É baseado em argumentos para se chegar a uma conclusão. Por isso, promover diferentes expe- riências torna-se fundamental para permitir à criança realizar inferências. Permitir à criança encontrar novas possibilidades, partindo de sua cria- tividade, é relevante para o processo de aprendizagem e a descoberta de novas possibilidades. Por meio de situa- ções atraentes, a criança está disposta a seguir para a descoberta do novo. Assim, tornar o processo do apren- dizado motivacional é relevante. Trata-se de um sentimen- to individual motivado pelo entusiasmo de novas desco- bertas. Fonte: Pontes, 2017, p. 162. O trabalho com a geometria nos primeiros anos escolares lança de- safios que precisam ser enfrentados com naturalidade, levando em con- ta esses quatro pilares. O professor deve estimular os alunos por meio de experiências e vivências no seu cotidiano. Ao explorar, por exemplo, a diferenciação entre retas horizontais, verticais e transversais, o profes- sor precisa sair de uma simples representação em um quadro com giz para situações reais – as ruas da cidade podem ser representações para o estudo dessas retas. A geometria espacial pode ser explorada com base em embalagens de produtos adquiridos no mercado. A geometria modifica a maneira de observar o mundo, sendo por meio da experimentação que se chega à abstração. Dessa maneira, a experimentação é fundamental na construção do conhecimento lógico-matemático (ARAÚJO, 1994). Os Parâmetros Curriculares Nacio- nais também destacam que a geometria leva o aluno a compreender o mundo como espaço capaz de conectar a Matemática com outras áreas de conhecimento (BRASIL, 1997). De acordo com Homen (2013), o estudo da geometria pode ser classificado em três tipos de relações: topológicas, projetivas e métri- cas. As relações topológicas estão relacionadas com a diferenciação entre figuras abertas ou fechadas, interior e exterior (PIRES, 2000). As projetivas são relações nas quais a criança deixa de ter um único ponto de referência, ou seja, observações em perspectivas associadas com projeções (DIENES; GOLDING, 1975). Em tal relação, a criança deixa de A criança e o ensino de Matemática 41 ter um único ponto de referência e passa a perceber os objetos sob outros pontos de vista. Já as relações métricas são observadas na geo- metria euclidiana com questões envolvendo distâncias, ângulos e suas relações (HOMEN, 2013). CONSIDERAÇÕES FINAIS Este capítulo explorou a origem, representação e caracterização dos números, além de apresentar a formação e a importância de alguns dos diferentes sistemas de numeração que contribuíram para a evolução da humanidade. Por meio dele, foi possível também conhecer as principais ca- racterísticas do sistema de numeração decimal, percebendo que o proces- so de aprendizagem precisa levar em conta a experimentação dos alunos. Refletimos, ainda, sobre a geometria. Tivemos a oportunidade de per- ceber que a criatividade e a conexão com o cotidiano são essenciais para explorar conceitos geométricos. Nessa reflexão, foi possível rever concei- tos e perceber a necessidade de explorar uma matemática criativa e en- volvente com os alunos. ATIVIDADES 1. O processo de recitação dos números por uma criança no processo de alfabetização garante completamente que ela já se apropriou dos conceitos de numeração e contagem? Justifique sua resposta. 2. Qual é a diferença entre números cardinais e ordinais? Cite exemplos. 3. Uma das características do sistema decimal é o valor posicional. O que ele representa? Cite um exemplo. REFERÊNCIAS ARAÚJO, M. A. S. Por que ensinar geometria nas séries iniciais de 1º grau. Educação Matemática em Revista, São Paulo, Ano 2, n. 3, p. 12-16, 1994. BORGES, L. R.; BONFIM, S. H. A origem dos números. Interfaces da Educação, v. 2, n. 6, p. 37-49, 2012. Disponível em: https://periodicosonline.uems.br/index.php/interfaces/ article/view/584/548. Acesso: 1 jul. 2020. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília, DF: MEC/SEF, vol. I, 1998. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf. Acesso em: 1 jul. 2020. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília, DF: MEC/SEF, 1997. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/ arquivos/pdf/livro03.pdf. Acesso em: 1 jul. 2020. CAMPOS, R. S. P.; MONTOITO, R. O texto alternativo ao livro didático como proposta interdisciplinar do ensino de ciências e matemática. In: PIROLA, N. A. (org.). Ensino de ciências 42 Metodologia do ensino de Matemática - anos iniciais do ensino fundamental e matemática, IV: temas de investigação. São Paulo: Cultura acadêmica, 2010. v. 4. CENTURIÓN, M. Números e operações. São Paulo: Scipione, 1994. DEHEINZELIN, M.; MONTEIRO, P.; CASTANHO, A. F. Aprender com a criança: experiência e conhecimento. Livro do Professor da Educação Infantil: creche e pré-escola: 0 a 5 anos e 11 meses. Belo Horizonte: Autêntica, 2018. DIENES, Z. P.; GOLDING, E. W. A geometria pelas transformações: