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1 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 Tutorial 10 OBJETIVO 1: COMPREENDER A EPIDEMIOLOGIA, FISIOPATOLOGIA, MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS, DIAGNÓSTICO, PROGNÓSTICO, COMPLICAÇÕES. Clínica médica – USP Reumatologia – Harrison Current, diagnóstico e tratamento em reumatologia INTRODUÇÃO - O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, multissistêmica, de causa desconhecida e de natureza autoimune, caracterizada pela presença de diversos autoanticorpos e considerada o protótipo das doenças mediadas por imunocomplexos. - Segundo o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde de 2013, Lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune sistêmica caracterizada pela produção de autoanticorpos, formação e deposição de imunocomplexos, inflamação em diversos órgãos e dano tecidual. - Caracteriza-se pela apresentação clínica polimórfica que, nas suas fases iniciais, pode dificultar o diagnóstico preciso. Esta diversidade de manifestações sistêmicas torna esta doença uma das mais desafiadoras, mas também uma das mais fascinantes do ponto de vista clínico. - As manifestações clínicas podem aparecer de maneira isolada, consecutiva ou aditiva no decorrer do tempo, sobretudo nos primeiros 5 anos da doença, que é o período em que a enfermidade habitualmente mostra os locais preferenciais de comprometimento. EPIDEMIOLOGIA - De modo característico, o LES é muito mais prevalente em mulheres, principalmente na idade fértil, sendo que os seus primeiros sinais e sintomas iniciam-se entre a 2a e a 3a décadas de vida, nas quais o predomínio do sexo feminino é de 10:1. Entretanto, a doença pode ocorrer também em crianças e em idosos, porém com menor predomínio do sexo feminino nestes extremos de idade. - O LES é uma doença universal encontrada em todas as etnias e em diferentes áreas geográficas, mas parece ser mais prevalente na raça negra. É interessante notar uma determinada agregação de doenças autoimunes na família de pacientes com LES, pois aproximadamente 10 a 20% destes pacientes apresentam história familiar de alguma doença autoimune ou mesmo de lúpus. - O LES tem preferência por mulheres jovens, durante a menacme (idade fértil), numa proporção feminino/masculino em torno de 9:1. A doença costuma se manifestar entre 15-45 anos, mas pode ocorrer em qualquer idade. Existe predomínio na raça negra (3-4 vezes mais frequente que nos brancos). ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA - Apesar dos progressos na identificação e da melhor caracterização dos autoanticorpos que comprovam a disfunção imunológica do LES, a sua patogênese ainda necessita de maiores esclarecimentos. Certamente, a doença é multifatorial e várias condições desempenham um papel predisponente ou coadjuvante na doença. FATORES GENÉTICOS - O componente genético merece destaque dentre os . fatores envolvidos na patogênese. Sabe-se que existe no LES maior frequência de certos haplótipos dos antígenos de histocompatibilidade (HLA), tanto de classe I (B8) como de classe II (DR3, DR2, DQw1 e DQw2), que se lo-calizam no braço curto do cromossomo 6. De maneira curiosa, deficiências de frações de complemento, notadamente C2 e C4, que são observadas no LES com frequência, também estão ligadas aos haplótipos DR2 e DR3, respectivamente. - Deficiência dos componentes iniciais da cascata do complemento (C1q, C2 e C4), sendo a deficiência de C1q o fator mais fortemente associado ao LES. - Deficiência do receptor Fc de imunoglobulinas, altamente associado a nefrite lúpica por depósito de imunocomplexos. - Polimorfismos do Fator regulador de Interferon (IRF5), levam a um aumento da produção de interferon do tipo 1, exacerbando a ação da imunidade inata. - Presença de HLA-DR2 e DR3 que aumentam o risco de LES em 2 a 3 vezes. - Deficiência nos mecanismos de autorregulação do sistema imune, como deficiência na produção de IL-2, TGF-β ou outras citocinas, levando a uma ativação exagerada do sistema imune. - A participação hormonal na patogênese do LES se baseia na maior incidência e prevalência do LES na população fértil feminina e em modelos experimentais. Comprovadamente, existe na doença um metabolismo anormal de hormônios sexuais, com aumento da 16-alfa-hidro-xiestrona e de prolactina, e alterações no metabolismo dos androgênios, com diminuição de testosterona nos homens e de de- hidroepiandosterona nas mulheres com lúpus. 2 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 FATORES AMBIENTAIS - A influência dos fatores ambientais também é bem documentada, principalmente com a comprovação de que a exposição à luz solar agrava ou desencadeia a doença. A luz ultravioleta, em especial com a irradiação beta, é capaz de induzir e exacerbar a atividade inflamatória, tanto nos quadros cutâneos quanto sistêmicos do lúpus. Exposição aos raios ultravioleta, principalmente tipo B. - Hormônios sexuais como androgênios e progestógenos (por isso a associação da doença em mulheres na idade fértil). De modo que, pacientes em uso de anticoncepção oral ou terapia de reposição hormonal (TRH) possuem risco aumentado de LES. - A participação de diversos agentes infecciosos, particularmente virais, como mixovírus, reovírus, parvovírus, retrovírus tipo C, vírus Epstein-Barr (EBV), na gênese da doença sempre foi considerada, embora a relação destes agentes com a doença não seja universal. Além do possível envolvimento no desenvolvimento da doença em indivíduos geneticamente predispostos, os gatilhos infecciosos estão implicados no desencadeamento dos episódios de exacerbação do LES. Agentes microbiológicos, principalmente vírus, que podem promover modificações antigênicas e simular auto antígenos, desencadeando doenças autoimunes. - Da mesma forma, o papel de diversas substâncias químicas como desencadeantes do lúpus propriamente dito também é conhecido. Existe uma forma especial de doença, denominada lúpus induzido por drogas, que se distingue do LES idiopático pela associação temporal do uso de determinados medicamentos, pela apresentação de um quadro clínico mais leve, em geral, sem acometimento renal e do sistema nervoso central (SNC) e pela presença de altos títulos de anticorpos anti-histona de forma isolada. - Medicamentos que geram o “lúpus farmacoinduzido”. Esse mecanismo se explica, principalmente, pela indução de desmetilação do DNA, gerando expressão exagerada de genes.Além disso, o tabagismo talvez seja outro fator ambiental envolvido no desenvolvimento do LES. OBS 1: Embora certamente exista a influência destes fatores, é importante ressaltar que a produção anormal de autoanticorpos pelas células B é o principal evento no LES, e esta alteração é a principal característica da doença. Estudos recentes sugerem que a apoptose, ou morte celular programada, contribui para a resposta imunológica inadequada do lúpus por meio da exposição de antígenos celulares. OBS 2: Quaisquer que sejam as interações entre fatores genéticos e ambientais, parece que um elemento central na fisiopatologia do LES é a existência de “receptores de reconhecimento de padrões moleculares” anômalos (os “TLR” = Toll-Like Receptors). FISIOPATOLOGIA - As respostas imunes subjacentes ao LES podem ser definidas de forma resumida como respostas que levam à produção de quantidades aumentadas e de formas imunogênicas de ácidos nucleicos, de suas proteínas acompanhantes e de outros autoantígenos. - O processo pode começar com a ativação de imunidade inata indutora de autoimunidade, em parte via ligação de DNA/RNA/proteínas por receptores semelhantes ao Toll presentes nas células envolvidas. - As alterações incluem células dendríticas produtoras de α- interferona (α-IFN); macrófagos ativadores produtores de citocinas/quimiocinas inflamatórias, como as interleucinas (p. ex.,IL-12), o fator de necrose tumoral α (TNF-α) e o fator de maturação/sobrevida da célula B (BLys/BAFF); neutrófilos liberadores de redes contendo DNA/proteína; e células natural killer (NK) incapazes de destruir células B e T autorreativas ou de produzir o fator de crescimento transformador β (TGF-β), necessário ao desenvolvimento de células T reguladoras. - A regulação positiva de genes induzida pelas IFNs é uma “assinatura” genética nas células do sangue periférico de 50 a 80% dos pacientes com LES. O sistema imune inato interage com as células B e T da imunidade adaptativa, o que impulsiona ainda mais as respostas autoimunes. Os linfócitos T têm metabolismo alterado (anomalias no transporte de elétrons mitocondrial, no potencial de membrana e no estresse oxidativo), utilização aumentada da glicose, produção aumentada de piruvato, ativação de mTOR e autofagia aumentada. - As células T e B são ativadas e conduzidas à apoptose com mais facilidade do que as células normais, provavelmente devido à sua ligação aos autoanticorpos e, adicionalmente, à sinalização anormal após o envolvimento de moléculas de superfície, resultando em uma produção anormalmente baixa de IL-2 (necessária para a sobrevida da célula T). As células B apresentam antígeno e secretam IL-6 e IL-10, promovendo a sobrevida de células B autorreativas (que também é favorecida pelo estrogênio). - As células fagocíticas do lúpus têm capacidade reduzida de eliminar imunocomplexos, células apoptóticas, bem como as bolhas de superfície contendo fosfolipídeos e DNA/RNA/Ro/La. O resultado é a persistência de grandes quantidades de autoantígenos e as consequentes quantidades aumentadas de autoanticorpos com números ampliados de células B ativadas e plasmoblastos/plasmócitos, bem como de células T autorreativas que mudam de populações reguladoras para células TH1, TH17 e TFH numérica e funcionalmente aumentadas, as quais promovem síntese de autoanticorpos e lesão tecidual. - Essa lesão começa com a deposição de autoanticorpos e/ou imunocomplexos, seguida pela destruição mediada por 3 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 ativação do complemento e pela liberação de citocinas/quimiocinas. Células não imunes fixas nos tecidos são, então, ativadas para produzirem mais inflamação e lesão – como se observa com as células basais na derme, os fibroblastos sinoviais, as células mesangiais renais, os podócitos e o epitélio tubular, bem como com as células endoteliais no corpo inteiro. - Enquanto isso, o ataque imune inicial atrai para os tecidos- alvo mais células B e T, monócitos/macrófagos, células dendríticas e plasmócitos. A inflamação também causa liberação de peptídeos vasoativos, lesão oxidativa, além de liberação de fatores de crescimento e fatores fibrosantes. Pode ocorrer esclerose/fibrose com dano tecidual irreversível em múltiplos tecidos, incluindo rins, pulmões, vasos sanguíneos e pele. Cada um desses processos depende da constituição genética do indivíduo, das influências ambientais e da epigenética. - Múltiplas alterações epigenéticas caracterizam o LES, incluindo a hipometilação do DNA em células T CD4+, em células B e em monócitos, incluindo genes que controlam a produção de interferonas tipo 1, além de modificações em histonas. Algumas dessas alterações são mediadas por micro-RNAs associados ao LES, incluindo aqueles que controlam as DNA-metiltransferases (DNMTs), como mIR- 146a, que controlam a metilação de DNA em células T CD4+ e a produção de IFN. Alguns polimorfismos gênicos contribuem para diversas doenças autoimunes, como em STAT4 e CTLA4. Todas essas combinações gênicas epigenéticas/transcricionais/polimórficas influenciam as respostas imunes aos ambientes externo e interno; quando tais respostas são excessivamente altas e/ou excessivamente prolongadas e/ou inadequadamente reguladas, a doença autoimune é favorecida. - O LES é mais frequente no sexo feminino, com um papel evidente dos efeitos hormonais, dos genes no cromossomo X e das diferenças epigenéticas entre os gêneros. Em muitas espécies de mamíferos, as fêmeas produzem respostas de anticorpos mais altas do que os machos. As mulheres expostas a contraceptivos orais que contêm estrogênio ou que recebem reposição hormonal apresentam risco maior de desenvolvimento de LES (RR 1,2-2). - O estradiol liga-se a receptores presentes nos linfócitos T e B, aumentando a ativação e a sobrevida dessas células (especialmente as autorreativas), favorecendo, assim, a ocorrência de respostas imunes prolongadas. Os genes do cromossomo X que influenciam o LES, como o TREX-1, podem desempenhar um papel na predisposição do gênero feminino, possivelmente porque alguns genes localizados no segundo cromossomo X das mulheres não estão silenciados. Indivíduos com cariótipo XXY (síndrome de Klinefelter) apresentam risco significativamente elevado de terem LES. - Vários estímulos ambientais podem influenciar o LES . A exposição à luz ultravioleta provoca exacerbações do LES em cerca de 70% dos pacientes, possivelmente por aumentar a apoptose nas células cutâneas ou alterar o DNA e as proteínas intracelulares, de forma a torná-las antigênicas. Algumas infecções e fármacos indutores de lúpus ativam as células T e B autorreativas; se essas células não forem devidamente reguladas, ocorre produção prolongada de autoanticorpos. - A maioria dos pacientes com LES apresenta autoanticorpos por pelo menos 3 anos antes do surgimento dos primeiros sintomas de doença, sugerindo que a regulação controla o grau de autoimunidade por vários anos antes das quantidades e das qualidades dos autoanticorpos, das células B e T patogênicas e das células residentes teciduais (p. ex., macrófagos) causarem doença clínica. - O vírus Epstein-Barr (EBV) pode ser um agente infeccioso capaz de desencadear LES em indivíduos suscetíveis. Crianças e adultos com LES são mais suscetíveis à infecção pelo EBV do que os indivíduos controles de idade, gênero e etnia equivalentes. O EBV contém sequências de aminoácidos que simulam as sequências observadas nos espliceossomas humanos (antígenos RNA/proteína), frequentemente reconhecidos por autoanticorpos em indivíduos com LES. O tabagismo aumenta o risco de LES (RR 1,5). - A exposição ocupacional prolongada à sílica cristalina (p. ex., inalação da poeira de sabão em pó ou do solo em atividades rurais) eleva o risco (RR 4,3) em mulheres negras. O consumo de bebida alcoólica (2 taças de vinho por semana ou meia dose de uma bebida alcoólica qualquer diariamente) diminui o risco de LES. Assim, a interação entre suscetibilidade genética, ambiente, gênero, raça e respostas imunes anormais resulta em autoimunidade . - As biópsias da pele afetada mostram deposição de imunoglobulina (Ig) na junção derme-epiderme (JDE), lesão dos queratinócitos basais e inflamação dominada pelos linfócitos T na JDE e ao redor dos vasos sanguíneos e dos apêndices dérmicos. - A pele clinicamente não afetada também pode mostrar deposição de Ig na JDE. Esses padrões são inespecíficos para LES dermatológico, ainda que altamente sugestivos. Nas biópsias renais, o padrão e a gravidade da lesão são importantes para estabelecer o diagnóstico e escolher a melhor terapia. Estudos clínicos mais recentes sobre nefrite lúpica adotaram a classificação da International Society of Nephrology (ISN)/Renal Pathology Society (RPS) . - Na classificação ISN/RPS, a adição de um “a”, indicando “ativo”, e de um “c”, indicando “alterações crônicas”, fornece aos médicos informação sobre a potencial reversibilidade da doença. O sistema enfoca a doença glomerular, embora a presença de doença intersticial tubular e vascular e o escore de cronicidade, tanto nos 4 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 glomérulos como no interstício, sejam importantespara prever os desfechos clínicos. - Em geral, a doença de classes III e IV, assim como de classe V acompanhada por doença III ou IV, deve ser tratada sempre que possível com imunossupressão agressiva, dado o alto risco de doença renal em estágio terminal (DRET) em pacientes não tratados ou tratados de maneira insuficiente. Por outro lado, o tratamento para nefrite lúpica não é recomendado para pacientes com doença de classe I ou II ou com alterações extensas e irreversíveis. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS - O lúpus é uma doença pleomórfica, cujo diagnóstico se baseia fundamentalmente no quadro clínico que, associado aos dados laboratoriais e sorológicos, favorece a definição. O LES, na fase inicial, acomete com maior frequência o sistema osteoarticular e o cutâneo e, de forma mais grave, o renal e o SNC. - O LES pode começar de forma aguda (fulminante) ou insidiosa, mas é, por definição, uma doença crônica, remitente e recidivante. - Os locais mais caracteristicamente envolvidos pelo processo patológico do LES são: (1) Pele (2) Articulações (3) Membranas Serosas (4) Rins (5) Sistema Nervoso Central - À semelhança de outras condições autoimunes, sua apresentação inicial pode revelar o comprometimento de apenas um sistema orgânico, o que muitas vezes dificulta a suspeita diagnóstica, ou já se exteriorizar de forma completa, envolvendo diversos órgãos e sistemas simultaneamente. - Independente da forma clínica de apresentação, a maioria dos doentes tem períodos de exacerbações intercalados por períodos de relativa melhora ou mesmo inatividade. SINTOMAS GERAIS - Sintomas constitucionais são bastante frequentes: mal- estar, fadiga (90%), queda do estado geral, febre (80%), perda ponderal (60%). Apesar de comuns são inespecíficos e de modo isolado não configuram diagnóstico da doença. - Pode revelar o comprometimento de apenas um sistema orgânico ou já se exteriorizar de forma completa, envolvendo vários órgãos e sistemas. - A maioria dos pacientes possuem períodos de exacerbações intercalados por períodos de relativa melhora ou mesmo inatividade. - A anorexia e a perda insidiosa de peso podem ser identificadas no início do quadro e até preceder em meses o aparecimento de manifestações orgânicas. A febre como primeiro sinal clínico de LES pode ocorrer em cerca de 50% dos casos, sendo principalmente observada em crianças e adolescentes e, com frequência, associada aos sintomas consumptivos. Apesar da alta frequência, o LES como causa de febre de origem indeterminada perfaz menos de 5% destes casos. - É importante lembrar que a linfoadenopatia no LES é encontrada em 30 a 80% dos pacientes, é mais frequente nas crianças, pode ser generalizada ou localizada, com certo predomínio das cadeias cervical e axilar. LESÕES CUTANEAS - As lesões cutâneas são de grande importância no reconhecimento do LES, tanto que constituem uma parte importante dos critérios de classificação. No início da doença, as manifestações cutâneas são extremamente frequentes, correspondendo a cerca de 70% dos casos, o que facilita a suspeita, e são observadas em mais de 90% dos pacientes lúpicos em algum momento da doença. - AGUDAS: Presença de lesão em região malar ou em “asa de borboleta” que se caracteriza por erupção sobre as bochechas e nariz, elevada, por vezes dolorosa e pruriginosa, frequentemente precipitada pela exposição solar. Pode durar horas a dias e é um evento recorrente. Ausência de pápulas e pústulas e não acometimento dos sulcos nasolabiais. A fotossensibilidade está associada a presença do anticorpo anti-Ro. - O lúpus cutâneo agudo é o mais conhecido no LES, e a forma localizada é descrita como rash malar ou rash em asa de borboleta, notadamente simétrica e fortemente associada à fotossensibilidade. A lesão é encontrada em 20 a 60% dos pacientes lúpicos, sendo exacerbada ou precipitada após exposição à radiação ultravioleta. A característica destas lesões é a evolução para hiperpigmentação após resolução da fase inflamatória inicial, que, por vezes, pode ser confundida com o cloasma. - A forma generalizada é conhecida como rash maculopapular ou dermatite lúpica fotossensível e se apresenta como erupção exantematosa ou morbiliforme generalizada. - CRÔNICAS: Lúpus discoide é a lesão cutânea crônica do LES. Ela pode tanto ocorrer na ausência de quaisquer manifestações sistêmicas, quanto aparecer como parte de um quadro de LES clássico. Há predomínio na face, pescoço, couro cabeludo e pavilhão auricular. Correspondem a placas 5 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 eritematosas, infiltradas e hiperpigmentadas, que evoluem lentamente com uma cicatriz despigmentada e atrófica, principalmente no centro da lesão. Costuma deixar cicatrizes, incluindo alopecia irreversível. Paniculite de Kaposi: forma rara de lúpus cutâneo crônico.Nódulos firmes e dolorosos no tecido subcutâneo. Quando a paniculite está presente abaixo de uma região com lúpus discoide na superfície, temos o que se chama de lúpus profundo. - Por outro lado, o lúpus cutâneo crônico engloba uma série de lesões, nas quais a discoide é a mais conhecida. Inicialmente, a lesão discoide clássica é caracterizada por placa eritematosa e hiperpigmentada que evolui com lentidão na periferia, deixando uma cicatriz central hipopigmentada com atrofia. Na maioria das vezes, esta lesão é única e preferencialmente encontrada na face, no couro cabeludo, no pavilhão auricular e no pescoço. - As úlceras orais também fazem parte dos critérios de classificação; geralmente, não são dolorosas e são encontradas em até 25% dos pacientes, sendo relacionadas à atividade inflamatória da doença, o que justifica um exame clínico minucioso se houver suspeita da doença. - SUBAGUDAS: Referem-se ao lúpus cutâneo subagudo, uma entidade distinta, que pode estar associada ou não à forma sistêmica do lúpus. Cursa com lesões cutâneas eritematosas e descamativas difusas, não ulcerativas, predominando em membros superiores e parte superior do tronco (a face geralmente é poupada). Frequentemente são desencadeadas pela exposição solar e são acompanhadas por sintomas musculares e anormalidade sorológicas (anti- Ro). Erupção papuloescamosa (lenticular) que simula psoríase ou lesões eritematoanulares, policíclicas, que simulam eritema anular centrífugo. Lesão comum de lúpus: envolvimento do dorso das falanges de forma a poupar os nós articulares das interfalangianas (espelho do sinal de Gottron da polimiosite). - O lúpus cutâneo subagudo é uma entidade à parte do LES, caracterizado pela presença de lesões eritemato-sas papuloescamosas (tipo psoriasiformes) ou anulares (tipo placas policíclicas), localizadas sobretudo em regiões de exposição solar (face, vespertílio e braços). - Ambas as formas de lesão estão fortemente associadas à fotossensibilidade e à presença dos anticorpos anti-Ro/SS-A. Embora aproximadamente metade destes pacientes preencha os critérios de classificação de LES, somente 10 a 15% evoluem para formas graves de comprometimento sistêmico. As lesões evoluem após o tratamento sem deixar cicatrizes profundas, mas produzem áreas de hipopigmentação, tipo vitiligoides, que podem se tornar permanentes. - Ainda fazem parte do LES algumas outras lesões cutâneas não específicas, cuja importância reside na alta frequência na doença: a alopecia, a vasculite cutânea e o livedo reticular. - A alopecia difusa pode ser observada em até 50% dos casos, podendo ser o primeiro sinal clínico, e está diretamente relacionada com a atividade inflamatória, podendo até anteceder outras manifestações de exacerbação da doença. Em geral, existe recuperação após a remissão do surto inflamatório, embora, em casos mais graves e em formas mais agressivas, possa se tornar definitiva. - A vasculite cutâneaé identificada em 20 a 70% dos casos, variando desde lesões do tipo urticária até grandes úlceras necróticas. O padrão de vasculite é determinado pelo nível e 6 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 pela intensidade do dano inflamatório dos vasos comprometidos. - O fenômeno de Raynaud, fortemente associado à presença dos anticorpos anti-U1RNP, também pode ser a primeira manifestação da doença, e sua frequência e intensidade estão condicionadas à exposição ao frio. MANIFESTAÇÕES MUCULOESQUELÉTICAS - São frequentes nas fases iniciais de doença, sendo que artralgia e/ou artrite podem ser a principal queixa em aproximadamente 75 a 80% dos indivíduos no momento do diagnóstico. Nesta fase, a natureza transitória da poliartrite pode determinar certa dificuldade, uma vez que o derrame articular constatado ao exame nem sempre é percebido pelos pacientes. Entretanto, os quadros articulares tornam- se mais marcantes no curso da doença quando comprometem até 90% dos pacientes. - Apesar de não existir um padrão articular, a maioria dos casos cursa com quadros de poliartrite simétrica episódica, de caráter migratório ou aditivo, e quase sempre não deformante. Por vezes, a rigidez matinal é bastante proeminente e o diagnóstico de LES pode ser facilmente confundido com o da artrite reumatoide, visto que também compromete pequenas e grandes articulações, na maioria de vezes de forma simétrica. - Poliartralgia e mialgias (95%): Artrite lúpica geralmente segue um padrão simétrico, distal e migratório com os sintomas durante 1 a 3 dias em cada articulação. Apresenta- se associada a rigidez matinal inferior a 1 hora e, geralmente, possui pouco ou nenhum derrame articular. A artrite é critério diagnóstico, diferentemente da artralgia. As articulações mais envolvidas são das mãos, punhos e joelhos. A LES geralmente não gera erosões articulares, mas pode haver deformidade semelhantes à da artrite reumatoide, conhecida como artropatia de jaccoud (10%). Diferente da AR, o LES tipicamente não determina erosões articulares. Em alguns casos, entretanto, como resultado de doença nos tecidos periarticulares (tendões e ligamentos), podem surgir deformidades semelhantes às da AR! Esse padrão deformante, porém não erosivo, é conhecido como artropatia de Jaccoud. Diferencia-se clinicamente do padrão encontrado na AR porque, em vez de fixo, é redutível, ou seja, retorna ao normal transitoriamente se manipulado. - A osteonecrose (ou necrose óssea avascular) deve ser suspeitada em pacientes lúpicos que se apresentam com dor persistente. Ocorre geralmente no quadril após a resolução de um quadro de poliartrite (15%). - Na evolução da doença, cerca de 10 a 15% dos casos apresentam artropatia crônica ou artropatia tipo Jaccoud, que se caracteriza por desvio ulnar seguido de subluxação, deformidades do tipo pescoço-de-cisne e subluxação das interfalângicas do polegar. Estas deformidades são decorrentes da instabilidade provocada pelo processo inflamatório crônico da cápsula articular, dos ligamentos e dos tendões. Mesmo nesta fase tardia do LES, estas deformidades reversíveis podem ser confundidas, à inspeção, com aquelas decorrentes da artrite reumatoide. - Outro quadro articular importante no LES é a necrose avascular, que pode acometer vários sítios, sendo o mais frequente a cabeça femoral e, na maioria dos casos, associada ao tratamento com glicocorticoides. - A tenossinovite pode ocorrer em até 10% dos pacientes em qualquer fase da doença e ser independente do envolvimento articular. Mialgia generalizada é comum du- rante os episódios de exacerbação clínica da doença, por isso, pode ser a queixa inicial em 40 a 45% dos casos. Entretanto, a miosite inflamatória envolvendo musculatura proximal com elevação de enzimas musculares, como a creatinofosfoquinase (CPK) e a aldolase, ocorre em uma porcentagem menor, ao redor de 5 a 10%. ENVOLVIMENTO CARDIOVASCULAR E PULMONAR - Pode se manifestar por pericardite sintomática em 20 a 30% durante o curso da doença e pode ser observada como primeira manifestação em 5% dos casos de LES. O quadro agudo pode ser isolado ou fazer parte de serosite generalizada, particularmente associada à pleurite. - A manifestação mais frequente é a pericardite (30%). Miocardite (10%) - Endocardite de Libman-Sacks (10%): forma verrucosa e não bacteriana de endocardite ou valvulite cardíaca. Ocorre principalmente na valva mitral (face atrial) e menos frequente na valva aórtica (face arterial). A manifestação mais temida desse tipo de endocardite é a embolia 7 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 pulmonar. O tratamento imunossupressor não costuma ser eficaz. - Coronariopatia (10%): LES é considerada fator de risco cardiovascular independente, ou seja, por si só já coloca o paciente na categoria “alto risco”. - Os sintomas clássicos de pericardite variam desde discretos e transitórios até graves e persistentes, sendo que o atrito pericárdico pode ser encontrado mesmo em indivíduos assintomáticos. É interessante notar que o ecocardiograma pode revelar derrame ou espessamento pericárdico em até 30% dos pacientes lúpicos durante o acompanhamento, frequência inferior à observada nas autopsias, em que o achado de pericardite é de aproximadamente 50%.A evolução é habitualmente subaguda ou crônica, explicando a rara tendência ao tamponamento. - A miocardite clínica é encontrada sobretudo no de-correr do LES, sendo caracterizada por taquicardia persistente e sinais clínicos de insuficiência cardíaca de instalação aguda, em geral acompanhada de alterações no mapeamento cardíaco e em enzimas musculares. - A endocardite de Libman-Sacks é classicamente descrita pela presença de vegetações verrucosas localizadas próximas às bordas valvares. Estas vegetações podem ser encontradas em até 50% dos casos autopsiados e se desenvolvem em qualquer válvula, havendo, no entanto, predileção pela mitral. Em geral, estas lesões não produzem repercussão clínica e são habitualmente diagnosticadas no ecocardiograma. - A aterosclerose precoce nos pacientes lúpicos é, na atualidade, uma importante causa de mortalidade na doença em decorrência de infarto agudo do miocárdio. Este processo é multifatorial, com a contribuição das lesões endoteliais, das dislipidemias, da menopausa precoce, da hipertensão arterial e da insuficiência renal. - A pleurite é uma manifestação pulmonar frequente, ocorrendo em 40 a 60% dos casos, assim como o derrame pleural, que ocorre em 16 a 40% durante o curso da doença. A doença intersticial pulmonar é rara, mas faz importante diferencial com infecções bacterianas ou oportunistas. A hipertensão pulmonar primária pode ocorrer de forma leve em até 10% dos pacientes, mas exige descartar tromboembolismo pulmonar, principalmente relacionado a SAF e outros estados de hipercoagulabilidade. - Pleurite lúpica (50%): embora possa haver derrames maciços, a dor pleurítica é mais comum do que o achado radiográfico de derrame pleural. O derrame é mais comumente bilateral, sendo sempre um exsudato com níveis de glicose geralmente normais. - Pneumonite lúpica (10%): pode causar febre, tosse, dispneia, hemoptise. - Quando um paciente com LES desenvolve quadro pneumônico, até que se prove ao contrário, este deve-se a infecção (pneumonia). - “Síndrome do pulmão contraído”: é uma rara entidade lúpica. Se caracteriza por dispneia + raio-X com elevação da cúpula diafragmática sem alterações de parênquima. Ocorre devido fraqueza muscular, pela miosite lúpica. SISTEMA NERVOSO - Engloba uma série de condições neurológicas que são identificadas entre 25 e 70% dos pacientes. Uma padronização de nomenclatura para as síndromes neuropsiquiátricas no LES foi recentemente sugerida e as manifestações foram classificadas em 19 síndromes subdivididasem dois grandes grupos: SNC e sistema nervoso periférico (SNP). - Didaticamente, estas condições podem ser sudivididas em difusas, nas quais fazem parte dos critérios a convulsão, a psicose e o estado confusional agudo, e os quadros focais. A maioria dos quadros epilépticos é do tipo grande-mal, de eventos tônico-clônicos e associação temporal com a doença ou com períodos de exacerbação, e reforçam a hipótese de LES. - Os distúrbios de comportamento também são muito frequentes e podem ocorrer em aproximadamente metade dos pacientes. A psicose ocorre em até 10% dos casos e pode se manifestar em diferentes formas, como esquizofrenia e distúrbios bipolares. - Os quadros difusos incluem ainda a cefaleia, o pseudotumor cerebral e a síndrome orgânica cerebral, caracterizada por distúrbio de função mental com delírio, inadequação emocional, prejuízo da memória ou concentração. Nos quadros focais, encontra-se o acidente vascular cerebral (AVC), a mielite transversa, a síndrome de Guillain-Barré, a meningite asséptica, a neuropatia craniana e a periférica (mononeurite multiplex), além de distúrbios do movimento como tremores, coreia e parkinsonismo. - Podem ocorrer de forma isolada, mas geralmente acontecem na vigência de um quadro sistêmico. A manifestação mais frequente é a cefaleia (25%), seguida de convulsões, AVE isquêmico (10%), AVE hemorrágico, Neuropatia periférica (15%), Mielite transversa (<1%) e Meningite asséptica (<1%). - Cerca de metade dos casos de LES apresentam alguma disfunção cognitiva, geralmente leve. - Demência lúpica: fase mais avançada do quadro, ocorrendo raramente. - Psicose lúpica: ocorre geralmente no 1o ano de doença, surgindo como um quadro de delirium. - O autoanticorpo anti-P tem sido associado com alterações psiquiátricas do LES, em especial psicose e depressão. 8 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 ENVOLVIMENTO RENAL - A nefrite lúpica ainda é uma das maiores preocupações na doença e exige maior atenção tanto no início como no seguimento dos pacientes. É interessante notar que a maioria dos quadros renais se apresenta nos primeiros 5 anos de LES, mas podem ser detectados em qualquer momento do curso, o que determina monitoração cuidadosa e regular no seguimento. A identificação precoce é extremamente importante para adequação do tratamento. Deve-se ter sempre em mente que os sintomas e os sinais específicos de nefrite só ocorrem em avançado grau de síndrome nefrótica ou insuficiência renal. - É importante salientar que, embora a proteinúria e a presença de cilindros façam parte dos critérios de classificação da doença, outros parâmetros, como hematúria e aumento de creatinina, devem ser considerados para o diagnóstico de glomerulonefrite (GN). - A GN mesangial (classe II) é encontrada em aproximadamente 10 a 20% dos casos renais, sendo caracterizada por hematúria e proteinúria discretas (é raro exceder 1 a 1,5 g nas 24 horas) com função renal preservada e na ausência de hipertensão arterial. A GN proliferativa focal (classe III) é encontrada em 10 a 20% dos casos e se caracteriza por sedimento nefrítico acompanhado de proteinúria, por vezes nefrótica (20 a 30%), com hematúria, cilindrúria, hipertensão e discreta perda de função renal. A GN proliferativa difusa (classe IV), a mais grave das nefrites, corresponde a 40 a 60% dos casos e é caracterizada por uma combinação de sedimento nefrítico e nefrótico, com proteinúria e hematúria mais significativas. - A hipertensão arterial está invariavelmente presente e a in- suficiência renal é marcante. A GN membranosa (classe V) é identificada por síndrome nefrótica e ocorre em 10 a 20% dos casos. - Achados: (1) Proteinúria > 500mg/24 h ou ≥ 3+ no EAS (50%) (2) Identificação de cilindros celulares no sedimento urinário (50%) - A maioria dos portadores de LES acaba desenvolvendo algum grau de nefropatia no decorrer da doença, sendo os glomérulos os principais alvos renais. A deposição dos imunocomplexos DNa/anti-DNA é a base fisiopatológica da nefrite lúpica. - Os glomérulos são os principais alvos renais do lúpus. Clinicamente, qualquer uma das síndromes glomerulares conhecidas pode aparecer, incluindo hematúria isolada, cilindrúria, proteinúria isolada, síndrome nefrítica, GN rapidamente progressiva (crescêntica) e síndrome nefrótica. ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS - A série branca é a mais frequentemente alterada, com leucopenia e linfopenia isoladas ou associadas. Estas alterações ocorrem em até 70% dos casos e podem preceder as manifestações clínicas, sendo de grande auxílio diagnóstico. - O monitoramento destes parâmetros é útil no acompanhamento de doença, pois a diminuição de seu número em geral reflete a atividade do lúpus, desde que excluído o uso de medicações imunossupressoras. - São frequentes em pacientes com LES, sendo a mais comum a anemia (70%) normocítica e normocrômica, associada ao aumento de VHS (causada por eritropoese deficitária e disponibilização de ferro bloqueada, comum em doenças crônicas). Pode ser usada para avaliar a progressão/atividade da doença. - Anemia hemolítica autoimune apresenta coombs direto positivo e é observada em 10% dos pacientes com LES. Corresponde ao único tipo de anemia considerada nos critérios de classificação do LES. - A anemia pode ser identificada em até 80% dos pacientes com lúpus em alguma fase da doença e pode ser classifi-cada em imune e não imune. A mais comum das anemias não imunes é a da doença crônica, seguida pela anemia ferropriva e a secundária à doença renal. A anemia he- molítica Coombs positivo é a principal representante do grupo das anemias imunes e é a única que faz parte dos critérios de classificação da doença, podendo preceder em anos outras manifestações clínicas. - A plaquetopenia, definida como me-nos de 150.000 células/mm3 , é encontrada em 15% dos casos de LES. O grau de plaquetopenia é bastante variável, e formas graves são menos comuns. ACOMETIMENTO GASTROINTESTINAL - Os pacientes lúpicos também podem apresentar acometimento gastrointestinal, manifestando-se como peritonite asséptica com ascite, hepatite, pancreatite, vasculite mesentérica que pode levar à isquemia e à perfuração intestinal, obstrução intestinal subaguda e enteropatia perdedora de proteínas. Sendo assim, os sintomas de dor abdominal, náuseas, vômitos e diarreia devem ser adequadamente avaliados nos pacientes com LES. - Hepatomegalia é comum e as enzimas hepáticas, principalmente as aminotransferases, podem estar elevadas, mas não há lesões hepáticas significativas. É importante diferenciar de hepatite autoimune pela presença do anticorpo anti músculo liso (anti-LKM1). 9 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 ACOMETIMENTO OCULAR - Ceratoconjutivite seca (Síndrome de Sjogren): é a manifestação ocular mais comum, podendo apresenta-se associada ou não à xerostomia (15%). - Vasculite retiniana é uma complicação rara, porém grave. O diagnóstico é feito pela presença de sinais algodonosos na fundoscopia (corpos citoides). DIAGNÓSTICO - Recentemente, foram propostos novos critérios de classificação do LES (Systemic Lupus International Col- laborating Clinics Classification Criteria for Systemic Lu-pus Erythematosus – SLICC Classification Criteria). Para o preenchimento destes critérios, o paciente deve apresentar pelo menos 4 dos critérios (com pelo menos um clínico e um laboratorial) de forma simultânea ou evolutiva. - Nestes novos critérios, foram ampliadas as manifestações clínicas, principalmente as cutâneas e as neurológicas. Além disso, foi dada maior relevância ao comprometimento renal, o qual, se con-firmado histologicamente e na presença de FAN ou do anticorpo anti-dsDNA, já possibilita a classificação como LES. Este novos critérios representaram um pequenoaumento da sensibilidade para o diagnóstico de LES, sem diminuição da especificidade quando comparados aos critérios anteriores. - Além dos dados hematológicos característicos do LES, outros achados laboratoriais são fundamentais tanto para a complementação diagnóstica da enfermidade quanto para o seguimento destes pacientes, e podem ser classificados em inflamatórios e imunológicos. - O primeiro grupo engloba as provas inflamatórias de fase aguda, como a velocidade de hemossedimentação (VHS) e a proteína C-reativa (PCR). Em geral, o VHS está aumentado na atividade de doença, refletindo a fase aguda dos processos inflamatórios, porém pode persistir ele-vado mesmo após o controle da doença, não se correlacionando com sua atividade inflamatória. Por outro lado, a PCR é geralmente baixa no LES e aumenta nos processos infecciosos, auxiliando por vezes no diagnóstico diferencial destas duas condições. - A avaliação imunológica é fundamental para a carac- terização da doença autoimune. Os FAN detectados pela imunofluorescência indireta utilizando a célula HEp-2 são o primeiro teste a ser realizado, pois é positivo em mais de 98% dos casos e é um dos critérios de classifica-ção da doença. - Diante da suspeita de LES e da positividade do FAN, é fundamental tentar caracterizar os autoanticorpos es- pecíficos da doença, particularmente o anti-DNA nativo (anti-dsDNA) e o anti-Sm (que são marcadores), pois suas detecções corroboram o diagnóstico. A positividade do anti- dsDNA chega a 40% e a determinação de seus tí-tulos é útil no acompanhamento da atividade inflamató-ria da doença, particularmente na nefrite. - Os anticorpos anti-Sm são identificados em aproximadamente 30% dos casos e auxiliam no diagnóstico. Da mesma forma, os an-ticorpos antiproteína P ribossômica, presentes em ape-nas 10% dos casos de LES, podem, em alguns casos, ser os únicos marcadores de doença e também auxiliar no acompanhamento de pacientes com quadros graves de distúrbios psiquiátricos associados a esta doença. - Aproximadamente 25% dos casos de LES apresentam positividade do fator reumatoide. - A determinação da atividade hemolítica do comple-mento e dos níveis séricos dos seus componentes C3 e C4 é extremamente útil na monitoração de doença e da resposta terapêutica. COMPLICAÇÕES - A causa principal do óbito de pacientes com LES é aterosclerose acelerada, um processo multifatorial em que o lúpus desempenha papel importante, junto com outros fatores de risco cardiovascular tradicionais (alguns agravados pelo tratamento com glicocorticóides). É fundamental controlar o peso, a hipertensão, a hiperlipidemia, o tabagismo, o diabetes e a homocisteinemia. - A insuficiência renal está associada à nefrite lúpica, apesar do tratamento rigoroso com ciclofosfamida intravenosa e outros esquemas. Hipertensão é a comorbidade principal e 10 Sanndy Emannuelly – 5° Período 2020.2 deve ser rigorosamente controlada com inibidores da enzima conversora da angiotensina, que podem exercer um efeito nefroprotetor. - Os AVE podem ser causados pelo lúpus em atividade no sistema nervoso central, mas também pela síndrome do anticorpo antifosfolipídio, pela hipertensão, pela aterosclerose e por infecções. A síndrome do anticorpo antifosfolipídio é uma causa importante de morbidade entre os pacientes com LES e contribui para a mortalidade. - Até que se prove o contrário, deve-se considerar a possibilidade de uma infecção nos pacientes febris com LES. As infecções oportunistas comumente passam despercebidas até a necropsia. A profilaxia para pneumonia por Pneumocystis carinii pode ser administrada aos pacientes neutropênicos com lúpus e consiste em 100 mg de dapsona 3 vezes/semana. Além disso, deve-se evitar a utilização de antibióticos do grupo das sulfonamidas, porque eles podem desencadear exacerbações do lúpus em alguns casos. - Estudos recentes sugeriram aumento do risco de neoplasias malignas nos pacientes com LES, mesmo que não haja exposição à ciclofosfamida. Os pacientes com LES tratados com ciclofosfamida oral pelo protocolo dos National Institutes of Health tiveram mais câncer de pele e desenvolveram mais doenças linfoproliferativas tardias. As mulheres com LES são mais suscetíveis a displasia e carcinoma da cérvix, devendo ser realizados esfregaços de Papanicolaou anualmente. - Cerca de 10% dos pacientes com LES desenvolvem hipotireoidismo. Também ocorre síndrome de Sjögren secundária nos pacientes com LES, com ou sem os anticorpos anti-Ro e anti-La dessa síndrome. Se o anticorpo antiRo (mas principalmente o anti-La) estiver presente, há risco de lúpus fetal neonatal, que se evidencia por bloqueio cardíaco congênito ou erupção lúpica neonatal transitória. - O tratamento com glicocorticóides contribui para o desenvolvimento de catarata, fraturas osteoporóticas, diabetes melito, diversos fatores de risco cardiovascular, infecções e redução da qualidade de vida pelo aspecto cushingóide, acúmulo de peso, acne e labilidade emocional ou depressão. O reconhecimento da toxicidade associada aos glicocorticoides motivou uma abordagem de redução do seu uso, com diminuição progressiva das doses da prednisona; se a redução não for bem-sucedida, então devem ser acrescentados outros imunossupressores para controlar a atividade da doença. PROGNÓSTICO - O índice de sobrevivência dos pacientes com lúpus em 10 anos atingiu o patamar mais alto na década de 1980. Esse progresso foi atribuído não apenas à melhora da assistência reumatológica, como também ao tratamento bem sucedido das infecções e às medidas de suporte à insuficiência renal. A morte precoce de pacientes com lúpus tende a refletir a atividade da doença e as infecções, enquanto a morte em idade avançada deve-se em grande parte a complicações cardiovasculares.
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