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Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 INTRODUÇÃO A Entamoeba histolytica (E. histolytica) é o agente etiológico da Amebíase; A amebíase constitui um importante problema de saúde pública que leva ao óbito anualmente cerca de 100.000 pessoas, sendo a segunda causa de mortes por parasitoses (doenças parasitárias) do mundo; Apesar da alta mortalidade, muitos casos de infecções assintomáticas são registrados, em torno de 10 a 40% do total; Devido a este fato, de uma grande parte das infecções serem assintomáticas, em 1925, Brumpt, sugeriu a existência de outra espécie de ameba, que seria a responsável pelos casos assintomáticos, a Entamoeba dispar (E. dispar); No entanto, os pesquisadores da época refutaram essa hipótese, alegando que essa variação das infecções se devia à variabilidade na virulência da E. histolytica; Em 1977, a OMS assume a E. dispar como uma espécie infectando humanos; Atualmente, mesmo com o ressurgimento da E. dispar, a amebíase ainda é considerada uma infecção sintomática ou assintomática causada pela E. Histolytica. OBS: Morfologicamente, E. histolytica e dispar são semelhantes. Existe, ainda, uma terceira entamoeba que se assemelha as duas anteriores, a Entamoeba moshkovskii. CLASSIFICAÇÃO A classificação das amebas que vivem no intestino humano é: A) REINO Protista; B) FILO Sarcomastigophora; C) SUBFILO Sarcodina; D) ORDEM Aemoebida; E) FAMÍLIA Entamoebidae; F) GÊNERO Entamoeba – Endolimax – Iodamoeda. Todas as espécies do gênero Entamoeba vivem no intestino grosso de humanos ou de animais, à exceção da E. moshkovskii, que é uma ameba de vida livre e E. gingivalis, que vive na cavidade oral; O gênero Entamoeba, de maneira geral, se caracteriza por possuir um núcleo: a) Esférico ou arredondado e vesiculoso; b) Com a cromatina periférica formada por pequenos grânulos justapostos e distribuídos regularmente na parte interna da membrana nuclear; c) Com um Cariossoma relativamente pequeno, podendo ser central ou excêntrico. NÚMERO DE NÚCLEOS DO CISTO As espécies do gênero entamoeba foram divididas em grupos de acordo com o número de núcleos do cisto ou pela ausência de cistos. São eles: A) Entamoeba com Cistos de 8 Núcleos: Entamoeba coli (homem); Entamoeba muris (roedores) e Entamoeba gallinarum (aves domésticas). B) Entamoeba com Cistos de 4 Núcleos: Entamoeba histolytica (homem); Entamoeba dispar (homem); Entamoeba ranarum (sapo e rã); Entamoeba invadens (cobras e répteis) e Entamoeba moshkoviskii (vida livre). Entamoeba Histolytica/Dispar Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 C) Entamoeba com Cistos de 2 Núcleos: Entamoeba polecki e Entamoeba suis. D) Entamoeba sem Cistos: Entamoeba gingivalis (humanos e macacos). OBS: Então, várias espécies de ameba podem ser encontradas no homem, como: a) Entamoeba histolytica; b) Entamoeba hartmanni; c) Entamoeba dispar; d) Entamoeba coli; e) Endolimax nana; f) Iodamoeba butschlii; g) Diantamoeba fragilis; - Todas essas espécies vivem no intestino grosso, sendo a Entamoeba histolytica a única que, em determinadas situações, pode ser patogênica; - A Entamoeba gingivalis vive na cavidade oral. MORFOLOGIA – E. HISTOLYTICA As amebas se distinguem uma das outras pelo (a): a) Tamanho do trofozoíto e do cisto; b) Estrutura; c) Número de núcleos nos cistos; d) Número e formas dos vacúolos nos trofozoítos e corpos cromatóides nos cistos. A distinção entre as espécies é difícil, pois nenhuma delas se diferencia facilmente das demais, principalmente nos trofozoítos. OBS: Classicamente, se encontra os trofozoítos no intestino, nas úlceras e nas fezes diarreicas. Já os cistos imaturos (binucleados) ou maduros (tetranucleados) estão presentes nas fezes normais. A E. histolytica, como já mencionado, é a forma patogênica que causa amebíase em humanos, sendo este parasito possuidor de 4 formas evolutivas, são elas: (1) Trofozoíto ou Forma Vegetativa; (2) Cisto ou Forma de Resistência; (3) Pré-cisto; (4) Metacisto. TROFOZOÍTO Mede de 20 a 40 μm, mas pode chegar a 60 μm nas formas invasivas; Possui um único núcleo; O citoplasma apresenta-se dividido em ectoplasma (claro e hialino) e endoplasma (finamente granuloso, contendo vacúolos, o núcleo e restos de substâncias alimentares); OBS: Quando provenientes de casos de disenteria, é comum encontrar eritrócitos (hemácias) no citoplasma desses trofozoítos; Já em trofozoítos não invasivos se encontra no seu citoplasma bactérias, grão de amido ou outros detritos, mas nunca eritrócitos. Os trofozoítos, quando são fixados e corados por hematoxilina férrica apresentam: a) Diferenças entre o ecto e endoplasma; b) Núcleo bem visível e destacado, geralmente esférico; c) Membrana nuclear é bastante fina e a cromatina justaposta a ela internamente é formada por pequenos grânulos (uniformes em tamanho e destruição, dando ao núcleo um aspecto de anel). Na parte central do núcleo encontra-se o Cariossoma (ou Endossoma); O Cariossoma é pequeno e de constituição semelhante à cromatina periférica; Frequentemente, o cariossoma apresenta-se formado por pequenos grânulos centrais, dando uma configuração, com a cromatina, de “roda de carroça”. Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 Ao observar o trofozoíto a fresco, ele apresenta pleomorfismo, é ativo, alongado, com emissão rápida e contínua de pseudópodes (parecendo estar deslizando na superfície, semelhante a uma lesma). PRÉ-CISTO É uma fase intermediária entre trofozoíto e o cisto maduro (tetranucleado); É oval ou ligeiramente arredondado; É menor que o trofozoíto; O núcleo é semelhante ao do trofozoíto; No citoplasma pode ser visto Corpos Cromatóides, em formas de bastonetes. METACISTO É uma forma multinucleada que emerge do cisto no intestino delgado, onde sofre divisões, dando origem aos trofozoítos. CISTOS São esféricos; Medem de 8 a 20 μm de diâmetro; Possui uma quantidade de núcleos variada, de um a quatro núcleos, sendo os cistos com quatro núcleos denominados Cistos Maduros; O cariossoma é pequeno, localizado no centro do núcleo; Os corpos cromatoides, quando presentes, tem a forma de bastonetes ou charutos, com pontas arredondadas, variando de um a quatro; No citoplasma dos cistos se encontra, também, regiões que se coram de castanho pelo lugol, que são as reservas de glicogênio, também chamadas de Vacúolos de Glicogênio. BIOLOGIA E CICLO BIOLÓGICO BIOLOGIA Os trofozoítos da E. histolytica normalmente vivem na luz do intestino grosso podendo, ocasionalmente, penetrar na mucosa e produzir ulcerações intestinais; A produção de ulceras pode ocorrer em outras regiões do organismo também, como: fígado, pulmão, rim e, mais raramente, no cérebro; A membrana plasmática é formada por carboidratos, lipídios e proteínas, sendo que Endoplasma Ectoplasma Cariossoma Núcleo Metacisto Pré-cisto Cisto Trofozoíto Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 carboidratos como glicose fazem parte do metabolismo do parasito; Os trofozoítos de E. histolytica, por viverem, normalmente, no intestino grosso, são essencialmente anaeróbios; No entanto, podem crescer em locais contendo até 5% de oxigênio (microaerófilas). A locomoção se dá através de pseudópodes; A ingestão de alimentos por fagocitose (partículas sólidas como hemácias, bactérias ou restos celulares) e por pinocitose (ingestão de partículas líquidas); A multiplicação ocorre por divisão binária. CICLO BIOLÓGICO É um ciclo Monoxênico; No ciclo há uma série de estágios evolutivos, que são: trofozoítos – pré-cisto – cisto – metacisto; O ciclo ocorreda seguinte maneira: 1. O ciclo se inicia pela ingestão dos cistos maduros (tetranucleados), junto de alimentos e água contaminados; 2. Os cistos passam pelo estômago, resistindo à ação do suco gástrico, chegam ao final do intestino delgado ou início do intestino grosso, onde ocorre o desencistamento, com a saída do metacisto através de uma pequena fenda na parede cística; 3. Em seguida o metacisto sofre sucessivas divisões nucleares e citoplasmáticas, dando origem a quatro e depois oito trofozoítos, chamados Trofozoítos Metacísticos; 4. Estes trofozoítos metacísticos migram para o intestino grosso onde o colonizam, em geral, ficando aderidos à mucosa do intestino, vivendo como um comensal, alimentando-se de detritos e de bactérias; 5. Sob certas circunstâncias os trofozoítos podem se desprender da parede da mucosa e, na luz do intestino grosso, principalmente no cólon, sofrer a ação da desidratação e eliminar substâncias nutritivas presentes no citoplasma, transformando-se em pré-cistos; 6. Em seguida, os pré-cistos secretam uma membrana cística e se transformam em cistos, inicialmente mononucleados; Através de divisões nucleares sucessivas, os cistos mononucleados se transformam em cistos tetranucleados, que são eliminados com as fezes normais. OBS: Os cistos não são encontrados em fezes liquefeitas ou disentéricas. CICLO PATOGÊNICO Em situações que ainda não são bem esclarecidas, o equilíbrio parasito-hospedeiro pode ser rompido e os trofozoítos invadem a submucosa intestinal, multiplicando-se ativamente no interior das úlceras; O trofozoíto presente nestas úlceras é denominado Forma Invasiva ou Virulenta; Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 Além do intestino, os trofozoítos podem, através da circulação porta, atingir outros órgãos como: fígado e, posteriormente, o pulmão, o rim, o cérebro ou a pele, causando amebíase extraintestinal. OBS: No interior da mucosa não há formação de cistos. Os cistos são formados apenas pelos trofozoítos que não conseguiram invadir a mucosa do intestino grosso! PATOGENIA E VIRULÊNCIA A amebíase é a infecção no homem causada pela E. histolytica, com ou sem manifestações clínicas; A Entamoeba histolytica possui uma grande variabilidade quanto ao seu potencial patogênico e à diferença de virulência; Esse fenômeno parece estar ligado a fatores que determinam a virulência do parasito, principalmente o que faz mudá-lo de um tipo comensal para um agressivo invasor. O início da invasão amebiana é resultante da ruptura ou quebra do equilíbrio parasito- hospedeiro, em favor do parasito; Um dos principais fatores ligados ao meio onde as amebas vivem é a microbiota bacteriana associada; Determinadas bactérias, principalmente anaeróbicas, são capazes de potencializar a virulência de cepas de E. histolytica. Com relação ao parasito, sabe-se que a evolução da patogenia ocorre após a invasão dos tecidos pelos trofozoítos invasivos e virulentos; Tudo indica que a E. histolytica tem um efeito letal direto sobre a célula, necessitando, para isso, que haja inicialmente uma forte adesão entre a ameba e a célula que será lesada; Esta adesão parece estar mediada por lectinas contidas na superfície das amebas, sendo auxiliadas por formações filopódicas que ampliam a adesão, logo seguida pela fagocitose. Outra ferramenta usada pela E. histolytica para lesionar os tecidos são os amebaporos, induzindo apoptose e lise osmótica da célula- alvo; Uma vez invadida a mucosa, os trofozoítos se multiplicam e prosseguem penetrando nos tecidos sob a forma de microulcerações em direção à camada muscular, com pouca reação inflamatória, pois encontra resistência nesta camada; Na submucosa, as amebas progridem em todas as direções, provocando a típica ulceração chamada “Botão de camisa” ou “colo de garrafa”; Estas lesões são resultado da necrose liquefativa produzida inicialmente pelas amebas. Ocasionalmente os trofozoítos podem induzir uma resposta inflamatória proliferativa com formação de uma massa granulomatosa chamada “ameboma” (não é comum na amebíase). OBS: As amebas podem penetrar nos vasos sanguíneos e, através da circulação porta, atingir primeiramente o fígado (que é o principal órgão com acometimento extraintestinal), formando “abscessos” (necrose coliquativa); Podem atingir também o pulmão, a pele, as regiões anal ou vaginal (períneo) e mais raramente o cérebro. TRANSMISSÃO O uso de água sem tratamento, contaminada por dejetos humanos; Ingestão de alimentos contaminados; Os alimentos podem ser contaminados por cistos veiculados nas patas de baratas e moscas; Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2019.2 Os “portadores assintomáticos” que manipulam alimentos são importantes disseminadores dessa protozoose. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS AMEBÍASE INTESTINAL A) Infecção Assintomática: - Presente entre 10 a 40% dos indivíduos infectados; - Colonização do parasito no intestino (80 a 99%); - Eliminação dos cistos nas fezes; - Testes sorológicos positivos a E. histolytica pode não penetrar no enterócito, mas ainda assim o teste sorológico pode ser positivo. B) Infecção Sintomática: 1. Colite não Disentérica sintomas intermitentes; fezes moles ou pastosas (3 a 4 vezes ao dia); desconforto abdominal. 2. Forma Disentérica colites amebianas; a) Cólicas intestinais; b) Diarreia mucossanguinolenta (8 a 20 vezes ao dia); c) Febre moderada; d) Complicações perfuração do intestino; peritonite; ameboma; apendicite e hemorragia. OBS: Se muitos trofozoítos invadem o epitélio e estabelecem muitas úlceras, a amebíase pode culminar em uma colite amebiana fulminante. AMEBÍASE EXTRA-INTESTINAL A) Amebíase hepática: o fígado é o primeiro órgão “extra-intestino” a receber trofozoítos, estes vão causar a destruição dos hepatócitos (Necrose Coliquativa Amebiana). B) Amebíase pleuropulmonar. C) Amebíase cerebral: abscesso cerebral (raro). D) Abscesso cutâneo. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL TESTES COPROPARASITOLÓGICOS Exame de fezes para identificação de trofozoítos ou cistos; A) Exame de fezes a fresco microscópio. B) Métodos de concentração: (1) Centrifugo flutuação no sulfato de zinco (Faust); (2) Centrifugação em éter (Método de Ritchie); (3) Sedimentação espontânea (Hoffman). TESTES IMUNOLÓGICOS A) Testes sorológicos: Anticorpos monoclonais IgM e IgG anti-lectinas podem ser detectados em amostras de fezes, saliva, soro e fluido de abscesso hepático ELISA, Imunofluorescência indireta, Hemaglutinação indireta. B) Testes imunocoprológicos: detecção de antígenos nas fezes. C) Testes bioquímicos e genéticos: ambos para diferenciar as espécies (não são muito utilizados em laboratórios). PROFILAXIA Exame frequente de manipuladores de alimentos (possíveis portadores); Educação e engenharia sanitária; Combate a moscas e baratas; Manter os alimentos protegidos; Lavar verduras e frutas cruas antes do consumo. REFERÊNCIAS NEVES, David Pereira. Parasitologia humana. 13. ed. São Paulo: Atheneu, 2016.
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