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ANEMIA FALCIFORME

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MODULO II
PROBLEMA 1: MAS NÃO TEM NINGUÉM DOENTE NA FAMÍLIA.
Hb - Hemoglobina: Quantidade de hemoglobina em todos os eritrócitos em 100ml de sangue.
Valores de referência: Homem 13,5 a 17,5 g/ml – Mulher 12 a 15,5 g/ml
Ht – Hematócrito: É a porcentagem do colume total do sangue composta por eritrócitos.
Valores de referência: Homem 40 a 52% – Mulher 36 a 48%
VCM - Volume corpuscular médio: Média do tamanho das hemácias, dividindo as anemias em microcíticas < 80, normocíticas 80-100 e macrocítica >100.
Valores de referência: 80 a 100 f/L
HCM – Hemoglobina corpuscular médio: hemoglobina média presente em cada hemácia, dividindo as anemias em hipocrômica < 28, normocrômica 28-34 e hipercrômica > 34.
Valores de referência: 28 a 34 f/L
CHCM – concentração hemoglobina corpuscular médio: Concentração média de hemoglobina em 100ml de eritrócitos. ( Volume celular e não eritrócitos )
Valores de referência: 30 a 35 g/dL
RDW – Amplitude de distribuição dos eritrócitos: Índice de variação do tamanho dos eritrócitos, indicando anisocitose. ( Tamanho das hemácias )
Valores de referência: 12 A 14% ou 37 a 47 f/L
Rt – Reticulócitos: Revelar a atividade medular de produção de eritrócitos imaturos, revelando estados hipoproliferativos e hiperproliferativos.
Valores de referência: 40.000 a 100.000 ou 0,5 a 1,8%
Pqt - Plaquetas : Megacarioblasto Megacariócitos Plaquetas
Valores de referência: 150.000 a 450.000 /uL
Trombocitopenia: anemia aplásica, deficiência de B12 e ácido fólico e hiperesplenismo.
Trombocitose: deficiência de ferro, anemia de doença crônica, neoplasia e sepse.
Leucócitos : segmentados( neutrófilos), eosinófilos, basófilos, monócitos, linfócitos, metamiócitos, bastonetes.
Leucopenia: Anemia aplásica, deficiência de B12 e ácido fólico.
Leucocitose: Inflamação, infecção e neoplasia.
1. ESTUDAR ANEMIA FALCIFORME.
Definição
A Anemia Falciforme (AF) é uma anemia hemolítica hereditária, caracterizada pela presença de células vermelhas com formato anormal (forma de foice), que são removidas da circulação e destruídas. A alteração de base nas células vermelhas é a presença de uma hemoglobina anormal que, quando desoxigenada, torna-se relativamente insolúvel, formando agregados que distorcem sua forma e impedem seu fluxo no interior dos vasos sanguíneo.
Epidemiologia
Estima-se que entre 8-10% dos negros norte-americanos possuam pelo menos uma cópia do gene βS ; 3% têm pelo menos uma cópia do gene βC; 1,5% são heterozigotos para alguma forma de β-talassemia; e 0,1% têm o gene da HPFH. De acordo com tais estatísticas, 1 a cada 600 nascimentos na população negra naquele país apresenta homozigose HbSS (“anemia falciforme”), enquanto 1 a cada 400 possui alguma “variante falcêmica”. No Brasil, os dados são menos precisos, e variam conforme a região (fato explicado pelas diferentes participações do negro africano na formação da sociedade de cada local): a anemia falciforme incide em 1 a cada 500 nascimentos na Bahia, 1 a cada 1.200 no Rio de Janeiro e 1 a cada 8.000 no Rio Grande do Sul.
Fisiopatologia
A alteração molecular primária na anemia falciforme é representada pela substituição de uma única base no códon 6 do gene da globina b, uma adenina (A) é substituída por uma timina (T) (GAG→GTC). Esta mutação resulta na substituição do resíduo glutamil na posição b 6 por um resíduo valil (β6Glu→Val) e tem como consequência final a polimerização das moléculas dessa hemoglobina anormal (HbS) quando desoxigenadas. 
A substituição do ácido glutâmico por valina na posição β6 ocorre na superfície da molécula, sem provocar alterações significativas na sua conformação global. 
A hemoglobina S na conformação oxi é isomorfa à hemoglobina normal, sugerindo que a estrutura das duas moléculas (exceto pela substituição do aminoácido) são similares. As solubilidades das hemoglobinas oxigenadas A e S são semelhantes, embora pequenas diferenças tenham sido detectadas em tampão fosfato concentrado. No entanto, soluções concentradas de desoxi-hemoglobina S e desoxi-hemoglobina A diferem grandemente, e este fato fornece as bases físico-químicas da gelificação e falcização. 
· A hemoglobina S, quando desoxigenada in vitro, torna-se relativamente insolúvel e agrega-se em longos polímeros. Esses polímeros resultam do alinhamento de moléculas de hemoglobina S, unidas por ligações não covalentes e, na descrição desse fenômeno, os termos polimerização, agregação e gelificação são usados como sinônimos. 
· A polimerização da desoxi-hemoglobina S depende de numerosas variáveis, como concentração de oxigênio, pH, concentração de hemoglobina S, temperatura, pressão, força iônica e presença de hemoglobinas normais. 
· Somente a forma desoxigenada de hemoglobina S sofre polimerização; o fenômeno não ocorre, normalmente, com nenhuma das formas cuja conformação se assemelha à oxi-Hb S, como meta-Hb S, carboxi-Hb S ou cianometa-Hb S. 
· A polimerização da hemoglobina S é o evento fundamental na patogenia da anemia falciforme, resultando na alteração da forma do eritrócito e na acentuada redução de sua deformabilidade. 
A Hemoglobina Fetal (HbF) inibe a polimerização, fenômeno responsável pela redução de sintomatologia clínica nos pacientes com elevados níveis de Hb fetal. Da mesma forma, a HbA participa pouco do polímero e esta é a razão para a quase ausência de anormalidades clínicas nos heterozigotos para o gene da hemoglobina S. 
A troca do ácido glutâmico pela valina resulta em perda de eletronegatividade e ganho de hidrofobicidade. A menor carga elétrica negativa da cadeia βS , aliada à sua maior “repulsa pela água”, gera uma tendência à autoagregação, que pode culminar na súbita formação de polímeros de hemoglobina S no interior do citoplasma (perda de solubilidade), polímeros esses que, por constituírem fibras alongadas e rígidas, alteram o formato da célula (afoiçamento), prejudicando sua deformabilidade Os polímeros de HbS não carreiam oxigênio.
No portador de anemia falciforme, o afoiçamento de hemácias acontece de forma espontânea em graus variáveis, mas sabemos que ele se torna extremamente exacerbado na vigência de um ou mais dos seguintes fatores: (1) hipóxia; (2) acidose; (3) desidratação celular. 
•A hipóxia transforma a oxi-HbS em desoxi-HbS. O “limiar de solubilidade” da desoxi-HbS (16 g/dl) está muito abaixo da CHCM (concentração de hemoglobina corpuscular média, que na anemia falciforme varia entre 23-50 g/dl). Assim, mesmo numa hipóxia leve – onde apenas parte da hemoglobina da hemácia se torna desoxigenada – a concentração corpuscular de desoxi-HbS já pode ultrapassar seu limiar de solubilidade, desencadeando a polimerização. 
•A acidose desloca a curva de saturação da hemoglobina “para a direita”, isto é, reduz a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio (efeito Bohr). Logo, na vigência de acidose, há mais desoxi-HbS para um mesmo nível de pO2. Novamente, quanto mais desoxi-HbS dentro da célula, maior a taxa de polimerização. 
•A desidratação celular favorece a polimerização por aumentar a CHCM. Com isso, a concentração de desoxi-HbS também aumenta, ultrapassando seu limiar de solubilidade. 
É importante ressaltar que, uma vez resolvidos tais fatores, os polímeros de HbS se desfazem e as hemácias podem retomar seu formato original (mas às vezes isso não acontece, gerando as chamadas Irreversibly Sickled Cells, ou ISC).
A hemoglobina mais eficiente no bloqueio à formação dos polímeros de HbS é a HbF. As demais hemoglobinas (ex.: HbA1, HbA2, HbC etc.) exercem efeitos variáveis, mas sempre de redução da polimerização da HbS. É por isso, inclusive, que a forma mais grave de doença falciforme é a homozigose HbSS (anemia falciforme), onde > 90% da hemoglobina é HbS.
A HbS é uma molécula “instável”, no sentido de que ela tende a sofrer oxidação com mais facilidade do que a hemoglobina normal. A HbS possui uma taxa de auto-oxidação espontânea moderadamente alta (cerca de 40%). No entanto, o que chama a atenção é sua absurda instabilidade perante o contato com os fosfolipídeos da membrana celular: a oxidação aumenta em340%, levando à formação de macromoléculas “desnaturadas” compostas por fragmentos de globina, ferro (separado dos grupamentos heme, que são destruídos) e fosfolipídeos. Na hemácia do portador de anemia falciforme tais produtos são gerados incessantemente, e permanecem “ancorados” na face interna da membrana .
As duas características físico-químicas da HbS que acabamos de descrever (tendência à polimerização e instabilidade molecular) respondem pela cascata de eventos fisiopatológicos no interior da hemácia. Além da alteração morfológica patognomônica (isto é, o afoiçamento decorrente da polimerização da HbS), ocorre um curioso fenômeno secundário à instabilidade dessa hemoglobina mutante: o aumento no estresse oxidativo intracelular. Uma vez que o mero contato com os fosfolipídeos da membrana plasmática exacerba a “instabilidade” da HbS, pode-se deduzir que um excesso de reações oxidativas acontece o tempo todo dentro das hemácias do falcêmico, independentemente da polimerização da HbS, ou seja, acomete até as hemácias bem oxigenadas e não afoiçadas.
As macromoléculas “desnaturadas” criadas durante este processo possuem ferro não heme em sua composição. Uma das consequências da presença de ferro não heme é a catalização da síntese de espécies reativas de oxigênio, os principais “radicais livres” que agridem as células. Logo, a noção que devemos ter é que TODAS as células vermelhas no sangue de um falcêmico apresentam níveis aumentados de estresse oxidativo, mesmo quando não afoiçadas. 
•Em primeiro lugar, a membrana plasmática sofre dano cumulativo. Ocorre peroxidação de lipídeos e oxidação de múltiplas proteínas estruturais, o que rompe as interações com o citoesqueleto, levando à formação de microvesículas na superfície, as quais se destacam para a corrente circulatória. A fluidez da membrana também é comprometida, o que faz com que muitas hemácias não consigam sair do estado afoiçado mesmo quando os polímeros de HbS se desfazem, gerando as chamadas ISC (Irreversibly Sickled Cells). Num espaço de tempo curtíssimo (entre 7-30 dias), a célula pode se tornar tão frágil que ocorre lise osmótica ou mecânica no próprio compartimento intravascular, contribuindo para a anemia hemolítica (componente de hemólise intravascular).
•O transporte iônico é afetado. A peroxidação de lipídeos aumenta a permeabilidade da membrana aos cátions, em particular na vigência de afoiçamento (uma característica denominada mecanossensibilidade). O resultado final é a desidratação celular, veja: a entrada de cálcio no citoplasma ativa um canal transmembrana denominado “canal gardos”, que induz a perda de K+ e água para o extracelular. Lembre-se que hemácias desidratadas se afoiçam com mais facilidade, além de serem mais viscosas mesmo quando não afoiçadas. Desse modo, cria-se um ciclo vicioso de afoiçamento e desidratação celular progressiva. 
•Por fim, surgem modificações antigênicas na membrana, como a já citada agregação da proteína banda 3 (que estimula autoanticorpos anti-banda 3, naturalmente presentes na circulação a opsonizar a superfície da hemácia, aumentando a eritrofagocitose no sistema reticuloendotelial – componente de hemólise extravascular). Outra modificação antigênica de interesse é a Exposição da Fosfatidilserina (FS), uma molécula com propriedades diretamente adesiogênicas e pró-inflamatórias. A FS presente na membrana pode ser “virada” para dentro ou para fora da célula, de acordo com a atividade da enzima translocase. O estresse oxidativo desregula a translocase, fazendo com que mais FS seja externalizada... Isso acontece, inclusive, nas vesículas que se desprendem das hemácias falcêmicas, o que explica a sua participação nos processos de lesão endotelial difusa e estímulo à resposta inflamatória.
As hemácias ricas em HbS são verdadeiros “agentes do caos” dentro do corpo do paciente.
Entenda que os dois mecanismos básicos de hemólise acontecem ao mesmo tempo na anemia falciforme (Tabela 2). Apesar de representar a menor parcela da taxa hemolítica total, a hemólise intravascular é a chave para compreendermos aquele que atualmente é considerado um dos pontos centrais na fisiopatologia da doença: a disfunção endotelial
Quando as hemácias falcêmicas são destruídas no interior da corrente circulatória, ocorre liberação de seus conteúdos para o sangue. A hemoglobina S (instável e com tendência a provocar reações oxidativas), bem como as moléculas “desnaturadas” existentes nessas células (que são ricas em ferro não heme altamente catalítico), exercem uma série de efeitos negativos sobre a camada interna da parede vascular, isto é, o endotélio. 
Uma das principais consequências observadas é a depleção do óxido nítrico, uma substância com propriedades vasodilatadoras, antitrombóticas e anti-inflamatórias. Não se esqueça que, mesmo antes da destruição definitiva da hemácia, as microvesículas ricas em fosfatidilserina que se desprenderam da membrana já deram início ao processo de lesão endotelial. Além de todos esses efeitos tóxicos diretos, ocorre ainda um efeito indireto: os conteúdos das hemácias e as microvesículas ricas em FS também estimulam células da imunidade inata, como macrófagos e monócitos, a produzir e secretar citocinas pró-inflamatórias, como TNF-alfa e interleucinas. Assim, na anemia falciforme ocorre um estado de inflamação sistêmica crônica, que por sua vez potencializa a disfunção endotelial.
 Corroboram a noção de que existe inflamação sistêmica crônica nessa doença a presença de alterações persistentes nos exames de sangue, como leucocitose e elevação de marcadores de fase aguda (ex.: proteína C reativa) – o falcêmico é um paciente constantemente “inflamado”! O resultado final é que o endotélio (considerado o maior órgão do corpo, por revestir internamente toda a rede micro e macrovascular) acaba sendo difusamente comprometido. Suas células adquirem um fenótipo “ativado”, com exposição de fatores adesiogênicos na superfície. Sobrevém um processo de hiperplasia e fibrose na parede dos vasos de maior calibre, com obstrução progressiva do lúmem, e a inflamação sistêmica crônica produz ainda hipercoagulabilidade, facilitando o surgimento de tromboses. O aumento episódico na exposição de fatores adesiogênicos pelas células endoteliais (aliado a um aumento no afoiçamento de hemácias) explica o fenômeno da vaso-oclusão capilar que caracteriza as crises falcêmicas agudas (ex.: crises álgicas). Já a lesão crônica da parede vascular, em associação à hipercoagulabilidade, explica a vasculopatia macroscópica subjacente a certas complicações, como o AVE isquêmico e a hipertensão pulmonar.
O PROCESSO VASO-OCLUSIVO 
O fenômeno de vaso-oclusão ocorre geralmente na microcirculação. No entanto, grandes artérias, principalmente nos pulmões e cérebro, também podem ser afetadas. Atualmente, acredita-se que o fenômeno vaso-oclusivo compreende um processo com várias etapas que envolve interações de hemácias, leucócitos ativados, células endoteliais, plaquetas e proteínas do plasma (Figura 27.1). 
A liberação intravascular de hemoglobina pelas hemácias fragilizadas, além da vaso-oclusão recorrente e dos processos de isquemia e reperfusão, leva a dano e ativação das células endoteliais da parede do vaso. Como consequência, há indução de uma resposta inflamatória vascular e a adesão de células brancas e vermelhas à parede dos vasos sanguíneos. Tal fato, associado a uma redução na biodisponibilidade de Óxido Nítrico (NO) no interior do vaso e ao estresse oxidativo, pode ocasionar, em alguns casos, uma redução no fluxo sanguíneo e, finalmente, a vaso-oclusão. „ 
Vaso-oclusão e o endotélio.
· A falcização repetida de hemácias SS pode levar a dano da membrana dos eritrócitos com a exposição de proteínas na superfície celular e a produção de Espécies Reativas de Oxigênio (ROS). 
· As células falcizadas, e a própria hemoglobina liberada no vaso pelo processo de hemólise, podem ocasionar danos às células endoteliais que revestem a parede vascular. 
· A subsequente ativação das células endoteliais tem consequências significativasque incluem a expressão de moléculas de adesão, como VCAM-1 (molécula de adesão vascular -1), ICAM-1 (molécula de adesão intercelular-1) e E-selectina na superfície celular e a produção de citocinas e quimiocinas como Interleucina (IL)-8, IL-6 e GM-CSF (fator estimulador de colônias de granulócitos-macrófagos).
· O endotélio ativado ainda libera fatores procoagulantes e fatores vasoconstritores potentes, como as Endotelinas 1 e 2 (ET-1, ET-2). „ 
A vaso-oclusão e a inflamação. 
· A anemia falciforme está, geralmente, associada a um estado inflamatório crônico que exerce um papel fundamental na ativação das células endoteliais e células sanguíneas, em especial, dos leucócitos. 
· Diversas moléculas inflamatórias se apresentam em níveis elevados na anemia falciforme, incluindo TNF-a (Fator de Necrose Tumoral-a), IL-1β, proteína C reativa (todos potentes ativadores do endotélio) além do M-CSF (fator estimulador de colônia de macrófagos), IL-3, GM-CSF, IL-8 e IL-6. 
· Além disso, algumas proteínas anti-inflamatórias como a Heme-Oxigenase-1 (HO-1) e IL10 também estão aumentadas na anemia falciforme, possivelmente tentando limitar a produção de moléculas inflamatórias e a ativação endotelial na doença. „ 
Vaso-oclusão, plaquetas e a coagulação. 
· A fisiopatologia da AF está associada a um estado de hipercoagulabilidade.
· Indivíduos com AF apresentam níveis elevados de marcadores de ativação de trombina, plaquetas e células endoteliais, tais como o dímero-D, Trombina-Antitrombina (TAT), ligante de CD40 solúvel (CD40L), Fator Tecidual (FT), Fator Ativador de Plaquetas (FAP), Fator de von Willebrand (FvW), entre outras moléculas. 
· Contudo, é provável que a vaso-oclusão recorrente contribua com a hipercoagulabilidade por aumentar a ativação do endotélio e das plaquetas.
Quadro clínico
As manifestações clínicas nas doenças falciformes são extremamente variáveis, mas são derivadas primariamente da oclusão vascular e, em menor grau, da anemia. Praticamente todos os órgãos podem ser afetados pela oclusão vascular (Tabela 27.3). Os recém-nascidos portadores de doenças falciformes possuem níveis elevados de HbF e, por essa razão, não apresentam manifestações clínicas significativas. De fato, apenas quando os níveis de HbF declinam significativamente aparecem os primeiros sinais e sintomas da doença, em geral após os seis meses de idade.
Crises de falcização
Os pacientes apresentam períodos sem manifestações clínicas correspondentes à fase estável da doença, que pode ser interrompida por manifestações agudas, denominadas crises de falcização: classificadas em crises vaso-oclusivas ou episódios dolorosos, crises aplásticas, hemolíticas e de sequestro.
Crises vaso-oclusivas 
· Os episódios dolorosos agudos representam as manifestações clínicas mais comuns e características das doenças falciformes. 
· A frequência e a gravidade das crises variam consideravelmente de paciente para paciente, e em um mesmo paciente, modificando-se bastante em diferentes períodos da vida. Os fatores desencadeantes são variados e incluem infecção, desidratação e tensão emocional de qualquer natureza. 
· As crises dolorosas são mais frequentes na terceira e quarta décadas de vida, e a taxa de mortalidade é mais alta em adultos .
· A oclusão microvascular, sobretudo na medula óssea, é o fator inicial do episódio doloroso. 
· Essa oclusão, secundária à falcização das hemácias, causa isquemia dos tecidos o que, por sua vez, provoca uma resposta inflamatória aguda.
· As crises dolorosas típicas atingem principalmente ossos longos, articulações e região lombar. Outras regiões podem também ser afetadas, como couro cabeludo, face, tórax e pelve.
· Episódios agudos de dor e inchaço de mãos e pés (síndrome das mãos e pés ou dactilite) são frequentes em crianças entre seis meses e dois anos de idade, e extremamente raras após os sete anos de idade. 
· Essas crises vaso-oclusivas são autolimitadas e, em geral, desaparecem após uma semana, embora possam ocorrer ataques recorrentes.
· Uma crise dolorosa grave é definida como aquela que exige tratamento hospitalar com analgésico parenteral por mais de quatro horas. A ocorrência de mais de três episódios graves em um mesmo ano caracteriza doença falciforme com evolução clínica grave.
Crises aplásticas
· São caracterizadas por queda acentuada nos níveis de hemoglobina, acompanhada de níveis de reticulócitos reduzidos, caracterizando insuficiência transitória da eritropoese. 
· Em geral, esse tipo de crise é desencadeado pela infecção por parvovírus B19 e ocorre, em 68% dos casos, em crianças. 
· No entanto, em adultos a presença de imunização natural por exposição prévia ao vírus torna mais frequentes infecções por Streptococcus pneumoniae, salmonelas e pelo vírus Epstein- -Barr, além de necrose medular óssea extensa, com febre, dor óssea, reticulocitopenia e reação leucoeritroblástica.
· Outra causa de queda na contagem de reticulócitos é o uso iatrogênico de tensões supramáximas de oxigênio inalatório, que podem suprimir a produção endógena de eritropoetina após dois dias de uso. 
· Essa complicação é autolimitada, e no período de cinco a dez dias a eritropoese volta ao normal. 
· No entanto, no período agudo de anemia, pode ser necessária a terapêutica com transfusões de concentrado de hemácias. 
· A insuficiência medular também pode resultar da deficiência de ácido fólico, especialmente durante a gravidez (também conhecida como crise megaloblástica).
 Crises hemolíticas 
· Também denominadas de crises hiper-hemolíticas, derivam de um incremento brusco na taxa de hemólise. 
· Esse tipo de crise é raro e aparentemente está relacionado a infecções por Mycoplasma, deficiência de G6PD ou esferocitose hereditária associadas. 
· As manifestações clínicas podem incluir agravamento da anemia e acentuação da icterícia. 
 Crise de sequestro esplênico 
· Esse tipo de crise representa um episódio agudo caracterizado pelo acúmulo rápido de sangue no baço.
· A crise de sequestro esplênico é definida pela queda nos níveis basais de hemoglobina de pelo menos 2 g/dL, hiperplasia compensatória de medula óssea e aumento rápido do baço. 
· Essa complicação ocorre, em geral, após o sexto mês de vida, e torna-se menos frequente após os dois anos de idade. No entanto, pode ocorrer mesmo em adultos portadores de esplenomegalia, especialmente portadores de S/β-talassemia ou hemoglobinopatia SC. 
Infecções
· Infecções são a principal causa da morbidade e mortalidade na anemia falciforme. 
· A infecção bacteriana é a maior causa de morte na anemia falciforme, particularmente na infância, além de constituir a principal causa de hospitalização.
· O risco de infecções graves é maior em pacientes com menos de quatro anos de idade, e entre estas se destaca a meningite bacteriana, causada em 78% dos casos por pneumococos. 
· Outros tipos de infecções frequentes são pneumonia, osteomielite, septicemia e infecção urinária. As bactérias envolvidas são mais comumente (embora não exclusivamente) aquelas que caracteristicamente possuem envoltório de polissacarídeos tais como: Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae tipo b, Neisseria meningitidis, Escherichia coli, Enterobacter sp, Klebsiella sp e Staphylococcus aureus, além de Mycoplasma sp.
Complicações cardíacas 
· As manifestações cardíacas são relacionadas à circulação hiperdinâmica secundária aos mecanismos compensatórios da anemia. 
· A radiografia de tórax mostra cardiomegalia global mesmo em pacientes jovens. 
· Também são observadas comumente artérias pulmonares proeminentes e aumento no padrão vascular pulmonar. 
· Dados convincentes mostram que isquemia miocárdica pode ocorrer mesmo em pacientes jovens, embora não seja um evento comum. 
· Alguns pacientes podem evoluir para insuficiência cardíaca, principalmente depois da segunda década de vida.
· A pressão arterial em pacientes com doenças falciformes é, em geral, inferior à observada em populações controles. 
Complicações pulmonares 
· Os episódios agudos são denominados de Síndrome Torácica Aguda (STA),e são caracterizados por dor torácica, febre, dispneia, opacidade nova na radiografia de tórax e queda no nível de hemoglobina, podendo evoluir com hipóxia grave.
· Esse tipo de complicação é hoje uma das causas mais comuns de morte, e a segunda causa mais comum de hospitalização em pacientes com doenças falciformes nos Estados Unidos. 
· É três vezes mais frequente em crianças do que em adultos, sendo mais comum nos homozigotos SS, seguidos por S/β° talassemia, hemoglobinopatias SC e S/β+ talassemia, em ordem decrescente de frequência. 
· A STA pode ser causada por infarto de costela ou esterno, pneumonia, embolia pulmonar após necrose de medula óssea, ou infarto pulmonar devido a falcização in vivo. 
· A função pulmonar pode ser anormal mesmo em pacientes que não apresentem antecedentes prévios de doença pulmonar. 
· A hipertensão pulmonar na doença falciforme pode ser de origem arterial, venosa ou mista. Até 20% dos pacientes terão hipertensão pulmonar leve ou limítrofe (Pressão Sistólica de Artéria Pulmonar (PSAP) estimada acima de 35 mmHg), e 10% terão hipertensão pulmonar moderada ou grave (PSAP acima de 45 mmHg). 
Complicações neurológicas 
· Algum tipo de comprometimento neurológico acomete cerca de 25% dos pacientes com doenças falciformes. 
· Essas alterações são mais comuns em pacientes SS do que em pacientes com hemoglobinopatias SC ou S/β talassemia. 
· As complicações clínicas no sistema nervoso central incluem acidente vascular cerebral, hemorragia cerebral e ataques isquêmicos transitórios. 
· Infartos cerebrais são mais frequentes em crianças, com pico de incidência até os seis anos de idade, e em adultos após os trinta anos de idade, ao passo que hemorragia intracerebral é mais frequente em adultos entre as segunda e terceira décadas de vida. 
· Aparentemente, novelos vasculares (conhecidos como moya moya) envolvendo vasos frágeis e dilatados, que se desenvolvem como circulação colateral ao redor de áreas de infarto e aneurismas, são os fatores causais das hemorragias em adultos. 
· No sistema nervoso, ao contrário de outras regiões, vasos maiores parecem ser os locais preferencialmente acometidos por vaso-oclusão. 
Complicações hepatobiliares
· A excreção contínua e elevada de bilirrubinas leva à formação de cálculos biliares. 
· As alterações na função hepática podem ser relacionadas à falcização intra-hepática, infecções adquiridas na transfusão ou hemossiderose transfusional.
· A denominação síndrome do quadrante superior direito designa episódio agudo caracterizado por hiperbilirrubinemia extrema, aumento rápido do fígado, febre e dor acentuada. 
· O diagnóstico diferencial desta condição inclui colecistite aguda, pancreatite, hepatite aguda, crise dolorosa e um possível sequestro hepático. 
· Os níveis de enzimas hepáticas são anormais e os níveis de bilirrubina podem chegar até a 100 mg/dL. 
Complicações genitourinárias 
· O rim é extremamente suscetível a complicações em pacientes com doenças falciformes devido às características peculiares de seu microambiente, que incluem reduzidas tensões de oxigênio, pH ácido e alta tensão osmótica. 
· Esse tipo de ambiente facilita a ocorrência de falcização e infarto na medula renal, com consequente hematúria e inabilidade de concentrar urina (hipostenúria). 
· É importante lembrar que essas complicações podem ocorrer não somente em pacientes com doenças falciformes, mas também em heterozigotos para hemoglobina S (traço falciforme, AS). 
· A excreção de potássio também está reduzida, e episódios de hipercalemia foram descritos. 
· Ocasionalmente, podem ser observados níveis elevados de ácido úrico devido à hiperplasia de medula óssea e consequente aumento na produção de urato em razão do metabolismo das purinas, além da redução na depuração de urato pelos túbulos renais. „ 
· Proteinúria ocorre em 26% dos pacientes com doença falciforme e creatinina sérica elevada em 7%. 
· A lesão anatomopatológica é representada por aumento glomerular e glomeruloesclerose periférica focal segmentar. O tratamento com enalapril, um inibidor da enzima conversora de angiotensina, parece reduzir a proteinúria, sugerindo que a hipertensão capilar pode ser um fator patogênico na nefropatia da anemia falciforme. Em pacientes com insuficiência renal crônica, deve ser iniciado programa de hemodiálise e, se possível, indicado transplante renal. „ 
· Priapismo é uma complicação relativamente frequente e ocorre quando as células falcizadas obliteram os corpos cavernosos e esponjoso e impedem o esvaziamento do sangue do pênis. 
· Existem duas apresentações clínicas: priapismo agudo e priapismo recorrente ou “intermitente” (do inglês stuttering). 
· A apresentação aguda corresponde à ereção dolorosa, prolongada, que persiste por várias horas, ao passo que o priapismo recorrente é caracterizado por episódios reversíveis da ereção que podem ocorrer em períodos variáveis, com duração de minutos, e também em múltiplos episódios no mesmo dia. O tratamento deve ser feito com repouso, hidratação, analgésicos e, nos casos mais graves, transfusão de substituição para manter níveis de HbS abaixo de 30%. 
Complicações oftalmológicas 
· As complicações oftalmológicas são frequentes nas doenças falciformes e incluem anormalidades na conjuntiva, infartos orbitários, hemorragia retiniana e retinopatia proliferativa. 
· A retinopatia resulta de lesões oclusivas arteriolares que levam a microaneurismas e proliferação neovascular colateral. 
· Essa alteração é mais frequente em pacientes com hemoglobinopatia SC do que em outras doenças falciformes
Complicações osteoarticulares 
· A complicação mais comum é a necrose asséptica da cabeça do fêmur, e afeta cerca de 10% das pacientes, podendo chegar a mais de 50% dos portadores de hemoglobinopatia SC. 
· Outras regiões ósseas podem também ser afetadas pela necrose vascular, como corpos vertebrais e cabeça do úmero. 
· A necrose asséptica da cabeça do fêmur aparenta estar associada positivamente com a idade, frequência de episódios dolorosos, deleção do gene da α-globina e níveis de hemoglobina. 
· O tratamento é sintomático: inclui analgésicos, repouso e redução de carga naquele membro. 
Manifestações cutâneas 
· Além de manifestações comuns às demais anemias hemolíticas, como icterícia e palidez, as doenças falciformes caracterizam-se pela presença de úlceras no terço inferior das pernas, especialmente na região maleolar. 
· A prevalência de úlcera de perna na anemia falciforme é estimada em 5 a 10% dos pacientes.
· É mais comum em homens e em pacientes mais velhos, e raras nas crianças e doenças falciformes heterozigóticas duplas. 
· É uma complicação altamente incapacitante, principalmente para jovens. 
· O tratamento é quase sempre insatisfatório e inclui cuidados locais da ferida: higiene, antibióticos, e repouso.
Gravidez 
Com os cuidados terapêuticos atuais, a morte materna é complicação rara nas doenças falciformes. 
Abortos espontâneos. Complicação de etiologia desconhecida, parece ter menor frequência nas portadoras de hemoglobinopatia SC em relação às SS, mas tem incidência desconhecida nas S-βtalassêmicas. Especula-se que lesões microvasculares na placenta causadas pelas hemácias falcizadas tenham papel mais importante na fisiopatologia das perdas gestacionais do primeiro trimestre do que o próprio grau de anemia das doentes acometidas. �
 Retardo de crescimento intrauterino. Ocorre com frequência elevada em pacientes com anemia falciforme, e com menor frequência em portadoras de hemoglobinopatia SC ou S-β-talassemia. Numerosas causas contribuem para esse quadro, porém dois fatores que agem desfavoravelmente no crescimento fetal intrauterino são a hipóxia e a desnutrição. A placenta de portadoras de anemia falciforme é anormal em tamanho, localização, inserção na parede uterina e histologia. Anemia materna promove diminuição do fluxo sanguíneo na região placentária, causando déficit de crescimento da membrana placentária. Episódios frequentes de vaso-oclusão podem ainda contribuir para o retardo do crescimento intrauterino,sendo possível que arteríolas deciduais sejam obstruídas por agrupamentos de hemácias falcizadas, promovendo hipoperfusão e hipóxia da membrana placentária. 
 Infecções. São provavelmente as complicações mais comuns das doenças falciformes, com frequência estimada em 28 a 67% dos casos. A infecção urinária é encontrada em 28% dos casos, superando o grupo controle normal, com apenas 15%. Inicialmente, a infecção urinária é assintomática, mas com o transcorrer da gravidez, há possibilidade de exacerbação da bacteriúria com aumento na frequência de prematuridade e de recém-nascido pequeno para a idade gestacional. As pacientes devem, pois, ser investigadas e tratadas precocemente durante o acompanhamento pré-natal. „ 
Dores ósseas. Episódios de dores ósseas são frequentemente observados nas doenças falciformes. Durante a gravidez, principalmente no terceiro trimestre, pode haver maior incidência dessa complicação. „ 
Anemia. Durante o terceiro trimestre, principalmente ao redor de 32-34 semanas de gravidez, há redução nos níveis de hemoglobina, tanto em mulheres normais como em mulheres com doenças falciformes. Essa redução é de aproximadamente 30%, sendo agravada por deficiência de folato, quadros infecciosos ou inflamatórios, crises aplásticas ou acentuação da hemólise. „
 Pré-eclâmpsia. A frequência de pré-eclâmpsia é elevada em mulheres com doenças falciformes, podendo agravar as doenças renais preexistentes. Por outro lado, a presença de proteinúria e hipertensão arterial em pacientes com lesão renal prévia pode ser confundida com o diagnóstico de pré-eclâmpsia. O diagnóstico deve ser sugerido quando há hipertensão arterial associada com edema e proteinúria após a 20ª semana de gravidez. Essa afirmação é consequência do fato de que, habitualmente, na doença falciforme, os níveis pressóricos são inferiores aos de indivíduos normais, e durante a gestação normal observa-se pressão arterial mantida em níveis inferiores aos de mulheres grávidas normais até a 20ª semana. Dessa forma, níveis pressóricos iguais ou superiores a 125 × 75 mmHg devem ser rigorosamente monitorizados, pois a existência de pré-eclâmpsia é acompanhada de alta taxa de mortalidade.
Infertilidade e contracepção 
No entanto, existe atraso puberal significativo nessas pacientes, o que em parte pode explicar os dados conflitantes concernentes à fertilidade dessa população. Entre os métodos contraceptivos mais amplamente empregados em portadoras de doenças falciformes, encontram-se os de barreira, géis espermicidas, dispositivos intrauterinos, acetato de medroxiprogesterona e anticoncepcionais orais. Aparentemente, não há aumento da incidência de infecções ginecológicas com os métodos utilizados.
Diagnóstico
Por ser uma anemia hemolítica crônica, a anemia falciforme cursa com alterações laboratoriais estereotipadas condizentes com este grupo de doenças, a saber: 
(1) queda leve a moderada da hemoglobina e do hematócrito; 
(2) reticulocitose (entre 3-15%); 
(3) hiperbilirrubinemia indireta; 
(4) aumento de LDH;
 (5) queda da haptoglobina. 
A reticulocitose provoca um aumento “artificial” do VCM (os reticulócitos possuem maior tamanho que as hemácias maduras), de tal sorte que quando um portador de anemia falciforme não apresenta VCM “normal alto” ou francamente alto, deve-se suspeitar da coexistência de ferropenia... As hemácias falcêmicas são normocrômicas, e a hipocromia também sugere ferropenia associada... Devido à resposta inflamatória sistêmica que acompanha a doença esperam-se contagens de leucócitos e plaquetas aumentadas, além de elevação dos “marcadores de fase aguda” (ex.: proteína C reativa). O panorama apresentado pelo esfregaço de sangue periférico é relativamente específico, sugerindo o diagnóstico no contexto apropriado. Observam-se neste exame: 
(1) hemácias irreversivelmente afoiçadas – as ISC; 
(2) policromasia – indicativo de reticulocitose;
(3) corpúsculos Howell-Jolly – sinal de asplenia; 
(4) hemácias “em alvo” – indício genérico de que existe uma hemoglobinopatia. 
Confirmação 
Assim como acontece com outras hemoglobinopatias, o diagnóstico de AF geralmente é confirmado por meio da eletroforese de hemoglobina. Neste método, as diferentes hemoglobinas presentes nas hemácias são separadas num gel em função de seu peso molecular e carga elétrica (Figura 7). 
Na grande maioria das vezes, o “perfil de distribuição” das hemoglobinas encontradas permite o diagnóstico diferencial entre anemia falciforme e as principais variantes falcêmicas (Tabela 3). Outros exames capazes de confirmar o diagnóstico são a Cromatografia Líquida de Alta Performance (HPLC) e a análise genética. Os testes de afoiçamento e de solubilidade da hemoglobina não diferenciam entre AF e as variantes falcêmicas (apenas detectam a presença de HbS), logo, não são capazes de confirmar o diagnóstico, ainda que possam ser usados como testes de rastreio. Uma vez confirmado o diagnóstico de anemia falciforme, deve-se solicitar uma bateria de exames específicos visando o acompanhamento evolutivo da função dos múltiplos “órgãos-alvo” dessa doença (maiores detalhes adiante).
Tratamento
Profilaxia contra o Pneumococo 
A principal causa de óbito em crianças falcêmicas (em particular na faixa etária entre 1-3 anos) é a infecção por germes encapsulados, com destaque para o Streptococcus pneumoniae (pneumococo). O pneumococo tem comportamento mais invasivo nesses pacientes, evoluindo com pneumonia, bacteremia e meningite. A vacinação antipneumocócica e o uso profilático de penicilina, apesar de não interferirem diretamente no processo de afoiçamento de hemácias, reduzem de forma significativa a morbimortalidade precoce da AF, sendo consideradas, por conseguinte, terapias modificadoras de doença.
 ANTIBIOTICOPROFILAXIA.
Existem fortes evidências na literatura de que, em crianças falcêmicas, a profilaxia com penicilina V oral iniciada no 2º mês de vida reduz em mais de 80% a chance de infecção invasiva pelo pneumococo! A dose é de 125 mg 2x ao dia até a idade de dois anos, passando-se para 250 mg 2x ao dia posteriormente. Nos pacientes sem história de sepse pneumocócica ou esplenectomia cirúrgica é seguro interromper a antibioticoprofilaxia aos cinco anos de idade. 
Reativação da Síntese de Hemoglobina Fetal 
Os níveis de HbF são inversamente proporcionais à gravidade da anemia falciforme! Lembre-se que a hemoglobina fetal evita a polimerização da HbS, reduzindo o afoiçamento.– um quimioterápico inibidor da ribonucleotideo-redutase – aumenta os níveis de HbF. Hematologicamente, ocorre melhora da anemia e queda na contagem de reticulóticos, leucócitos e plaquetas. Clinicamente, diminui a frequência de crises álgicas, incluindo os episódios de síndrome torácica aguda, além de haver uma redução na necessidade de hemotransfusão. A dose inicial é de 15 mg/kg/ dia, podendo ser titulada até 30-40 mg/kg/dia. O controle é feito pela contagem de neutrófilos, que deve permanecer > 2.000/ml. É esperado um aumento discreto do VCM com seu uso. Na maioria dos adultos a dose prescrita fica entre 1-2 g/dia. Com essa posologia leva de três a quatro meses para se atingir o efeito pleno (isto é, resposta máxima da HbF)... As principais indicações de HU na AF são listadas na Tabela 6.
Hemotransfusão 
Existem duas modalidades básicas de hemotransfusão na AF: (1) transfusão simples; (2) transfusão de troca parcial (exsanguinitransfusão parcial). Ambas podem ser realizadas de maneira episódica, mas quando é necessário transfundir cronicamente o paciente indica-se apenas a transfusão de troca parcial, já que com este procedimento o risco de sobrecarga de ferro é meno. Na transfusão simples, as bolsas de hemácias são ministradas conforme a necessidade. Lembre-se que cada bolsa, num adulto médio, eleva a hemoglobina em cerca de 1 g/dl (o que equivale a um aumento de 3% no hematócrito). Tal estratégia, em falcêmicos, deve trazer a Hb e o Ht até um máximo de 10 g/dl e 30%, respectivamente. Valores de Hb/Ht acima desses limiares produzem hiperviscosidade sanguínea na presença de HbS. 
Na transfusãode troca parcial, parte das hemácias falcêmicas é removida da circulação em troca de hemácias normais. Isto pode ser feito sequencialmente, através de uma flebotomia (retirada de 10 ml/kg de sangue) seguida pela transfusão de hemácias.. Os alvos de Hb e Ht são os mesmos: 10 g/dl e 30%. No entanto, além de aumentar Hb e Ht, a transfusão de troca possui uma vantagem adicional: redução na quantidade de HbS circulante. Neste procedimento, objetiva-se manter a proporção de HbS < 30%.
As principais complicações transfusionais são a aloimunização (isto é, desenvolvem anticorpos contra antígenos de grupos sanguíneos incompatíveis, A aloimunização contra os referidos grupos sanguíneos justifica a ocorrência das reações hemolíticas tardias) a sobrecarga de ferro e as infecções virais hemotransmissíveis.
Quelação do Ferro 
Indivíduos que necessitam de hemotransfusões repetitivas ao longo da vida estão sob risco de desenvolver sobrecarga de ferro (hemocromatose secundária). A hemocromatose, ao danificar múltiplos órgãos e tecidos (ex.: cirrose hepática, miocardiopatia dilatada, insuficiência pancreática) reduz a expectativa de vida. Seu tratamento, baseado no uso de quelantes de ferro (“quelante” = substância que sequestra o ferro e aumenta sua eliminação do organismo) comprovadamente diminui a morbimortalidade.
Os principais quelantes de ferro disponíveis são: (1) deferoxamina – utilizada pela via endovenosa ou subcutânea; (2) deferasirox – utilizado pela via oral. Ambos possuem eficácia semelhante, e são indicados nas seguintes situações.
Flebotomia 
Sabemos que na anemia falciforme um hematócrito > 30% (Hb > 10-11 g/dl) se associa a um aumento da viscosidade sanguínea, o que por sua vez aumenta a frequência e a intensidade do fenômeno de vaso-oclusão capilar. Nos raros pacientes que apresentam espontaneamente uma Hb ≥ 9,5 g/dl, um protocolo de flebotomias quinzenais pode ser instituído, visando à redução da hiperviscosidade. A conduta consiste na retirada de 10 ml de sangue/ kg de peso em 20-30min (com reposição de igual volume de salina isotônica), repetindo-se o procedimento até que um alvo de Hb entre 9-9,5 g/dl seja atingido.
Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas 
O transplante de células-tronco hematopoiéticas representa a única chance de CURA da AF. O transplante, no entanto, não é indicado de rotina devido à dificuldade em se obter doadores compatíveis e também – principalmente – devido à elevada morbimortalidade do procedimento em si! Segundo a literatura atual sua taxa de mortalidade na AF gira em torno de 10%. Nos 90% restantes, a sobrevida livre de eventos adversos é de cerca de 80% num período de mais ou menos cinco anos... O transplante pode ser indicado nas crianças HbSS que têm fenótipo mais agressivo, com anemia profunda refratária à HU e múltiplas disfunções orgânicas precoces. A fonte das células-tronco pode ser a medula óssea ou o cordão umbilical de um doador HLA-compatível.
Crise Álgica 
A dor aguda é o sintoma inicial da AF em > 25% dos casos, e representa o principal motivo que leva esses doentes a procurar auxílio médico. A forma mais comum de crise álgica é a “crise esquelética”, sendo seu mecanismo causal a vaso-oclusão no interior da medula óssea produzindo infarto ósseo.
A hidratação é outro ponto essencial no manuseio da crise álgica, devendo ser feita preferencialmente pela via oral (60 ml/kg/dia). A hidratação venosa passa a ser indicada nos casos em que a hidratação oral não é adequada ou não pode ser garantida, tendo em mente que todo cuidado é pouco a fim de evitar a hipervolemia iatrogênica. 	 Particularmente em falcêmicos adultos, que costumam apresentar disfunção cardíaca crônica.
2. ELUCIDAR AS ANEMIAS CARÊNCIAIS 
ANEMIA FERROPRIVA
Definição
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, anemia é um problema de saúde pública global, que afeta o estado de saúde, a capacidade laborativa e a qualidade de vida de cerca de 2 bilhões de pessoas, cerca de um terço da população mundial. A Deficiência de Ferro (DF) é responsável por 75% de todos os casos de anemia
Epidemiologia
Estima-se a prevalência de DF em até 45% das crianças até cinco anos de idade, e de até 50% nas mulheres em idade reprodutiva. Cerca de 500 milhões de mulheres e até 60% de gestantes apresentam Anemia por Deficiência de Ferro (ADF), com resultados negativos na qualidade de vida, no feto e no lactente. Tanto em países subdesenvolvidos quanto em países desenvolvidos, a DF advém principalmente de desigualdades sociais. É muito mais prevalente em estratos sociais mais baixos, nos grupos de menor renda, e na população menos educada. 
Fisiopatologia
O corpo de um indivíduo adulto bem nutrido e saudável contém de 3 a 4 g de ferro. O éritron (órgão descontínuo, porém único, formado pelo somatório de eritroblastos, reticulócitos e hemácias) é o maior compartimento funcional de ferro do organismo humano, contendo de 60 a 70% do ferro total. Desta forma, a necessidade de ferro do éritron tem influência dominante na sua deficiência. O restante do ferro corporal está distribuído nos hepatócitos e nos macrófagos do Sistema Reticuloendotelial (SRE), que atuam como órgão de depósito. O SRE é responsável por fagocitar células senescentes, catabolizar Hemoglobina (Hb) para restaurar o ferro e devolvê-lo à transferrina para nova utilização. Apesar da baixa capacidade absortiva do duodeno, o balanço de ferro no organismo é regulado a partir da absorção intestinal. Como não existe uma via fisiológica de excreção de ferro, essa regulação é crítica. A deficiência de ferro surge a partir do desequilíbrio entre ingesta, absorção e situações de demanda aumentada ou perda crônica (anemia ferropriva), sendo multifatorial. (Tabela 20.1) 
, doença celiaca
Giardise e doença celiaca
Anemia ferropriva é bastante frequente em recém-nascidos, crianças, adolescentes e mulheres em idade fértil, gestantes e lactantes. Além de esses grupos apresentarem incremento na necessidade de ferro, sua ingestão média diária de ferro está abaixo da recomendada, mesmo em países desenvolvidos, em diferentes levantamentos populacionais. O ferro dietético consiste de ferro heme e não heme. Ferro heme está presente em alimentos de origem animal e tem excelente biodisponibilidade para absorção intestinal; o ferro não heme é encontrado em produtos de origem vegetal e tem baixa biodisponibilidade. Assim, indivíduos que consomem produtos animais têm menor risco de desenvolvimento de anemia ferropriva que vegetarianos. Anemia ferropriva é o distúrbio do ferro mais frequente em adultos e está associada à perda crônica de sangue, tanto por hipermenorreia ou menorragia (sítio mais frequente em mulheres em idade fértil), quanto pelo trato gastrointestinal (sítio mais frequente em homens e mulheres pós-menopausa). Cada mL de sangue perdido resulta em redução de cerca de 0,5 mg de ferro.
A anemia ferropriva é, de longe, a causa mais comum de anemia em crianças, sendo encontradas, em alguns locais, taxas tão altas quanto 50%! A criança que nasceu a termo, com peso normal, apresenta reservas corporais de ferro (estimadas em 70 mg/kg) suficientes para garantir as necessidades do metal até os seis meses de idade. Por isso, a anemia é menos comum nessa faixa etária. O aleitamento materno exclusivo é recomendado até essa idade, pois, apesar de conter pequena quantidade de ferro (0,26-0,73 mg/ml), a sua absorção é excelente (50%). O ferro presente no leite de vaca (in natura ou industrializado) é muito pouco absorvido (apenas 10%).
Em prematuros e crianças com baixo peso ao nascer (PIG), tudo muda: estas crianças nascem com menos estoque de ferro e têm uma velocidade de crescimento maior da massa hemoglobínica no primeiro ano de vida, necessitando, portanto, de maior aporte diário de ferro (2 mg/kg/dia, comparado a 1 mg/kg/dia na criança à termo de peso normal). Daí a maior chance de desenvolver anemia ferropriva, caso não recebam suplementos de ferro. 
Entre 6-24 meses (até dois anos completos) é o período mais propenso à anemia ferropriva. Três são os motivos:(1) momento do pico de crescimento da criança, necessitando de mais ferro.
(2) esgotamento dos estoques do nascimento
(3) desmame sem suplemento de ferro e sem fórmulas ou alimentos enriquecidos. 
Além do deficit alimentar, a perda sanguínea crônica também pode contribuir para a anemia ferropriva infantil. O uso do leite de vaca está associado à perda de sangue oculto nas fezes em 30% dos casos (enteroproctocolite por alergia ao leite). 
Quadro clínico
· Deficiência de ferro pode gerar redução da capacidade funcional de vários sistemas orgânicos, estando associada à alteração do desenvolvimento motor e cognitivo em crianças, redução da produtividade no trabalho e problemas comportamentais, cognitivos e de aprendizado em adultos.
· Em gestantes, aumenta o risco de prematuridade, baixo peso, sendo responsável por 18% das complicações no parto e morbidade materna.
· As queixas costumam ser leves, pois a anemia se instala de maneira insidiosa, gerando adaptação, e há pacientes completamente assintomáticos. 
· Anemia MICROCÍTICA e HIPOCRÔMICA
· Pode-se observar palidez cutaneomucosa, fadiga, baixa tolerância ao exercício, redução do desempenho muscular, perversão alimentar ou pica (desejo e consumo de substâncias não nutritivas como gelo, terra, sabão, argila), baqueteamento digital e coiloníquia (unhas em forma de colher), atrofia das papilas linguais, estomatite angular .
· Uma manifestação eventualmente observada, que acomete mais frequentemente mulheres idosas, é a disfagia pela formação de uma membrana fibrosa na junção entre a hipofaringe e o esôfago (síndrome de Plummer-Vinson ou Paterson-Kelly) A membrana muitas vezes não desaparece após a correção do estado ferropênico, necessitando de terapia endoscópica de dilatação.
· Em crianças: Anorexia e irritabilidade são os sintomas mais comuns. Pode haver prejuízo ao desenvolvimento psicomotor e alterações comportamentais. 
Diagnóstico
Hemograma 
O hemograma é um teste rápido, barato e amplamente disponível no rastreio de anemia ferropriva, mas incapaz de detectar DF sem anemia. Frequentemente se observa hipocromia, microcitose, aumento do índice de Anisocitose Eritrocítica (RDW) e plaquetose, além da presença de anisocitose, poiquilocitose, hemácias em charuto, eliptócitos e reticulocitopenia ao exame microscópico.
· O hemograma na anemia ferropriva passa por duas fases evolutivas. Na primeira fase, temos uma anemia leve a moderada, com índices hematimétricos normais, ou seja, uma anemia do tipo normocítica normocrômica. 
· Porém, numa segunda fase, a anemia torna-se moderada a grave, convertendo-se para o tipo microcítica e hipocrômica. A hipocromia costuma se instalar depois da microcitose. De uma forma geral, a
A anemia ferropriva cursa caracteristicamente com trombocitose, isto é, aumento de plaquetas na periferia, com contagem geralmente em torno de 500.000 a 600.000/mm3 . 
A leucometria em geral está dentro dos limites da normalidade. O RDW é classicamente elevado (> 14%), sendo em média 16%. Isso ajuda a diferenciar a anemia ferropriva da talassemia minor (também microcítica), que tem RDW normal (em torno de 13%). Diante de uma anemia com acentuada microcitose (VCM < 72 fL), a dúvida deve ficar entre anemia ferropriva ou talassemia. 
Ferro Sérico 
Deve sempre ser interpretado junto com os valores de ferritina e TIBC. Encontra-se baixo na anemia ferropriva (geralmente < 30 mg/dl), mas eleva-se imediatamente após a reposição oral e parenteral, permanecendo, neste último caso, elevado por semanas. Na anemia de doença crônica o ferro sérico também está baixo, geralmente < 50 mg/dl. 
Ferritina Sérica 
A dosagem da ferritina no soro é o teste indicado para documentar a deficiência de ferro. É o primeiro parâmetro a se alterar na anemia ferropriva. Sabemos que os níveis de ferritina sérica refletem os estoques de ferro corporal, presentes no sistema reticuloendotelial. 
Níveis abaixo de 15 ng/ml são típicos da anemia ferropriva, enquanto valores acima de 60 ng/ml praticamente afastam este diagnóstico. Na anemia de doença crônica, a ferritina sérica costuma estar entre 50-500 ng/ml. Na associação anemia ferropriva + anemia de doença crônica, a ferritina sérica encontra-se entre 20-60 ng/ml (raramente, entre 60-100 ng/ ml). A reposição de ferro afeta os valores de ferritina e, em alguns casos, pode atrapalhar a nossa interpretação. Quando queremos diagnosticar a etiologia correta de uma anemia em indivíduos utilizando ferro oral, devemos suspendê-lo e aguardar cerca de uma semana para obtermos um valor de ferritina mais confiável. 
TIBC e Saturação da Transferrina
· O TIBC, reflete os sítios totais de ligação da transferrina e, portanto, varia de acordo com a concentração da transferrina sérica. 
· Nos casos de ferropriva, o TIBC encontra-se elevado, acima de 360 mg/dl e quase sempre acima de 400 mg/dl, em função de um aumento na produção de transferrina pelo fígado, em resposta à carência de ferro (Tabela 1). 
A saturação da transferrina (Fe/TIBC), como o próprio nome diz, espelha a porcentagem de receptores de ferro em todas as moléculas de transferrina circulante que se encontram saturados. O valor normal da saturação está em torno de 30- 40%. Valores abaixo de 15% são consistentes com o diagnóstico de anemia ferropriva.
Hematoscopia 
· Nas fases iniciais da deficiência de ferro, observa-se apenas anisocitose. Se a anemia piora, podemos encontrar microcitose e hipocromia. 
· A poiquilocitose (neste caso marcada por hemácias em forma de charuto e micrócitos bizarros – Figura 4) é um achado que acompanha a anemia grave. 
· A anemia ferropriva é aquela que mais se relaciona ao achado de anisopoiquilocitose.
Aspirado de Medula Óssea (mielograma) PADRÃO OURO
O mielograma é o exame de maior acurácia para o diagnóstico da anemia ferropriva, porém só deve ser realizado em casos duvidosos. Os estoques de ferro das células reticuloendoteliais podem ser avaliados através de uma amostra de medula óssea, obtida por meio de aspirado ou biópsia e corado com Azul da Prússia. Por convenção, esses estoques são graduados numa escala de 1 a 4+. A presença de qualquer ferro corável afasta a possibilidade de anemia ferropriva declarada. Um aumento dos depósitos de ferro é frequente em duas situações principais: 
(1) pacientes submetidos a transfusões periódicas; 
(2) anemia de doença crônica. 
Concluímos então que a análise do ferro medular pode permitir a diferenciação entre anemia ferropriva e anemia de doença crônica quando os níveis de ferritina forem inconclusivos 
Tratamento
O tratamento da DF consiste na reposição oral ou venosa. No entanto, é mandatória a investigação da causa e sua pronta correção; do contrário, a reposição é paliativa e tende a ser ineficaz no longo prazo.
Oral 
A dose ideal para tratamento é de 180 a 200 mg de ferro elementar/dia para adultos e 1,5 a 2 mg de ferro elementar/dia para crianças, dividida em 3 a 4 tomadas, preferencialmente com o estômago vazio, ou 30 minutos antes das principais refeições. A forma ferrosa é mais bem absorvida que a férrica. (Tabela 20.3) 
Para pacientes em uso de antiácidos e inibidores da bomba de prótons recomenda-se a reposição com doses maiores e por mais tempo. A prevalência de efeitos colaterais é de até 30%, notadamente do TGI: pirose e dor epigástrica, náuseas, vômitos, empachamento, dor abdominal em cólica, diarreia e obstipação.
 O paciente deve ser informado de que é esperada mudança da cor das fezes, e que os efeitos colaterais melhoram com o tempo. Redução das doses diárias e ingestão do medicamento junto com alimentos diminuem a eficácia, porém diminuem os efeitos colaterais. Recomenda-se manter doses terapêuticas por cerca de quatro meses após a resolução da anemia.
Parenteral 
A reposição parenteral de ferro é efetiva, cara, trabalhosa, não isenta de efeitos colaterais, e deve ser indicada em situações especiais. Existem formulações para administração intramuscular, praticamente proscrita, e intravenosa. A via intramuscular está associada à dor local, pigmentação irreversível da pele e linfonodomegalia.A infusão venosa pode estar associada a irritação, dor e queimação do sítio de punção, náuseas, gosto metálico na boca, hipotensão e reação anafilactoide, sendo que o principal fator no aparecimento dessas reações é a velocidade de infusão.
A administração de ferro parenteral eleva a ferritina em vinte e quatro horas e a mantém assim por quatro a seis semanas. Dessa forma, em pacientes que utilizaram o preparado parenteral, só teremos um nível de ferritina confiável cerca de um mês após a última dose.
Resistência 
O sinal mais precoce de resposta é o aumento na contagem de reticulócitos, que atinge seu pico entre o 5º e o 10º dias de tratamento. Observa-se, também, aumento médio de 1g/dL por semana na Hb. Considerável proporção dos pacientes tratados apresenta má resposta, recaída precoce ou resistência. Nesses casos, deve-se investigar: presença de fatores que interfiram na absorção intestinal, persistência do sangramento, perda maior que a capacidade de absorção, má adesão e, se constatada a impossibilidade de uso da via oral, partir para a reposição parenteral. Várias metanálises mostraram que a erradicação do H. pylori associada à ferroterapia oral é mais efetiva que a ferroterapia oral isolada, e há evidência de que a presença dessa bactéria é causa de resistência à ferroterapia; assim, há correntemene recomendação de que se investigue a presença e se trate a infecção pelo H. pylori após exclusão de sangramento pelo trato gastrointestinal.
ANEMIA MEGALOBLASTICA 
Definição
Anemia megaloblástica é um distúrbio ocasionado por um bloqueio na síntese do DNA, que se caracteriza por um estado em que a divisão celular se torna lenta, a despeito do crescimento citoplasmático. Esta anormalidade nada mais é do que uma assincronia da maturação do núcleo em relação ao citoplasma – as células se preparam para uma divisão que não ocorre e, como resultado, acabam se tornando maiores. As células mais afetadas são aquelas que possuem renovação mais rápida, como as precursoras da Medula Óssea (MO) e as células da mucosa do trato gastrointestinal.
O termo “Megaloblastose” não se refere a uma alteração no tamanho das hemácias circulantes, mas sim a uma anormalidade morfológica nos núcleos dos progenitores eritroides no interior da medula óssea. Os eritroblastos que desenvolvem essa alteração nuclear são reconhecidos como megaloblastos.
Os megaloblastos são reconhecidos como células defeituosas pelos macrófagos da medula óssea, sendo destruídos no interior da própria medula, um fenômeno que chamamos de eritropoiese ineficaz. Até prova em contrário, uma anemia megaloblástica deve ser atribuída à carência de vitamina B12 (cianocobalamina) e/ou ácido fólico (folato)
Epidemiologia
Fisiopatologia
Ácido Fólico
· O ácido fólico (folato ou ácido pteroilglutâmico) tem como principal fonte natural os vegetais verdes frescos (fonte mais importante), fígado, aveia e algumas frutas, nas quais ele se encontra sob a forma de poliglutamato (o cozimento prolongado pode destruir até 90% do folato alimentar). 
· A necessidade mínima diária da vitamina gira em torno de 50-200 µg micrograma, entretanto, durante períodos de demanda metabólica, como gravidez, lactação ou hemólise, as necessidades podem aumentar para 200-800 µg/dia. 
· O folato da dieta é absorvido pelo duodeno e jejuno proximal (mesmo local da absorção do ferro) que contêm enzimas em suas microvilosidades, chamadas carboxipeptidases, capazes de converter o poliglutamato em mono ou diglutamato, permitindo assim uma pronta absorção.
· Logo após ser absorvido, o folato circula no plasma como Metiltetraidrofolato (MHTF) sob a forma de monoglutamato, ligado a proteínas. 
· Ao penetrar nas células, o grupamento metil é retirado por uma enzima dependente da vitamina B12 (metionina sintase), liberando no citoplasma o Tetraidrofolato (THF), já na forma de poliglutamato – a forma ativa da vitamina. 
· O maior reservatório corpóreo de folato é o fígado, responsável por metade das reservas. 
· O folato é secretado na bile, para ser reabsorvido no jejuno (ciclo êntero-hepático do folato), além de ser excretado na urina. 
· O balanço negativo de folato geralmente é decorrente de uma dieta inadequada, da má absorção ou da utilização exagerada da vitamina. O estoque de folato dura pouco (como na maioria das vitaminas hidrossolúveis). 
· Na maioria das vezes, os sinais clínicos de deficiência de folato se desenvolvem cerca de 4-5 meses após o início das perdas. A má absorção de folato pode ser consequência de um distúrbio primário da mucosa duodenojejunal (ex.: doença celíaca, espru tropical), ou do uso de determinados fármacos que interferem com o processo de absorção como a sulfasalazina e alguns anticonvulsivantes. 
· A hemodiálise também causa perda excessiva do folato através da membrana do dialisador. 
· Existe uma interdependência do metabolismo do ácido fólico e da cobalamina, uma vez que a vitamina B12 é necessária para a manutenção do folato no meio intracelular (conversão do monoglutamato metiltetraidrofolato em poliglutamato tetraidrofolato).
· O Metiltetraidrofolato (MTHF) é a forma circulante do folato que precisa ser convertida na forma celular, o Tetraidrofolato (THF), ou “folato ativo”. 
· Isso é feito pela enzima metionina sintase, utilizando a cobalamina (vitamina B12) como cofator. 
· Perceba, portanto, que a deficiência de B12 impede a formação de THF a partir do MTHF, logo, reduz a forma ativa, intracelular, do folato.
· Em outras palavras: a deficiência de B12 provoca um “estado de deficiência celular de folato”.
· É através deste mecanismo que a deficiência de B12 prejudica a síntese de DNA, e isso explica porque a reposição de altas doses de ácido fólico pode resolver parcialmente a anemia megaloblástica por carência de B12.
Vitamina B12 (Figura 2) 
 
· A vitamina B12 ou cobalamina tem uma estrutura semelhante ao heme, mas, ao contrário deste último, não consegue ser sintetizada no corpo humano, devendo fazer parte da dieta (por isso, é uma vitamina). 
· A cobalamina não é encontrada em plantas, e as únicas fontes dietéticas são os compostos de origem animal, como carnes, ovos e laticínios. 
· Dessa forma, vegetarianos estritos, que não ingerem nenhum tipo de carne ou outros compostos animais (como leite, ovos e queijo), acabarão desenvolvendo deficiência de cobalamina caso não utilizem suplementos multivitamínicos. 
· A necessidade mínima de vitamina B12 (que corresponde às perdas) é de cerca de 2,5 µg (micrograma)/ dia (2,5 unidades/dia), e a quantidade corpórea total dessa vitamina é de aproximadamente 2-4 mg, com metade das reservas presentes no fígado. 
· O estoque corporal de cobalamina é bastante duradouro.
· Seriam precisos: 10-15 anos com dieta pobre em cobalamina para haver sinais clínicos de deficiência, caso a absorção não se encontre prejudicada; e 3-6 anos, caso a absorção da vitamina esteja prejudicada. 
· Esse fato, somado aos requerimentos mínimos dessa vitamina, nos faz concluir que a deficiência de vitamina B12 tem como etiologia mais frequente a má absorção, em vez da pobre ingestão alimentar. 
· A cobalamina da dieta vem sempre ligada às proteínas alimentares, precisando sofrer a ação do ácido gástrico e da pepsina para se desprender. 
· Durante a digestão gástrica, a vitamina B12 é liberada e imediatamente se liga a uma glicoproteína: o ligante R, secretado na saliva e na mucosa gástrica. 
· No duodeno, o complexo vitamina B12-Ligante R é dissolvido sob a ação das proteases secretadas pelo pâncreas. 
· Dessa forma, a vitamina B12 é liberada, sendo então captada pelo Fator Intrínseco (FI). O FI é uma glicoproteína produzida pelas células parietais do fundo e corpo gástricos, secretada em paralelo com o ácido clorídrico. 
· O complexo vitamina B12-FI é resistente à degradação proteolítica e prossegue até o íleo distal, onde receptores específicos situados na borda em escova da mucosa ligam o complexo e possibilitam finalmente a absorção da vitamina. 
· Além de evitar a degradação, o FI também funciona como um verdadeiro“guia” para a vitamina B12 alcançar o epitélio ileal. 
· Cerca de 99% da absorção da vitamina B12 só se dá ligada ao FI. 
· Uma pequena parcela (1%) é absorvida sem o FI, por difusão passiva por entre as células da mucosa intestinal. 
· No interior da célula da mucosa ileal, a cobalamina (vit. B12) se liga a uma proteína transportadora, a transcobalamina II (TC-II), que a transporta para o plasma. 
· Entretanto, a meia-vida da TC-II é muito curta, e a cobalamina que se desprende do carreador recém-destruído passa a ser carreada pela TC-I (quantitativamente, o maior carreador de vitamina B12 no plasma) e TC-III.
Quadro clínico
Manifestações Hematológicas 
· Decorrem de queixas referentes à anemia, como palpitações, fraqueza, cefaleia, irritabilidade . 
· É interessante notarmos que estes pacientes são capazes de tolerar baixíssimos níveis de hemoglobina, pois a anemia megaloblástica é uma anemia de instalação insidiosa. 
· Eventualmente, notamos petéquias e púrpuras devido à presença de trombocitopenia. 
Manifestações Digestivas 
· Podemos observar diarreia e perda ponderal, ambos decorrentes de má absorção. 
· Os pacientes muitas vezes queixam-se de uma sensação dolorosa na língua, que se mostra avermelhada e com atrofia de papilas (glossite – Figura 1A).
· A queilite angular, semelhante à observada na anemia ferropriva, também pode ser encontrada. 
Manifestações Neurológicas 
· Estas podem ocorrer com o hemograma absolutamente normal e somente com a vitamina B12 sérica baixa. 
· Entretanto, na maioria dos casos, existe anemia megaloblástica associada. 
· Os achados neurológicos ou, melhor dizendo, neuropsiquiátricos, incluem: 
(1) parestesia em extremidades (alteração mais precoce) decorrente de uma polineuropatia; 
(2) diminuição da sensibilidade profunda (proprioceptiva e vibratória); 
(3) desequilíbrio, marcha atáxica, sinal de Romberg, refletindo a perda da propriocepção inconsciente nos membros inferiores; 
(4) fraqueza e espasticidade nos membros inferiores, com sinal de Babinski, hiperreflexia profunda, refletindo uma síndrome piramidal nos membros inferiores; 
(5) deficits cognitivos, demência e psicoses. 
O acometimento da sensibilidade profunda (cordão posterior da medula espinhal) associado ao comprometimento dos feixes piramidais dá o nome de “síndrome dos sistemas combinados” ou “mielinose funicular” ao deficit neurológico da carência de B12. 
Anemia Perniciosa
· A anemia perniciosa é uma doença caracterizada pelo desenvolvimento de autoanticorpos que atacam as células do corpo e fundo gástricos (células parietais), reduzindo tanto a produção de ácido e pepsina quanto de Fator Intrínseco. 
· O resultado é o desenvolvimento de hipocloridria e anemia megaloblástica por má absorção de B12. 
· A anemia perniciosa é a causa mais comum de deficiência de cobalamina descrita na literatura. 
· Afeta indivíduos entre 45-65 anos, sendo rara antes dos 30 anos. É ligeiramente mais comum em mulheres (1.6:1) de origem nórdica, com olhos azuis e que possuem cabelos brancos precocemente. 
· A anemia perniciosa é fator de risco para o adenocarcinoma gástrico. 
· Os anticorpos anticélulas parietais estão presentes em 90% dos pacientes, enquanto os anticorpos anti-Fator Intrínseco são encontrados em 60%, inibindo a ligação do FI com a vitamina B12. 
· A anemia perniciosa está associada a outras afecções autoimunes, como a tireoidite de Hashimoto (hipotireoidismo), o vitiligo, a insuficiência suprarrenal idiopática (doença de Addison), o hipoparatireoidismo e a doença de Graves. 
· Além dos fenômenos imunológicos, a própria hipocloridria resultante dificulta a liberação de vitamina B12 da proteína alimentar para união com o Ligante R, etapa anterior à sua captação pelo fator intrínseco.
Deficiência de Ácido Fólico
· Os pacientes com deficiência de folato geralmente estão mais desnutridos do que aqueles deficientes em cobalamina. 
· As manifestações clínicas são semelhantes às da anemia por deficiência de vitamina B12, exceto por dois fatores importantes: 
(1) os achados do aparelho digestivo são mais exuberantes.
 (2) não ocorrem manifestações neurológicas. 
· A deficiência de folato (e a deficiência de cobalamina também) pode cursar com hiperpigmentação difusa da pele, ou somente das pregas cutâneas
Diagnóstico
Sangue periférico
Hemograma
· O VCM está caracteristicamente aumentado, podendo atingir valores de até 140 fL. Embora existam outras causas de macrocitose que não a anemia megaloblástica, quando nos deparamos com um VCM superior a 110 fL, o diagnóstico é bem provável, quando além de 120 fL, praticamente não há outro diagnóstico. 
· O CHCM encontra-se com valores normais, uma vez que a síntese da hemoglobina continua e muitas vezes preenche toda a célula. 
· É comum a anisocitose, com aumento do RDW. Uma análise dos hemogramas anteriores frequentemente revela aumento progressivo do VCM ao longo de meses ou anos 
Sangue Periférico 
· A alteração mais característica de anemia megaloblástica no esfregaço de sangue periférico é a chamada hipersegmentação do núcleo dos neutrófilos (Figura 1A), que pode ser definida pelos seguintes critérios: 
(1) achado de apenas um neutrófilo contendo seis ou mais lobos (normal 3 lobos)
(2) presença de pelo menos 5% de neutrófilos com cinco lobos. 
· O achado desses neutrófilos plurissegmentados é quase patognomônico de anemia megaloblástica.
Medula óssea mielograma
· A medula geralmente é hipercelular, com uma diminuição da relação mieloide/eritroide.
· Podemos identificar ferro corável em teores expressivos. 
· As alterações morfológicas megaloblásticas (nucleares) costumam ser vistas em todos os tipos celulares, porém são mais intensas e frequentes na linhagem vermelha. 
· Os eritroblastos estão aumentados de volume, com importante assincronia núcleo/citoplasma, isto é, um atraso na maturação do núcleo quando comparado ao citoplasma. 
· O núcleo imaturo apresenta uma cromatina granulada, ou com aspecto “em peneira”, enquanto que o citoplasma encontra-se desproporcionalmente hemoglobinizado (“avermelhado”) – Figura 1C. 
· Observamos também alterações nos precursores dos granulócitos e plaquetas.
Dosagem das vitaminas (Cobalamina e Folato Séricos) 
· Os teores de vitamina B12 e folato no sangue devem ser solicitados. 
· Níveis normais de vitamina B12 encontram-se entre 200 e 900 pg/ml. 
· Uma B12 sérica acima de 300 pg/ml torna improvável o diagnóstico de carência da vitamina, enquanto que uma dosagem abaixo de 200 pg/ml praticamente o confirma. 
· Entre 200- 300 pg/ml (normal baixa) é a faixa de incerteza. 
· A dosagem da B12 pode sofrer influência de artefatos provocados pelo radioimunoensaio e por hepatopatia crônica – valores falsamente elevados. 
· A presença de mieloma, gravidez, deficiência concomitante de folato, anemia aplástica e altas doses de vitamina C nos fornecem valores falsamente baixos. 
· O folato sérico apresenta níveis de 2,5 a 20 nanograma/ ml. 
· Um folato sérico abaixo de 2 nanograma/ml torna provável o diagnóstico de carência de folato, enquanto que acima de 4 ng/ml, em termos práticos, exclui este diagnóstico. 
· O folato sérico deve ser colhido sempre em jejum e em pacientes sem história de anorexia, caso contrário, não é um exame confiável (o folato sérico varia agudamente com a alimentação). 
· Mais uma vez há uma faixa de incerteza: entre 2-4 ng/ml. 
· Neste caso, dosamos o folato eritrocitário (mais confiável).
· Devemos lembrar, também, que a deficiência de vitamina B12 pode levar a aumentos do folato no sangue: como a cobalamina é necessária para a manutenção do folato no interior das células, em sua ausência, este se “desvia” para o soro. 
Pesquisa de metabólitos 
· Nos casos de dúvida diagnóstica, a dosagem sérica de ácido metilmalônico e de homocisteína total pode auxiliar na diferenciação das duas anemias megaloblásticas. 
· Ambos os metabólitos estão aumentados em cerca de 95% dos casos de deficiência de vitamina B12, enquanto que o aumento de homocisteína (sem aumento do ácido metilmalônico) ocorre em 91% na deficiênciade folatos. 
· No entanto, o alto custo desses exames faz com que sejam reservados para situações de dúvidas diagnósticas.
Tratamento
A mais importante medida no tratamento dessas anemias consiste em identificar a causa e removê-la, se possível. Só excepcionalmente há necessidade de tratar esses pacientes com transfusões sanguíneas, uma vez que a reposição adequada do nutriente é acompanhada de pronta resposta, com rápida normalização hematológica. Nos casos em que há concomitância com carência de ferro, o tratamento deve ser simultâneo, caso contrário não haverá recuperação completa dos níveis de hemoglobina. 
Tratamento da carência de vitamina B12
· Na grande maioria dos pacientes com deficiência de cobalamina o problema está na má absorção dessa vitamina. 
· Assim, a via de administração tradicional é a parenteral. 
· A vitamina B12 é prescrita sob a forma de cianocobalamina ou hidroxicobalamina
· O mais clássico consiste numa dose intramuscular de 1.000 µg (1.000 unidades), inicialmente uma vez ao dia durante sete dias, seguida da mesma dose uma vez por semana por quatro semanas, e daí em diante uma dose mensal para o resto da vida do paciente. 
· Já foi descrito também um tratamento bem sucedido com a forma oral de cobalamina, a vitamina B12 cristalina, 2 mg (2.000 µg) por dia, baseando-se no princípio de que 1% da vitamina é absorvido mesmo na ausência do FI. 
· Pacientes idosos com atrofia gástrica e má absorção por dificuldade de dissociação da vitamina B12 do alimento e vegetarianos beneficiam-se preventivamente com doses orais da vitamina em torno de 50 g/ dia (doses maiores podem ser usadas sem efeitos indesejáveis).
 Tratamento da carência de folato 
· Correção da dieta, aumentando a ingestão de verduras. 
· A deficiência de folato é tratada com terapia de reposição, na dose usual de 1-5 mg/dia por via oral. 
· Se o problema estiver na absorção, doses de até 15 mg/dia podem ser utilizadas, sendo rara a necessidade do folato parenteral.
· A quantidade de folato absorvida quando se usam doses terapêuticas é geralmente suficiente para tratar a carência, 
· A duração da terapia depende do grau de deficiência. 
· A dieta deve ser corrigida, para que não haja recidiva do quadro carencial após o fim do tratamento. 
· Tratamento permanente é necessário em pacientes que têm doenças que aumentam o consumo de folatos, como anemias hemolíticas crônicas e pacientes submetidos à diálise.
 Resposta ao tratamento 
· A melhora subjetiva acontece em 48 horas, com o restabelecimento da hematopoese normal. 
· Como pode ocorrer modificação da estrutura da medula óssea com uma simples refeição hospitalar, a punção de medula óssea para fins diagnósticos deve ser realizada o mais rapidamente possível. 
· A contagem do reticulócitos aumenta até atingir o pico no 5º ao 8º dia, e sua elevação é proporcional ao grau de anemia. 
· A hemoglobina e o hematócrito começam a melhorar já na primeira semana, e a hemoglobina deve atingir o seu valor normal em cerca de um mês. 
· Se isso não ocorrer, deve ser investigada a associação da anemia megaloblástica com outras doenças que cursam com anemia hipocrômica. 
· O número de neutrófilos normaliza em uma semana e a hipersegmentação desaparece em 10-14 dias. 
TESTES TERAPÊUTICOS 
· Os testes terapêuticos são usados quando há dúvida diagnóstica entre anemia megaloblástica e outras doenças que têm manifestações clínicas semelhantes, ou quando não estão disponíveis os métodos de dosagens. 
· Empregam-se doses de 1 mg de ácido fólico oral por 10 dias ou 1 mg de vitamina B12 parenteral por 10 dias. 
· Quando se utiliza o tratamento correto para a forma de carência presente, ocorre uma elevação dos reticulócitos, que inicia no 2º ao 3º dia, atingindo o pico máximo no 5º ao 8º dia, acompanhado de queda dos níveis séricos de Desidrogenase Láctica (LDH). 
· É importante enfatizar que se não houver resposta dentro de dez dias, deve ser realizado exame de medula óssea para a identificação de outra possível causa, como síndrome mielodisplásica. 
3. ENTENDER O METABOLISMO DO FERRO.
O FERRO NO ORGANISMO 
· O ferro faz parte do grupo heme, que integra numerosas proteínas do organismo, como citocromos, citocromo oxigenase, peroxidases, catalase, mioglobina e hemoglobina. 
· Sendo um metal pesado, o ferro livre é quase insolúvel e bastante tóxico, e por isso durante todo o seu ciclo metabólico está sempre ligado a proteínas de transporte ou funcionais.
· O homem adulto possui cerca de 3-4 g de ferro (ou seja, 3545 mg de ferro/kg de peso), quantidade em média 30-40% menor em mulheres em idade fértil em consequência à perda periódica de sangue na menstruação. 
· Mais de dois terços do conteúdo de ferro do organismo encontra-se incorporado à molécula de hemoglobina.
· Assim, a hemoglobina é a principal forma funcional de ferro no organismo e também seu principal depósito, e por isso a anemia é a manifestação clínica mais proeminente da carência de ferro. 
· Aproximadamente 1 mL de concentrado de hemácias contém 1 mg de ferro. 
· No homem, cerca de 2 g de ferro estão presentes na hemoglobina, enquanto que, em mulheres, esse valor corresponde a 1,7 g. 
· A mioglobina tem uma estrutura muito semelhante à hemoglobina, sendo no entanto um monômero e não um tetrâmero, e funciona como uma proteína para depósito de oxigênio nos músculos, de onde o O2 é liberado durante o exercício. 
· Presente em todas as células dos músculos esquelético e cardíaco, o organismo humano contém um total de cerca de 300 mg de ferro na mioglobina. 
· As demais formas de ferro funcional nos tecidos (citocromos e enzimas) representam 0,5% do total de ferro do organismo. 
· Além da hemoglobina, o organismo armazena ferro em diferentes tecidos sob formas de ferritina e hemossiderina. 
· A quantidade de ferro nos depósitos é muito variável, mas equivale a 800 a 1.000 mg em um homem adulto, e cerca de 300 mg na mulher adulta. 
· A ferritina, proteína presente no citoplasma da maioria das células, tem importante papel na estocagem do ferro (estoca até 4.500 átomos de ferro). 
· É composta por 24 subunidades, com dois subtipos denominados H (Heavy ou Heart) e L (Light ou Liver), codificados por genes localizados nos cromossomos 11q e 19q, respectivamente.
· A ferritina H é pouco maior que a ferritina L e tem ação ferroxidase importante. 
· A maior parte da ferritina sintetizada é usada na estocagem do ferro, entretanto pequena quantidade é secretada e liberada no soro (ferritina sérica), quantidade esta que se correlaciona com o estoque total de ferro no organismo. 
· Por isso, a dosagem de ferritina plasmática é um exame importante para avaliar os depósitos de ferro do organismo.
· A outra forma de depósito de ferro no organismo é a hemossiderina, que corresponde a um agregado heterogêneo de ferro, componentes do lisossomo e outros produtos da digestão intracelular.
· Ela restringe-se aos macrófagos da medula óssea, do fígado e baço, representando pequena fração do ferro de estoque que pode, todavia, estar dramaticamente aumentada na sobrecarga de ferro.
· A destruição de hemácias senescentes ocorre nos macrófagos, principalmente do baço e medula óssea. 
· O ferro dos depósitos e aquele liberado pela destruição das hemácias são reutilizados para a síntese de hemoglobina. 
· Dessa forma, o ferro é transferido dos depósitos, principalmente os macrófagos, para os eritroblastos em desenvolvimento. Essa mobilização do ferro dos depósitos torna possível a reutilização 25 a 30 mg de ferro por dia, o que corresponde à necessidade diária de ferro para a eritropoese.
DIETA E ABSORÇÃO DE FERRO 
· A absorção intestinal é um processo finamente regulado em resposta às alterações da necessidade de ferro pelo corpo. 
· Em geral é absorvido 0,5-2,0 mg/dia.
· Entretanto, essa absorção depende do depósito corporal de ferro, da hipóxia e do ritmo de eritropoese.
· A deficiência de ferro, por exemplo, é capaz de estimular a absorção de qualquer forma de ferro, embora seja menos eficiente no estímulo de absorção do ferro heme.
· A quantidade

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