Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Sotaques da Língua Inglesa APRESENTAÇÃO Existem diferentes formas de se utilizar uma mesma língua, que variam de acordo com o contexto em que os interlocutores se encontram e também com a identidade social e cultural dos falantes. Essas diferentes formas que uma língua pode assumir são chamadas variedades linguísticas. Essas variedades ocorrem, principalmente, em diferentes contextos geográficos, como o inglês dos Estados Unidos, da Inglaterra, da Irlanda, da Escócia, da Austrália, do Canadá, da África do Sul, da Nigéria, da Índia, entre outros. Além dessas diferenças, o uso da língua em situações reais de interação também apresenta variações, pois nem sempre obedece aos padrões de normas gramaticais da língua inglesa. Nesta Unidade de Aprendizagem, você refletirá e compreenderá melhor os sotaques da língua inglesa, ao relacionar fonologia, variação linguística e pronúncia. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Relacionar fonologia e variação linguística, considerando os diferentes sotaques da língua inglesa. • Identificar diferentes variedades de pronúncia em língua inglesa.• Descrever aspectos determinantes das variedades de pronúncia em língua inglesa.• INFOGRÁFICO Os aspectos fonológicos da variação linguística são evidenciados pela maneira de se pronunciar as palavras de uma língua. Determinadas por mudanças histórico-temporais e espaciais e também por aspectos sociais, as variações de pronúncia e o sotaque trazem a marca identitária dos falantes. Pode-se identificar de onde vem o falante a partir do seu sotaque. No Infográfico, veja como ocorrem essas variações de pronúncia. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! CONTEÚDO DO LIVRO A Sociolinguística é um ramo da Linguística que estuda a língua a partir de seu contexto social e como se dá a interação, atitudes e comportamentos dos falantes, considerando não só fatores linguísticos, mas também extralinguísticos e como eles influenciam os fenômenos de variação presentes em todas as línguas. Essa área de estudos, interdisciplinar, estuda as variações linguísticas entre outros comportamentos dos falantes, como preconceito linguístico e o bilinguismo. No capítulo Sotaques da língua inglesa, da obra Fonética da língua inglesa, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você examinará as variações linguísticas que formam os diferentes sotaques da língua inglesa, identificando as variedades de pronúncia e os fatores que as determinam. Boa leitura. FONÉTICA DA LÍNGUA INGLESA Elisa Lima Abrantes Sotaques da língua inglesa OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: > Relacionar fonologia e variação linguística, considerando os diferentes sotaques da língua inglesa. > Identificar diferentes variedades de pronúncia em língua inglesa. > Descrever aspectos determinantes das variedades de pronúncia em língua inglesa. Introdução A sociolinguística é um ramo da linguística que estuda a língua a partir de seu contexto social, levando em consideração fatores linguísticos e extralinguísticos e sua influência para os fenômenos de variação e mudanças presentes em todas as línguas. Para os sociolinguistas, a língua é heterogênea, e a variação, uma realidade social, de modo que existem diferentes opções de realizações possíveis para deter- minada função linguística, as quais não afetam o processo de comunicação. Ou seja, as variantes constituem os diversos modos de se dizer a mesma coisa, remetendo ao mesmo estado de coisas, em um mesmo contexto de interação verbal. No entanto, esses modos não são aleatórios. De acordo com Labov (2008), a teoria da variação linguística pressupõe que a heterogeneidade é inerente a todas as línguas, sendo ordenada por restrições linguísticas e extralinguísticas. Essas restrições levam o falante a usar certas formas e não outras ao fazer uso de sua língua. Para Alkmim (2005), existem quatro tipos de variações linguísticas: a va- riação diacrônica, que resulta de mudanças ocorridas ao longo da história de uma língua; a variação diatópica, causada por fatores geográficos; a variação diastrática, que resulta de fatores sociais, como idade, sexo, classe social, entre outros; e a variação diafásica ou estilística, que diz respeito à adequação a um determinado contexto de uso. As variações diatópica, diastrática e diafásica são sincrônicas. As variedades de pronúncia que caracterizam os diferentes sotaques em língua inglesa se alinham principalmente à variação diatópica, objeto de estudo deste capítulo. Neste capítulo, você conhecerá a articulação entre fonologia e variação linguística, considerando os diferentes sotaques da língua inglesa. Além disso, conhecerá diferentes variedades de pronúncia em língua inglesa, bem como os aspectos determinantes das variedades de pronúncia dessa língua. Fonologia e variação linguística em sotaques da língua inglesa Na década de 1960, com os estudos do linguista estadunidense William Labov, surgiu a sociolinguística, como uma reação aos estudos da década anterior, representados pela linguística gerativista de Chomsky, em 1957, que concebia a língua como um sistema de princípios universais e a competência que o falante nativo tem como um conhecimento inato de sua língua, isto é, uma gramática universal interna, com regras de formação de sentenças gramaticais. Essa teoria considerava um falante-ouvinte ideal, e a língua, uma unidade abstrata, homogênea e desvinculada do contexto social. Contudo, Labov criticou essa desvinculação e considerou fundamental o componente social na análise linguística. Para ele, o objeto da sociolinguística é o estudo da língua falada em relação ao contexto social, a partir da comunidade linguística, isto é, o conjunto de indivíduos que interagem verbalmente e partilham um conjunto de normas relativas aos usos da língua (LABOV, 2008). Cabe destacar que a sociolinguística é um ramo da linguística de caráter multidisciplinar, pois flerta com a antropologia e a sociologia, além de enten- der a língua como um complexo heterogêneo, dinâmico e fluido, que é sempre um reflexo da sociedade que a utiliza. Sendo assim, sob essa perspectiva, todas as línguas apresentam variações, variando de acordo com os contextos histórico-temporal, geográfico, social e de uso da língua. Desse modo, den- tro de uma mesma comunidade, podem ocorrer variações, devido a fatores políticos, de escolaridade, de gênero, religiosos, econômicos, entre outros. Sotaques da língua inglesa 2 Todavia, a variação também pode ocorrer entre diferentes comunidades, devido, sobretudo, a fatores geográficos, como os diferentes sotaques, por exemplo. Segundo Monteiro (2008, p. 47-50): Sotaque: refere-se apenas a diferenças de pronúncia, à maneira como um falante pronuncia e, por conseguinte, a uma variedade que é foneticamente e/ou fonologi- camente distinta de outras variedades. Idioleto: é a maneira de falar característica de um indivíduo. Numa comunidade, não há duas pessoas que falem igualmente, empregando os mesmos tipos de construção sintática, uma frequência igual na seleção de vocábulos ou uma realização de fonemas sem distinção. Socioleto: também denominado de dialeto social, é o uso linguístico próprio de uma classe ou categoria social específica. Para Mattoso Câmara Júnior (1996, p. 279), “[...] sotaque, também dito impropriamente acento, é o conjunto de traços fonológicos específicos que caracterizam a pronúncia numa modalidade regional de uma língua, ou a pronúncia de uma língua falada por estrangeiros aloglotas [de língua distinta]”. Portanto, o sotaque é uma variação determinada pelo contexto geográfico, classificada como diatópica (do grego dia = através de, e topos = lugar). Em relação à classificação dessas variações, tem-se quatro tipos, um diacrônico e três sincrônicos, conforme Alkmim (2001 apud MESSIAS, 2015, p. 220):A variação diacrônica, que resulta de mudanças ocorridas ao longo da história de uma língua. No plano sincrônico, temos a variação diatópica, causada por fatores geográficos; a variação diastrática, resultado de fatores sociais, como idade, sexo, classe social, entre outros. E por último, a variação diafásica ou estilística, que diz respeito à adequação a um determinado contexto. Essas variantes podem ocorrer dentro de um país, de um estado, de uma cidade ou de um grupo de pessoas. Em geral, as modificações são fonológicas, ou seja, na pronúncia, traço distintivo entre as diversas possibilidades de realização sonora. Desse modo, a mesma palavra é pronunciada de maneira diferente. Por exemplo, a palavra better (melhor) é pronunciada com a con- soante “t” marcada e o final “er” como “ã” em inglês britânico ('béttar); no inglês norte-americano, mais aberto, o “t” é pronunciado como “r” ('bérer'); e inglês australiano não pronuncia todas as letras ('bérã). Além disso, pode haver variações no léxico, quando são utilizadas palavras diferentes para falar da mesma coisa; por exemplo, a palavra calçada é pavement em inglês britâ- nico, sidewalk em inglês norte-americano e footpath em inglês australiano. Tomando como base as variantes inglês estadunidense e inglês britânico, um traço distintivo marcante são os fonemas róticos (da família do 'r'; 'r' forte Sotaques da língua inglesa 3 e 'r' fraco). O inglês britânico é não rótico, ou seja, não se pronuncia o /r/ nas palavras, a menos que ele seja seguido por uma vogal, como em /red/ ou / bedroom/. Por exemplo, /hard/ é pronunciado como /haad/, e /car/, como / caa/. Já o inglês estadunidense é rótico, ou seja, o /r/ é pronunciado, de modo que, nos exemplos anteriores, as pronúncias seriam /hard/ e /car/, com o “r” marcado. Outra característica marcante no inglês estadunidense é que o “t” entre vogais é pronunciado como um “d” suavizado, o que faz as palavras writer e rider terem pronúncias bastante similares. Os falantes britânicos geralmente pronunciam o “t” como /t/. Na língua inglesa, falada por uma enorme quantidade de pessoas em todo o mundo, é natural que existam muitas variedades, mas as mais significativas, das quais derivam as outras, são: o inglês britânico, falado com variações na Inglaterra, na Escócia, no País de Gales, na Irlanda do Norte e na Irlanda; e o estadunidense. Apesar do código oficial, tanto no Reino Unido quanto nos Estados Unidos, existem variantes regionais e sociais, e a língua socialmente mais aceita é tida como modelo e entendida por todos. Pode-se comparar essas variações entre o inglês norte-americano e o britânico com o caso do português falado em Portugal e no Brasil e as variações existentes nas regiões desses países. A língua portuguesa é a mesma, compreendida por todos os falantes, porém há diferenças de pronúncia, de ortografia e de léxico. Como visto, fonologicamente, existem algumas diferenças principais entre os sotaques norte-americano, britânico e australiano, bem como o inglês falado por canadenses, sul-africanos, neozelandeses, entre outros. Essas modificações na produção de sons da língua se devem aos contextos daquelas regiões. A seguir, serão apresentados alguns exemplos de variações fonológicas no inglês australiano, canadense e sul-africano para ilustrar essa afirmação. Muitas vezes, a variação diatópica está associada à etnia colonizadora de uma comunidade, uma vez que a língua do povo colonizador acaba influen- ciando a língua da região colonizada. A Austrália, por exemplo, foi mapeada e reivindicada para a Grã-Bretanha pelo oficial da Real Marinha Britânica, James Cook, em 1770, para funcionar como colônia penal. O contato com aborígenes e a chegada gradativa de britânicos influenciaram a constitui- ção do chamado inglês australiano. Fonologicamente, esse tipo de inglês se diferencia das demais variantes do inglês, principalmente na pronúncia das vogais. Em algumas palavras, o som /ei/ é pronunciado /ai/. A palavra day, por exemplo, é pronunciada como /dai/, e não /dei/, como na maioria das outras variantes. Outras palavras, como mate (parceiro) e fate (destino), soam, respectivamente, como /mait/ e /fait/. No geral, a pronúncia do inglês Sotaques da língua inglesa 4 australiano se aproxima mais do inglês britânico do que do norte-americano, em virtude da influência histórica do Reino Unido naquele país. No caso do inglês canadense, a pronúncia varia de região para região, principalmente por ser um país bilingue, anglófono, francófono e de grandes dimensões. O desenvolvimento da língua inglesa no Canadá incorporou em- préstimos das línguas indígenas e do francês, com ampliação e adaptação do vocabulário e a criação de novas palavras; mistura expressões estadunidenses e ortografia britânica. Os falantes nativos de regiões francófonas do país têm um sotaque mais carregado. O inglês canadense segue o estilo britânico, apesar da proximidade com os Estados Unidos e de os falantes pronunciarem algumas palavras como os estadunidenses. Em comparação com o inglês dos Estados Unidos, no inglês do Canadá, as vogais são pronunciadas de forma mais prolongada, e alguns fonemas são substituídos quando antecedem consoantes surdas, como no caso da palavra about, por exemplo, em que se substitui o som /ou/ por /u/. Existem também as expressões cotidianas próprias do Canadá. O inglês sul-africano tem por característica a variação por classes sociais, divididas em três grupos: o inglês falado pelas classes mais altas, muito próximo fonologicamente do inglês do sul da Inglaterra, como a pronúncia padrão do Reino Unido, a RP (received pronunciation); o inglês falado pela classe média, com influência do africâner, língua que deriva do holandês, já que os holandeses se estabeleceram no país desde meados do século XVII até o século XIX; e o inglês falado pela classe operária e pelos falantes do africâner que têm o inglês como segunda língua, trazido com a colonização britânica, no século XIX, cuja realização fonológica é fortemente influen- ciada pelo africâner, o zulu e outras línguas africanas. Há variações na pronúncia de vogais e consoantes, como o /I/, que, na maioria das palavras, é pronunciada com o som de schwa /ə/, ou seja, de forma neutra como a vogal “a” em about. As variedades de pronúncia de diferentes regiões e países de língua inglesa podem ser consultadas em dicionários de fonética, livros de viagem com frases do cotidiano do país (phrasebooks) e sites da internet que informam sobre o país ou a região que se deseja verificar. É importante conhecer os símbolos do Dicionário Internacional de Fonética (IPA, International Phonetic Alphabet) para identificar vogais longas e breves, ditongos e sons consonantais. Confira, a seguir, um quadro simplificado desse alfabeto, cuja versão completa pode ser encontrada no site da IPA. Sotaques da língua inglesa 5 Fonte: Fernanda (2019, documento on-line). Variedades de pronúncia em língua inglesa A língua inglesa, além de ser a língua oficial de países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Irlanda, Austrália e Nova Zelândia, é a língua oficial per jure (por lei) de 41 estados e territórios soberanos membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e em 27 não soberanos, além de em dois estados não membros da ONU. Em muitos casos, o inglês não é a língua principal do país, mas é utilizado como língua internacional, de negócios, na educação e no direito. Além disso, como o inglês se tornou a língua franca dos séculos XX e XXI, países como o Brasil fazem uso da língua inglesa como língua estrangeira para relações internacionais e negócios, turismo, entretenimento, mídia e comunicação com estrangeiros em geral. Atualmente, o inglês ultrapassou barreiras políticas e passou a pertencer ao mundo. Na obra The Handbook of World Englishes, de Braj Kachru, Yamuna Kachru e Cecil Nelson (2009), a expansão global da língua inglesa é explicada pela existência de quatrodiásporas, em diferentes períodos histórico-temporais. A primeira refere-se ao avanço da língua por outras terras da própria Grã Bretanha: País de Gales, Escócia e Irlanda; a segunda, para as colônias na América do Norte (Estados Unidos) e Oceania (Austrália e Nova Zelândia); a terceira é aquela que levou o inglês para novos contextos linguísticos, culturais e sociais, na empreitada colonizadora do império britânico, como Sotaques da língua inglesa 6 leste, sudeste e sul da Ásia, a África Oriental, Ocidental e do Sul e o Caribe; e, por fim, a quarta diáspora, a dos dias atuais, em que o inglês, em muitas instâncias, tornou-se a língua franca. Como pode-se perceber, os sotaques são bastante diversos ao redor do mundo, e é importante para o falante se comunicar em diferentes situações e contextos. Os professores de inglês devem oferecer aos alunos oportunidades de entrarem em contato com a língua inglesa em suas diversas variedades de ritmos e sotaques, sem privilegiar as culturas hegemônicas, como a Inglaterra e os Estados Unidos, mostrando aos estudantes que não se trata de línguas diferentes, mas sim de formas diferentes de se utilizar uma mesma língua. Essas formas caracterizam identidades próprias de cada localidade e suas necessidades de comunicação. As variedades não impossibilitam a comunicação entre os falantes da mesma língua, no entanto, socialmente, é atribuída uma carga maior ou menor de prestígio a cada uma delas, em virtude de aspectos históricos e econômicos, principalmente. Na contemporaneidade, o ensino de inglês deve levar em consideração esses aspectos e preparar os alunos para utilizarem a língua inglesa como língua franca, como forma de comunicação com outros povos, nativos de países anglófonos ou não. Por essa razão, os professores devem trabalhar com seus alunos o alfabeto fonético internacional, a pronúncia de sons individuais, como vogais, consoantes e ditongos, bem como elementos suprassegmentais, como tonicidade da frase, ritmo e entonação, para que a sua fala seja inteligível. Os exercícios de audição também devem ser privilegiados, e as amostras escolhidas devem contemplar diversas variedades do inglês, como o sota- que britânico, estadunidense, canadense, irlandês, escocês, galês, indiano, sul-africano, australiano, entre outros. Trabalhar algumas características fonológicas de cada variedade apresentada será interessante para o aluno, bem como motivará um debate sobre a variação linguística. Aqui, o professor poderá, ainda, discutir o preconceito linguístico e a questão do sotaque como marca da identidade de uma região ou país. Em todos os países anglófonos, existe a língua padrão, ou o Standard English, uma língua-modelo que obedece à gramática normativa e serve de referência. Essa é a língua ensinada nas escolas de países em que se fala inglês e a que é ensinada aos estudantes de inglês como língua estrangeira. De acordo com Carter et al. (2011), existem várias formas do Standard English no mundo, como o inglês estadunidense, inglês canadense, inglês australiano, inglês britânico, entre outras. Cada uma dessas diferentes formas de inglês representa a linguagem culta utilizada oficial e institucionalmente em deter- Sotaques da língua inglesa 7 minado país. Elas variam em alguns aspectos na pronúncia, mas não há muita variação nos aspectos gramaticais. As variedades não padrão do inglês, ou Non Standard English, são variações do dia a dia, dialetos de diversos grupos sociais que não seguem as regras do inglês-padrão; como exemplo, tem-se os patoás (patois), que são diferentes formas, mais ou menos rudimentares, de comunicação entre falantes de línguas diferentes. Segundo Monteiro (2008, p. 46), dialeto “[...] é uma variedade subordinada a uma dada língua, que assim seria entendida como a soma de vários diale- tos”. O autor afirma, ainda, que, em geral, um dialeto se circunscreve a uma zona ou região territorial, que frequentemente coincide com as fronteiras ou barreiras geográficas. Já para Câmara Júnior (1996, p. 115), os dialetos são “[...] falares regionais que apresentam entre si coincidência de traços linguísticos fundamentais. Cada dialeto não oferece uma unidade absoluta em todo o território por que se estende”. Observando essas definições, pode-se dizer que dialetos são subconjuntos da língua e possuem menos prestígio do que ela. Para saber mais sobre os diferentes sotaques na Inglaterra e sua associação com as classes sociais, assista ao filme My Fair Lady (1964), de George Cukor. No site IMDb, é possível assistir clips e trailers do filme. Aspectos determinantes nas variedades de pronúncia em língua inglesa Historicamente, a língua inglesa tem origem nas ilhas britânicas, no século V, com as invasões sofridas naquele território por tribos de origem germânica — anglos, saxões e jutos —, que chegaram à região por volta do ano 450. A partir daquele momento, as línguas célticas, já romanizadas em algumas regiões, foram sendo apagadas e substituídas pelo que é chamado de inglês antigo, originado das línguas germânico-escandinavas; o latim permanecia como língua da Igreja. No século XI, com a invasão normanda, em 1066, a língua oficial da Grã-Bretanha passou a ser o francês. O latim continuava como a língua eclesiástica, e o inglês antigo, amalgamado com o francês e o latim, deu origem ao inglês médio, que perdurou até os séculos XV e XVI. A ampliação da chamada grande mudança vocálica, que teve seus primórdios no século XII, no sul da Inglaterra, mudou a pronúncia das vogais longas, que mudaram o seu ponto de articulação, transformando a pronúncia para o que se entende hoje como inglês moderno. Sotaques da língua inglesa 8 A expansão da língua inglesa, como visto na seção anterior, se deu por meio de quatro diásporas. A primeira se deu nos territórios próximos, como a Irlanda, que já no século XII (1170) foi tornada a primeira colônia inglesa; e o País de Gales, no século XIII (1277). A Escócia se uniu à Inglaterra no século XVII (1603), quando o rei escocês James VI recebeu de herança o reino da Inglaterra, com a morte de sua prima, Elizabeth I. A segunda diáspora da língua inglesa se dá também no século XVII, com a chegada dos peregrinos nos Estados Unidos; e no século XVIII, com a reivindicação do território da Austrália. A terceira se estendeu por todo o século XIX, com a expansão do império britânico. Por fim, a quarta diáspora ocorreu nos séculos XX e XXI, com a língua inglesa como língua franca para negócios, comércio, relações internacionais, mídia, entretenimento, turismo e comunicação entre povos de línguas diferentes. Portanto, as palavras sofrem influência histórica por parte de invasores e colonizadores, além de povos locais, como, por exemplo, a Austrália e o Canadá, com a influência dos povos aborígenes, e a África do Sul, com a in- fluência das línguas nativas, como o zulu. Além disso, destaca-se a questão das fronteiras, visto que muitos países são cercados por outros de língua distinta. Nesses casos, tanto a outra língua quanto dialetos próximos a essas regiões afetam a construção do idioma, como é o caso da Jamaica, onde o inglês sofre influência das línguas africanas. Segundo Monteiro (2008), em casos assim, um dialeto se circunscreve a uma região territorial que coincide com as fronteiras, e, ao se tentar estabelecer limites entre diferentes diale- tos, considera-se mais os fatos sociais do que os linguísticos. Aqui, tem-se o surgimento de patoás (patois), que são realizações orais de fala utilizadas por grupos restritos, geralmente rurais. Nessa categoria, tem-se os pidgins, línguas de contato criadas a partir da mistura de duas ou mais línguas, que servem como meio de comunicação entre falantes dessas línguas e apresen- tam vocabulário restrito e regras gramaticais rudimentares; e a língua crioula (creole), derivada de um pidgin, que desenvolve vocabulário mais amplo e um sistema gramatical mais rico, devido ao contatocom a língua de prestígio padrão daquela região. Toda língua sofre influências histórica e social de outras línguas, e o que a teoria da variação de Labov aponta é a realidade concreta da língua, que muda no tempo (historicamente) e no espaço (geograficamente), bem como socialmente. Nesse sentido, Bagno (2007) aponta que a língua é múltipla, instável e está sempre em desconstrução e reconstrução, pois é uma ativi- dade social, um trabalho coletivo empreendido por todos os seus falantes ao interagirem por meio da fala e da escrita. Sotaques da língua inglesa 9 Se a língua é parte da identidade de um povo, é natural que se compre- enda que cada grupo social, geográfico e histórico produza e utilize a sua própria variedade, de acordo com as suas necessidades e características. Com essa sucessão de variedades linguísticas, a sociedade escolhe apenas uma como modelo, o padrão a ser seguido. Essa escolha é influenciada por fatores políticos e econômicos, e não linguísticos. A norma elitizada é vista como única e correta, ao passo que as demais variedades são consideradas menores; isso é o que se chama de preconceito linguístico. Como visto, o aspecto da dominação linguística tem lugar nos processos de colonização e invasões, e o contato com outras línguas locais modifica uma determinada variedade linguística, como, por exemplo, o inglês britânico e estadunidense. Steinberg (2003, p. 8) faz a seguinte consideração sobre o inglês falado nos Estados Unidos após a chegada dos peregrinos, ainda no século XVII, em relação àquele falado no Reino Unido: Os peregrinos, ao aportarem no Novo Mundo, entraram em contato com os povos indígenas, dos quais tomaram emprestados termos referentes especialmente à flora e fauna, diversa da existente no Velho Mundo. Outros povos vieram, dentre eles em maior número os franceses, alemães, holandeses e espanhóis, e, com eles, novos termos foram incorporados ao léxico. E a língua inglesa falada deste lado do oceano foi ficando diferente não apenas no léxico, mas também na pronúncia, que se assemelha hoje à da época de Shakespeare, conhecida como era Elizabetana. O inglês britânico, por sua vez, também continuou se modificando, sofrendo influências e empréstimos linguísticos, principalmente do francês, além do inglês estadunidense dos programas de televisão e do cinema. A variedade diatópica ocorre por variação geográfica, porém deve-se lembrar que os fatores socioculturais também influenciam os indivíduos, como o nível de escolarização e a classe social. Nesses casos, tem-se as variedades diastrática (grupo social) e diafásica (adequação da língua ao contexto de uso). A relação que o indivíduo mantém com diferentes grupos em seu cotidiano (amigos, família, trabalho, colégio, igreja) afetará a situação e a intenção comunicativa. Ou seja, o idioleto, que é a linguagem do indivíduo, pode apresentar diferenças de pronúncia de acordo com esses aspectos. Cabe, aqui, mencionar o preconceito linguístico, que está associado ao preconceito social (KRIESER, 2017, p. 109): As variedades consideradas corretas são aquelas utilizadas pelas elites de um país. As demais são consideradas incorretas. O preconceito não é somente contra as variedades que as pessoas falam, mas contra as pessoas em si, que geralmente Sotaques da língua inglesa 10 são pessoas que vivem à margem da sociedade de elite. As variedades utilizadas pelas camadas mais pobres da população geralmente são alvo de preconceito, assim como as pessoas que as utilizam. Conhecer as variedades, compreender por que elas existem e qual função desempenham na sociedade auxilia a combater o preconceito linguístico. Em suma, os aspectos determinantes para as variedades de pronúncia em língua inglesa são os fatores históricos de contato com outras línguas, como a colonização, as invasões e as relações comerciais, e os aspectos geográficos, como o contato nas zonas de fronteiras. Além disso, os fatores socioeconômicos, como o grau de escolaridade e a classe social, bem como os grupos sociais frequentados pelos indivíduos, interferem não apenas no vocabulário, mas também na pronúncia das palavras da língua inglesa. Referências ALKMIM, T. M. Sociolingüística: parte 1. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (org.). Introdução à lingüística. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005. v. 1, p. 21-47. BAGNO, M. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola, 2007. CÂMARA JÚNIOR, J. M. Dicionário de lingüística e gramática: referente à língua portu- guesa. 17. ed. Petrópolis: Vozes, 1996. CARTER, R. et al. English grammar today: an A-Z of spoken and written grammar. Cam- bridge: Cambridge University, 2011. FERNANDA. Aprenda a língua de Shakespeare pela fonética e pela pronunciação. [S. l.]: Superprof, 2019. Disponível em: https://www.superprof.com.br/blog/pronuncia- -lingua-inglesa/. Acesso em: 18 ago. 2020. KACHRU, B. B.; KACHRU, Y.; NELSON, C. L. (ed.). The handbook of world Englishes. West Sussex: Wiley-Blackwell, 2009. KRIESER, D. S. Linguística aplicada à língua inglesa II. Indaial: UNIASSELVI, 2017. LABOV, W. Padrões sociolingüísticos. São Paulo: Parábola, 2008. MESSIAS, C. M. F. Um estudo sobre a variação linguística em língua inglesa. Claraboia, v. 2, n. 2, p. 217-233, 2015. Disponível em: http://seer.uenp.edu.br/index.php/claraboia/ article/view/629/pdf_54. Acesso em: 10 ago. 2020. MONTEIRO, J. L. Para compreender Labov. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2008. STEINBERG, M. Inglês americano x inglês britânico: palavras diferentes para o mesmo sentido, sentidos diferentes para a mesma palavra. São Paulo: Disal, 2003. Sotaques da língua inglesa 11 Leituras recomendadas CRYSTAL, D. English as a global language. 2nd ed. Cambridge: Cambridge University, 2003. LIMA, D. Inglês australiano: características e curiosidades. [S. l.]: Inglês na Ponta da Língua, 2012. Disponível em: www.inglesnapontadalingua.com.br/2012/05/ingles- -australiano-caracteristicas-e.html. Acesso em: 10 ago. 2020. MELCHERS, G.; SHAW, P. World Englishes. 2nd ed. London: Hodder Education, 2011. TARALLO, F. L. A pesquisa sociolinguística. 8. ed. São Paulo: Ática, 2012. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Sotaques da língua inglesa 12 DICA DO PROFESSOR Travaglia (2002, p.17) define o conceito de competência comunicativa como “a capacidade do usuário de empregar adequadamente a língua nas diversas situações de comunicação”, ou seja, usar a linguagem apropriada para cada situação em que ocorre a comunicação, levando em consideração o interlocutor. Por exemplo, uma conversa informal entre amigos usará uma variante da língua distinta da usada em uma entrevista de emprego. Sendo a variação linguística uma realidade concreta na comunicação, caberia à escola trabalhar com a variação, para que o aluno pudesse ter acesso às diferentes variedades da língua e saber em quais contextos sociais pode utilizar cada variante, e não restringir o ensino da língua à norma padrão. Na Dica do Professor, você verá como fazer a inclusão da variedade linguística em língua inglesa para a sala de aula e a importância do ensino da pronúncia aos estudantes. Confira a seguir. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! NA PRÁTICA .Hoje em dia, a língua inglesa é uma língua global, considerada uma língua franca para a comunicação entre os povos. O estudante desse idioma deve estar preparado para entender as variedades do inglês produzidas por falantes de diferentes nacionalidades, entendê-las e se fazer entender por eles. Por essa razão, o professor deve trabalhar a pronúncia de seus alunos,para que seja inteligível para os diferentes povos, e exercitar muito a audição de diferentes amostras de língua inglesa para que os estudantes possam reconhecer a entonação, os sons individuais e os aspectos prosódicos das diferentes variedades. Veja, a seguir, como uma professora trabalhou atividades de audição apresentando variedades linguísticas aos seus alunos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Um estudo sobre a variação linguística em língua inglesa Leia o artigo para conhecer melhor alguns conceitos importantes sobre a sociolinguística e examinar variações linguísticas da língua inglesa. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Canadian vs. American accent (em inglês) Neste vídeo, são mostradas, de forma clara e didática, algumas diferenças entre o inglês canadense e o estadunidense. Além disso, também são apresentadas algumas diferenças entre o inglês estadunidense falado nas diferentes regiões do país. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Inglês como língua internacional: por uma pedagogia intercultural crítica O artigo discute os conceitos de inglês como língua mundial da contemporaneidade e a atitude dos professores diante da tarefa de ensiná-la. Reflete-se e discute-se até que ponto os professores estão conscientes das implicações relacionadas à condição do inglês como língua de contato entre povos de culturas diversas e se a prática diária dos educadores se alinha a essa condição. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Inglês como língua franca: explicações e implicações Para refletir sobre o ensino de inglês na contemporaneidade e o conceito de língua inglesa como língua franca, vale a pena ler o artigo de Rodrigo Lopes e Carmem Baumgartner. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Prof. David Crystal on standard vs. non standard English (em inglês) Assista à breve fala do linguista Prof. David Crystal sobre a variedade padrão e não padrão da língua inglesa e reflita sobre o preconceito linguístico que permeia as variedades não padrão. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! The English Language in 24 accents (em inglês) Assista este vídeo divertido de um jovem londrino imitando diferentes sotaques da língua inglesa, dentro e fora do Reino Unido. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Where did English come from (em inglês) Este vídeo breve e elucidativo resume a história da língua inglesa em poucos minutos. Vale a pena assistir. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Compartilhar