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1 CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI ARTE, CULTURA VISUAL E EDUCAÇÃO GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3 2 ARTE: INTERFACES E PERSPECTIVAS .............................................................. 4 2.1 Construção do conceito de arte ............................................................................ 4 3 ARTE E HISTÓRIA ................................................................................................. 9 3.1 A história da arte e a trajetória das expressões artísticas ..................................... 9 3.2 Compreendendo as artes cênicas musicais e da dança na contemporaneidade 21 3.3 Compreendendo as artes plásticas, visuais e literárias na contemporaneidade . 25 4 ARTE E SOCIOLOGIA .......................................................................................... 28 4.1 Arte e sociedade, um binômio indissociável ....................................................... 30 5 ARTE E COMUNICAÇÃO ..................................................................................... 37 5.1 Por que as comunicações e as artes estão convergindo? .................................. 37 5.2 A relação entre a Comunicação e a Arte ao longo das eras ............................... 39 6 O SISTEMA DA ARTE E A INDÚSTRIA CULTURAL ........................................... 44 6.1 Ideologia e Mercadoria........................................................................................ 47 6.2 Mimese e pseudo-individuação ........................................................................... 49 6.3 Semiformação e experiência, ou a razão ‘comum e cativa’ ................................ 53 7 MOVIMENTOS DA ARTE MODERNA E DAS VANGUARDAS ............................ 60 7.1 Vanguardas europeias ........................................................................................ 60 7.2 Modernidade e vanguarda artística na América Latina ....................................... 70 7.3 A Semana de Arte Moderna no Brasil ................................................................. 76 8 O IMPACTO DA COMUNICAÇÃO DE MASSA E DA RESPONSABILIDADE TÉCNICA (FOTOGRAFIA E CINEMA) NA ARTE ..................................................... 79 8.1 A fotografia e a arte ............................................................................................ 79 8.2 Cinema e arte ..................................................................................................... 83 9 MOVIMENTOS ARTÍSTICOS CONTEMPORÂNEOS: DO PÓS-GUERRA AO INÍCIO DO SÉCULO XXI........................................................................................... 86 9.1 O desenvolvimento da arte pós-moderna ........................................................... 86 9.2 Sobre a Pop Art e o seu desenvolvimento .......................................................... 91 9.3 Os artistas da Pop Art ......................................................................................... 95 9.4 A Pop Art no Brasil ............................................................................................ 100 9.5 A Minimal Art e as suas características ............................................................ 103 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 ARTE: INTERFACES E PERSPECTIVAS Ao longo de toda a história, o homem produziu artefatos que auxiliaram em seu trabalho e o ajudaram a vencer as limitações físicas apresentadas pela natureza. Para dominar e aperfeiçoar o meio natural, o ser humano produziu um número imenso de utensílios, ferramentas e artefatos. Segundo Dulce América Souza (2019), estudar essa produção torna possível a compreensão do processo civilizatório ocorrido desde que o homem habitou a Terra. O ser humano também produziu coisas que, embora não possuam uma utilidade imediata, sempre estiveram presentes em sua vida e revelam a história da humanidade. Esta produção — que permite que tenhamos conhecimento da visão do ser humano frente ao mundo que o cerca: seu momento histórico, seus desejos e a expressão de seus sentimentos — se refere às denominadas “obras de arte”. (SOUZA, 2019). Neste capítulo, será estudado a construção do conceito de arte, delineando as implicações culturais que o envolvem. A história da arte se desenvolve nos limites daquilo que os autores consideram “conceito restrito” de arte, pois contempla a produção realizada por artistas e legitimada por instituições, teoria e crítica. As definições de “belas artes” e “artes aplicadas”, por exemplo, contribuem para a compreensão do fenômeno artístico e sua conceituação. 2.1 Construção do conceito de arte Se buscarmos uma resposta objetiva e definitiva para o conceito de arte, nos frustraremos, pois, as definições podem ser divergentes e até contraditórias. Inúmeros tratados de estética debruçaram-se sobre esse problema, buscando situá-lo, com o intuito de definir o conceito. Ainda que sem definir claramente o conceito de arte, identificamos algumas produções da cultura na qual estamos inseridos como “arte”. Há, no entanto, um consenso sobre o nosso comportamento em relação à ideia de arte, pois nossa atitude diante dela é de admiração. É possível dizer, então, que arte são certas manifestações da atividade humana diante das quais nosso sentimento é admirativo, isto é: nossa cultura possui uma noção que denomina solidamente algumas de suas atividades e as privilegia (COLI, 2002, p. 8). 5 Em contrapartida, nossa tranquilidade se desfaz quando nos deparamos com objetos artísticos que não se conformam exclusivamente à apreciação admirativa. Percebemos que, à noção sólida e privilegiada, o conceito de arte agrega também limites imprecisos. Exemplificamos a pluralidade do conceito de arte com dois ícones da arte ocidental, ilustrados pela Figura 1. Não há dúvidas que a escultura Davi, de Michelangelo, é uma obra de arte. Entretanto, quando nos deparamos com um mictório de louça — absolutamente idêntico a todos os mictórios masculinos do mundo inteiro — conservado no acervo de um consagrado museu, assinado por R. Mutt e datado de 1971, nos sentimos automaticamente incomodados em atribuir a esse objeto o mesmo status conferido a Davi, uma vez que esse mictório não corresponde exatamente à ideia que temos de “arte”. Trata-se da Fonte (1917), obra de Marcel Duchamp, um importante artista do século XX, e sim, é arte. Investigando a construção do conceito ocidental de arte, conseguiremos compreender o fenômeno representado pela Fonte e o status de arte a ela concedido. 6 Os aspectos em comum de produções tão distintas — como uma pintura renascentista, uma catedral gótica ou um poemade Homero, por exemplo — adquirem um conceito geral de arte no mundo Ocidental a partir do século XVIII. É incontestável que, antes disso, a palavra “arte” já era utilizada para designar habilidades especiais de algumas realizações: pintura, escultura, música, teatro, etc (EAGLETON, 2005). Esse conceito geral de arte está associado à noção do “belo” no Ocidente, decorrente dos conhecimentos da estética, um ramo da filosofia. Para Deleuse e Guattari (2010, p. 10): “A filosofia é a arte de formar, de inventar, de construir conceitos”. Os conceitos têm a necessidade de ter personagens conceituais que contribuam para a sua definição — os personagens ou os “objetos” da filosofia são, em grande parte, a arte, o artista e a criação artística, seja esta de qualquer categoria: música, teatro, artes plásticas, literatura. Sob esse aspecto, a filosofia da arte pode ser entendida como um ramo da estética, uma vez que a atividade artística promove a emergência do belo. A estética tem como objeto todas as poéticas, sejam elas de uma arte compromissada ou não, realista ou idealista, naturalista ou lírica, figurativa ou abstrata, douta ou popular. (SOUZA, 2019). A função da arte modificou-se ao longo da história humana desde a sua origem. O homem adequou à arte as mudanças ocorridas na sociedade, nos seus costumes, na sua religiosidade, na sua forma de fazer política, de conceber a ética. Na busca humana de fazer de seu espaço algo significativo, a arte sempre teve, desde o início da humanidade, um papel essencial na compreensão do universo, na relação dialética com a realidade, com os fenômenos e com a sua imaginação lúdica. O homem sempre teve necessidade da arte, visto que ela está extremamente ligada à sua humanidade. A arte está completamente impregnada do universo humano (FISCHER, 2002). Há de se destacar também que durante muito tempo a validade da arte estava centrada na sua função na sociedade, ou seja, a obra de arte só tinha validade mediante a função que ela desempenhava dentro da sociedade. A arte emerge da vida e, por isso, vem carregada de funcionalidade, porém esta não afeta em nada sua suficiência, ou seja, sua autonomia. Fischer (2002) defende que a arte quer ser contemplada por leis que lhe são próprias, sem abdicar da totalidade dos seus valores espirituais, sociais e éticos, de forma que toda a plenitude de significado e de funções que a obra irradia advém, na verdade, da sua própria realidade de arte. Assim, a obra 7 não adquire validade pela função, e sim possui uma função justamente por ser suficiente. Quando enfocamos, por exemplo, a arte clássica, observamos que ela era uma produção de arte que não era entendida em primeiro plano como arte, “[...] mas como formas que se encontravam no meio religioso ou também no mundano, como decoração do próprio mundo em seus atos de destaque: o culto, a representação dos soberanos e outros” (GADAMER, 1985, p. 27). O responsável pela independência do fato estético, frente à finalidade utilitária da arte, foi o filósofo alemão Immanuel Kant (séc. XVIII), que o fez a partir de sua expressão - agradar desinteressado - ou seja, a arte deveria ter validade e, entretanto, não ser incluída em objetivos puramente finalistas. Assim, a arte tem validade e funcionalidade dentro da sociedade porque ela é um produto humano, gerado da vida, que emerge da vida, trazendo em si todos os âmbitos da vida humana, podendo, portanto, ser significativa a cada um deles. Gadamer (1985, p. 28) assim define o termo - agradar desinteressado - de Kant: “Sem qualquer fim objetivo, sem qualquer expectativa de utilitarismo, o belo preenche-se numa espécie de auto definição e respira na auto representação”. Circundando a definição do conceito de arte, nos deparamos com a necessidade de fornecer uma resposta objetiva e clara para a pergunta: “O que é arte?”. Embora não haja uma definição exata, objetiva e cientificamente comprovada, o termo “arte” remete a dois conceitos básicos, segundo Ferreira (2014, documento on-line): [...] um mais restrito, pois trata da arte como ‘obra de arte’, circunscrita na história da arte, feita por artistas e na maioria das vezes localizada em instituições artísticas; o outro é mais amplo, pois concebe a arte como o conjunto de atos criadores ou inovadores presentes em qualquer cultura humana. O conceito mais restrito surge em um contexto histórico-cultural delimitado espacial e temporalmente, e é a partir dele que a história da arte se desenvolve, uma vez que é balizada pelo contexto teórico e institucional legitimador, como, por exemplo, museus, teatros e galerias de arte. Já ao conceito amplo, podemos associar a noção de “arte” como um adjetivo: a arte da gastronomia, a arte da perfumaria, a arte da joalheria, por exemplo. Muito mais do que um conceito, trata-se de uma 8 concepção cotidiana que se refere a contextos eruditos ou populares que não pertencem ao “mudo da arte” (FERREIRA, 2014). Há algumas possibilidades específicas do objeto artístico que permitem classificar o conceito de arte. As chamadas definições estéticas destacam como condição necessária a intenção de provocar experiências estéticas; as definições institucionalistas se referem ao caráter condicional da legitimação da obra pelas instâncias da teoria e da crítica da arte, cumprindo certas regras e procedimentos; e as definições históricas identificam a relação das produções artísticas com uma determinada tradição histórica (ALMEIDA, 2014). Arthur Danto (1924–2013), filósofo e crítico de arte norte-americano, é um importante interlocutor sobre o conceito restrito de arte, e sua teoria se funda na construção de uma definição de arte histórica e socialmente relacionada com o mundo da arte. Danto (2010) não afirma que algo pode ser considerado arte apenas pela afirmação do artista e pela legitimação por parte dos críticos e curadores. O autor pressupõe que objetos ou eventos podem ser reconhecidas como obras de arte por conter determinadas características que as coisas banais não possuem. Em seus estudos, investiga quais são essas características e como é possível fundamentar uma teoria que abranja todas as obras de arte, de modo a diferenciá-las dos objetos comuns. Corroborando com a teoria de Danto (2006), Mammi (2012) reconhece que o conceito moderno de arte surge no Renascimento, porém seu significado (da arte) tem a ver com algo atemporal e inesgotável. O autor concorda com a perspectiva dantiana (relativa ao pensamento de Danto) de que tudo pode, em um primeiro momento, ser arte. Não porque é legitimado pelo mundo da arte, mas sim quando passa a desempenhar um papel fundamental na totalidade da cultura: a possibilidade de gerar novas experiências significativas. Temos, então, a visão atemporal e eminentemente significativa, ou produtora de significados da arte, na qual o que conta é a atualização do que ela é a cada momento, mesmo provindo de um passado distante. É a sua capacidade de inaugurar novos campos de experiência. Seu significado pertence ao agora. Conforme defende Mammi (2012, p. 9): Talvez seja próprio da obra de arte não pertencer a nenhum tempo específico – ou talvez a todos, mas sempre como se proviesse de outro tempo, passado ou futuro. Quem sabe um dia outra civilização, ou uma outra fase desta, desvelará a valência artística de uma luta de Ali, ou de um número de dança de Astaire. Uma obra de arte é um objeto que sobrevive à vida e à intenção 9 que a gerou, e a todos os discursos produzidos sobre ela. Nesse sentido, “o que resta” é, simplesmente, sinônimo de “arte”. A partir das vanguardas artísticas do século XX, a construção dos conceitos de arte se tornou complexa, volátil e subjetiva, inviabilizando definições abrangentes o suficiente para dar conta de abarcar todas as experiências ou linguagens da arte. A crítica e a teoria da arteestabeleceram parâmetros externos (não mais relacionados apenas com a virtuosidade ou o domínio técnico do artista, ou do conteúdo da obra) que pudessem definir o fato artístico, como: o discurso que sustenta a obra, a consagração institucional e a resposta dos especialistas e do público, por exemplo (ECO, 2004). Uma possibilidade para contornar o dilema pode ser ancorada nos raciocínios de Wittgenstein (2000), que alega que compreender o conceito de arte não é, necessariamente, ser capaz de defini-lo teoricamente. O importante é saber usá-lo para reconhecer e elucidar obras de arte e para distinguir, diante de novas experiências artísticas, aquilo que pode ser denominado arte ou não. O autor sugere que essa definição se baseia na reflexão sobre a rede de similitudes compartilhadas que identificam o pertencimento a uma mesma família, que é a arte. 3 ARTE E HISTÓRIA A história da arte revela as variadas maneiras de se interpretar o mundo e o ser humano ao longo do tempo. Antropólogos, arqueólogos, historiadores, filósofos, linguistas e outros tantos pesquisadores tentam, há muito tempo, desvendar as origens da humanidade. Portanto, neste capítulo, você vai participar de uma retrospectiva da história da arte e suas manifestações. Você também vai receber subsídios para compreender os diversos segmentos da arte: artes cênicas, plásticas, visuais, musicais, literárias e da dança. 3.1 A história da arte e a trajetória das expressões artísticas A história da arte está relacionada à cultura dos mais variados povos existentes. Ela atravessa os tempos, criando e contando o passado e recriando o presente. A arte está presente à nossa volta, e, com ela, construímos a história de uma sociedade. 10 Cada objeto artístico apresenta uma finalidade. Desde a pré-história, o homem sempre criou elementos que o ajudassem a superar suas necessidades e a vencer desafios. Existem objetos do homem que representam seus sentimentos, algo que a utilidade pública muitas vezes não consegue questionar, somente considerando a sua beleza. Esses objetos são conhecidos como obras de arte. Elas fazem parte da cultura do povo e são capazes de ilustrar situações sociais ou não. A arte pode ser definida como fruto da criação do homem e de seus valores junto à sociedade. Dentro dela existem vários procedimentos e técnicas utilizadas para compor uma obra. Ela é uma necessidade que faz o homem se comunicar e refletir sobre as questões sociais e culturais dentro da sociedade. O campo artístico nos revela os valores, costumes, crenças e modos de agir de um povo. Ao detectar um conjunto de evidências perceptíveis na obra, o intérprete da arte se esforça na tarefa de relacionar esses vestígios com algum traço do período em que foi concebida. A partir dessa ação, a arte passa a ser interpretada com um olhar histórico, que se empenha em decifrar aquilo que o artista disse com a obra. Conhecendo a história da arte, você irá perceber que uma manifestação de clara evidência “artística” pode não ser encarada como tal pelo seu autor ou sociedade em que surge. Além disso, ao estabelecermos um olhar atento à manifestação artística de um único artista, podemos reconhecer que os seus trabalhos não só refletem o tempo em que viveu, mas também demonstram a sua relação particular, o diálogo singular que estabeleceu com seu tempo (ESCOSTEGUY, 2017). De acordo com o crítico de cinema Ricciotto Canudo, existem sete tipos de arte, que, no século XX, em 1923, foram regulamentados pelo Manifesto das Sete Artes. O objetivo do crítico era estabelecer uma ordem estética e comunicativa paras as principais artes existentes. Elas ficaram relacionadas da seguinte forma: 1ª Arte – Música (som) 2ª Arte – Dança/Coreografia (movimento) 3ª Arte – Pintura (cor) 4ª Arte – Escultura (volume) 5ª Arte – Teatro (representação) 6ª Arte – Literatura (palavra) 7ª Arte – Cinema 11 Anos mais tarde, foram adicionados mais quatro tipos de arte à lista: 8ª Arte – Fotografia (imagem) 9ª Arte – História em quadrinhos 10ª Arte – Jogos de computador e de videogame 11ª Arte – Arte digital Cada uma das artes citadas e formalizadas no manifesto apresentam sua história, compreensão e particularidades, portanto é de suma importância que tenhamos uma visão de cada uma. Música A música existe e sempre existiu como produção cultural, pois, de acordo com estudos científicos, desde que o ser humano começou a se organizar em tribos primitivas pela África, a música era parte integrante do cotidiano dessas pessoas. Acredita-se que a música tenha surgido há 50.000 anos, quando as primeiras manifestações foram feitas no continente africano, expandindo-se pelo mundo com o dispersar da raça humana pelo planeta. A música, ao ser produzida ou reproduzida, é influenciada diretamente pela organização sociocultural e econômica local, contando, ainda, com as características climáticas e o acesso tecnológico que envolvem toda a relação com a linguagem musical. A música possui a capacidade estética de traduzir os sentimentos, atitudes e valores culturais de um povo ou nação e é uma linguagem local e global. Na pré-história, o ser humano já produzia uma forma de música que lhe era essencial, pois sua produção cultural constituía de utensílios para serem utilizados no dia a dia. Já na cultura egípcia, por volta de 4.000 anos a.C., alcançou-se um nível elevado de expressão musical, pois era um território que preservava a agricultura, e esse costume levava às cerimônias religiosas, durante as quais as pessoas batiam espécies de discos e paus uns contra os outros, utilizavam harpas, percussão, diferentes formas de flautas e também cantavam. (ESCOSTEGUY, 2017). A teoria musical só começou a ser elaborada no século V a.C., na Antiguidade Clássica, e a música renascentista ficou marcada pelo período do século XIV, durante o qual os artistas pretendiam compor uma música mais universal, buscando se 12 distanciarem das práticas da Igreja. Havia um encantamento pela sonoridade polifônica, pela possibilidade de variação melódica. Após, surge a Música Clássica e, neste momento, diversas novidades, como a orquestra, que toma forma e começa a ser valorizada. As composições para instrumentos, pela primeira vez na história da música, passam a ser mais importantes do que as compostas para canto, surgindo a “música para piano”. (ESCOSTEGUY, 2017). A imagem abaixo ilustra os maiores ícones da música clássica: Os artistas na figura acima, da esquerda para a direita, são: Topo – Antônio Vivaldi, Johann Sebastian Bach, George Frideric Handel, Wolfgang Amadeus Mozart, Ludwig van Beethoven. Segunda linha – Gioachino Rossini, Felix Mendelssohn, Frédéric Chopin, Richard Wagner, Giuseppe Verdi. Terceira linha – Johann Strauss II, Johannes Brahms, Georges Bizet, Pyotr Ilyich Tchaikovsky, Antonín Dvořák. Baixo – Edvard Grieg, Edward Elgar, Sergei Rachmaninoff, George Gershwin, Aram Khachaturian. 13 Dança Sem música, não há dança. Sem movimento corporal, também não. A dança, portanto, apenas ocorre quando o corpo executa movimentos a partir de um determinado ritmo, e isso acontece desde a Era Paleolítica. Nessas eras, a dança estava diretamente relacionada à sobrevivência, pois os homens, vivendo em tribos isoladas e alimentando-se de caça, pesca, vegetais e frutos colhidos da natureza, criavam rituais em forma de dança que impediriam eventos naturais de prejudicar essas atividades. (ESCOSTEGUY, 2017). As danças na Índia, por sua vez, têm origem na invocação do Shiva (deus da dança). Com suas danças e músicas, os hindus procuravam uma união com a natureza. Assim a dança de Shiva tinha por tema a atividade cósmica. Ela exprimia os eventos divinos. O ritmo da dança estava associado à criação contínua do mundo, à destruição de algumas formaspara o nascimento de outras. Os vários estilos de dança, sempre relacionados a deuses, tinham o mesmo princípio, o de que “o corpo inteiro deve dançar”. É por isso que as danças indianas apresentam movimentos muito elaborados de pescoço, olhos, boca, mãos, ombros e pés. (ESCOSTEGUY, 2017). Escosteguy (2017) lembra que a Idade Média, chamada de “idade das trevas” pelos humanistas do Renascimento, foi um período contraditório para a dança. Nessa época, a Igreja se tornou autoridade constituída. Manifestações corporais foram proibidas, uma vez que a dança foi vinculada ao pecado. Os teatros foram fechados e eram usados apenas para manifestações e festas religiosas. A Igreja, porém, não conseguiu interferir nas danças populares dos camponeses, que continuaram a fazer suas festas nas épocas de semeadura e colheita e no início da primavera. Para não afrontar a Igreja, essas danças eram camufladas com a introdução de personagens como anjos e santos. Posteriormente, essas manifestações foram incorporadas às festas cristãs, com a introdução da dança dentro das igrejas. A partir do Renascimento, houve mudanças marcantes, como a renovação em muitos âmbitos da vida social e cultural, pois as cortes reais também se transformaram. Pela necessidade de ostentar suas riquezas, passaram a comemorar, com grandes festas, datas como: nascimento, casamento, aniversário etc. A dança se desenvolve particularmente em Florença, na Itália, no palácio da família Médici, onde, nas festas, eram apresentados espetáculos chamados de trionfi (triunfos), que simbolizavam riqueza e poder. 14 Cabe ressaltar que, em 1500, no carnaval de Veneza, foi encenado um dos triunfos mais suntuosos, no qual os dançarinos usavam máscaras bordadas com fios de ouro e pedras preciosas, leques de plumas e mantos de seda adamascada. Em 1581, o primeiro “balé da corte”, intitulado Le Ballet Comiquede la Reine (O Balé Cômico da Rainha – neste caso, o termo “cômico” deve ser entendido no sentido de “dramaturgia de uma comédia”), foi um grande espetáculo que durou seis horas, com participação de carros alegóricos e efeitos cênicos. No século XVII, o balé é a modalidade que surgiu e marcou época, pois foi nesse século que Luís XIV criou uma companhia de dança, com vinte bailarinos, para a famosa Ópera de Paris. Os vestidos, compridos e pesados, impediam o virtuosismo de movimentos verticais. O sonho de voar de Ícaro, Leonardo da Vinci e Santos Dumont também são o sonho dos bailarinos dessa época. Os temas para o balé começam a exigir a ilusão do voo e, para isso, os cenógrafos utilizaram alavancas e roldanas para erguer os bailarinos. (ESCOSTEGUY, 2017). No século XIX, o balé criava um mundo de ilusão, esboçando o ideal das concepções românticas. A fada, a feiticeira, o vampiro e outros seres imaginários eram seus personagens. No século XX, anuncia-se como o tempo do progresso, das descobertas científicas, da rapidez, de expansão de fronteiras, da modernidade. Grandes transformações nas tradições e valores adotados até então marcam esse momento de início da era industrial. Nasce uma nova sociedade com outros anseios e necessidades. Na fase modernista da história da dança, o que vai separar o clássico do moderno não é simplesmente a técnica, mas, também, o pensamento que norteou sua elaboração. Nos Estados Unidos e na Europa, apareceram novos modos de dançar bastante diferentes da tradição clássica em relação aos espaços utilizados, à concepção de dança e aos movimentos do corpo. No momento de transição para a era contemporânea, nas décadas de 1940 e 1950, alguns coreógrafos passam a questionar os modos de se construir a dança, criando uma verdadeira revolução na modernidade. Na fronteira entre a dança moderna e a contemporânea, está o coreógrafo e bailarino Merce Cunningham. Os pioneiros da dança moderna se dedicaram à construção das fundações de uma nova dança. Cunningham, chamado pelos críticos de precursor da dança contemporânea, posiciona-se contra a permanência de modelos acadêmicos na dança moderna. 15 Cunningham buscou novas fórmulas e, com seus parceiros – o compositor John Cage, uma das mais interessantes figuras do mundo da música contemporânea, e o artista plástico Robert Rauchenberg, um dos expoentes da pop art –, constrói uma nova estética para a dança, lançando os princípios da dança contemporânea. A dança contemporânea não impõe modelos rígidos; os corpos dos artistas não têm um padrão preestabelecido, bem com os tipos físicos. São gordos, magros, altos, baixos e de diferentes etnias. A maioria desses trabalhos incorpora novos movimentos e não mais os movimentos convencionais do balé ou das técnicas de dança moderna. (ESCOSTEGUY, 2017). Pintura A pintura, por sua vez, acompanha o ser humano por toda a sua história. Ainda que durante o período grego clássico ela não tenha se desenvolvido tanto quanto a escultura, a pintura foi uma das principais formas de representação dos povos medievais, do Renascimento até o século XX. A pintura surgiu na pré-história quando os homens das cavernas faziam as pinturas rupestres. Arte rupestre, pintura rupestre ou, ainda, gravura rupestre são os nomes dados às mais antigas representações pictóricas conhecidas – com as mais antigas datadas do período Paleolítico Superior (40.000 a.C.) –, gravadas em abrigos ou cavernas, em suas paredes e tetos rochosos ou também em superfícies rochosas ao ar livre, mas em lugares protegidos. No entanto, é a partir do século XIX, com o crescimento da técnica de reprodução de imagens, graças à Revolução Industrial, que a pintura de cavalete perde o espaço que tinha no mercado. Até então, a gravura era a única forma de reprodução de imagens, trabalho muitas vezes realizado por pintores. Com o surgimento da fotografia, porém, a função principal da pintura de cavalete, a representação de imagens, enfrenta uma competição difícil. Essa é, de certa maneira, a crise da imagem única e o apogeu de reprodução em massa. (ESCOSTEGUY, 2017). Durante o século XX, a pintura de cavalete se mantém pela difusão das galerias de arte, mas a técnica da pintura continua a ser valorizada por vários tipos de designers, especialmente na publicidade. 16 Devido ao fato de grandes obras de arte – tais como a Mona Lisa e A Última Ceia – do renascentista Leonardo Da Vinci serem pinturas a óleo, a técnica é historicamente considerada uma das mais tradicionais das artes plásticas. Escultura Na pré-história, a escultura foi associada à magia e à religião. No período paleolítico, o objetivo era moldar animais e figuras humanas, geralmente femininas. A escultura, como é conhecida atualmente, surgiu no Oriente Médio, e foi uma das últimas artes a serem desenvolvidas durante a Idade Média – talvez pelo apelo sensual. A Grécia Clássica é o berço ocidental da arte de esculpir, desde os seus primeiros artefatos em mármore ou bronze a partir do século 10 a.C. até o apogeu da era de Péricles, com as esculturas da Acrópole de Atenas. Posteriormente, os romanos aderiram à cultura clássica e continuaram a produzir esculturas até o fim do império, difundindo o trabalho em mármore por todo o império. As esculturas gregas se inspiraram na arte egípcia até criar exclusivamente a sua própria arte, a qual foi bastante copiada – especialmente pelos romanos. A escultura romana herdou da escultura grega a sua perfeição, mas assumiu um caráter mais realista – em vez de idealista – das formas, além de ter contribuído com obras originais – consideradas as mais belas da Antiguidade. Foi no Renascimento que a escultura se destacou, com a famosa estátua de Davi, de Michelangelo. (ESCOSTEGUY, 2017). Donatello e Verocchio foram outros mestres importantes do período. Entre os séculos XIX e XX, destacam-se os artistas Constantin Brancuse e August Rodin, dois mestres da escultura queinfluenciaram vários outros artistas. No Brasil, o primeiro escultor brasileiro de que se tem notícia, porém, é Frei Agostinho de Jesus, o qual se acredita ser o autor da imagem de Nossa Senhora da Aparecida que foi encontrada por pescadores e fez surgir a devoção à então padroeira do Brasil. A partir do início do século XX, a escultura passou a se ajustar às propostas das vanguardas artísticas que emergiram na Europa, como o cubismo, o dadaísmo, o abstracionismo e o construtivismo. Além de Picasso, outros escultores, como 17 Constantin Brancusi e Henry Moore, tornaram-se célebres dentro das vanguardas modernistas, que, até hoje, seguem influenciando a produção contemporânea de esculturas. Teatro O teatro teve sua origem no século VI a.C., na Grécia, surgindo das festas dionisíacas realizadas em homenagem ao deus Dionísio, deus do vinho, do teatro e da fertilidade. Essas festas – que eram rituais sagrados, procissões e recitais que duravam dias seguidos – aconteciam uma vez por ano na primavera, períodos em que se fazia a colheita do vinho naquela região. O teatro grego que hoje conhecemos surgiu, segundo historiadores, de um acontecimento surpresa: quando um participante desse ritual sagrado resolveu vestir uma máscara humana, ornada com cachos de uvas, subiu em seu tablado em praça pública e disse: “Eu sou Dionísio! ”. Todos ficam espantados com a coragem desse ser humano de se colocar no lugar de um deus, ou melhor, fingir ser um deus. Esse acontecimento é o marco inicial da ação dramática. (ESCOSTEGUY, 2017). Com o passar do tempo, as celebrações ao deus Dionísio ficaram cada vez mais elaboradas. Dessa forma, durante tais celebrações os gregos começaram a representar cenas da vida da própria divindade. Nessa época, todos os papéis eram interpretados por homens, já que não era permitida a participação de mulheres nas representações. Paralelos a esse acontecimento sociocultural, vão surgindo os prédios teatrais gregos – bem como as arquibancadas, que eram feitas de pedra –, e sua utilização pelos cidadãos gregos era democrática; todos podiam assistir com a mesma qualidade de visão as tragédias, comédias e sátiras. Poucas manifestações teatrais parecem ter resistido nessa época. Apenas alguns artistas percorriam as cortes de reis e nobres, como malabaristas, trovadores (poetas que cantavam poemas ao som de instrumentos musicais), imitadores e jograis (intérpretes de poemas ou canções românticas, dramáticas ou sobre feitos heroicos). Na China antiga, o budismo usava o teatro como forma de expressão religiosa. No Egito, um grande espetáculo popular contava a história da ressurreição de Osíris e da morte de Hórus. Na Índia, acredita-se que o teatro tenha surgido com Brama. 18 No Brasil, o teatro foi obra dos jesuítas, empenhados em catequizar os índios para o catolicismo e coibir os hábitos condenáveis dos colonizadores portugueses. O padre José de Anchieta (1534–1597), em quase uma dezena de autos inspirados na dramaturgia religiosa medieval e, sobretudo, em Gil Vicente, notabilizou-se nessa tarefa, de preocupação mais religiosa do que artística. (ESCOSTEGUY, 2017). Já os fundamentos estéticos vivenciados no século XIX, entre público e artistas, no âmbito do teatro, foram desafiados e ampliados no século XX, expandindo-se em experiências e inovações teatrais. Naquele momento, o “naturalismo” cênico dominava as convenções teatrais, e, em seguida, no início do século XX, novos movimentos e experimentações artísticas começaram a surgir em oposição às regras dominantes. Na era Pós-moderna, uma dramaturgia que se assume fora do textocentrismo nasce com as experiências de criação coletiva privilegiada por inúmeras equipes artísticas. Macunaíma - espetáculo de Antunes Filho de 1978, pode ser considerado o marco instaurador da pós-modernidade no Brasil. Associando códigos da intertextualidade, da paródia, da ironia, do humor, ele soube preencher o palco nu com signos impactantes e oferecer uma nova face ao homem brasileiro, assim como a instaurar um renovado padrão de teatralidade. (ESCOSTEGUY, 2017). Literatura Na origem, a literatura de todos os povos foi oral. Apesar de se originar etimologicamente da palavra “letra” (do latim, littera), a literatura surgiu nos primórdios da humanidade, quando o homem ainda desconhecia a escrita e vivia em tribos nômades, à mercê das forças naturais que ele tentava entender pelos primeiros cultos religiosos. Lendas e canções eram transmitidas de forma oral por gerações. Com o advento da escrita, as paredes das cavernas começaram a receber pinturas e desenhos simbólicos que passaram a registrar a tradição oral. Mais tarde, surgiriam novas formas para armazenar essas informações, como as tabuletas, óstracos, papiros e pergaminhos. Dessa maneira, as primeiras obras literárias conhecidas são registros escritos de composições oriundas de remota tradição oral. Certos tempos primários podem ser considerados os primeiros passos da literatura. Exemplos muitos antigos são o Poema de Gilgamesh, em sua versão de 19 aproximadamente 2000 a.C., e o Livro dos Mortos, escrito em Papiro de Ani em aproximadamente 1250 a.C. O Egito, que detinha a intuição mística de um mundo sobrenatural, atiçou a imaginação dos gregos e dos romanos. Da cultura hebraica, a principal herança literária para o Ocidente veio de seus primeiros manuscritos, como o Antigo Testamento da Bíblia. Muitos textos se expandiram por forma oral durante vários e vários séculos antes que fossem escritos, e esses são difíceis de datar. A chamada literatura clássica, que engloba toda a produção greco-romana entre os séculos V a.C. e V d.C., influenciou toda a literatura do Ocidente. Todos os gêneros importantes de literatura – épica, lírica, tragédia, comédia, sátira, história, biografia e prosa narrativa – foram criados pelos gregos e pelos romanos, e as evoluções posteriores são, na maioria, extensões secundárias. (ESCOSTEGUY, 2017). As primeiras manifestações da literatura brasileira foram fortemente marcadas pelo modelo literário de Portugal, já que nossos primeiros escritores ou eram portugueses de nascimento ou brasileiros com formação universitária em Portugal. Com o passar do tempo, surge a literatura moderna, que foi um movimento da literatura brasileira que surgiu em 1920 e se estendeu até meados de 1978. Dividido em três fases principais, a literatura moderna reúne características inconfundíveis, como a liberdade de expressão, contextualização e inclusão do cotidiano, linguagem coloquial e novas técnicas de escrita. Nesse novo estilo moderno, todas as normas e parâmetros da criação artística foram rompidos. Os autores do modernismo passam a valorizar o retrato da vida cotidiana. A vida burguesa sai do cenário artístico. Quanto à escrita, os versos aparecem livres, sem as formas fixas de sonetos e versos. As frases curtas são mais valorizadas. A fragmentação do texto e recortes também ganham espaço na literatura moderna. Muitos autores utilizam várias vozes narrativas nos seus textos. Os sinais de pontuação desaparecem. O pós-modernismo na literatura brasileira consiste num período em que os autores apresentam um amadurecimento, tanto na poesia quanto na prosa. O pós- modernismo atuou como uma intensificação dos traços da modernidade. 20 Cinema A origem do cinema está associada à invenção do cinematógrafo, no século XIX, um aparelho capaz de capturar “imagens em movimento”. Um dos fenômenos tecnológicos mais impressionantes de nossa história é a capacidade de captação (ou captura) da “imagem em movimento”, isto é, da apreensão de imagens dinâmicas da realidade. Essa capacidade de captação foi tornada possível a partir de 1889, com a criação do cinetoscópio – por William Dickson, assistente do cientista e inventor americano Thomas Edison.Esse invento e os modelos que o sucederam na década seguinte contribuíram para o desenvolvimento do cinema tal como compreendemos hoje, ou seja, a arte cinematográfica. (ESCOSTEGUY, 2017). O cinema, portanto, teve origem no cinetoscópio, que não projetava as imagens em telões. O espectador do cinetoscópio tinha de observar, durante um tempo-limite de 15 minutos, as imagens no interior de uma câmara escura por meio de um orifício em que colocava um dos olhos. Nesse sentido, a experiência visual proporcionada pelo cinetoscópio não podia ser feita coletivamente. Edison não chegou a patentear o invento, o que abriu portas para outros inventores, sobretudo da Europa, aperfeiçoarem o modelo. No ano de 1892, o francês Léon Bouly conseguiu, a partir do cinetoscópio, desenvolver o cinematógrafo, um modelo que conseguia gravar e projetar a luz das imagens em movimento em tela, em quadros por segundo. Contudo, Bouly não possuía dinheiro para registrar a patente do invento. O cinematógrafo acabou sendo patenteado pelos irmãos Lumière, que passaram, a partir de 1895, a fazer várias produções cinematográficas de pequena capacidade e a exibi-las em sessões especiais para isso. A primeira exibição de filme feito por Auguste e Louis Lumière ocorreu em 22 de março de 1895. O filme era intitulado “La Sortie de L’usine Lumière à Lyon” (A Saída da Fábrica Lumière em Lyon) e registrava a saída dos funcionários do interior da empresa Lumière, na cidade de Lyon, na França. Foi ainda com os irmãos Lumière que começaram as primeiras “direções cênicas” para o cinema. O cinematógrafo logo passou a registrar não apenas cenas do cotidiano, mas também cenas dramáticas, elaboradas com certo nível de teatralidade. 21 Entretanto, seria nas três primeiras décadas do século XX que o cinema afirmar-se-ia como arte. Isso ocorreu sobretudo pela ação de artistas interessados em teatro, mágicos (e ilusionistas) e todo tipo possível de efeito cênico. Um dos principais nomes dessa fase do cinema foi Georges Meliès, que dirigiu Viagem à Lua, em 1902, conseguindo, com esse filme, efeitos visuais verdadeiramente impressionantes para a época. Os primeiros filmes gravados em terras brasileiras foram desenvolvidos no fim do século XIX, quando o Brasil ainda enfrentava problemas sérios em relação à energia elétrica, o que dificultava muito a produção dos filmes no país. Os filmes de ficção só começaram a surgir no Brasil no início do século XX. A partir de 1905, houve o que ficou conhecido como a “Belle Epoque” (Bela Época) do cinema nacional, marcado pelas produções inspiradas na ópera e no que se chamou de “cinema cantado”. Em 1930, foi edificado o primeiro estúdio de cinema do Brasil: a Cinédia, que produziu sátiras dos filmes de Hollywood, chanchadas e os primeiros filmes carnavalescos, que dominaram a produção cinematográfica nacional até a década de 1950. (ESCOSTEGUY, 2017). De qualquer forma, o que se vê hoje no cinema é um movimento no sentido de romper com o dispositivo que imperou ditatorialmente por mais de cem anos e buscar inspiração para mudanças no campo das artes visuais. Por outro lado, contraditoriamente, percebemos, no campo das artes visuais, um movimento inverso, no sentido de buscar formas e conteúdos do cinema, como a narração e o documentário, a projeção em sala escura, e assim por diante. Se o cinema e a arte contemporânea puderem se encontrar em algum lugar no meio do caminho para trocar experiências, talvez esse encontro seja produtivo para os dois no sentido de superar os atuais impasses. 3.2 Compreendendo as artes cênicas, musicais e da dança na contemporaneidade Barbosa (1978) defende que os novos métodos de ensino de Arte não são resultantes simplesmente da junção da Arte e da educação, muito menos da oposição entre elas, mas da sua interpenetração. O professor é o instrumento principal para as transformações no ensino de arte – ele é o diferencial, o colaborador para a eficácia do bom aproveitamento dos 22 conteúdos. Segundo Barbosa (1978, p. 50), “[...] sua tarefa é oferecer a comida que alimenta o aprendiz e também organizar pistas, trilhas instigantes para descobertas de conhecimentos, pelos alunos e visitantes, alimentando-se também [...]”. Como tal, é necessário que ele entenda a importância do seu posicionamento e compromisso diante da questão, buscando, em parceria com as instituições de educação, possíveis soluções para a melhoria da qualidade do ensino. São necessários conteúdos que favoreçam a compreensão da arte como cultura, do artista como ser social e dos alunos como produtores e apreciadores. Pensando nisso, o foco atual são conteúdos que valorizem as manifestações artísticas de povos e culturas de diferentes épocas e locais, incluindo a contemporaneidade e a arte brasileira e conteúdos que possam ser realizados com grau crescente de elaboração e aprofundamento. (ESCOSTEGUY, 2017, p. 163). Podemos compreender as artes cênicas, musicais e da dança como correlacionadas, pois, na dramaturgia, é possível ver a dança e a música, em um espetáculo só, articuladas para uma aparição artística de muita qualidade e riqueza. Sendo o corpo o eixo de toda e qualquer produção criativa na dança, a materialidade dos processos se organiza de modo subjetivo a partir das características próprias de cada indivíduo. Isso produz abordagens muito diferenciadas de acordo com cada visão de mundo que se instaura dramaturgicamente. Nesse sentido, destacam-se as palavras de Hércules (2010, p. 199), quando ela aborda que Em primeira instância, dramaturgia será entendida como composição de ações. Considerando-se que o ambiente onde estas ações se configuram é o da dança, torna-se imperativo o reconhecimento dos distintos modos como as instruções que constituem o movimento são, singularmente, implementadas por cada corpo. Assim sendo, a denominação dramaturgia da dança torna-se imprecisa, necessitando ser substituída por dramaturgia do corpo que dança. Portanto, no interior das escolas, faz-se necessário outra compreensão em relação a esses segmentos artísticos, podendo, em muitos momentos, serem trabalhados de forma conjunta. É preciso que, no ensino de dança como atuação pedagógica, tirem-se as sapatilhas para poder ver melhor os pés dos alunos, e que se flexibilizem os espaços para a atuação da dança. O primordial é reconhecer a expressão corporal de cada um, e o papel do educador é revelar a dança que se encontra em cada aluno como resultado de uma didática inovadora (MILLER, 2007). 23 A história da dança na contemporaneidade parece aflorar e apontar percursos artísticos e didáticos transgressores que fissuraram uma época – como Judith Dunn, que estimulava a produção de “espaços do nada”, em que o vazio pudesse ocorrer, proporcionando liberdade e empoderamento aos indivíduos. Ainda se faz urgente que esses tipos de pensamento/prática sejam inseridos de modo mais contundente nos processos formativos em dança na contemporaneidade. O teatro, por sua vez, é uma forma de manifestação artística no qual uma história real ou não é interpretada por meio de cenários, figurinos e representações de atores em um palco para uma plateia. Reportando-nos ao cenário escolar, indagamos: como o teatro é concebido na escola atualmente? O que é possível visualizar? Dramatizações almejam ilustrar conteúdos? Uma brincadeira para tornar a aula mais agradável? Concomitantemente, são essas ideias que povoam o imaginário popular. Em outras palavras, é esse o estereótipo de teatro na escola que a sociedade tem em mente e vem divulgando. Sobretudo, o teatro “[..] na educação ainda é um espaço a ser conquistado [...]”, conforme ressalta Cunha (2009, p. 293). Reforçando essa opinião, ele relata: Apesar de existirem educadores que acreditam na força que a arte de encenar tem para promover a aprendizagem e o desenvolvimentodo aluno, ainda há um grande número de escolas que não aceitam e não valorizam a atividade teatral no processo educativo. Isso pode se dar devido a enorme carga transdisciplinar que permeia o teatro, o qual gera algo novo, causando, assim, o risco da descoberta (CUNHA, 2009, p. 293). Assim, a necessidade de o teatro existir dentro da escola, abrindo um espaço que permita reconhecermos o seu ensino como um fim em si mesmo, e não de por ser instrumento para fins de outra natureza, é bastante necessário. Os olhos dos profissionais vinculados à escola devem estar focados nesse entendimento de práticas teatrais que estimulam e desenvolvem o caráter de produção coletiva dessa atividade artística na escola, que podem estimular o treinamento técnico e individualista das pessoas que a praticam. Para tanto, faz-se necessário que os professores ministrantes das aulas de teatro tenham amplo conhecimento e domínio das teorias e metodologias teatrais e sejam comprometidos com seu trabalho. Em outras palavras, o professor de teatro na escola, além de possuir conhecimento teatral, deve estar em permanente contato com as principais abordagens sobre o ensino do teatro para que essa prática pedagógica tenha objetivos claros e consistentes de aprendizagem. 24 Em relação às artes musicais, a educação musical tem sido colocada como algo facultativo na escola. Há uma total desconsideração com o poder que a música exerce sobre as pessoas, bem como a influência que exerce sobre o desenvolvimento cultural e cognitivo das crianças e das pessoas em geral (ESCOSTEGUY, 2017). Não há estudos que vinculem a situação de subdesenvolvimento de algumas áreas do país à baixa valoração dada à música brasileira, apontada como um dos fatores que mais contribui para a baixa estima que o Brasil possui em relação a si mesmo. Um princípio bastante enfatizado no cenário da educação atual e, consequentemente, no campo da educação musical contemporânea é a ideia de valorizar o contexto cultural do estudante, compreendendo, reconhecendo e utilizando o seu discurso musical como base para o processo de ensino e aprendizagem da música. A mudança de mentalidade é um fator fundamental para que se avance em termos da música na escola, principalmente levando-se em consideração a qualidade desse ensino de música que se espera na educação básica para todos os estudantes. Essa mudança de mentalidade depende de argumentações e de orientações claras sobre como fazer essa inclusão da música, como respeitar o ensino da arte como um todo na escola, como elaborar editais que garantam a especificidade de cada linguagem artística, e assim por diante. O Conselho Nacional de Educação está atuando diretamente nessas questões referentes à implementação da Lei nº 11769/2008, realizando audiências públicas nas diferentes regiões brasileiras com o objetivo de ouvir administradores, professores, profissionais da educação em geral e estudantes de licenciatura sobre os desafios e as ações necessárias para que a música passe a fazer parte do currículo (ESCOSTEGUY, 2017). O importante é que existe a intenção de conhecer melhor a situação da música na escola e encontrar soluções para os desafios vinculados a essa inclusão da música no currículo escolar. Segundo Escosteguy (2017), as mudanças desejadas acontecerão a partir das ações que envolvem as universidades formadoras; os profissionais da educação atuantes nas escolas brasileiras; os administradores escolares responsáveis pela reorganização curricular e pela contratação de profissionais para a escola; e a sociedade como um todo, que precisa também conhecer e opinar sobre as possíveis decisões curriculares. 25 3.3 Compreendendo as artes plásticas, visuais e literárias na contemporaneidade A relevância de se abordar a arte contemporânea na escola está na diversidade de experiências que ela apresenta, na relação com outras áreas, na proximidade da arte com a vida e sua constante mutabilidade, o que a torna um importante veículo para a produção de sentidos, dentre outros aspectos. Portanto, é possível trabalhar em consonância as artes plásticas, visuais e literárias por apresentarem tantas diferenças, mas, ao mesmo tempo, muitas afinidades. Afirma-se que as três trabalham com o visual, o concreto e a criatividade. Quando se pensa em artes visuais, logo vem à mente desenhos, pinturas, esculturas, tinta, entre outros milhares de recursos capazes de representar o mundo real ou o imaginário. No entanto, elas estão além do papel. O campo de atuação nas artes visuais é amplo. O teatro, o cinema, a música, a fotografia, a moda ou a arquitetura, por exemplo, também as representam. A arte é o registro mais fiel da história da humanidade. É o retrato da contemporaneidade de cada época. Os conteúdos, por exemplo, estão conectados à literatura, geografia, física, química, música, teatro, etc. Fazendo essas conexões, essas “teias”, tornam-se evidentes outros olhares e percepções estéticas diferenciadas. A visualidade também tem impacto sobre a aprendizagem. A capacidade das crianças de sentir uma imagem está se tornando cada dia mais presente e influente. Não se pode mais dizer que a escola é o único lugar onde os alunos apreendem. Portanto, o educador deve ensinar os conhecimentos artísticos culturais do passado 26 associado aos dias atuais. Sobre esse assunto, Escosteguy faz o seguinte comentário: Atualmente se vive em um aparente estado de submersão no universo virtual, definido por um espaço multiplicado exponencialmente pela imagem, e que redefine, reiteradamente, a nossa relação com o mundo. Ao se estar submerso no virtual, sofre-se uma espécie de escaneamento constante, como uma invasão desejada/não desejada, interna/externa, sendo que o mapa resultante desse esquadrinhamento interfere em todos os lugares, atuando diretamente nas escolhas que se faz e, consequentemente, nas ações de todos. (2017, p. 167). As artes plásticas, por sua vez, referem-se a expressões artísticas que utilizam técnicas de produção que manipulam materiais para construir formas e imagens que revelem uma nova concepção estética e a visão poética do artista plástico. No interior das escolas, esse tipo de arte adota várias linguagens artísticas contemporâneas para expressar emoções e valores estéticos. A multiplicidade como expressão do modo de conhecimento do homem contemporâneo condiz com as proposições artísticas atuais, com a educação em arte e com as tecnologias do século XXI. Portanto, questionar, desacomodar, problematizar, instigar, estender caminhos à reflexão... O ensino de Arte na contemporaneidade deve estar norteado nessas ações. A Arte também proporciona conhecimento e também nos leva à transformação, seja ela arte visual ou plástica. A literatura, como a arte visual e a plástica, prescinde de significação, não pode ser contida, pois alcança o inatingível, o imensurável. A literatura é a arte da palavra e faz da palavra o seu principal objeto, concedendo-lhe outras possibilidades, 27 retirando-a do seu lugar habitual e transpondo-a para um universo onde apenas homens e mulheres dotados de subjetividade podem percebê-la. A arte, em geral, e a literatura, em particular, são atividades cujas grandezas residem nessa sublime “inutilidade”. A literatura é fruição, é mergulhar no prazer que a leitura pode oferecer. O prazer estético que a literatura proporciona nos torna mais atentos àquilo que é impalpável, torna-nos sensíveis às dores do mundo. “A literatura existe porque a vida não basta” – foi assim que o mestre Fernando Pessoa definiu a literatura. O que seria da vida se não houvesse os momentos de fuga que nos permitem abstrair e, assim, amenizar o dia a dia e suas inúmeras obrigações que preenchem de vazio nossos dias. Se, para Pessoa, escrever é esquecer, para o leitor, leré esquecer, é permitir-se entrar em sintonia com a palavra, com o estado de fruição que só a arte nos permite experimentar. A vida não basta; para isso, existe a literatura, para preencher os vazios que a realidade não consegue perceber. (ESCOSTEGUY, 2017). Ler, assim sendo, não é uma atitude passiva; não se reduz a uma simples decodificação de sinais gráficos, mas pressupõe uma atividade de reconstrução de sentidos. Ela não é um ato solitário porque envolve o diálogo com o interlocutor, que pode ser com diversos escritores. No momento em que fazemos o cruzamento de um texto com outro, que introduzimos questões, os interlocutores se ampliam. Nesse sentido, a leitura é sempre escritura; são processos geminados. O texto literário apresenta sempre dupla escritura–leitura; ele é uma rede de conexões atravessada por várias formações discursivas. Leitura e escrita são processos que se completam e complementam. É por meio da literatura, diz Escosteguy (2017), que os alunos desenvolvem a imaginação, o hábito de leitura, o pensamento crítico e suas emoções. E, mesmo sabendo que o ensino de literatura não está tão presente nas escolas como deveria, deve ser tomando cuidado para não tornar monótona essa disciplina tão importante. A arte literária é de fundamental importância para o desenvolvimento das pessoas – para nossa formação social –, contemplando os mais variados aspectos que vão desde a linguagem, passando pela sensibilidade, emoção até a criticidade e exercício de reflexão que são fundamentais para as diferentes aprendizagens. Pelas leituras, nos apropriamos de um vasto conhecimento sobre diferentes lugares e 28 descobrimos um novo mundo de culturas e saberes, muitas vezes sem fisicamente sairmos do lugar. Ler é um processo contínuo, pois envolve uma compreensão que não se esgota na decodificação da palavra escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. Para Orlandi (2003), a produção do sentido está no modo como a leitura se relaciona entre o dito e o compreendido. O ato de ler implica, segundo Freire (1989), na percepção crítica, na interpretação, na reescrita e na reelaboração do que lemos. 4 ARTE E SOCIOLOGIA A relação entre a arte e a sociedade, desde há muito tempo, tem provocado pensadores de diversas áreas do conhecimento. Alguns autores apontam o enciclopedista Denis Diderot como marco inicial, o primeiro a destacar o caráter social da arte, identificando nela um potencial instrumento para reformas sociais, antecipando Karl Marx, e inaugurando o diálogo entre arte e sociedade. Posteriormente, empenhados em compreender as estruturas do fenômeno artístico, Hippolyte Taine, Charles Lalo, Sigmund Freud, Carl Gustav Jung, Arnold Hauser, Pierre Francastel, Roger Bastide, Pitirim Sorokin, Michel de Certeau, e pensadores de linha mais marxistas como Georgy Lukács, Ernest Fischer, Jean Duvignaud, Walter Benjamin, Theodor Adorno e Nestor Garía Canclini, dentre outros, criaram teorias extrapolando o enfoque puramente social ou abrangendo os aspectos estéticos, psicológicos, psicanalíticos, históricos e filosóficos da arte. (BAY, 2006). De acordo com Bay (2006), os estudos desta inter-relação afloraram principalmente nos campos da Sociologia da Arte, da Estética Sociológica, da Filosofia da Arte e da História Social da Arte. O traço comum a todas as abordagens é a constatação, já vislumbrada por Platão, de que arte e sociedade são conceitos indissociáveis, uma vez que ambos se originam da relação do homem com seu ambiente natural. Igualmente é consenso entre autores que a arte representa um fator fundador, unificador, e agente nas sociedades, desde as mais simples às mais complexas; fato que pode ser constatado ao longo da história, quando fica evidente que, não só não houve sociedade sem arte, mas também que em cada contexto específico a arte sempre teve um significado social preponderante. 29 O motivo desta presença marcante tem sido objeto de incessantes investigações sobre a natureza da criação artística, os fatores internos e externos envolvidos e a função do artista na sociedade. As inúmeras respostas variam desde a função da arte como substituta da vida, mantenedora de equilíbrio com o meio, caminho para o alcance da totalidade, anseio de união da individualidade com o social; passam pela busca da verdade permanente expressa na arte, de algo que tenha significação transcendente, para além da simples descrição do real; e alcançam o entendimento de que o homem necessita da arte, incluindo aí a inerente parcela mito- mágica, para conhecer e transformar o mundo, ou seja, a arte como imprescindível meio de conhecimento e transformação (BAY, 2006). Fonte: https://www.lotsearch.net/ É verdade, entretanto, que existe ainda certa dificuldade no tocante a integração da arte nas ciências sociais - o que pode ser potencializado como um ganho, ao possibilitar abordagens transdisciplinares - porque as diferentes proposições existentes tendem a privilegiar um determinado enfoque, como o histórico, o psicológico, o filosófico ou o estético, descuidando da interação e articulação entre eles. A sociologia da arte como disciplina é fruto do Positivismo e nasceu em intensa oposição ao Romantismo, embora permaneçam nela alguns resquícios românticos, como por exemplo, a noção de que a arte reflete e revela, não mais o espírito do 30 tempo, mas sim o contexto histórico. Ao examinar a relação da obra com o meio procurando no fenômeno artístico uma origem ancorada na função social, a sociologia vê a arte essencialmente como uma maneira de comunicação entre os indivíduos e seus grupos. Sua proposição fundadora é de que a arte e a realidade são em si uma mesma coisa, não havendo distanciamento entre ambas. Enfocando predominantemente as relações inter-humanas derivadas da arte como fator de convivência, a sociologia negligencia a questão da estética, fator relevante, uma vez que intrínseco à arte. (BAY, 2006). 4.1 Arte e sociedade, um binômio indissociável Os pensamentos de Karl Marx sobre arte e sociedade são baseados no materialismo dialético. Retiradas de comentários expressos em textos diversos, alguns reunidos no livro Sobre Literatura e Arte, uma vez que o autor não se dedicou notadamente ao assunto, são hoje vistas com certas restrições, ou mesmo como anacrônicas. Disse que arte e literatura só podem ser estudadas diretamente no contexto da história, do trabalho e da indústria, pois o modo de produção terá um papel decisivo na sociedade e na vida intelectual. Assim, a estrutura econômica da sociedade e a organização da produção e das classes sociais dela participantes, seriam fatores determinantes para a cultura, que por sua vez pertenceria a superestrutura, abarcando a arte. Fonte: https://revistagloborural.globo.com/ 31 Isso contribuiu para o entendimento da arte como sendo reflexo da realidade social e também como uma forma de conhecimento capaz de interagir nela, com o poder de modificá-la. Atribuindo a arte um caráter libertador, via a possibilidade de ela exercer tal função através da representação formal e realista dos conteúdos da luta de classes. Todavia, Marx não ousou aplicar literalmente o método dialético no estudo da arte, pois embora a tomasse como um reflexo da realidade, relegada à condição secundária da superestrutura, admitia sua capacidade de expressar a beleza, entendendo que o artista necessitava conceber a obra antes de realizala. Marx observou que em certos períodos havia uma defasagem entre o desenvolvimento artístico e o da produção material, entrando em jogo outros fatores como natureza e raça (BAY, 2006). Mencionou o exemplo dos gregos, que considerava crianças normais, mas com alto grau de desenvolvimento artístico: ...a dificuldade não está na idéia de que a arte e a epopéia gregas estejam ligadasa certas formas de desenvolvimento social. A dificuldade está em compreender por que ainda hoje nos proporcionam um prazer artístico e valem, em certos aspectos, como norma e modelo insuperáveis. (MARX, 79, pág.35) A arte, segundo Marx, mesmo condicionada histórica e socialmente, poderia mostrar um momento de humanidade. Tal capacidade da arte de se sobrepor ao momento histórico é que faz com que ela continue permanentemente a extasiar, a valer como modelo e norma insuperáveis, nas suas próprias palavras. Uma concepção um tanto quanto idealista no contexto de seu pensamento que via no realismo da representação o compromisso da arte para com a sociedade e as ideias do socialismo. Numa visão conceitual extremamente diferenciada, fundada na psicanálise, Sigmund Freud (1856-1939) escreveu inúmeros artigos específicos sobre a criação artística e seu lugar na sociedade, tais como Uma Recordação da Infância de Leonardo da Vinci, O Moises de Michelangelo, Escritores Criativos e Devaneio, O Delírio e o Sonho em Gradiva, Poesia e Verdade, e Dostoievski e o Parricídio. A partir deles é possível identificar duas vertentes principais em sua abordagem a propósito do tema. Uma que se centraliza na figura do artista, mostrando que a obra apresenta relação direta com sua história pessoal, principalmente a da infância, e outra que entende a arte conduzida por um processo de simbolização, exatamente o mesmo que age no inconsciente individual e determina a cultura. (BAY, 2006). 32 Seus estudos psicanalíticos sobre alguns artistas o levaram a asseverar que o artista não seria um neurótico, mas que, ao contrário, ao criar realizaria também um processo de adequação à realidade circundante, ao conscientemente transformar seus impulsos inconscientes. Observa-se que nesta afirmação já se delineia o papel social da arte como mediadora, como fator de adaptação do indivíduo à sociedade. Freud acreditava que a arte teria o poder de liberar o artista de suas fantasias, permitindo-lhe exorcizar os fantasmas interiores, canalizando-os para a obra, num processo catártico e terapêutico. Desta maneira entendeu que o ponto inicial de criação era a própria vida do artista, a qual determinaria a temática, o estilo e toda forma plástica, de tal maneira que a obra poderia ser vista como um substituto das fantasias geradas pelo seu inconsciente. Um conceito chave no entendimento da ideia freudiana de arte é o de sublimação, o mecanismo de derivação das pulsões sexuais em direção a objetivos de outra ordem; tal processo, ao qual o autor atribui a possibilidade de realização da cultura, viabilizaria também o processo de criação da obra de arte. O artista seria para ele um tipo de pessoa propensa à sublimação, correlacionada à estrutura de personalidade fundamentalmente narcisista, a qual descobre na arte a forma de realizar suas fantasias de poder e de criação. Igualmente o narcisismo teria a função de tentar ultrapassar a condição mortal do artista, atendendo à necessidade humana de busca de imortalidade. (BAY, 2006). Percebe-se assim a arte constituindo-se como um elemento intermediário entre a realidade e a imaginação, entre o interno e o externo, o individual e o social: A arte é uma realidade convencionalmente aceita, na qual, graças à ilusão artística, os símbolos e os substitutos são capazes de provocar emoções reais. Assim, a arte constitui um meio-caminho entre a realidade que frustra os desejos e o mundo dos desejos realizados da imaginação – uma região em que, por assim dizer, os esforços de onipotência do homem primitivo ainda se acham em pleno vigor. (FREUD, apud RAFFAELLI, 1996, pág. 11) Conforme Freud afirmava, o processo pelo qual o artista passa ao criar e realizar a obra desencadeia uma espécie de eco no espectador que provocaria um caminho inverso, indo da obra até o conteúdo inconsciente que motivou o artista. Assim haveria uma identificação entre os desejos reprimidos do artista e os desejos equivalentes do espectador, de sorte que tal identificação seria o fator desencadeante do prazer estético. Resultado da possibilidade de experimentar desejos e realizar fantasias reprimidas na realidade social, o prazer estético estaria no mesmo nível do 33 prazer sexual, realizando um deslocamento do impulso sexual em direção à apreciação da beleza; em suma, encontrar-se-ia fatalmente atrelado à libido. Caracterizada desta forma, a arte estaria destinada a carregar para sempre “a cruz da sublimação”. (RAFFAELLI, op.cit., pág.11) Fonte: https://br.pinterest.com/ O outro ponto da explicação de Freud para a arte, de que a obra artística traz em sua gênese um valor simbólico, apresenta-se atualmente mais significativo, sob o ponto de vista da investigação sobre a origem de arte, do que sua teoria que enfatiza mecanismos inconscientes do criador e do receptor. Os simbolismos dos sonhos têm estreita correspondência com simbolismos expressos nas criações artísticas, que nada mais são do que suas transformações. (BAY, 2006). Mas como as representações nos sonhos constituem-se basicamente em imagens visuais, Freud via os sonhos como um complexo sistema de escritura, correlacionada às escritas pictográficas e aos hieróglifos, nos quais alguns elementos servem como marcadores 34 que apontam para determinados significados somente identificáveis num certo contexto. Para ele isto foi um indício de que a lógica dos sonhos não estaria ancorada no logos consciente, mas que, do mesmo modo que a escritura artística, seria regida por regras próprias, sendo impossível tentar traduzí-las em outra linguagem. Pode- se dizer que Freud considerou a obra de arte um todo analisável em si mesmo, no qual a modificação em um simples elemento desencadeia a constituição de um outro e diverso conjunto. (BAY, 2006). Essa constatação possibilitou o desenvolvimento de abordagens posteriores sobre a criação e interpretação da obra de arte, como as de Gaston Bachelard (poética da imagem), Gilbert Durand (mitocrítica), Hans Robert Jauss (estética da recepção), Wolfgang Iser (efeito estético), dentre outros. Convertendo conteúdos psíquicos como fantasias e sonhos, ou sublimando as forças da libido, o que se extrai da teoria freudiana é que a arte em relação ao social tem função mediadora, de promover a adaptação do indivíduo e garantir o equilíbrio das sociedades. Com o objetivo de criar uma história dos distintos modos de subjetivação dos seres humanos, uma demonstração de seu pensamento multifacetado e da ruptura epistemológica que promoveu, Michael Foucault, deixou em sua obra algumas opiniões importantes sobre arte. Ainda que este tema não tenha sido seu principal objeto de estudos, é possível encontrar, de forma esparsa e basicamente nas Conferências, algumas ideias e conceitos sobre arte e sua inserção na sociedade. Segundo Bay (2006), Foucault valorizou a relação entre a sociedade e a arte, sobretudo pela possibilidade de ruptura e de desconstrução que ela pode desencadear através da experiência e da vivência, para o criador e para o público receptor. Situou a arte ao lado da loucura, num parentesco mágico entre a insanidade e a genialidade, apontando a genialidade como a antítese não formulada das visões institucionais da loucura e de suas relações latentes com o crime, com a miséria material e espiritual, e com as doenças incuráveis em geral. Para ele, o conjunto oculto e desequilibrado de carências que se manifestam sob as diversas formas de loucura, não passariam de uma consciência trágica vigilante. Esta mesma consciência trágica abafada, mas sempre de vigília, irromperia no artista, possibilitando através da obra ultrapassar a razão, e ir além das promessas da dialética. Para Foucault a arte na sociedade moderna é portadora de um discurso trágico, uma experiência até certo ponto negativa e radical, que provocaria alterações, deslocamentose transposições; daí então a contigüidade com a loucura, e a aparente 35 ausência de sentido. Para ele, ao re-inventar um outro diálogo a arte estaria expressando o homem moderno em sua experiência trágica. A arte ao cumprir o papel de vigília e contestação, apontaria os limites e a interação entre o real e o possível, entre a palavra e a imagem, isto é, entre o homem e seu simbólico, entre a continuidade e a ruptura. Pode-se inferir que Foucault percebeu o artista como agente desencadeador de mudanças, polemizador e crítico da ordem presente na medida em que constrói significações novas, entre o real e o possível. Assim enquanto intelectual e produtor de cultura, seria ele capaz de mobilizar e desestabilizar, apontando ou desencadeando novos caminhos para reflexão; daí a probabilidade de vê-lo como um intelectual específico foucaultiano. (BAY, 2006). Fonte: https://www.culturagenial.com/ Analisando as obras de arte, destacadamente na que realizou sobre a pintura As Meninas, de Diego Velazques, Foucault destacou o jogo existente entre o visível e o invisível. Levantou a questão do reflexo, do espelho, da presença do espelho, que da mesma forma que a obra, mostraria o invisível, o que ela deixa entrever e o que oculta. Este jogo entre o sugerido e o manifesto na criação artística é um fio condutor do pensamento de Foucault sobre a arte, uma vez que aparece em vários de seus estudos. Entendeu ele que o artista se colocaria na borda entre o que é plenamente visível e a invisibilidade, “ele reina no limiar dessas duas visibilidades incompatíveis”. (FOUCAULT, 2002, pág 4.) 36 Na obra de arte a essência revelada seria a invisibilidade profunda do que se vê, e ao mesmo tempo, solidária com a visibilidade de quem vê, do fruidor participante. A obra procuraria auto-representar-se através dos elementos que a compõem, tornando-se então apresentação da própria representação, bem mais que a simples semelhança explícita, acena a uma similitude presente, mas não dita: “É, talvez, por meio desta linguagem nebulosa, anônima, sempre meticulosa e repetitiva, porque demasiado ampla, que a pintura, pouco a pouco, acenderá suas luzes”. (FOUCAULT, op. Cit., pág. 12.). O filósofo italiano Umberto Galimberti, por sua vez, aborda a arte e a implicação dela na sociedade a partir da impossibilidade da existência de uma sem a outra. Este co-pertencer é para ele essencial, uma vez que afastar o homem da expressão espiritual propiciada pela arte, equivaleria a limitá-lo a condição animal; da mesma forma a arte em sua materialidade não existiria sem o homem, estaria restrita ao domínio do espírito. (BAY, 2006). Deste modo vinculados e pertencentes à terra, arte e homem encontrar-se-iam prisioneiros de um destino perecível muito embora ambos tendam para o eterno. Assim a arte seria um enobrecimento da condição humana e concretizaria a tensão do homem para além da espessura opaca e escura da matéria, através de uma entrega à debilidade e efemeridade da mesma matéria que viabiliza sua comunicação. Diz ele: “O homem não tem nenhum valor se não consegue exprimir algo que transcenda sua vida biológica, e a arte é uma forma desse transcender. Mas também a arte não tem nenhum valor se não reflete o ultrapassar do homem, a sua superação da condição animal”. (GALIMBERTI, 2003, pág. 186). Ao estudar os vestígios do sagrado na civilização ocidental atual, Galimbert (2003) considera a arte uma de suas últimas pegadas. Para ele, a dimensão do sagrado, embora pareça não mais estar entre nós numa época em que a técnica dessacralizou tudo o que nos rodeia, continuaria a existir fora e dentro de nós, no inconsciente ou na loucura. Esta região misteriosa, que é tudo o que antecede a razão, as regras e a organização civil, pertence ao domínio do sagrado o qual age dentro de nós, que desprovidos de rito e sacrifícios para nos defendermos, nos encontramos expostos diretamente a ele. Os resultados seriam as angústias e ansiedades, por vezes loucuras, violências e outras sociopatias, para as quais nem mais a psicanálise tem sido suficiente. (BAY, 2006). 37 Galimberti acredita que se faz necessário a reconstrução de liturgias, cantos, danças e outras situações em que a comunidade se recolha, pois se continuarmos esquecendo ou ignorando o sagrado, não mais teremos humanidade; do mesmo modo que se nos deixarmos tomar totalmente por ele, chegaremos a devastação. É imperativo termos então uma relação ambivalente para com o sagrado se quisermos evitar a dissolução da personalidade e a aceleração das doenças sociais, na relação do indivíduo com a coletividade. No entender dele a arte seria uma possível alternativa, pois: “Estética” é composição do dado e daquilo que o transcende, mas para que uma inteligência possa transcender é necessário que uma paixão a dirija. E cultivar uma paixão, movendo as delicadíssimas teclas da sensibilidade, é tarefa tipicamente estética e ao mesmo tempo religiosa.O que se cria é a harmonia que emana da composição de uma laceração, algo que também Kant, a pesar de atento às exigências da razão matemática, soube indicar como configuração do belo, ou melhor, do sublime. (GALIMBERTI, op. Cit., pág. 194). A proposta de Galimbert é um retorno ao sagrado, na forma de seus rastros, na mobilização dos afetos e na construção de uma teoria da sensibilidade. Inclui nesta urgente retomada as manifestações e as vivências artísticas, linguagens simbólicas, como forma de experiência do sublime e aproximação ao sagrado. É novamente a arte compreendida como fator de equilíbrio social e psíquico do indivíduo, interligada às questões da ética e da técnica na sociedade contemporânea, na qual predomina a ausência de sentido. 5 ARTE E COMUNICAÇÃO 5.1 Por que as comunicações e as artes estão convergindo? Segundo Lucia Santaella (2008), no mundo antigo e na Idade Média, o que hoje chamamos de artes visuais era considerado como artesanato utilitário dentro do mesmo paradigma de outros tipos de artesanato, tais como fabricação de móveis, sapatos etc. Esse quadro só se modificou no Renascimento, quando os artistas conseguiram levantar o status das artes ao colocar em destaque seu caráter intelectual e teórico. 38 A autora (2008) comenta ainda que durante o século XVIII, o sistema das artes foi esquematizado em cinco belas artes: pintura, escultura, arquitetura, poesia e música. O adjetivo “belas” (em inglês fine) implicava, além da beleza, a habilidade, a superioridade, a elegância, a perfeição e a ausência de finalidades práticas ou utilitárias, em contraste com o artesanato mecânico e aplicado. A arquitetura, a pintura e a escultura eram as três principais artes visuais da Europa, durante um bom tempo, pelo menos do Renascimento até meados do século XIX. Essas artes se desenvolveram e consolidaram muito em razão do apoio dos indivíduos e grupos mais ricos e poderosos daquelas sociedades: reis, príncipes, aristocratas, a Igreja, mercadores, governos nacionais, conselhos municipais etc. As mudanças trazidas pela Revolução Industrial, pelo desenvolvimento do sistema econômico capitalista e pela emergência de uma cultura urbana e de uma sociedade de consumo alteraram irremediavelmente o contexto social no qual as belas artes operavam. Desde então e cada vez mais, nossa cultura foi perdendo a proeminência das “belas letras” e “belas artes” para ser dominada pelos meios de comunicação. Nesse contexto, as expressões “meios de massa” e “cultura de massa” denotam os sistemas industriais de comunicação, sistemas de geração de produtos simbólicos, fortemente dominados pela proliferação de imagens. Trata-se de produtos massivos porque são produzidos por grupos culturais relativamente pequenos e especializados, e são distribuídos a uma massa de consumidores. Na lista dos meios de massa incluem-se geralmente a fotografia,
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