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Unidade 02 – O que é texto? Objetivo Proporcionar aos estudantes a habilidade necessária para o desenvolvimento de textos acadêmicos e o conhecimento da estrutura dos mais variados gêneros usados no contexto universitário e fora dele. O que é texto? Você deve estar se perguntando o que é um texto, não é mesmo? O que caracteriza um texto ou mesmo o que faz um texto ser um texto? A palavra texto tem a origem latina “textu” e significa literalmente, “tecido”. Vejamos o que diz Fávero e Koch (2001) sobre esse assunto: Como se pode observar na citação acima, o texto consiste em qualquer passagem falada ou escrita que forma um todo significativo independente de sua extensão. Trata-se, pois, de um contínuo comunicativo contextual caracterizado pelos fatores de textualidade. Nesse sentido, concorda Costa Val (1992) quando define o texto como “ocorrência linguística falada ou escrita, de qualquer extensão, dotada de unidade sociocomunicativa, semântica e formal”. Sendo a linguagem considerada como forma de inter(ação) entre os interlocutores, cuja função básica é persuadir e convencer e não apenas comunicar, então, os estudos da língua já não podem mais estar ancorados, apenas, nos campos da estrutura linguística: da morfologia, da fonética e da sintaxe frasal. Torna-se necessário uma reatualização sobre a concepção de texto em contextos mais amplos, que levem em consideração pressupostos advindos de áreas como a Linguística Textual, a Análise do Discurso dentre outras, para que se possa dar conta de explicar certos fenômenos linguísticos que ocorrem entre os enunciados e sequências enunciativas. Nessa perspectiva pode-se considerar texto uma frase, um fragmento de um diálogo, um provérbio, um verso, uma estrofe, um poema, um romance e também expressões situadas em contextos específicos como “Socorro!”, “Silêncio!”, “Fogo!”, etc. Sintetizando Texto é toda e qualquer sentença/ou expressão que constitua comunicação. Exemplo 01 Fonte: http://planetaterra-chama.blogspot.com/2011/07/o-planeta-terra-pede-socorro-o-planeta.html Perceba, caro aluno, que o texto acima (exemplo 1) deve ser entendido como um todo significativo, levando-se em consideração não apenas a palavra isolada por ela mesma, mas o contexto comunicativo em que se insere. Há de se considerar na leitura desse texto o pedido de socorro refere-se ao nosso próprio planeta que não cabe aqui discutir todos os seus problemas: miséria, fome, guerra, terrorismo, desmatamento só para citar alguns. Exemplo 02 Fonte: https://pascoalonline.blogspot.com/2012/04/silencio-e-o-melhor-remedio.html Este segundo exemplo pode ser considerado um texto? Com certeza todos vocês reconhecem ao ver tal imagem que se trata de um pedido de silêncio. Mas pensemos, então, em que contexto isso pode ocorrer, pois não se trata de um pedido de silêncio qualquer. Na realidade é um pedido de silêncio em contexto específico: num hospital, em um posto de saúde. Compreendemos assim pelas marcas que a imagem nos traz, a posição do dedo indicador na boca, as roupas na qual a personagem se veste nos indicam que se trata de um pedido de silêncio num contexto comunicativo específico. Exemplo 03 O terceiro exemplo é um excerto de um texto conversacional. Trata-se de uma entrevista de televisão. Com suas características próprias, o texto conversacional é reconhecido como um todo significativo se levarmos em consideração o contexto em que o mesmo se insere. Veja-se que os falantes vão se revezando nos turnos conversacionais e utilizando-se de marcas próprias da modalidade oral da língua. PRETI, Dino (org.). Análise de textos orais. São Paulo: Humanitas, 2003. Exemplo 04 O quinto exemplo é um texto pertencente à esfera lexicográfica: um verbete de um dicionário. Veja que um texto nunca está isolado de um contexto mais amplo. Ele pertence a uma esfera social, tendo, portanto, uma função sociocomunicativa. Um texto, nessa perspectiva, pode ser, então, uma amostra de comportamento linguístico-textual e comunicativo encontrados nos mais diversos gêneros textuais presentes em nossa sociedade. Nessa perspectiva até mesmo o silêncio pode ser considerado um texto, desde que tenha uma intenção interativa. No texto conversacional as formas do silêncio, por exemplo, são bastante frequentes e podem servir como estratégias textual-interativas para que o interlocutor conceda a passagem do turno conversacional dentre outras. Vamos ver como Louis Hjelmslev concebe a palavra texto? Para o autor, a palavra texto é tomada em um sentido mais amplo, designando um enunciado qualquer, falado ou escrito, longo ou curto, velho ou novo. “Silêncio!” como vimos no exemplo 2 é um texto tanto quanto o é um conto de Machado de Assis. Vamos refletir? A Lexicografia é uma disciplina intimamente ligada à Lexicologia. Ela se ocupa da descrição do léxico de uma ou mais línguas, a fim de produzir obras de referência, principalmente dicionários, em formato papel ou eletrônico, e bases de dados lexicológicas. Como se observa, conceituar a palavra texto é bem mais complexo do que se pode pensar dada a abrangência de termos que se ligam a sua significação. Mesmo assim, podemos dizer que a configuração de um texto deve levar em consideração alguns critérios de textualidade (tessitura) que garanta a organização do sentido e a completude da mensagem num dado contexto sociocomunicativo. Enfim, é por meio de textos que o discurso se manifesta e qualquer passagem no plano verbal e não-verbal, independentemente de sua extensão, que constitua um todo significativo, efetiva-se em um texto. O que é textualidade? Para falarmos sobre textualidade precisamos muito de sua atenção. Se chegamos até aqui é porque iremos ainda mais longe redescobrindo o fascinante mundo do texto. Afinal, uma das coisas que fazemos todos os dias é produzir e entrar em contato com textos quando conversamos, ao pegarmos um ônibus, ao pagarmos as compras no caixa do supermercado, ao irmos à escola, ao falarmos ao telefone, ao assinarmos um contrato dentre muitas outras atividades durante nossa vida. O texto é uma unidade de linguagem em uso. Como uma ocorrência linguística falada ou escrita deve apresentar três propriedades básicas: • a primeira é sua função sociocomunicativa, tais como as intenções do autor, o contexto sociocultural; • a segunda propriedade é o fato de constituir-se como uma unidade semântica, em que o texto seja um todo significativo, ter coerência; • a terceira propriedade é a sua unidade formal, as palavras se integram para formar um todo coeso. Os autores que tratam da textualidade tomam esse termo como o conjunto de características que fazem com que um texto seja um texto e não apenas uma sequência de frases isoladas do seu contexto de uso. Lembram-se das perguntas iniciais desse capítulo? Beaugrade e Dressler (1983) apontam sete fatores responsáveis pela textualidade, que se dividem em linguísticos e pragmáticos, conforme o quadro seguinte: Fatores linguísticos: a) Coerência É importante ressaltar que a coerência textual não está no texto, mas se constrói a partir do texto. Lembremo-nos de que a construção do sentido vai envolver o autor, que detém experiências de vida e que criou o texto em determinada situação e com um propósito, e o leitor, que também possui experiências prévias e que vai receber o texto em situação e tempo diferentes dos da produção. A coerência textual está ligada ao sentido empregado no texto e também ao sentido construído pelo interlocutor (que são aspectos mentais, ou seja, tudo aquilo que é processado no cérebro), como se refere Koch e Travaglia (2004 p.21): a coerência está diretamente ligada à possibilidade de estabelecer um sentido para o texto, ou seja, ela é o que faz com que o texto faça sentidopara os usuários, devendo, portanto, ser entendida como um princípio de interpretabilidade, ligada à inteligibilidade do texto numa situação de comunicação e à capacidade que o receptor tem para calcular o sentido deste texto. Ainda para Koch e Travaglia (2004) a coerência não está somente no texto, mas também deve ser construída a partir dele. Vejamos um exemplo retirado do “A coerência textual” de Koch & Travaglia (2004, p. 1): Exemplo 05 Fonte: KOCH, Ingedore Vilaça; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual. São Paulo: Contexto, 2004 Percebe-se que no quinto exemplo há falta de sentido na frase do ponto de vista que não há possibilidade de conter uma mesma realização acabada em um primeiro momento e ao mesmo tempo não acabada num segundo, o que fatalmente acarreta incoerência inaceitável na construção textual para o entendimento do texto. Outro exemplo de uma sequência sem elementos linguísticos coesivos, mas que mantém coerência textual pode ser encontrado no texto o show no seguinte exemplo: Exemplo 06 O texto acima foi criado a partir de uma proposta de um modelo de Affonso Romano de Sant’Anna mostrando que mesmo uma lista de palavras sem nenhuma ligação sintática e sem nenhuma explicação quanto à relação entre elas, pode-se perceber a unidade de sentido estabelecido pelos seus componentes. O que faz com que o texto tenha sentido é o conhecimento prévio que o leitor tem do que seja um show, ou seja, está arquivado em sua memória um modelo de um show, desde a divulgação, até o sentimento de vazio quando tudo acaba e o espectador volta para sua casa. b) Coesão A coesão textual aborda os fenômenos sintático-semânticos entre os enunciados, ou seja, os fenômenos que descrevem a relação das frases entre si e o significado das palavras respectivamente. Segundo Koch (2007, p.45) podemos conceber a coesão como fenômeno relacionado ao modo como os elementos linguísticos presentes na superfície textual se encontram interligados, por meio de recursos também linguísticos, formando sequências veiculadoras de sentidos. Pode-se salientar que a coesão é o conjunto de conectores que, ao serem inseridos de forma correta no texto, dá a ele a coerência esperada. Em Koch (2005, p.13), há um exemplo que define bem a importância da coesão textual para um texto: Exemplo 7 Fonte: Koch (2005, p.13) No sétimo exemplo, pode-se perceber que o texto não é um amontoado de frases sem nexo, ou uma soma de frases isoladas, essas frases são entrelaçadas por chamados recursos de coesão textual. Conforme Halliday & Hassan: “a coesão ocorre quando a interpretação de algum elemento no discurso é dependente da de outro”, ou seja, para que haja coesão é necessário que os enunciados tenham ligação entre si. Os conectores estabelecem a relação entre elementos do texto, correlacionam o que está para ser dito com o que já foi dito. A coesão divide-se em duas ramificações: a coesão referencial e a coesão sequencial. Basicamente, a coesão referencial está ligada à disposição dos elementos coesivos no texto, em que um elemento faz remissão a outro no texto. O primeiro elemento é chamado forma referencial ou remissiva e o segundo elemento de referência ou referente textual. O elemento de referência/ referente textual pode ser representado por um nome, um sintagma, um fragmento da oração ou um todo enunciado. Vejamos como isso ocorre no exemplo 8, a seguir: Exemplo 08 No oitavo exemplo, “homem” é o elemento denominado de forma referencial e “ele” é o elemento de referência, ou seja, remete a um elemento que já foi dito. A coesão sequencial subdivide-se em sequenciação parafrástica e sequenciação frástica. A sequenciação parafrástica dá-se quando o autor utiliza de formas diferentes a serem percebidas pelos leitores. Para isso utiliza-se de alguns artifícios chamados de elementos de recorrência que, segundo Koch (2000 p. 51 a 54), são: • Recorrência de termos: reiteração de um mesmo item lexical geralmente usado para ideia de continuidade ou enfatização. Por exemplo: “E o cavalo corria, corria, corria...”. • Recorrência de estruturas: usa-se as mesmas estruturas sintáticas, preenchidas com itens lexicais diferentes”. Como o exemplo encontrado de Gonçalves Dias: (1) Nosso céu tem mais estrelas, (2) (1) Nossas várzeas tem mais flores, (2) (1) Nossos bosques tem mais vida, (2) (1) Nossa vida mais amores. (2) Em (1) tem-se a mesma estrutura sintática e em (2) são os itens lexicais diferentes usados no preenchimento da estrofe. • Recorrência de conteúdos semânticos-paráfrase: mesmo conteúdo semântico apresentado sob formas estruturais diferentes, significa que o autor usa o texto de um outro, com palavras diferentes, o que é muito recorrente em trabalhos acadêmicos. • Recorrência de recursos fonológicos segmentais e/ou suprassegmentais: o autor utiliza características da poesia como: o ritmo, a rima, a assonância, a aliteração, etc. • Recorrência de tempo e aspecto verbal: é fator coesivo a partir do momento em que o autor indica ao leitor/ouvinte que se trata de uma sequência, principalmente temporal, a partir do modo em que a sequência verbal é utilizada. A sequenciação frástica se dá pelas relações gramaticais formadas por marcas linguísticas, que são os elementos coesivos, tornando o texto mais rápido e de leitura mais eficiente. Fatores Pragmáticos: a) Intencionalidade A intencionalidade tem relação estrita com o que se tem chamado de argumentatividade. Se considerarmos que não existem textos neutros, que há sempre alguma intenção ou objetivo da parte de quem produz um texto, e que este não é jamais uma “cópia” do mundo real, pois o mundo é recriado no texto através da mediação de nossas crenças, convicções, perspectivas e propósitos, então somos obrigados a admitir que existe sempre uma argumentatividade subjacente ao uso da linguagem. Para Koch & Travaglia (2004) a intencionalidade está atrelada aos propósitos comunicativos do interlocutor. Veja o que diz os autores: b) Aceitabilidade A aceitabilidade está relacionada à atitude do receptor frente aos textos, se tem relevância ou utilidade para ele. Tal princípio depende da intencionalidade, relacionada à atitude do autor que busca apresentar um texto coerente e coesivo. Quem produz um texto tenta criá-lo com sentido para que o interlocutor assim o receba. Há quem considere que não existe texto incoerente, uma vez que, pelo princípio da cooperação, o receptor esforça-se para dar um sentido ao texto e tenta encontrar coerência nele. Assim, a aceitabilidade de um texto dependeria menos de sua correção em termos de correspondência ao “mundo real” e mais da credibilidade e relevância que lhe são atribuídas numa determinada situação. (Sobre o assunto, consultar Koch, 1996,1997 e Costa Val, 1996). c) Informatividade A informatividade é avaliada em função das expectativas e dos conhecimentos dos usuários. Para Beaugrande e Dressler (1981) esse fator de textualidade tem a ver com grau de novidade e de previsibilidade, pois quanto mais previsível, menos informativo será o texto para determinado usuário, porque acrescentará pouco às informações que o recebedor já tinha antes de processá-lo. Os usuários tenderiam a rejeitar tanto os textos que têm, para eles, Informatividade alta demais, porque são muito difíceis (ou impossíveis) de serem entendidos quanto aqueles que lhes parecem óbvios, porque pouco acrescentam aos conhecimentos já adquiridos pelo interlocutor do enunciado. Segundo os autores, um grau mediano de informatividade seria o mais confortável, porque permitiria ao recebedor apoiar-se no conhecido para processar o novo. Por outro lado, para os autores, funcionaria melhor um texto que alternasse zonas de baixa informatividade com zonas de alta informatividade, porque, no processamento desse texto,o recebedor teria que agir no sentido de alçar ou rebaixar informações, levando-as ao nível mediano, para integrá-las no sentido que está produzindo para o texto, e esse trabalho o manteria envolvido com o texto, interessado no texto. Nessa perspectiva, a informatividade não é pensada como característica absoluta nem inerente ao texto em si, mas como um fator a ser considerado em função dos usuários e da situação em que o texto ocorre. O princípio da informatividade mostra até que ponto uma informação é nova ou não no texto. Tanto o excesso como a escassez de informações novas podem prejudicar o entendimento do texto. Cabe destacar que é nova a informação não recuperável no texto e que constitui um dado a que pode ser recuperada. Facilita a compreensão do texto o conhecimento partilhado, o conhecimento de mundo, com algum grau de similaridade, do remetente e do destinatário. d) Situacionalidade A situacionalidade refere-se a fatores que dão relevância a um texto numa dada situação comunicativa. O texto vincula-se às circunstâncias em que interagimos com ele e sua configuração aponta a utilidade e a pertinência dos nossos objetivos. Assim, a situacionalidade se configura como um princípio importante para a constituição da textualidade, já que a coesão, a coerência, a informatividade e as atitudes/disposições de produtor e recebedor (intencionalidade e aceitabilidade) são função do modo como os usuários interpretam as relações entre o texto e sua situação de ocorrência: o sentido e o uso do texto são decididos via situação (Beaugrande e Dressler, 1981, p.10). Esse conceito não se resume às circunstâncias empíricas em si, mas de atividade dinâmica, que envolve monitoramento e gerenciamento contínuos da interação comunicativa, por parte do produtor e do recebedor, uma vez que as ações discursivas não se prendem só às evidências perceptíveis, mas sobretudo às perspectivas, crenças, planos e metas dos usuários. (Beaugrande e Dressler, 1981, p. 179). e) Intertextualidade De acordo com Kristeva (1966) a intertextualidade seria o encontro de duas vozes, ou seja, quando ocorre um diálogo entre os muitos textos de uma (ou várias) cultura(s) que se instala no interior de cada texto e o define ocorre tal fenômeno, que vem a ser um ponto de intersecção de muitos diálogos, cruzamento de vozes oriundas de práticas da linguagem socialmente diversificadas, que têm no texto sua realização. Na perspectiva da Linguística textual, a intertextualidade sempre foi vista como um dos critérios de textualidade de considerável relevância. Muitos trabalhos já deram conta desse fenômeno como coadjuvante na construção/ reconhecimento da tipologia textual e do estabelecimento de novos sentidos. Dentre estes trabalhos, destacam-se aqueles produzidos por Koch (1986, 1991, 1994, 1997), Portela (1999) os quais procuram estabelecer critérios para uma melhor compreensão desse fenômeno. O que são tipos e gêneros textuais? Você sabe o que são tipos e gêneros textuais? Uma questão que tem sido bastante debatida é a aproximação das noções de gêneros e tipos. Mas até que ponto gêneros e tipos podem ser aproximados? Convido você a realizar a leitura desse texto para refletirmos um pouco sobre o assunto. Tipos textuais Os textos, independentemente do gênero a que pertencem, se constituem de sequências com determinadas características linguísticas, como classe gramatical predominante, estrutura sintática, predomínio de determinados tempos e modos verbais, emprego de vocativo, etc. Dessa forma, dependendo dessas características, configuram-se os diferentes tipos textuais que podem ser: narrativo, descritivo, argumentativo, explicativo ou expositivo, injuntivo ou instrucional. Sintetizando: tipos textuais relaciona-se com a estrutura do texto. 1. Sequência Narrativa Marcada pela temporalidade, como seu material é o fato e a ação, a progressão temporal é essencial para seu desenrolar, ou seja, desenvolve-se necessariamente numa linha de tempo e num determinado espaço. Gramaticalmente, percebe-se o predomínio de: • frases verbais indicando um processo ou ação; • formas verbais no pretérito; • advérbios de tempo e de lugar. São exemplos de gêneros em que predomina a sequência narrativa: relato, crônica, romance, fábula, conto de fada, piada, etc. Veja a fábula seguinte: 2. Sequência Descritiva Não há sucessão de acontecimentos no tempo, de sorte que não haverá transformações de estado da pessoa, coisa ou ambiente que está sendo descrito, mas sim apresentação pura e simples do estado do ser descrito em um determinado momento. Gramaticalmente, percebe-se o predomínio de: • frases nominais e orações centradas em predicados nominais; • formas verbais no presente ou no imperfeito; • adjetivos, que ganham expressividade tanto na função de adjunto adnominal quanto na de predicativo; • períodos curtos e coordenação; • advérbios de lugar que ganham destaque identificando a dimensão e/ou disposição espacial do objeto descrito. São exemplos de gêneros em que predomina a sequência descritiva: folheto turístico, (auto)- retrato, anúncio classificado, lista de compras, lista de ingredientes de uma receita, cardápio, etc. Pode-se, ainda, observar que as sequências narrativa e descritiva apresentam focos diferentes. Veja o quadro seguinte e compare o foco com os dois exemplos apresentados (fábula e lista de compras): 3. Sequência Argumentativa É aquela por meio da qual se faz a defesa de um ponto de vista, de uma ideia, ou em que se questiona algum fato. Ao expressar um parecer sobre alguma pessoa, acontecimento ou coisa, intenta-se persuadir o leitor ou o ouvinte, fundamentando o que se diz com argumentos de acordo com o assunto ou tema, a situação ou o contexto e o interlocutor. Gramaticalmente caracteriza-se pela: • progressão lógica de ideias e linguagem mais sóbria, objetiva, denotativa; • polifonia (ou seja, presença de várias vozes que se integram ao texto, seja por citações, seja por menções, seja por referências intertextuais), geralmente introduzida por sinais de pontuação (dois-pontos, parênteses, aspas, travessões), funcionando de apoio para a argumentação; • presença de palavras valorativas (positivas ou negativas) e expressões modalizadoras (geralmente, advérbios de enunciação: sinceramente, cá entre nós, etc.), que manifestam o posicionamento do falante; • emprego de orações subordinadas adverbiais causais, introduzidas pelas conjunções visto que, pois, porque, para a apresentação da relação de causa consequência; • emprego de perguntas retóricas, prevendo possíveis interrogações por parte do interlocutor. São exemplos de gêneros em que se predomina a sequência argumentativa: sermão, ensaio, editorial de um jornal ou revista, crítica, monografia, redações dissertativas, resenhas, etc. Observe o editorial publicado no jornal “O Globo” sobre a Lei de Biossegurança: Exemplo Dificilmente a Câmara dos Deputados conseguirá aprovar a curto prazo a Lei de Biossegurança que precisa votar por ter sido modificada no Senado. É muito longa a pauta de projetos à espera de apreciação: além de outras importantes leis, há projetos de emendas constitucionais e uma série de medidas provisórias, que trancam a pauta. Mas, com tudo isso, é importante que os deputados tenham consciência da necessidade de conceder aos cientistas brasileiros, o mais rapidamente possível, a liberdade de que eles necessitam para desenvolver pesquisas na área das células-tronco embrionárias. Embora seja este um novo campo de investigação, já está fazendo surgir aplicações práticas concretas, que demonstram seu potencial curativo fantasticamente promissor. Não é por outro motivo que os eleitores da Califórnia aprovaram a emenda 71, que destina US$ 3 bilhões às pesquisas com células-tronco, causa defendida com veemência porseu governador, o mais do que conservador Arnold Schwarzenegger. O caso chama a atenção porque o ex-ator, ao contrário de outros republicanos (como Ron Reagan, cujo pai sofria do mal de Alzheimer), não tem interesse pessoal no desenvolvimento de tratamentos médicos para doenças degenerativas hoje incuráveis. Apenas o convívio com pessoas como o recentemente falecido Christopher Reeve, que ficou tetraplégico após um acidente, ou Michael J. Fox, que sofre do mal de Parkinson, parece ter sido suficiente para convencer Schwarzenegger de que é fundamental apoiar a pesquisa. O projeto que retornou do Senado ainda inclui graves restrições à ciência, como a limitação das pesquisas às células de embriões congelados há pelo menos três anos nas clínicas de fertilização — embriões descartados que, com qualquer tempo de congelamento, vão acabar no lixo. Também algum dia será preciso admitir a clonagem com fins terapêuticos, hoje vedada, e que é particularmente promissora. Ainda assim, comparado com o projeto proibitivo que veio originalmente da Câmara, o novo texto da Lei de Biossegurança é um importante passo à frente. Merece ser apreciado com rapidez e aprovado pelos deputados. (O Globo, 5/11) Fonte: http://www.jornaldaciencia.org.br 4. Sequência Explicativa ou Expositiva Intenta explicar ou dar informações a respeito de alguma coisa. O objetivo é fazer com que o interlocutor adquira um saber, um conhecimento que até então não tinha. É fundamental destacar que, nos textos explicativos, não se faz a defesa de uma ideia, de um ponto de vista, características básicas do texto argumentativo. Os textos explicativos tratam da identificação de fenômenos, de conceitos, de definições. Predomina a função referencial da linguagem. Por isso, é o texto que predomina nos livros didáticos, nas aulas expositivas, por exemplo. Gramaticalmente, os textos explicativos apresentam várias marcas, como: • distanciamento do falante em relação àquilo que fala, resultando num texto objetivo, escrito, geralmente, em terceira pessoa; • predicados organizados em torno de verbos como ser, ter, conter, consistir, compreender, indicar, significar, constituir, denominar, designar; • sinais de pontuação que introduzem explicações ou citações (dois pontos, parênteses, aspas, travessões); • orações coordenadas explicativas introduzidas pelas conjunções pois e porque; • orações adjetivas explicativas; • marcas de reiteração e reformulação (isto é, ou seja, melhor dizendo, em outras palavras), com o objeto de aclarar, esclarecer, dirimir dúvidas; • marcas de comparação (assim, igualmente, contrariamente, como, ao contrário de, da mesma maneira que, etc.), com o objetivo de esclarecer conceitos por meio do confronto de informações, de analogias; • emprego de exemplificações (por exemplo, como é o caso de, etc.); • emprego de definições, ressaltando o significado de palavras ou expressões; • emprego de organizadores textuais (em resumo, até aqui, como já foi falado, etc.) e ordenadores da informação (em primeiro lugar, em segundo lugar, por um lado, por outro, etc.). São exemplos de gêneros em que predomina a sequência explicativa ou expositiva: textos de divulgação científica, de manuais, de revistas especializadas, de cadernos de jornais, de livros didáticos, de verbetes de dicionários e enciclopédias, etc. 5. Sequência Injuntiva ou Instrucional A marca fundamental é o verbo no imperativo (injuntivo é sinônimo de obrigatório, imperativo); predomina a função conativa da linguagem. Gramaticalmente, algumas marcas dos textos injuntivos são: • verbos no imperativo; • formas verbais que indicam ordem, orientação, pedido, como dever + infinitivo, ter que/de + infinitivo, gerúndio, infinitivo, etc.; • advérbios de modo; • advérbios de negação; • explicitação do interlocutor por meio do vocativo; • emprego das expressões (é proibido, não é permitido, (é) obrigatório, etc.) São exemplos de gêneros em que predomina a sequência injuntiva ou instrucional: propaganda, receita culinária (modo de fazer), manual de instruções de um aparelho, horóscopo, livros de autoajuda, etc. Observe as marcas que apontam o texto abaixo como injuntivo. Ingredientes 4 ovos 4 colheres (sopa) de chocolate em pó 2 colheres (sopa) de manteiga 3 xícaras (chá) de farinha de trigo 2 xícaras (chá) de açúcar 2 colheres (sopa) de fermento 1 xícara (chá) de leite Calda: 2 colheres (sopa) de manteiga 7 colheres (sopa) de chocolate em pó 2 latas de creme de leite com soro 3 colheres (sopa) de açúcar MODO DE PREPARO Massa: 1. Em um liquidificador adicione os ovos, o chocolate em pó, a manteiga, a farinha de trigo, o açúcar e o leite, depois bata por 5 minutos. 2. Adicione o fermento e misture com uma espátula delicadamente. 3. Em uma forma untada, despeje a massa e asse em forno médio (180 ºC) preaquecido por cerca de 40 minutos. Não se esqueça de usar uma forma alta para essa receita: como leva duas colheres de fermento, ela cresce bastante! Outra solução pode ser colocar apenas uma colher de fermento e manter a sua receita em uma forma pequena. Calda: 4. Em uma panela, aqueça a manteiga e misture o chocolate em pó até que esteja homogêneo. 5. Acrescente o creme de leite e misture bem até obter uma consistência cremosa. É importante considerar que, com a tipologia apresentada, não queremos dizer que um texto seja totalmente argumentativo, descritivo ou narrativo. Na realidade, o que devemos ter em mente é que os textos apresentam sequências predominantes e essa configuração pode ser observada em gêneros e não apenas em sequências isoladas. Gêneros do Discurso A referência a gêneros do discurso remete diretamente a textos verbais ou não- verbais concretizados em eventos comunicativos. Essas entidades empíricas são as diferentes práticas discursivas que fazem parte de nossa vida nos diferentes âmbitos sociais que estamos inseridos, são textos definidos por sua composição, estilo e, principalmente por seus propósitos comunicativos, nascentes da união de forças históricas, sociais e culturais. A noção de gênero está ligada aos pressupostos bakhitinianos, que apontam os gêneros discursivos como componentes culturais e históricos que ordenam e estabilizam nossas relações na sociedade. Para Koch (2002, p. 53) a competência discursiva dos falantes/ouvintes leva-os à detecção do que é adequado ou inadequado nas práticas sociais. Conforme a autora, essa competência acaba estimulando a diferenciação de determinados gêneros de textos, portanto, há o conhecimento, pelo menos indutivo, de estratégias de construção e interpretação de um texto. Dessa forma, os gêneros do discurso podem ser considerados a materialização das várias práticas sociais que permeiam a sociedade, articulados de tal forma que são imprescindíveis à vida em sociedade. Resumindo, os gêneros são a efetiva realização da linguagem oral ou escrita. Segundo Bakhtin (2000) qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual. No entanto, cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo por isso denominado gêneros do discurso. Já Marcuschi (2003) afirma que os gêneros são fenômenos históricos profundamente vinculados à vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros contribuem para ordenar e estabilizar as atividades do dia a dia. São entidades sociais e discursivas e formas de ação social incontáveis em qualquer situação comunicativa. A produção de discursos não ocorre no vazio. Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero discursivo. Sob esta perspectiva, os PCNs (1998) apresentam os vários gêneros que, por sua vez, constituem formas relativamente estáveis de enunciados. Pode-se ainda afirmar que a noção de gêneros refere-se a “famílias” de textosque compartilham algumas características comuns, embora heterogêneas, como visão geral da ação à qual o texto se articula, tipo de suporte comunicativo, extensão, grau de literalidade, por exemplo, existindo em número quase ilimitado. Sendo assim, denominam-se gêneros textuais, formas verbais de ação social relativamente estáveis, realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais típicas e em domínios discursivos específicos. Outro ponto importante que não devemos esquecer, quando o assunto é gênero do discurso, é o papel do suporte na definição do gênero. De acordo com Marcuschi (2003, p.8), o suporte é um “locus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto”. Assim, os suportes, além de ampararem a mensagem, auxiliam na delimitação e apresentação de um gênero do discurso. Dessa forma, podemos dizer, por exemplo, que o suporte outdoor é um dos fatores que definem o anúncio de outdoor, tanto na apresentação, quanto na formatação e na composição da mensagem, uma vez que esta deve ser curta, objetiva, usar tipos de letras grandes, buscar imagens e outros recursos para se chamar a atenção do público-alvo potencial. Neste caso, a influência do suporte é tão importante que o gênero recebe o seu próprio nome, como uma forma de distingui-lo de outros gêneros. Suporte pode ser compreendido, então, como instrumento utilizado para “suportar”, "comportar" o texto, como por exemplo, papel, paredes ou muros, pele, computador, monitor de computador, etc. Os gêneros textuais podem ser encontrados em diversos suportes, como por exemplo, revistas e jornais, que suportam os gêneros reportagem, matéria, coluna, resenha, charge, quadrinho, classificados entre outros gêneros. Cada um desses gêneros tem uma finalidade específica: • a reportagem e a matéria de jornal possuem a função de incluir o leitor dentro de um determinado contexto, dependendo da seção temática (policial, esporte, TV e Cinema, Saúde, infantil etc); • a coluna pode ser um texto de opinião ou texto de experiência pessoal do autor; • a resenha, na revista e no jornal, é um tipo de texto que faz uma análise de livros, filmes ou álbuns de música lançados recentemente ou que causam algum impacto; • a charge e o quadrinho se destacam pela linguagem não-verbal (a imagem) que adiciona ou é chave para entender a piada ou estória, sem falar que a sua função específica é provocar o riso; • os classificados são velhos conhecidos que possuem como característica a linguagem abreviada ao máximo e função de apresentar produtos, imóveis, veículos, serviços e empregos. Viu quanta coisa se pode encontrar numa revista e num jornal. É necessário, no entanto atentarmos para o fato de que os estudos sobre gênero e suporte são ainda bastante recente o que acaba propiciando uma série de discussão sobre o que realmente é suporte e gênero. Daí se ouvir muito, por exemplo, Orkut como gênero, quando na realidade é um suporte. Resumindo Nessa unidade tivemos a oportunidade de refletir sobre a configuração do texto enfocando os fatores linguísticos e pragmáticos de textualidade: coerência, coesão, intencionalidade, informatividade, aceitabilidade, situacionalidade e intertextualidade. Esses fatores, tão importantes para a configuração do texto, são imprescindíveis para garantir a sua inteligibilidade. Conforme Koch e Travaglia (2004) “[...] o produtor de um texto tem, necessariamente, determinados objetivos ou propósitos, que vão desde a simples intenção de estabelecer ou manter o contato com o receptor até a de levá-lo a partilhar de opiniões ou a agir ou comportar-se de determinada maneira.” Vimos também que a produção de discursos não ocorre no vazio. Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero discursivo. Sendo assim, a noção de gênero discursivo se torna imprescindível para reconhecermos que o texto não é isolada de um contexto mais amplo. Segundo Bakhtin (2000) qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual. No entanto, cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo por isso denominado gêneros do discurso. Já Marcuschi (2003) afirma que os gêneros são fenômenos históricos profundamente vinculados à vida cultural e social. Fruto de um trabalho coletivo, os gêneros contribuem para ordenar e estabilizar as atividades do dia a dia. São inúmeros os gêneros discursivos a ponto de não conseguirmos conferir-lhes uma quantidade exata. Eles circulam em várias esferas sociais e estão em nossa volta diariamente: quando vamos à casa bancária, à escola, ao supermercado ou mesmo quando estamos na rua. Daí a necessidade de estarmos permanentemente em contato com os gêneros existentes e com os que vão surgindo para podermos nos situar de forma mais participativa em sociedade. Ampliando Horizontes Você conhece o VOLP? O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, ou simplesmente VOLP, é uma publicação elaborada pela equipe de dicionaristas da Academia Brasileira de Letras e tem como objetivo compilar e registrar a grafia oficial das palavras do idioma, indicando sua classificação gramatical, mas sem o significado. A quinta edição, lançada em 2009, foi supervisionado pelo professor Evanildo Bechara e conta com cerca de 370 mil palavras. A edição anterior, de 2004, tinha aproximadamente 360 mil palavras; a primeira edição, lançada após a reforma ortográfica de 1943, registrava 60 mil palavras. Como o novo acordo ortográfico apresentava regras gerais e alguns exemplos, coube aos estudiosos interpretar as regras e aplicá-las à grafia dos demais vocábulos da língua. https://www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no- vocabulario Referências BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1987, p.261-305 DANTAS, Daniel & GOMES, Adriano Lopes. Questões de letramento e de gênero do discurso em blogs. Disponível: http://www.ufjf.br/revistagatilho/files/ 2009/12/ARTIGO1.-Questes-de- letramento.pdf. Acesso em 25/05/2011. KOCH, Ingedore Vilaça; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual. São Paulo: Contexto, 2004 MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In; Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucena, 2003, p. 20-36 PAULINO, Graça; WALTY, Ivete; et al. Tipos de texto, modos de leitura. Belo Horizonte: Formato Editorial, 2001. SOUZA, Aguinaldo Gomes de. Gêneros virtuais: algumas observações. Disponível http:// www.letramagna.com/generos_virtuais_revista_aguinaldo.pdf. Acesso em 25/05/2011. https://www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no-vocabulario http://www.ufjf.br/revistagatilho/files/ http://www.letramagna.com/generos_virtuais_revista_aguinaldo.pdf
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