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1 A cirrose representa a via final comum de uma lesão hepática crônica e persistente em um indivíduo geneticamente predisposto e que independente da etiologia irá causar fibrose e formação nodular difusa, com consequente desorganização da arquitetura lobular e vascular do órgão. Apresenta distribuição global, independendo da raça, idade e gênero. Causa crescente de morbidade e mortalidade nos países mais desenvolvidos, sendo a 14 causa mais comum de morte em adultos no mundo inteiro, com mais de 1 milhão de mortes anuais. Principal indicação de transplante hepático. Os principais agentes etiológicos causadores da cirrose podem ser classificados como: Metabólicos: decorrentes de erros congênitos ou adquiridos do metabolismo e que acometem crianças ou adultos jovens. Virais: associada aos vírus HBV, HVD e HVC da hepatite. Alcoólico: principal agente etiológico em adultos. Ocorre após período médio de 5 a 10 anos de ingestão de quantidade diária superior a 80g de etanol pra homens e 60g pra mulheres. Induzida por fármacos: principalmente metotrexato, isoniazida, oxifenisatina e alfametildopa. Autoimune: consequente à evolução da hepatite ou da colangiopatia autoimune. Atualmente, existem pelo menos 3 tipos de hepatite autoimune que podem ocasionar cirrose. Biliares: pode ser de causa primária ou secundária. Obstrução do fluxo venoso hepático: causa anoxia congestiva do fígado. Criptogênicas: etiologia indeterminada. Os principais achados morfológicos da cirrose hepática incluem fibrose difusa, nódulos regenerativos, arquitetura lobular alterada e estabelecimento de derivações vasculares intra- hepáticas. Outras características relevantes são capilarização dos sinusoides e fibrose perissinusoidal, trombose vascular e lesões obliterativas no trato portal e veias hepáticas. As células de Kupffer ao sofrerem injúria (toxinas como a do álcool) passam a secretar citocinas inflamatórias que agem nas células do ITO (estreladas) fazendo com que elas produzam colágeno. Ocorre também a capilarização dos sinusoides, pois eles perdem suas fenestrações, o que afeta a troca gasosa entre sangue e hepatócitos. Além disso, as células estreladas tornam-se miofibroblastos, se contraindo e diminuindo o tamanho dos sinusoides, que é o causa a hipertensão portal dentro do fígado. 2 - Isso causa uma desestruturação do parênquima hepático, gerando feixes de fibrose (devido a síntese de colágeno) além de nódulos de regeneração, uma vez que haverá danos ao capilares hepáticos fazendo com que o sangue não chegue adequadamente aos hepatócitos, com isso vão acabar morrendo e se regenerando de uma forma totalmente anárquica. FIBROSE HEPÁTICA E FIBROGÊNESE A fibrose representa o acúmulo relativo e absoluto dos componentes da matriz extracelular, esse acúmulo de tecido conjutivo no fígado decorre de uma maior síntese ou menor degradação desses componentes. Os mecanismos que determinam a reparação do tecido ou sua degradação são mediados pelas citocinas provenientes da necrose e da inflamação local, liberadas pelos linfócitos e macrófagos, que podem estimular a síntese proteica e a movimentação das células responsáveis pela síntese de tecido fibroso (fibrogênese) e de sua degradação (fibrólise). Entre esses mediadores (fator transformador do crescimento – TGF-beta 1; fator de necrose tumoral – TNF; as interleucinas; o fator de crescimento plaquetário e a fibronectina) o TGF-beta 1 parece ser o maior mediador da fibrogênese. Além disso, as células estreladas (células de ITO) sintetizam matriz extracelular e também estão associadas diretamente a degradação dessa matriz. Essa fibrólise depende da ativação de enzimas, como as colagenases, que é regulada por um sistema em que a ação de substâncias que ativam essa metaloprotease são contrabalanceadas pela liberação de substâncias que podem bloquear ou inibir diretamente sua ação, como os TIMPs (inibidor tecidual das metaloproteases) e a alfa-2 macroglobulina. As metaloproteases e os TIMPs são produzidos pelas células estreladas e pelos macrófagos hepáticos (células de Kupffer) os quais são regulados pelas citocinas inflamatórias (no caso das células estreladas) e citocinas anti-inflamatórias, como a IL-10 (no caso de macrófagos). Logo, quando tem uma lesão hepática crônica, a progressão para fibrose dependerá do tipo de estímulo desencadeado pela lesão e da genética do indivíduo. Superfície externa nodular com o fígado diminuído de tamanho. Consistência firme. Nódulos difusos na superfície de corte, podendo ser micro (<3mm) ou macronódulos (>3mm) ocasionados pela regeneração dos hepatócitos. 3 Septos fibrosos delimitando grupos de hepatócitos. Infiltrado inflamatório crônico e agudo. Proliferação de septos fibrosos confluentes, formando pontes entre os tratos portais ou entre veias centro-lobulares e tratos portais. Subversão da arquitetura lobular< com redução ou perda da função evoluindo para insuficiência. As manifestações clínicas da doença incluem icterícia, hemorragia digestiva e encefalopatia. Outras características clínicas são o prurido, colúria, epistaxe, telangiectasias, eritema palmar e o baqueteamento digital. Pode apresentar também outras manifestações menos específicas como: anorexia, perda de peso e fraqueza. De acordo com as formas clínicas de apresentação, os pacientes cirróticos podem ser classificados em: compensados ou descompensados (presença de ascite, encefalopatia e/ou icterícia). As principais complicações dessa doença hepática são: varizes esofágicas, ascite e hemorragia digestiva pelas varizes. As complicações mais tardias envolvem a insuficiência hepática, hipertensão portal e carcinoma hepatocelular. No exame físico: O sinal de cirrose consiste em aranhas vasculares, mais frequentemente no tronco, face e membros superiores. Eritema palmar envolvendo os dedos e suas pontas. Nos homens pode-se observar perda de cabelo no peito e abdome, ginecomastia e atrofia testicular. Petéquias e equimoses podem estar presentes devido a trombocitopenia ou tempo de protrombina prolongado. No exame do abdome nota-se um lobo hepático direito menor, com extensão de menos de 7cm na percussão, e o lobo esquerdo palpável, nodular, com consistência mais densa. A esplenomegalia quando presente é sinal de hipertensão portal. A circulação colateral também é consequência da hipertensão portal. Nos casos mais graves também se nota ascite, edema e icterícia. É um diagnóstico anatomopatológico, logo a forma mais correta de fazê-lo seria a biópsia do fígado. Entretanto, esse procedimento leva muitos riscos aos pacientes devido a alterações de coagulação. Exames Laboratoriais Lesão Hepatocelular é avaliada através das aminotransferase e da desidrogenase lática (DHL). Dentro da injúria hepatocelular, os testes que fazem essa detecção são realizados através da dosagem de enzimas distribuídas no plasma e no líquido intersticial. Essa detecção vai ser útil principalmente nas hepatites agudas e crônicas que cursam com esse dano ao hepatócito. Essas enzimas são liberadas no sangue após a injúria ao hepatócito ou morte e são representadas pelo 4 aspartato aminotransferase (AST) e a alanina aminotransferase (ALT), sendo a AST encontrada no fígado, músculo, rins, cérebro, pâncreas, pulmões, leucócitos e nos eritrócitos, já a ALT vai ser encontrada apenas no parênquima hepática, sendo, portanto, mais específica para lesão hepatocelular. Fluxo Biliar e lesão de vias biliares é avaliado através da fosfatase alcalina e da gama glutamiltransferase (GGT). A colestase é definida como redução ou interrupção do fluxo biliar, pode ser causada por obstrução das vias biliares, sendo que a cirrose biliar primária é a causa mais comum. A fosfatase alcalina (FA) vai ser um marcador importante para o diagnóstico dessacolestase, essa enzima catalisa a hidrólise de ésteres de fosfato orgânicos e inorgânicos, sendo encontrada principalmente no fígado. Assim, obstruções das vias biliares extra ou intra-hepáticas, bem como as doenças infiltrativas do fígado elevam rapidamente os níveis dessa enzima. A função de síntese do fígado é avaliada pelos fatores de coagulação e pela albumina. O fígado é um importante órgão sintetizador de proteínas, principalmente a albumina, fibrinogênio, fatores de coagulação e outras proteínas que são de grande importância para o diagnóstico diferencial das condições hepatobiliares. A albumina é uma proteína sintetizada exclusivamente no fígado, é encontrada em valores normais na hepatite aguda e nas crônicas que não possuem dano a função hepática. Também pode ser feito exames de imagem como a endoscopia digestiva alta, ressonância magnética, ultrassonografia e TC. Sempre que possível o tratamento deve ter como objetivo a erradicação do agente causal da cirrose. Atualmente, o tratamento da cirrose compensada está direcionado para a prevenção do desenvolvimento da descompensação por tratar a doença hepática subjacente e assim reduzir a fibrose e as chances de descompensação. O tratamento definitivo para cirrose hepática é o transplante de fígado. O consumo excessivo de álcool leva a efeitos deletérios principalmente no fígado. As duas lesões mais típicas da doença hepática provocada pelo álcool são a esteatose alcoólica, a hepatite alcóolica e a cirrose. O risco de doença hepática é proporcional à duração do alcoolismo, sendo fator agravante a ingestão regular, eventualmente diária. Estudos demostraram que o alcoolismo tem caráter genético. Polimorfismos em diversos genes que codificam as enzimas do metabolismo do etanol podem, pelo menos em parte, explicar a heterogeneidade das lesões hepática em indivíduos que consome álcool. Indivíduos com baixa atividade da enzima ALDH2*1 sofrem mais os efeitos do etanol. 5 O etanol é rapidamente absorvido no TGI, a maior parte dele vai ser oxidado no fígado, o que explica porque esse órgão é tão afetado. Três vias de metabolismo do álcool culminam na formação de acetaldeído: 1) via da álcool desidrogenase (ADH), que ocorre no citosol, no qual o hidrogênio do etanol é transferido pro NAD convertendo em NADH; 2) sistema microssomal de oxidação no retículo endoplasmático, por meio do citocromo P-450, também estão envolvidas CYP1A1, CYP3A, CYP4A e CYP2E1 (age sobre o etanol gerando radicais livres de O2; 3) via de catalase, que se faz nos peroxissomos. Em alcoolistas, no entanto, há aumento do metabolismo do álcool nos peroxissomos. Nas mitocôndrias, o acetaldeído é convertido em acetato e acetil CoA pela enzima aldeído desidrogenase (ALDH), reação que também consome NAD. Nesse complexo processo metabólico: Redução na relação NADH/NAD, que leva: (a) aumento na síntese e esterificação de ácidos graxos, (b) redução na oxidação de ácidos graxos; (c) acúmulo de ácidos lático e acidose. Geração de acetaldeído, que tem vários efeitos nas células. Produção de radicais livres, que interagem com proteínas, alteram a integridade de membranas celulares e induzem a liberação de citocinas, sobretudo TNF. Lesão mitocondrial, que reduz a oxidação de ácidos graxos. As alterações metabólicas convergem para várias modificações nos hepatócitos. No início, a lesão mais evidente é esteatose (acúmulo de ácidos graxos). A persistência da agressão acompanha-se da liberação de citocinas, o que leva a uma reação inflamatória. Destruição hepatocitária induz regeneração hepática e neoformação conjuntiva, o que pode evoluir para cirrose. A doença hepática alcoólica compreende três estágios: esteatose, hepatite alcoólica e cirrose. Esteatose Hepática Surge após ingestão discreta a moderada de álcool. Macroscopicamente, o fígado está grande, amolecido e amarelado. É reversível na maioria dos casos com a abstinência em duas ou quatro semanas. Microscopicamente, encontram-se glóbulos de gordura nos hepatócitos. Hepatite Alcóolica É a lesão mais típica estando presente em 10 a 35% dos alcoolistas. Além da esteatose, os principais achados são a balonização e focos de necrose dos hepatócitos, corpúsculos de Mallory-Denk (acúmulos de filamentos intermediários), infiltrado inflamatório rico em neutrófilos e fibrose perivenular e perissinusoidal. Achado adicional é necrose hialina esclerosante, caracterizada por necrose extensa de hepatócitos perivenulares associada a fibrose, que se caracteriza por obstrução 6 variada do lúmen devido a deposição de colágeno na parede da veia, podendo levar a hipertensão portal. Cirrose alcóolica Forma final e possivelmente irreversível da doença hepática alcóolica, que evolui de forma lenta e insidiosa. Inicialmente, o fígado está aumentado de volume e tem aspecto esteatótico, mas ao longo dos anos torna-se retraído, acastanhado e firme. Cirrose micronodular é o padrão mais comumente visto associado com o álcool, sendo caracterizado por nódulos regenerativos de tamanho uniforme <3mm. É uma doença prevalente, que acomete mais da metade das pessoas em alguns países desenvolvidos e 20% no Brasil. A entidade inclui esteatose hepática e esteato-hepatite não alcóolica (EHNA), sendo esta com grandes chances de evoluir para cirrose. A maioria dos casos ocorre em indivíduos com resistência à insulina e síndrome metabólica (resistência insulínica, diabetes, obesidade central, hipertensão arterial e dislipidemia). A EHNA é uma doença multifatorial no qual a dieta e o sedentarismo estão fortemente correlacionados. PATÔGENESE Hipótese de múltiplos golpes. No primeiro ocorre acúmulo de ácidos graxos livres nos hepatócitos, decorrente tanto do aumento dessa substância no sangue circulante (lipólise no tecido adiposo devido ao aumento da resistência a insulina) como da lipogênese (devido a diabetes melitos ou a dieta com excesso de carboidratos). Assim, a esteatose (acúmulo de triglicerídeos) ocorre quando as vias metabólicas normais não conseguem eliminar de forma eficiente os ácidos graxos livres nos hepatócitos. Esse excesso de ácidos graxos predispõe o segundo golpe, desencadeado pelos metabólitos tóxicos, que leva a estresse oxidativo, disfunção mitocondrial e liberação de citocinas pró- inflamatórias, incluindo TNF-alfa, IL-6 e IL-8. No terceiro golpe, o estresse oxidativo inibe a replicação de hepatócitos maduros, aumentando a população de células progenitoras, o que está implicado na neoformação conjuntiva e à gênese do carcinoma hepatocelular.
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