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TRATADO DE FISIOLOGIA MÉDICA – CAP. 60: ESTADOS DA ATIVIDADE CEREBRAL – SONO, ONDAS CEREBRAIS, EPILEPSIA, PSICOSES E DEMÊNCIA SONO Estado de inconsciência do qual a pessoa pode ser despertada por estímulo sensorial ou outro. Diferente do coma, que é o estado do qual a pessoa não pode ser despertada. DOIS TIPOS DE SONO – SONO DE ONDAS LENTAS E COM MOVIMENTOS RÁPIDOS DOS OLHOS (REM) Todas as pessoas apresentam dois estágios de sono: o sono REM e o sono de ondas lentas ou não REM. O sono REM ocupa aproximadamente 25% do tempo de sono dos adultos jovens e cada episódio recorre a cada 90 minutos. A maior parte do sono de cada noite pertence ao sono NREM, que corresponde ao sono profundo e restaurador (ao contrário do sono REM, que não restaura). Sono REM (Sono Paradoxa, Sono Dessincronizado) É comum que o sono REM dure entre 5 a 30 minutos a cada 90 minutos. No começo da noite, quando a pessoa está muito cansada, o sono REM pode até mesmo estar ausente. Entretanto, a medida que a pessoa vai ficando mais descansada com o passar da noite, a duração do sono REM aumenta. O sono REM apresenta características importantes: 1. Forma ativa de sono, associada a sonhos e movimentos corporais. 2. É mais difícil despertar o indivíduo por estímulo sensorial 3. Tônus muscular excessivamente reduzido (forte inibição das áreas de controle da medula espinal) 4. Frequências cardíacas e respiratórias irregulares 5. Movimentos irregulares podem ocorrer 6. Ondas cerebrais semelhantes ao do estado de vigilia. Metabolismo cerebral aumentado em até 20%. É um paradoxo a pessoa estar dormindo apesar dessa atividade cerebral. Sono de ondas lentas Esse sono é excepcionalmente relaxante e está associado às diminuições do tônus vascular periférico e muitas outras funções vegetativas do corpo. Há diminuição de 10 a 30% da pressão arterial, da frequência respiratória e no metabolismo basal. Sonhos e pesadelos podem ocorrer nessa fase, porém sem atividade muscular corporal e sem consolidação de sonhos na memória. TEORIAS BÁSICAS DO SONO O sono é causado por um processo inibitório ativo, centros localizados abaixo da região médio-pontina do tronco cerebral parecem ser necessários para causar sono pela inibição de outras partes do encéfalo. Antigamente, acreditava-se que o Sistema ativador reticular se fatigava durante o dia de vigília, e tornava-se consequentemente inativo durante a noite, hoje sabe-se que isso é mais complexo. Centros neuronais, substância neuro-humorais e mecanismos que podem causar sono – Possível papel específico para a serotonina A estimulação de diversas áreas do cérebro pode causar sono: 1. Núcleos da rafe situados na metade inferior da ponte e no bulbo: As fibras nervosas desses núcleos se disseminam localmente pela formação reticular do tronco cerebral, e em direção ao tálamo, ao hipotálamo, à maioria das áreas do sistema límbico e até mesmo ao neocórtex. Além disso, as fibras desses núcleos se dirigem também para baixo, inibindo sinais sensoriais que chegam nos cornos posteriores da medula espinal. Muitas terminações nervosas desses neurônios da rafe liberam serotonina. Quando a serotonina não está presente, pela ação de algum fármaco, o indivíduo não consegue dormir por vários dias. 2. Núcleo do trato solitário: É a terminação no bulbo e na ponte para as informações sensoriais viscerais que chegam pelo nervo vago e glossofaríngeo. 3. Diversas regiões do Diencéfalo, incluindo a parte rostral do hipotálamo, principalmente a área supraquiasmática; e a área ocasional nos núcleos talâmicos de projeção difusa. Lesões nesses centros podem causar vigília intensa. Além disso, outras substâncias podem estar relacionadas ao sono, por exemplo, a urina e o líquido cefalorraquidiano de animais que foram mantidos acordados por diversos dias contém peptídeo muramil, que quando administrado em outro animal induziu o sono dentro de alguns minutos. Outras substâncias semelhantes foram identificadas, como o nonapeptídeo isolado de sangue de animais adormecidos e fatores de sono nos tecidos neuronais. A razão pela qual o sono NREM é interrompido pelo sono REM ainda não é compreendida. Fármacos que mimetizam a ação da Acetilcolina aumentam a recorrência de sono REM, assim, grandes neurônios secretores de acetilcolina na formação reticular podem levar à atividade excessiva que ocorre em regiões cerebrais durante o sono REM. Ciclagem entre os estados de sono e de vigília Sugere-se que, quando o centro do sono não está ativado, os núcleos mesencefálico e reticular pontino superior ativador são liberados de sua inibição e excitam tanto o córtex cerebral quando o sistema nervoso periférico, e então, ambos mandam inúmeros sinais de feedback positivo, mantendo o indivíduo acordado. Após tempo acordado, os neurônios do sistema ativador ficam fatigados e o sistema de feedback positivo desaparece e os efeitos promotores do sono, dos centro do sono, tomam conta levando à transição rápida da vigília de volta para o sono. Os neurônios orexígenos são importantes no despertar e na vigília. A orexina é produzida por neurônios do hipotálamo, que proporciona estímulos aferentes excitatórios a muitas áreas do cérebro onde existem receptores de orexina. Esses neurônios estão mais ativos durante a vigília, e quase param de disparar durante o sono. A perda dos sinais orexígenos (por distúrbios dos neurotransmissores ou dos receptores) pode levar à narcolepsia. O SONO TEM FUNÇÕES FISIOLÓGICAS IMPORTANTES Restrições moderadas de sono por alguns dias podem degradar o desempenho cognitivo e físico, a produtividade global e a saúde da pessoa. O sono causa dois tipos de efeitos principais: no sistema nervoso; e em outros sistemas funcionais do corpo. A privação do sono pode levar ao funcionamento anormal do pensamento e pode causar atividades comportamentais anormais; aumento da lentidão dos pensamentos, pessoa irritável ou psicótica são alguns exemplos. O principal valor do sono é o de restaurar o equilíbrio natural entre os centros neuronais. Ondas cerebrais A atividade elétrica no cérebro é contínua, e a intensidade e os padrões dessa atividade são determinados pelos níveis de excitação decorrentes do estado encontrado: sono, vigília ou distúrbios cerebrais (como epilepsia ou psicoses). O exame que registra as ondas cerebrais é o eletroencefalograma (EEG). Em pessoas saudáveis a maioria das ondas no EEG pode ser classificada em alfa, beta, teta e delta. • As ondas alfa são rítmicas, com frequência entre 8 e 13 ciclos/s, e são encontradas quando os indivíduos estão acordados e no estado de calma e atividade cerebral em repouso. Sua voltagem é de 50 microvolts e elas desaparecem durante o sono profundo. Quando a pessoa vígil é direcionada para algum tipo atividade, as ondas alfa são substituídas por ondas beta assincrônicas de alta frequência mas baixa voltagem. • As ondas beta ocorrem com frequência maior que 14 ciclos/s, podendo chegar até a 80 ciclos/s. • As ondas teta tem frequência de 4 a 7 ciclos/s. Elas ocorrem normalmente nas regiões parietal e temporal em crianças, mas também durante o estresse emocional em adultos. Também ocorrem em muitos distúrbios cerebrais, principalmente nos processos cerebrais degenerativos. • As ondas delta incluem todas as ondas do EEG com frequência menor que 3,5 ciclos/s e tem voltagens de 2 a 4 vezes maiores que as outras. Elas ocorrem durante o sono profundo, na infância e em pessoas com doença cerebral orgânica grave. Podem ocorrer, de modo estrito, no córtex, independentemente das atividades nas regiões mais inferiores do encéfalo. A frequência média do ritmo do EEG aumenta progressivamente de acordo com maiores graus de atividade cerebral. Na figura abaixo está demonstrado as ondas delta na anestesia cirúrgica e no sono; as ondas teta em estados psicomotores; ondas alfa em estados relaxados; e ondas beta durante períodos de intensa atividade mental e medo.De modo geral, as ondas podem ser encontradas nos estágios da figura abaixo. Ondas alfa em vigília tranquila; ondas beta em vigília com atenção e nos estágios de sono REM. O sono NREM pode ser dividido em 4 fases: Na fase 1, a voltagem do sono fica baixa, mas o indivíduo apresenta os chamados fusos de sono, que são picos de ondas alfas que acontecem periodicamente. Nas fases 2 a 4, a frequência diminui, caracterizando as ondas delta. Convulsões e Epilepsia A epilepsia é uma doença crônica de crises epiléticas recorrentes, com sintomas clínicos heterogêneos, o que reflete as várias causas subjacentes e mecanismos fisiopatológicos que provocam disfunção cerebral e lesões, como traumatismos, tumores, infecção ou alterações degenerativas. A crise epiléptica é provocada por uma perturbação do equilíbrio normal entre correntes excitatórias e inibitórias, elas podem ser classificadas em dois tipos: crises focais (ou parciais) e crises generalizadas. As crises epilépticas focais (parciais) começam em uma região pequena (podendo se espalhar e dar origem a crise epiléptica generalizada secundária) e apresentam manifestações clínicas que refletem a função da área cerebral afetada. Deriva de alguma lesão orgânica ou anomalia localizada como tecido cicatricial que exerce tensão sobre tecido neuronal adjacente, um tumor que comprime uma área cerebral, uma área destruída do tecido cerebral ou circuitos locais desorganizados por causa congênita. As crises focais podem ser classificadas como parciais simples ou parciais complexas. As parciais simples podem ser precedidas por uma aura (como sensações de medo), seguida por sinais motores, como contrações rítmicas. As crises focais parciais complexas iniciam-se com uma aura seguida por deficit de consciência e movimentos repetitivos estranhos. Após a crise a pessoa pode não se lembrar do episódio. O período após a convulsão e antes da recuperação neurológica normal recebe o nome de período pós-crítico. As crises epilépticas generalizadas caracterizam-se por descargas neuronais difusas, excessivas e descontroladas que começam abruptamente e simultânea nos hemisférios cerebrais. Essas crises subdividem-se principalmente segundo as manifestações motoras ictais, que dependem da magnitude com que as regiões subcorticais do tronco cerebral participam da crise. As convulsões tônico-clônicas generalizadas (Grande Mal) caracterizam-se por uma perda brusca da consciência e descargas neuronais extremas em todas as áreas do encéfalo – no córtex cerebral, nas partes profundas do prosencéfalo e até mesmo no tronco cerebral. Algumas vezes as descargas transmitidas para a medula espinal causam convulsões tônicas generalizadas de todo o corpo seguidas pela alteração entre contrações musculares espasmódicas e tônicas. Podem iniciar por um estímulo emocional forte, alcalose causada pelo aumento da frequência respiratória, fármacos, febre e barulhos altos ou luzes piscantes. As crises de ausência (Pequeno Mal) iniciam-se em geral na infância ou no início da adolescência, constituindo 15-20% dos casos de epilepsia nas crianças. Geralmente são caracterizadas por 3 a 30 segundos de inconsciência, tempo durante o qual a pessoa apresenta olhar fixo e contrações bruscas em geral na região da cabeça, de modo especial um piscar de olhos; essa fase é seguida pelo retorno rápido da consciência e às atividades prévias. O curso usual é que essas crises desapareçam com a idade adulta. Tratamento da Epilepsia A maior parte dos fármacos busca bloquear o início ou o espalhamento das convulsões, embora não seja conhecido exatamente a ação deles. Alguns dos principais efeitos são: 1. Bloqueio dos canais de sódio dependentes de voltagem (carbamazepina e fenitoína) 2. Alterações das correntes de cálcio (etosuximida) 3. Aumento da atividade GABA (fenobarbital e benzodiazepinas) 4. Inibição dos receptores de glutamato (perampanel) A escolha do fármaco depende do tipo de epilepsia, a idade do paciente e outros fatores. Quando intratável com medicamento, o EEG pode localizar os focos inciais e a excisão cirúrgica pode ser considerada.
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