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Conceito * A miastenia gravis (MG) é um distúrbio autoimune crônico da membrana pós-sináptica na junção neuromuscular (JNM) do músculo esquelético. Anticorpos circulantes antirreceptor nicotínico da acetilcolina (AChR) e proteínas associadas comprometem a transmissão neuromuscular Epidemiologia e fisiopatologia * A MG afeta cerca de 40 a 140 indivíduos por milhão de habitantes. É mais frequente no sexo feminino (3:2) e tem dois picos de incidência: mulheres na segunda e terceira décadas e homens na sexta e sétima décadas 2 de vida. * A causa da MG não é conhecida, tal como acontece com as restantes doenças autoimunes. Sabe-se, no entanto, que existe associação aos antígenos HLA B8 e DRw3 e uma grande tendência à ocorrência de outras doenças autoimunes nestes doentes e seus familiares.Pensa-se que o timo possa estar implicado, uma vez que cerca de 75% dos doentes com MG têm anomalias tímicas, sejam elas hipertrofia (85%) ou timoma (15%), e que a timectomia resulta em melhoria dos sintomas na maioria destes doentes. * Um fator desencadeante pode ser uma infecção bacteriana (E. coli, Klebsiella ) ou viral, tendo já sido implicado o vírus Herpes simplex, que atuaria por um mecanismo envolvendo fenómenos de mimetismo molecular entre alguns dos seus peptídeos e sequências da subunidade alfa do receptor da ACC1. * A MG é mediada por anticorpos anti-R-ACC, que atuam, pelo menos, por três mecanismos diferentes: endocitose e degradação acelerada de receptores, bloqueio funcional dos locais de ligação da ACC e lesão dos receptores mediada * O defeito fundamental na MG reside na diminuição do número total de R-ACC disponíveis na junção neuromuscular, por estarem bloqueados por anticorpos anti R-ACC. Algumas fibras musculares que não se contraem por não serem gerados potenciais de ação, resultando em perda de força do músculo afetado. Sinais e sintomas * Fraqueza = A fraqueza piora com atividade (fadiga) e melhora com repouso, e as flutuações geralmente, mas não sempre, mostram uma variação diurna (melhor pela manhã que no fim do dia). * Ptose = Pálpebras caídas e visão dupla ocorrem precocemente na maioria dos pacientes. As pupilas estão preservadas. * Diplopia = Ocorre visão dupla precoce na maioria dos pacientes. * Disfagia = Ocorre dificuldade na mastigação e deglutição quando os músculos faciais e orofaríngeos são afetados. Os pacientes descrevem uma incapacidade de terminar de mastigar sua comida e completar sua refeição, e podem mudar para comidas mais leves. * Disartria = Ocorrem alterações na fala quando os músculos orofaríngeos são afetados, podendo ocorrer uma voz anasalada característica. * Paresia facial = Ocorrem alterações na expressão quando os músculos faciais são afetados e pode ocorrer um sorriso achatado ou transversal característico. * Fraqueza muscular proximal = Dificuldade para levantar de cadeiras ou subir escadas. Não há perda muscular evidente. Os reflexos são normais. As sensações estão intactas. Caracteristicamente, a fraqueza nos membros piora com atividade (fadiga) e melhora com repouso, e as flutuações mostram uma variação diurna (melhor pela manhã que no fim do dia). Classificação da miastenia Grupo Prevalência Sinais Grupo 1 = ocular 25% Ptose, diplopia. Grupo 2a = generalizada leve 35% Acometimento ocular e de extremidades, sem sinais bulbares proeminentes. Grupo 2b = Generalizada, moderada-grave. 20% Sinais oculares ou bulbares, acometimento variável da musculatura apendicular, sem crises. Grupo 3 = Aguda fulminante 11% Sinais generalizados com acometimento bulbar proeminente, com crises. Grupo 4 = Grave de instalação tardia 9% Generalizada, sinais bulbares proeminentes com crises. Diagnóstico * A confirmação da suspeita clínica de MG deverá ser feita realizando o teste de anticolinesterase (edrofônio ou piridostigmina), estimulação nervosa repetida, teste do gelo , eletroneuromiografia (EMG) e pesquisa de anticorpos anti-RACC. * O teste de anticolinesterase é feito, habitualmente, com edrofônio, 2 mg por vía endovenosa (EV), pois tem um início de ação mais rápido (30 segundos) e duração de ação de cerca de cinco minutos. É considerado positivo se for objetivada melhoria acentuada do sintoma selecionado para o teste. * A EMG de fibra única evidencia a falência ou atraso de transmissão em fibras musculares inervadas por uma única fibra nervosa. É positiva em 88 a 92% dos doentes mas a sua especificidade é baixa; * O teste considerado definitivo é a pesquisa de anticorpos anti-R-ACC, cuja positividade é específica da MG; * Após a confirmação de MG deve ser procurada a existência de um timoma ou hiperplasia tímica, através da realização de uma tomografia axial computorizada (TAC) ou ressonância magnética nuclear (RMN) do mediastino, uma vez que cerca de 75% dos doentes com MG têm anomalias tímicas. * A ENM apresenta uma sensibilidade de 80% nos casos de MG puramente ocular e 95% na MG sistêmica, porém sua especificidade é baixa, o teste é caro, necessita de profissional especializado e disponibilidade relativa; * A dosagem sérica do AchR é o teste mais específico no diagnóstico da MG. Entretanto sua sensibilidade na MG puramente ocular varia de 56 a 70%; * O teste com edrofônio (Tensilon®) apresenta uma sensibilidade de 86% para a MG ocular. Trata-se de um teste invasivo que pode ocasionar reações cardíacas adversas ao paciente, necessitando de profissional treinado para a sua realização; * Estudos prévios mostraram que o teste do gelo apresenta uma sensibilidade de 80 a 100% na MG ocular; Diagnóstico diferencial * O botulismo origina uma paralisia simétrica descendente com envolvimento dos nervos cranianos, precedida de contaminação pela neurotoxina produzida pelo Clostridium botulinum. * A hipótese de esclerose lateral amiotrófica é também de considerar, atendendo à idade do doente e ao aparecimento gradual de disfagia e disartria. * A sarcoidose pode originar paralisia de quase todos os nervos cranianos, pelo que poderia explicar o quadro. * A síndrome miastênica de Eaton-Lambert é uma hipótese a ter em conta neste doente que apresentava também um adenocarcinoma da próstata. os reflexos tendinosos estão abolidos ou diminuídos, há frequentemente alterações autonómicas (xerostomia, xeroftalmia, hipotensão ortostática, etc.). Distúrbios da condução neuromuscular * Genética: deficiência dos receptores de acetilcolina * Neurotóxica: - Botulismo: liberação de Ach pré-sináptico; - Picada de cobra, aranha, escorpião; - Fármacos: relaxantes musculares; - Inseticidas: organofosforados; Tratamento * O tratamento da MG assenta, fundamentalmente, em quatro pilares: - Fármacos anticolinesterásicos; - Timectomia; - Terapêutica imunossupressora; - Imunoterapia; * O uso dos fármacos anticolinesterásicos baseia-se na sua ação sobre a colinesterase, impedindo a degradação da ACC na fenda neuromuscular. Parece não haver diferenças na eficácia dos diferentes fármacos existentes. O mais utilizado continua a ser a piridostigmina (Mestinon) por via oral. Tem um início de ação de 15 a 30 minutos e uma duração de ação de cerca de 4 horas, com pico às 2 horas; Corticóides Anticolinesterásicos Plasmaférese * Atuam no sistema imunitário, diminuindo a produção dos anticorpos anti Ach * Efeitos adversos: - Aumento de peso (metabolismo lipídico alterado); * Inibidores da acetilcolinesterase; * Aumenta a disponibilidade de ACh e a probabilidade dela se ligar aos receptores; * Efeitos muscarínicos = hipermotilidade intestinal, * Remoção rápida de AC circulantes, citocinas, complexos imunes e outros mediadores inflamatórios do plasma; * São retirados proteínas e água (precisam de reposição); - Infecções (imunossupressão); - Osteoporose (aumento da atividade dos osteoclastos e diminuição reabsorção intestinal de cálcio); - Hipertensão (aumento de sódio); - Hipocalemia (eliminação de potássio na urina); - Edema (retenção de água); sudorese, secreções respiratórias e gastrointestinais aumentadas e bradicardia; * Efeitos nicotínicos = fasciculações e cãibras musculares. * Somenteem casos mais graves; Revisão - Potencial de ação . * O neurônio é a unidade funcional do sistema nervoso. * Potencial de ação: - Contração muscular; - Regulação da frequência cardíaca; - Geração de impulsos nervosos * Potencial de ação do neurônio - Os sinais nervosos são transmitidos por potenciais de ação; - Potencial de ação: rápida alteração do potencial de membrana que se; - Propaga com grande velocidade por toda a membrana da fibra nervosa - Potencial de ação: gerado pelo fluxo de íons através dos canais dependentes de voltagem – Na e K; - Propriedades do potencial de ação: ● Limiar para iniciação; ● Evento tudo ou nada; ● Propagado sem decremento (amplitude constante); ● O potencial de ação é seguido por um período refratário; * Potencial de repouso - Neurônio: -70mV; - Músculo esquelético: -85mV; - Músculo estriado cardíaco: -90mV; * Sinapse - O terminal axonal da célula pré-sináptica; - A membrana da célula pós-sináptica; * Identificação Clássica de Neurotransmissores - Deve estar presente no neurônio pré-sináptico; - Deve ser liberado por exocitose após despolarização dependente de Ca2+; - Deve se ligar à receptores nas membranas pós-sinápticas; - Deve sofrer inativação sináptica por mecanismos específicos; * Liberação dos neurotransmissores: 1. Um potencial de ação despolariza o terminal axonal; 2. A despolarização abre canais de Ca2+ dependentes de voltagem e o Ca2+ entra na célula; 3. A entrada do cálcio inicia a exocitose do conteúdo das vesículas sinápticas; 4. O neurotransmissor difunde-se através da fenda sináptica e se liga aos receptores na célula pós-sináptica; 5. A ligação do neurotransmissor inicia uma resposta na célula pós-sináptica. * Término da atividade dos neurotransmissores - A ação neurotransmissora encerra quando os compostos químicos são clivados, recaptados para dentro da célula ou se difundem para longe da sinapse: 1. Os neurotransmissores podem retomar aos terminais axonais para reutilização ou para serem transportados para as células da glia; 2. As enzimas inativam os neurotransmissores; 3. Os neurotransmissores podem difundir-se para fora da fenda sináptica por difusão; * Síntese e reciclagem da acetilcolina 1. A acetilcolina (ACh) é sintetizada a partir de colina e acetil CoA; 2. Na fenda sináptica, a ACh é rapidamente quebrada pela acetilcolinesterase; 3. A colina é transportada de volta para o terminal axonal vía cotransporte com o Na+; 4. A colina reciclada é utilizada para a produção de mais ACh; Vídeos - Sobre potencial de ação = https://www.youtube.com/watch?v=GAU4r0XleRU - Vídeo 2 = https://www.youtube.com/watch?v=VoDjmSRkYyk Referências - MIASTENIA GRAVIS: Fisiologia Humana – Uma abordagem Integrada; Silverthorn; 5ª ed.; 2010; Capítulo 12. - Tratado de Fisiologia Médica; Guyton & Hall; 13ª ed.; 2017; Capítulo 7. - BMJ Best Practice - Miastenia grave; Robert P. Lisak. https://www.youtube.com/watch?v=GAU4r0XleRU https://www.youtube.com/watch?v=VoDjmSRkYyk