Prévia do material em texto
1 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética INTRODUÇÃO • Outra substância que merece um sé- rio estudo é o álcool, muito popular em nosso país, sendo, principal- mente, seu consumo maciçamente es- timulado pelas mídias e, principal- mente, pela sociedade. • Se pararmos para pensar, quan- tos brasileiros nunca beberam ao me- nos um copo de cerveja? • Muito provavelmente pouquís- simos, não é mesmo? • Porém, vamos tratar do abuso do álcool, que gera várias consequências ao usuário. • CONCEITO Para uma melhor compreensão, va- mos traçar uma diferenciação entre embria- guez alcoólica, alcoolismo e alcoolemia. ➢ EMBRIAGUEZ ALCOÓLICA - É o conjunto de manifestações psicosso- máticas resultantes da intoxicação etílica aguda, de caráter episódico e passageiro. ➢ ALCOOLISMO - Tem como causa a ingestão continuada e imoderada de bebida alcoólica, a qual vai produ- zindo no paciente uma série de per- turbações orgânicas e psíquicas, ter- minando por configurar um perfil anormal não psicótico, que poderia ser chamado de personalidade alcoo- lista. ➢ ALCOOLEMIA - É a quantidade de álcool presente no sangue. • O consumo exagerado de bebidas al- coólicas leva à embriaguez, podendo até mesmo causar o alcoolismo, o que mais uma vez nos remonta a um pro- blema social crônico e de saúde pú- blica, gerando problemas de ordem médica, psiquiátrica, psicológica, po- licial e médico-legal. • As bebidas alcoólicas podem ser classificadas como: 1) Fermentadas: Vinho, sidra, cerveja, cauim. De característica de menor teor alcoólico (fermentação natural). 2) Destiladas: aguardentes, uísques, co- nhaque. Grande concentração alcoó- lica. 3) Artificiais (adição de álcool aos pro- dutos fermentados). • Em alguns casos acrescentam- se outras substâncias as bebidas al- coólicas, tais como: éteres, aldeídos, corantes (anilina), sulfitos e ácido sa- licílico (conservantes). • Os alcoólatras classificam-se se- gundo o gênero de bebida que conso- mem. • De acordo com esta classificação, são três os tipos de alcoólatras: • Enolistas: bebem bebidas fermenta- das, como a cerveja e o saquê. • Etnistas: bebem bebidas destiladas, como o uísque e a vodga. • Absentistas: bebem bebidas aromáti- cas, como licores e menta. Embriaguez e Alcoolismo toxicofilias 2 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética EMBRIAGUEZ ALCOÓLICA AGUDA – Estudo Clínico • As perturbações produzidas pelo uso excessivo do álcool estão mais em ra- zão direta da TOLERÂNCIA INDI- VIDUAL do que a QUANTIDADE INGERIDA. • Ação tóxica sobre o organismo: dá-se por manifestações físicas, neurológi- cas e psíquicas. • • Manifestações Físicas: taquicardia, congestão das conjuntivas, taqui- pneia (respiração acelerada), taquis- figmia (pulso acelerado), hálito al- coólico-acético. MANIFESTAÇÕES NEUROLÓGI- CAS: • - Alterações no equilíbrio: Sinal de Romberg, simples ou combinado - Embora demonstre instabilidade, é capaz de ficar em pé desde que haja controle visual; logo após fechar os olhos, as oscilações aumentam e a queda é inevitável. • - Na marcha: denominada de marcha ebriosa, cerebelar ou em ziguezague. Para o exame da marcha o paciente deverá estar descalço e semidespido e, sempre que possível solicitar que o mesmo realize alguns passos sem o controle visual. • - Perturbações na coordenação mo- tora: ataxia (não coordenação motora nos movimentos); dismetria (pertur- bação no tamanho dos movimentos); dissinergia ou assinergia (a não coor- denação da harmonia de certos con- juntos de movimentos); disdiadococinesia (desordem na rea- lização de movimentos rápidos e opostos). • - Disartria: dificuldade na articulação das palavras; fala arrastada ou lenta. • - Lentidão nos movimentos. • - Sensibilidade táctil inibida. • - Surgimento dos fenômenos vagais (soluço, vômito). • - Redução das funções sensoriais (visão, audição, gustação e olfação). MANIFESTAÇÕES PSÍQUICAS: • Apresentam-se progressivamente, atingindo inicialmente as funções do córtex cerebral, comprometendo, a seguir, as esferas menores. • - Apresentam alterações: do humor; do senso ético; da atenção do senso- percepção; do curso do pensamento; da associação de ideias. • - Surgem atitudes caracterizadas pelo exagero e ridículo (in vino veritas); e que fogem da conduta habitual. • Dependência: quando se fala em de- pendência, seja ela física, química ou psíquica, trata-se da relação entre um organismo vivo e a droga, que é ca- racterizada pela compulsão por inge- rir a droga, de forma contínua ou pe- riódica, e pelo surgimento de uma crise de abstinência, que se manifesta quando o organismo sente falta da droga. • Seja qual for o grau de dependência do alcoólatra, ele sempre procura no álcool uma forma de ajuste social, que é, em última análise, o objetivo de todo alcoólatra. • São três também as classes de perso- nalidades apresentadas pelos alcoóla- tras: 3 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética • Sintomático: é aquele que inicial- mente bebe, ou seja, experimenta a droga. • Primário: é aquele que, após experi- mentar a droga, passa a fazer uso re- gular dela, consumindo regularmente doses da bebida. • Secundário: é a pessoa que bebe ex- cessivamente. FASES DA EMBRIAGUEZ • Dividida em três fases: 1) Fase de Excitação – características do indivíduo ✓ Loquaz (falador); olhar ‘animado’; humorado; risonho; instável; eufó- rico; bonum vinum laetificat cor ho- minis – “O bom vinho alegra o cora- ção do homem!”; beber usque ad la- etitiam – Beber “até a alegria”. 2) Fase da Confusão = Fase Médico-Le- gal – características ✓ Surgem as perturbações nervosas e psíquicas; disartria; andar cambale- ante; perturbações sensoriais; irrita- bilidade; tendência a ser agressivo. 3) Fase de Sono ou Comatosa = Fase da inconsciência ✓ O indivíduo não se mantém em pé; andar instável necessitando de apoio; quedas com total falta de força para se reerguer; não reação aos estímulos normais; dilatação das pupilas; não reação a luz; relaxamento esfincteri- ano; sudorese; sono profundo. Existem autores que admitem cinco fases, sendo a primeira a Fase Subclínica, caracterizada por uma leve excitação em consequência de um pequeno teor de álcool e, a quinta e última, a Fase da Morte. • TOLERÂNCIA AO ÁLCOOL - A tolerância depende de vários fatores. ✓ Quanto maior o peso da pessoa mais diluído ficará o álcool. ✓ Maior concentração em indivíduos de menor peso. ✓ A passagem do álcool para o sangue através do sistema digestivo se dá de modo bem rápido. ✓ A absorção varia de acordo com a concentração alcoólica da bebida, o ritmo de ingestão, características es- tomacais, fenômenos de boa ou má absorção intestinal. ✓ Considerar o hábito de beber, isto é, se a pessoa ingere a droga (álcool) com constância e em intervalos rela- tivamente curtos de abstinência. ✓ O abstêmio, o bebedor moderado e o grande bebedor toleram o álcool em graus diferentes. ✓ Estados emotivos, estafa, sono, temperatura, fumo, doenças, estados de convalescença alteram a sensibilidade a bebida alcoólica. • TOLERÂNCIA AO ÁLCOOL ✓ A tolerância depende de vários fato- res. ✓ Quanto maior o peso da pessoa mais diluído ficará o álcool. ✓ Maior concentração em indivíduos de menor peso. ✓ A passagem do álcool para o sangue através do sistema digestivo se dá de modo bem rápido. ✓ A absorção varia de acordo com a concentração alcoólica da bebida, o ritmo de ingestão, características es- tomacais, fenômenos de boa ou má absorção intestinal. ✓ Considerar o hábito de beber, isto é, se a pessoa ingere a droga (álcool) com constância e em intervalos rela- tivamente curtos de abstinência. 4 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética✓ O abstêmio, o bebedor moderado e o grande bebedor toleram o álcool em graus diferentes. ✓ Estados emotivos, estafa, sono, temperatura, fumo, doenças, estados de convalescença alteram a sensibilidade a bebida alcoólica. • FORMAS DE EMBRIAGUEZ a) Embriaguez Voluntária: ação delibe- rada de beber; ficar embriagado para cometer um delito; o indivíduo co- nhece o efeito nocivo do álcool e de- seja ficar em condições que facilitem a prática delituosa. b) Embriaguez Culposa: o indivíduo é negligente ou imprudente, bebendo exageradamente e não reconhecendo os efeitos reais do álcool. c) Embriaguez Preterdolosa: o agente não quer o resultado, porém, sabe que em estado de embriaguez poderá vir a cometê-lo, e mesmo assim assume o risco de produzi-lo. d) Embriaguez Fortuita: ocasional, rara, que ocorre em momentos especiais, tendo origem num erro compreensí- vel e não em uma ação predetermi- nada ou imprudente. e) Embriaguez Acidental: o indivíduo ingere, por engano, bebida com alto teor alcoólico ou, potencializa os efeitos de pequenas doses de bebida considerada inócua através do uso de medicamentos. f) Embriaguez por Força Maior: é aquele que a capacidade humana é in- capaz de prever ou resistir, fazendo-o a fim de não ficar em desacordo com o meio e não contrariar as pessoas presentes (no carnaval). g) Embriaguez Habitual: o indivíduo vive sob a dependência do álcool, assumindo um estado de “normali- dade”, equilibrando suas reações e escondendo suas inibições em condi- ção de frequente embriaguez. h) Embriaguez Patológica: Resulta da ingestão de pequenas doses, com ma- nifestações inesperadas. Despropor- ção entre a quantidade ingerida e a in- tensidade dos efeitos causados. A DESCRIÇÃO CLÁSSICA DE VI- BERT A DIVIDE EM QUATRO TI- POS: A) Embriaguez agressiva e violenta: O alcoolista, abusando sobretudo de bebidas destiladas, torna-se agres- sivo e capaz de cometer homicídios, que parecem premeditados, dada a segurança com que se consumam. B) Embriaguez excito-motora: Neste tipo, o alcoolista, depois de breve período de inquietação, é acometido de acessos de raiva terrível e destru- tiva, durante os quais age com ex- trema violência, sobrevindo amnésia lacunar. C) Embriaguez convulsiva: O indiví- duo, depois de manifestar impulsos destruidores, apresenta crises con- vulsivas, idênticas às epilépticas D) Embriaguez delirante: Neste tipo surgem delírios sistematizados ou não, de colorido triste, com acentu- ada tendência para as ideias de auto- acusação ✓ Ressalte-se que a embriaguez pato- lógica configura verdadeira psicose e, portanto, deve ser tratada como doença mental, aplicando-se medida de segurança quando necessário. 5 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética ✓ A embriaguez habitual não se con- funde com a crônica, uma vez que naquela não há perturbação da saúde mental. Suspendendo-se o uso do ál- cool, cessarão os efeitos nocivos e ocorrerá a desintoxicação. ✓ O ébrio habitual apresenta tendência ao alcoolismo crônico, podendo vir a desenvolver as alterações fisiológicas e mentais acima descritas. ALCOOLISMO CRÔNICO Seu diagnóstico clínico baseia-se nas mani- festações somáticas, neurológicas e psíqui- cas. ➢ Manifestações Somáticas : Mais marcantes que na Embriaguez Al- coólica Aguda. ✓ Hepatomegalia (inchaço do fígado) ✓ Edemas das pálpebras ✓ Tremores das mãos ✓ Ventre aumentado ✓ Insegurança na marcha ✓ Congestão das conjuntivas ✓ Dispepsia (desconforto abdominal) ✓ Vermelhidão da face ✓ Pescoço fina. PERTURBAÇÕES NEUROLÓGI- CAS ✓ Polineurite: comprometimento de vários neurônios periféricos por pro- cesso degenerativo; parestesias das extremidades; hiperestesias cutâ- neas; mialgias; impotência motora dos músculos braquiais e curais (braços e pernas); alterações dos re- flexos; atrofias musculares, vegetati- vas e perturbações de coordenação motora. ✓ Poliencefalite Superior Hemorrá- gica de Wernicke = (Encefalopatia alcoólica, Psicose de Korsakoff, Do- ença de Wernicke, Encefalopatia de Wernicke, Beribéri cerebral): No al- coolismo agudo, o álcool dificulta a habilidade de absorção de tiamina por parte do organismo. Sintomas como paralisia dos músculos faciais e do globo ocular, nevralgia facial, disfonia, disfasia, tremores peribu- cais e da língua. ✓ Síndrome de Korsakoff: frequente- mente, mas nem sempre, precedida por um episódio de encefalopatia de Wernicke; apresenta mudanças crô- nicas de pensamento, da memória e declínio cognitivo; desorientação no tempo e no espaço; amnésias orgâni- cas progressivas; amnésias psicogê- nicas súbitas. ▪ Amnésia anterógrada ou lacunar – esquecimento de fatos recentes; atinge todo o período de vida do in- divíduo, após a instalação do quadro tóxico. ▪ Amnésia retrógrada – dificuldade de recordar fatos anteriores à doença. ▪ Amnésia total – associação da amné- sia anterógrada com a retrógrada. ▪ Amnésia alternante – impossibilidade de evocação de “trechos” da vida; esquecimentos de períodos diversos. 6 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética ▪ Como a perda crônica de memória da síndrome de Korsakoff geral- mente ocorre após um episódio de encefalopatia de Wernicke, o distúr- bio crônico também é conhecido como síndrome de Wernicke-Kor- sakoff. ▪ Mas a síndrome de Korsakoff também pode se desenvolver em in- divíduos que não tiveram um episó- dio anterior de encefalopatia de Wernicke. ▪ O Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo (NIAAA) conduz pesquisas sobre o impacto do uso de álcool na saúde e no bem- estar humanos. PERTURBAÇÕES PSÍQUICAS Perturbações que se revelam nas esferas da atenção, afetividade, memória, volição (processo cogni- tivo pelo qual um indivíduo se de- cide a praticar uma ação em particu- lar), senso ético, sensopercepção, consciência, capacidade de julga- mento. Manifestações psíquicas determina- das pela ação tóxica do alcoolismo: ▪ Delirium tremens - estado de con- fusão mental que surge abrupta- mente, e causa alterações da consci- ência, atenção, comportamento, me- mória, pensamento, orientação ou outra área da cognição, provocando um comportamento que costuma al- ternar entre sonolência excessiva e agitação. Dura entre três a dez dias. Índice de mortalidade em torno de 10 a 20 por cento, tendo como causa a pneumonia. ▪ Alucinose Alcoólica ou dos Bebedo- res - pode ocorrer em bebedores contumazes que param de beber. Es- sas pessoas ouvem vozes que pare- cem acusatórias e ameaçadoras, pro- vocando apreensão e terror. A aluci- nose alcoólica pode durar dias e pode ser controlada com medica- mentos antipsicóticos como, por exemplo, a cloropromazina ou a tio- ridazina. ▪ Delírio de Ciúmes dos bebedores – psicose que se manifesta por ideias interpretativas de ciúmes e infideli- dade conjugal; sentimento de culpa pela frieza ou impotência sexual, ▪ Epilepsia Alcoólica – crises convul- sivas semelhantes a da epilepsia, de- saparecendo quando cessam as cau- sas. Sofre influência no tipo de be- bida ingerida, mais comum nos con- sumidores de aguardente. ▪ Dipsomanias – crise impulsiva e ir- reprimível de ingerir grandes quanti- dades de bebidas alcoólicas. FI- SI- O- PATOLOGIA 7 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética Fisiopatologia diz respeito ao cami- nho que o álcool percorre em nosso organismo, sendo este caminho divi- dido em três etapas: Absorção, Me- tabolismo e Excreção. ➢ Absorção – ordinariamente proces- sada pela via digestiva (estômago e intestino delgado). Velocidade varia com alguns fatores e circunstâncias, como quantidade de álcool ingerido, fracionamento e espaçamento das doses, teor alcoólico da bebida, ali- mentação e capacidade de absorção do indivíduo.Pode haver absorção, entre- tanto, por outras vias respiratória (intoxicações profissionais), cutânea (desprezível) e intravenosa (medidas terapêuticas ou anestésicas). Através da difusão química o álcool chega à circulação sanguínea. ➢ Metabolismo e excreção - uma vez na circulação, o álcool alcança prati- camente todos os órgãos (cérebro, glândulas genitais, pulmão), vísceras (fígado, rins), tecidos e humores (lí- quido cefalorraquidiano). Mais de 90% do álcool é oxi- dado no interior do organismo, em uma reação na qual se dá o consumo de glicose. Outras parcelas menores são eliminadas por secreções e excre- ções (leite, saliva, esperma, urina), pelos rins. ➢ Curva alcoolêmica – auxilia no di- agnóstico médico-legal da embria- guez. I. Primeira linha - Curva de difusão ou absorção; ascendente; corresponde ao período de absorção; dura em torno de 30 a 60 minutos (em se tra- tando de absorção única); em casos de absorções sucessivas teremos uma linha quebrada e escalonada (em face das continuadas ingestões). II. Pico – nível de manutenção; concen- tração máxima de alcoolemia; dura- ção mínima; em alguns casos inexis- tente. III. Linha descendente – curva de elimi- nação; regular e gradativa; período de desintoxicação; predomínio do processo de oxidação; início a partir de 90 minutos após a ingestão. DIAGNÓSTICO DA EMBRIA- GUEZ Ebrietas non presumitur, onus pro- bandi incumbit alleganti. ▪ A embriaguez não se presume, de- vendo ser comprovada. Para tanto, há a pesquisa bioquímica, a prova testemunhal e o exame clínico, reali- zado por perito médico-legal. ▪ A pesquisa bioquímica do álcool é a aferição da quantidade de álcool 8 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética presente no organismo. Pode ser feita utilizando-se a saliva, a urina, o líquor, o ar expirado ou o sangue, sendo este último o meio mais pre- ciso. ▪ A pesquisa bioquímica isolada é in- suficiente para um correto diagnós- tico da embriaguez. ▪ Nas palavras de Genival de França, a investigação bioquímica "não res- ponde às indagações de como o indi- víduo se comportava em seu enten- dimento numa ação ou omissão cri- minosa, porque há uma variação de sensibilidade muito grande de um bebedor para outro". ▪ A absorção do álcool pelo orga- nismo é influenciada por diversos fatores, como vacuidade ou pleni- tude estomacal, constituição física, hereditariedade, ritmo de ingestão, concentração alcoólica da bebida, hábito de beber, sono, cansaço, esta- dos emocionais. ▪ Portanto, a sensibilidade ou tolerân- cia ao álcool varia consideravel- mente de indivíduo para indivíduo, donde conclui-se que uma mesma dose de bebida pode gerar efeitos mais ou menos intensos em cada su- jeito, em cada momento. ▪ Há pessoas que, extremamente tole- rantes ao álcool, apresentam altas ta- xas de concentração no sangue, sem características de embriaguez, en- quanto outras, mais suscetíveis aos seus efeitos, ficam indubitavelmente intoxicadas com pequenas doses. ▪ Ou seja, uma cifra não determina de modo absoluto e incontestável os li- mites de uma embriaguez. ▪ Complicador extra da análise bioquí- mica é a questão do consentimento do agente, necessário para a coleta do sangue e inexigível segundo de- terminação constante do artigo 5°, inciso II da Constituição Federal de 1988: "ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se- não em virtude de lei". ▪ Fosse a dosimetria alcoólica o único meio de prova aceitável, havendo re- cusa por parte do examinado, a em- briaguez seria inauferível. ▪ Embora alguns autores defendam a dosagem bioquímica do álcool no sangue como o melhor parâmetro para se avaliar a embriaguez, com cifras determinadas em valores de 6 a 20 dg/L, o exame clínico constitui o mais acertado meio de comprova- ção do estado de embriaguez, pois permite ao legista aferir concreta- mente os efeitos do álcool sobre a capacidade de julgamento e de auto- determinação do agente, essenciais para uma classificação precisa da es- pécie de intoxicação. ▪ A embriaguez produzida pelo álcool e/ou por substâncias psicoativas con- siste num estado de intoxicação aguda, cujos efeitos residem predo- minantemente, no sistema nervoso central e o exame clínico buscará si- nais e sintomas de sua ação manifes- tados nas esferas psíquica e neuroló- gica. 9 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética ▪ Definimos os sinais clínicos perti- nentes à embriaguez alcoólica: 1. Na faixa de 5 a 10 dg/L de etanol no sangue (fase de excitação): ✓ Euforia ou agressividade ✓ Diminuição da atenção ✓ Diminuição da concentração ✓ Alteração da concentração motora ✓ Dano ás funções sensoriais 2. Na faixa de 10 a 20 dg/L de etanol no sangue (fase de estado franco de embriaguez): ✓ Fala arrastada ✓ Ataxia (falta de coordenação dos movimentos musculares voluntários e do equilíbrio) ✓ Sonolência ✓ Instabilidade de humor ✓ Alteração de memória ✓ Perda do juízo crítico ▪ Desta forma, se no momento do exame clínico forem constatados os sinais acima, o perito poderá con- cluir o nível de alcoolemia e facilitar para que o julgador tipifique o crime. ▪ O exame clínico é prejudicado prin- cipalmente pelo decurso do tempo entre a ingestão do álcool e a reali- zação do exame, considerando-se que os efeitos da embriaguez aguda são transitórios, cessando com a eli- minação do tóxico pelo organismo. ▪ Nos Estados Unidos, um exame clínico foi desenvolvido em 1977, pelo National Highway Traffic Safety, chamado de The Standardized Field Sobriety Test (SFST), que é aplicado pelo agente policial e serve como instrumento de triagem de pacientes que serão encaminhados para exames de ar expirado (bafômetro) ou alcoolemia. ▪ O SFST é constituído de três subtestes: nistagmo horizontal (movimento involuntário da pupila), andar e virar (“atenção dividida”), e permanecer em uma perna só (o periciado é instruído a permanecer com um pé aproximadamente 15 cm acima do chão e contar em voz alta - cento e um, cento e dois- até 30 segundos). ▪ Este exame, apesar das críticas, é muito utilizado e aceito em várias instâncias superiores e com sensibilidade que chega a 80-90%. ▪ A avaliação do nistagmo é o mais confiável na detecção do comprometimento clínico do periciando em estado de embriaguez. ▪ O Laudo Pericial deve indicar à Jus- tiça: 1.º Se há ou não embriaguez; 2.º Se, em caso afirmativo, a embria- guez é ou não completa; 3.º Se a embriaguez comprovada é um fenômeno episódico, ocasional, ou se trata de um estado de 10 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética embriaguez aguda manifestada em alcoolismo crônico; 4.º Se se trata de uma embriaguez patológica; 5.º Se, no caso em que se encontra o paciente, pode ele pôr em risco a se- gurança própria ou alheia; 6.º Se é necessário o tratamento compulsório [40]. ▪ Por sua vez, a prova testemunhal, apesar de precária, é confiável e ad- missível, pois permite que o com- portamento do agente ao tempo da ação chegue aos autos mesmo nos casos em que o exame clínico tenha sido prejudicado. BAFÔMETRO E EXAME DE SANGUE – EXAMES COM- PLEMENTARES ▪ São técnicas de avaliar a dosagem de álcool no organismo. No bafômetro, esta dosagem é calculada a partir da concentração de álcool no ar dos pulmões. ▪ Sabendo-se a taxa de difusão, cal- cula-se a concentração no sangue (o aparelho faz na hora). ▪ No exame de sangue, coleta-se o próprio sangue, que tem sua dosa- gem de álcool quantificada por uma técnica experimental padronizada. ▪ O exame de urina é considerado um procedimento para média janela de detecção. ▪ Neste tipo de análise, é possível sa- ber se a pessoa fez uso de bebida alcoólica até 5 dias antes da coleta daurina. ▪ O exame também indica a quanti- dade de álcool encontrada na urina coletada. DIAGNÓSTICO DE ÁLCOOL NO CADÁVER ▪ A perícia poderá ser realizada desde que os fenômenos putrefativos do cadáver ainda não tenham surgidos. ▪ Na putrefação surgem substâncias redutoras que se assemelham ao ál- cool etílico. ▪ Em casos de morte violenta (aciden- tes de trânsito) aconselha-se a prá- tica da dosagem de álcool no san- gue. ASPECTOS JURÍDICOS ▪ Segundo a legislação, no art. 28, in- ciso II do Código Penal, o embria- gado, quando agente, é punido nos casos em que a sua embriaguez é vo- luntária ou culposa, pois, querendo ou não, tem consciência do que faz (antes de beber), logo ele é plena- mente responsável por tal ato. ▪ Nos casos de embriaguez preorde- nada, o autor do crime não só é res- ponsabilizado, como esta é causa que poderá agravar a sua pena. ▪ E nos casos de embriaguez acidental (ou fortuita), o agente poderá ser responsabilizado ou não: se for em- briaguez completa, exclui-se a pena, ele torna-se isento; porém, se for in- completa, o agente terá responsabili- dade pelo crime, mas esta será causa 11 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética para atenuar a sua pena (art. 28, II, §§ 1º e 2º). ▪ Quanto ao alcoólatra, aquela pessoa que bebe por hábito, não há previsão legal. Ele é considerado uma pessoa que precisa de ajuda, e não de cas- tigo. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRA- SILEIRO ▪ Lei no 12.760/2012 - Nova Lei Seca. Alterou os artigos 165 (infração ad- ministrativa), artigos 262, 276, 277 e 306 (penalidade criminal). A multa foi aumentada em dez vezes, com suspensão do direito de dirigir por 12 meses. No artigo 165, passa a ser .... qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penali- dades previstas no artigo 165. ▪ A infração prevista também poderá ser caracterizada mediante: imagem, vídeo, constatação de sinais que in- diquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da CAPACI- DADE PSICOMOTORA ou produ- ção de quaisquer outras provas em direito admitidas. ▪ O artigo 306 passa a ser: conduzir veículo automotor com CAPACI- DADE PSICOMOTORA alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência. ▪ Retirou-se o caput do tipo penal a exigência de determinada dosagem alcoólica para a sua consumação. ▪ As formas previstas passam a ser: teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meio de prova em direito ad- ministrativo, observado o direito à contraprova. ➢ Quando enfrentamos o problema do alcoolismo, devemos sempre ter em conta determinados aspectos. ➢ Veja a seguir um esquema com as três principais características a se- rem analisadas na situação concreta: 1) Pessoas com alcoolismo apresentam transtornos de conduta e relativo pe- rigo a si próprios e aos outros. 2) Eles tendem a mais facilmente de- senvolver outras formas de transtor- nos mentais. 3) Apresentam modificações do juízo crítico e da capacidade de adminis- trar seus interesses. ➢ E isso tudo é importante para sabermos dar o mais adequado tratamento à situação que nos será apresentada. ➢ Ilustrando com uma hipótese, deve- mos entender que se o agente delibe- radamente atingiu o estágio de em- briaguez para tomar coragem e reali- zar a conduta criminosa, ele vai ser criminalmente responsabilizado, como se sóbrio estivesse. ➢ Mas e aqueles casos referentes aos sujeitos que apresentam distúrbios com o álcool? A responsabilidade do agente será então perquirida a partir 12 Luiza Lyrio e Agatha Carvalho MED-103C Bioética do momento em que ele bebe para embriagar-se e não no instante em que, no estado de embriaguez, comete o crime (FRANÇA, 2015).