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Cumarinas 1. Introdução Cumarinas são compostos largamente distribuídos no reino vegetal. Mais de mil cumarinas diferentes já foram descritas, sendo as de estrutura mais simples, as mais distribuídas em todo o reino vegetal. Algumas famílias produzem uma vasta gama de estruturas. As famílias Fabaceae, Asteraceae, e especialmente Apiaceae e Rutaceae produzem os exemplos mais complexos. 2. Conceito As cumarinas são compostos formados por um esqueleto básico que consiste de um anel aromático ligado a um anel pirano substituído com uma carbonila (2H-benzopiran-2-ona). Podem ser consideradas como lactonas do ácido o-hidroxicinâmico. A palavra cumarina deriva de “cumaru”, nome popular da planta Amburana cearensis AC (sin. Dypterix odorata Willd.) da família Fabaceae, de onde as cumarinas foram isoladas pela primeira vez. Essa planta é também conhecida como fava-tonka, pode ser encontrada na região norte do Brasil e produz cerca de 1 a 3% de cumarinas. Figura 1 – Esqueleto básico das cumarinas O esqueleto básico das cumarinas, mostrado acima é também chamado de 1,2-benzopirona tendo como nome trivial “cumarina”. 3. Classificação Com exceção da cumarina propriamente, todas as outras são substituídas na posição 7, podendo ser uma hidroxila (mais freqüente) ou uma metoxila. A 7-hidroxicumarina (umbeliferona) é a precursora das cumarinas 6,7-dihidroxiladas e 6,7,8-trihidroxiladas. Essas hidroxilas podem ser metiladas (metoxis) ou glicosiladas. Outra substituição comum nesse grupo de cumarinas são as prenilas, que podem ocorrer em diversas posições do esqueleto. Quando a prenila encontra-se na posição C-6, origina as pirano ou furanocumarinas lineares. Quando a prenila encontra-se na posição C-8, origina as pirano ou furanocumarinas angulares. 3.1. Furanocumarinas 3.2. Piranocumarinas 4. Origem biossintética Como outros fenilpropanoides, as cumarinas são oriundas do metabolismo da fenilalanina, tendo como um dos seus primeiros precursores o ácido p-hidroxi-cinâmico (ácido p-cumarínico). O esquema dessa biossíntese pode ser visto a seguir. Figura 1 – Esquema de biossíntese do esqueleto básico das cumarinas 5. Ocorrência e distribuição Esta classe de substâncias encontra-se distribuída amplamente em angiospermas, sendo as estruturas mais simples as mais encontradas. Furanocumarinas e piranocumarinas lineares e angulares, lignocumarinas, cumarinas diméricas e triméricas são encontradas somente em certas famílias. As famílias mais citadas na literatura pelo conteúdo de cumarinas são: Apiaceae, Rutaceae, Asteraceae, Fabaceae, Oleaceae, Moraceae, Thymeleaceae. 6. Propriedades, extração e caracterização Cumarinas são solúveis em álcoois e em solventes orgânicos tais como éter e solventes clorados, com os quais as mesmas podem extraídas. Seus glicosídeos são relativamente solúveis em água. Normalmente as cumarinas são encontradas em misturas com outros compostos. O fato de possuírem um anel lactônico auxilia no processo de purificação das mesmas. Como se sabe, as lactonas podem ser abertas pela adição de bases à solução em que se encontram, formando sais solúveis em água. Pode-se então proceder uma limpeza da solução com solventes orgânicos, retirando-se compostos indesejáveis e em seguida, pela adição de ácido ao meio, relactonizá-las e extrair com solventes orgânicos (processo semelhante ao da extração de alcalóides). No entanto, deve-se levar em consideração que algumas cumarinas são sensíveis a ácidos e bases, tornando desaconselhável a utilização desse processo de purificação. Processos modernos de cromatografia são os métodos mais aconselháveis para o isolamento e purificação de cumarinas. Deve-se no entanto notar que algumas cumarinas, principalmente as glicosiladas e aciladas, podem sofrer transformações para artefatos quando são expostas a técnicas clássicas de cromatografia (silica gel). Portanto, aconselha-se o uso de técnicas diferenciadas, tais como Sephadex LH-20, silica gel com fase quimicamente ligada e outras. Pode-se ainda usar técnicas cromatográficas mais rápidas, tais como cromatografia de alta eficiência (CLAE), cromatografia líquida de média pressão (CLMP) e cromatografia líquida sob vácuo que diminuiria o tempo de exposição das cumarinas á sílica gel e consequentemente o risco de formação de artefatos. As cumarinas apresentam um espectro de ultravioleta (UV) característico, o qual é fortemente influenciado pela natureza e posição dos substituintes. Essa qualidade de ser fortemente ativas sob radiação ultravioleta, as torna facilmente detectáveis em placas de cromatografia de camada delgada, nas quais elas aparecem em diversas cores diferente, podendo essas cores ser ainda mais realçadas pela exposição ao vapor de amônia. 7. Usos e propriedades farmacológicas Muitas cumarinas possuem odor característico, destacando-se a cumarina, que foi amplamente utilizada como aromatizante em alimentos industrializados. No entanto, com base em dados sobre toxicidade hepática verificada em ratos, a agência americana Food and Drug Administration (FDA) a classificou como substância tóxica, passando a considerar sua adição em alimentos como adulteração. Seu uso continua ainda como odorizante na área de cosméticos e produtos de limpeza. O uso de cumarinas em medicamentos se destaca no uso dos derivados da 4-hidroxi-cumarina como anticoagulante. O dicumarol foi a primeira substância que apresentou atividade anticoagulante por via oral, constituindo modelo para o desenvolvimento de uma nova classe de anticoagulantes com base no núcleo da 4-hidroxi-cumarina. Dessa classe fazem parte importantes medicamentos como a varfarina e outros. Veremos a seguir alguns exemplos de cumarinas com atividade farmacológica cientificamente comprovada. Furanocumarinas são utilizadas desde épocas remotas para o tratamento de doenças de pele , tais como psoríase, hanseníase, vitiligo, lucoderma, micoses, dermatites e eczemas. Entretanto, no momento existem evidências de que essa classe de compostos pode estar relacionada a casos de câncer de pele, o que leva a classificá-la como tóxica. Portanto, uma avaliação risco-benefício se faz necessária. 7.1. Fotoquimioterapia por furanocumarinas Algumas enfermidade cutâneas podem ser tratadas por combinação de furanocumarinas e exposição controlada a raios ultravioleta. O uso tópico ou oral da droga, juntamente com a exposição ao UV, faz parte de alguns tratamentos para repigmentação da pele. A furanocumarina mais utilizada é o metoxisaleno (8-metoxi-psoraleno), podendo também ser empregado o trioxisaleno (trimetilpsoraleno). A terapia consiste na igestão da droga em dose única (20 a 40mg), seguida da irradiação da pele com luz UVA (320-380 nm) ou luz solar após 2 horas. os resultados esperados são normalmente obtidos após 20 sessões. Esse tipo de tratamento é contraindicado em mulheres grávidas e crianças. 8. Drogas vegetais clássicas Vemos a seguir algumas drogas vegetais clássicas, conhecidas por seu teor de cumarinas. 8.1. Âmio Nome científico: Ammi visnaga (L.) Lam. Família botânica: Apiaceae Parte usada: frutos Monografia farmacopéica: DAB 8 A droga consiste nos frutos desse vegetal que cresce nos países do Mediterrâneo. O uso tradicional na Europa tem sido para aliviar dores em casos de cólicas renais e outros distúrbios do trato urinário. No entanto, a Comissão E da Alemanha, após uma avaliação inicial positiva em 1986, em que foi considerada apropriada para o tratamento de distúrbios cardiovasculares e do trato urinário, em 1994 passou a não recomendar o seu uso terapêutico, considerando a eficácia não comprovada e os possíveis riscos de sua utilização, tendo em vista relatos de toxicidade hepática e reações pseudoalérgicas. Os constituintes característicos da droga são as furanocromonas quelina, visnagina, quelol, e quelinol e as piranocumarinas angulares visnadina, samidina, e dihidrosamidina. 8.2. Angélica Nome científico: Angelica archangelica L. Família botânica: Apiaceae Parte usada: raízes e rizomas secos Monografia farmacopéica: Ph.Bras. I Radiz Angelicae é uma droga clássica, do tipo amargo-aromática, obtida por cultivo da variedade Angelica archangelica L. var. archangelica. Usada tradicionalmente como estomáquica, estimulante do apetite e carminativo, recomendado em desconforto gástrico como flatulência, e sensação de plenitude. Os componentes característicos da droga são o óleo essencial (0,3 a 0,6% com predominância de monoterpenos), cumarinas simples e furanocumarinas lineares e angulares, além de lactonas macrocíclicas, ácidos fenólicos, flavonóides e esteróides. Devido à presença de cumarinas, que podem determinar reações de fotossensibilidade, a utilização terapêutica dessa droga não apresenta relação risco-benefício aceitável. Referências bibliográficas Bruneton, J. (1995) em Pharmacognosy, Phytochemistry and Medicinal Plants Pgs 229-240. Intercept Ltd., London, England. Robbers, J.E., Speedie, M.K. & Tyler, V.E. (1996) em Pharmacognosy and Pharmacobiotechnology Pgs 135-136. Williams & Wilkins, Baltimore, USA. Santos, S.A. & Mello, J.C.P. (2000) em Farmacognosia, da planta ao medicamento. (2a Ed.) Capítulo 24, Pgs 451-465. Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC.
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