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Fisioterapia oncológica para a graduação 1 Fisioterapia oncológica para a graduação. O papel da Fisioterapia no tratamento do câncer Autor: Daniel Salgado Xavier Daniel Salgado Xavier Prefácio A vida humana é um bem precioso de valor inestimável. A saúde, um meio que permite que esta seja desenvolvida em sua total plenitude. Indissociáveis, juntas carregam uma idéia real de possibilidades e realizações. O câncer é devastador! Não só para a pessoa objeto como para seus familiares. O sentido de plenitude imediatamente é perdido e os sonhos de realizações abandonados. O paradigma câncer-morte, ainda incrustado em nossa prática médica atual, aos poucos vem sendo abandonado. Os avanços técnico-científicos de nossa era, por ora, jogam em nosso favor e garantem ao paciente oncológico uma esperança, mesmo que tênue, da tão almejada cura. Neste contexto, a fisioterapia oncológica ganha espaço na medida em que garante a qualidade de vida e a dignidade ao portador da enfermidade oncológica. A labuta por vezes é ingrata, mas os resultados sempre gloriosos. Fazer parte de um corpo de cuidadores que lidam diariamente com os conceitos tão peculiares à condição humana Fisioterapia Oncológica para a graduação. 3 como os conceitos de vida e da morte, da esperança jamais abandonada e da superação constante, moldam nosso caráter e promove o crescimento pessoal e profissional. À fisioterapia oncológica, cabe essencialmente, a tarefa de prevenir, manter e promover condições previamente perdidas, entretanto, nosso maior mérito consiste em garantir a dignidade do ser humano. Este livro é dedicado inteiramente a todos àqueles guerreiros que lutam constantemente pela superação e pela vida, onde o embate ultrapassa nossas possibilidades de compreensão. Aos pacientes oncológicos, meu mais sincero sentido de gratidão e apreço pelos ensinamentos diários e pela oportunidade de acompanhar suas lutas, decepções e histórias. Daniel Xavier Daniel Salgado Xavier “Sou tão grato que nunca tenho dias ruins. Tenho dias de náuseas e dias de sustos; Dias de cansaço e dias de mágoa; Dias longos e dias curtos; Dias silenciosos e dias solitários; Dias de dor na boca e dias de mãos inchadas; Dias áridos e dias enfadonhos; Dias chuvosos e dias de sol; Dias frios e dias quentes. Mas nunca tenho dias ruins ““. **Jonh Robert Mc Farland (agora que tenho Câncer, estou completo). Fisioterapia Oncológica para a graduação. 5 SUMÁRIO: Capítulo I – O panorama do câncer no Brasil. O Histórico do Câncer de mama no Brasil Ações de controle e desafios no combate ao câncer no Brasil Capítulo II – O processo da Oncogênese. Introdução à oncogênese • A oncogênese • Acúmulo de alterações genéticas vantajosas • Evasão da apoptose e do sistema imune. • Indução de angiogênese tumoral • Oncogênese física • Oncogênese química • Oncogênese biológica • Oncogenes Capítulo III – Classificação, estadiamento e graduação dos tumores. Classificação e nomenclatura dos tumores Tumores benignos e malignos Nomenclatura dos tumores • A origem embrionária dos tumores • Uso de epônimos • Morfologia tumoral Graduação e estadiamento dos tumores O sistema TNM e os seus objetivos Bases para o Estadiamento Tipos de câncer mais incidentes na população brasileira. Daniel Salgado Xavier Intervenções terapêuticas • Radioterapia • Quimioterapia • Hormonioterapia • A cirurgia oncológica Capítulo IV- A dor oncológica e o papel da fisioterapia O processamento da dor O Sistema nociceptivo A dor em pacientes oncológicos Classificação da dor por seu mecanismo fisiopatológico • Padrões e tipos da dor Princípios gerais no controle à dor Mensuração da dor oncológica Recursos auxiliares no combate à dor A fisioterapia no controle da dor oncológica • O uso do TENS • A termoterapia • O uso da crioterapia • Métodos mecânicos • Massagem • Exercícios e a atividade física Capítulo V – A fisioterapia oncológica. A história e a evolução da fisioterapia oncológica Fisioterapia oncológica • Indicações para o atendimento fisioterapêutico A Fisioterapia respiratória em oncologia • Os incentivadores respiratórios Fisioterapia Oncológica para a graduação. 7 A Fisioterapia intensiva em Unidade de tratamento intensiva oncológica A Fisioterapia motora em oncologia • A atuação na fadiga • Fisioterapia motora em pacientes neurológicos • Cuidados às úlceras de pressão Capítulo VI – A fisioterapia no câncer de mama. O câncer de mama no Brasil • Patogenia e fatores de risco • Classificação • Estadiamento • Prevenção • Tratamento A intervenção cirúrgica • Comprometimento e problemas pós-operatórios • O Linfedema A fisioterapia no câncer de mama • Atuação dos exercícios terapêuticos nas complicações pós-mastectomia Daniel Salgado Xavier O histórico do câncer no Brasil. As duas primeiras décadas do século passado, enquanto as endemias ocupavam a atenção das políticas de saúde no Brasil, o câncer começava a despontar nos países desenvolvidos entre as doenças de maior taxa de mortalidade. Os números ascendentes na Europa e nos Estados Unidos determinariam, em 1920, no governo Epitácio Pessoa, a inclusão de propostas para uma política anticâncer na legislação sanitária brasileira. Na prática, o Decreto nº 14.354, proposto por Carlos Chagas, incluía uma rubrica específica para o câncer nos impressos de óbito distribuídos em inspetorias, delegacias de saúde e farmácias, assim como a notificação compulsória, no intuito da produção de medidas sanitárias eficientes. Os dados referentes à população do então Distrito Federal subsidiariam o primeiro plano anticâncer brasileiro, apresentado pelo obstetra Fernando Magalhães no Primeiro Congresso Nacional dos Práticos, em setembro de 1922, no contexto das comemorações pelo Centenário da Independência. Além dos primeiros números, ainda que precários, colhidos nas Casas de Misericórdia, Magalhães apontaria de maneira pioneira, a partir Fisioterapia Oncológica para a graduação. 9 de sua constatação em operários, relação entre câncer e substâncias como alcatrão, resinas, parafinas, anilinas. Do evento sairia à definição de câncer como "mal universal", um dos desafios a serem enfrentados pela agenda republicana, segundo a qual os dilemas que atingiam a nação só poderiam ser respondidos com um saber próprio sobre o país. O câncer começaria a migrar de encargo exclusivo da área médica para um problema de saúde pública. Paralelamente, novas tecnologias surgiam no combate às neoplasias, como eletrocirurgia, Raios-X e radium, impulsionando as políticas de profilaxia do câncer no Brasil, o que modificaria, ainda que lentamente, o paradigma de "incurável" para "recuperável". Caberia, no entanto, à iniciativa privada a fundação em 1922 do Instituto de Radium, em Belo Horizonte, primeiro centro destinado à luta contra o câncer no país, exeqüível pela persistência de Borges da Costa e o orçamento do governo Arthur Bernardes. A partir dos anos 20, influenciados por políticas anticâncer positivas nos países desenvolvidos, principalmente França e Alemanha, pesquisadores como Eduardo Rabello, Mario Kroeff Daniel Salgado Xavier e Sérgio Barros de Azevedo começariam a pensar o câncer como um processo sanitário gerenciado pelo Estado. Somente no início da década de 30, no Governo Provisório, viriam os investimentos na construção de um aparato hospitalar para tratamento e estudo do câncer. Em 1937, Getúlio Vargas assina o decreto-lei nº 378 criando o Centro de Cancerologia, no Serviço de AssistênciaHospitalar do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, embrião do Instituto Nacional de e Sérgio Barros de Azevedo começariam a pensar o câncer pelo Estado. Somente no início da década de 30, no Governo Provisório, viriam os investimentos na construção de um aparato hospitalar para tratamento e estudo do câncer. Em 1937, Getúlio lei nº 378 criando o Centro de cerologia, no Serviço de Assistência Hospitalar do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, embrião do Instituto Nacional de Fisioterapia Oncológica para a graduação. 11 Câncer, que seria inaugurado no ano seguinte pelo próprio Getúlio Vargas e Mario Kroeff, já no período do Estado Novo. O projeto anticâncer ganharia caráter nacional em 23 de setembro de 1941, com a criação do Serviço Nacional de Câncer (SNC), destinado a organizar, orientar e controlar a campanha de câncer em todo o país, como previa o Decreto-Lei nº 3.643. Ao SNC caberia a coordenação das ações em estados e municípios, além do incentivo à criação de organizações privadas que se estenderiam, com o passar dos anos, a todo o território, constituindo uma rede, ainda que não se adotasse este conceito. Instituída a política anticâncer nacional, o SNC seria despejado de sua sede pela Polícia Militar, em 1943, como parte do esforço de guerra, e depositado em espaço inadequado, na Lapa, danificando o processo de continuidade. Em 1946, o SNC ocuparia parte das dependências do Hospital Graff ré e Guinle, enquanto negociava a construção de uma sede central, também no Distrito Federal. No mesmo ano, no contexto de uma nova definição de saúde, como o completo bem-estar físico, social e mental, Daniel Salgado Xavier deixando de consistir apenas em ausência de doença - conforme proposta da então recém-fundada Organização Mundial de Saúde (OMS), com participação do Brasil, o SNC passaria a usar a informação como estratégia da prevenção, para obtenção do diagnóstico precoce da doença. A mudança de foco faria com que as políticas de câncer, a partir de 1951, ganhassem visibilidade entre a população, e em conseqüência, entre os legisladores, o que garantiria o suporte orçamentário adequado para a expansão da campanha anticâncer no Brasil e a conclusão do hospital-instituto central (INCA), sede do SNC, no Rio de Janeiro, inaugurado em agosto de 1957 por Juscelino Kubitschek e Ugo Pinheiro Guimarães. A ação ousada ultrapassaria fronteiras, pesando na decisão da União Internacional de Controle do Câncer (UICC) de promover no Brasil, em 1954, o 6º Congresso Internacional de Câncer, organizada em São Paulo por um dos integrantes de sua diretoria executiva, então diretor do SNC, Antonio Prudente. Como resoluções seriam adotados pela OMS o conceito de controle - consistindo em meios práticos aplicados às coletividades capazes de influenciar a mortalidade por câncer - e Fisioterapia Oncológica para a graduação. 13 uma nomenclatura de neoplasmas para uso internacional, mais tarde aprimorada para Classificação Internacional de Doenças para Oncologia (CID-O). O fortalecimento do papel do SNC e o aprimoramento dos conceitos fariam com que os mentores da política anticâncer começassem a pensar na epidemiologia do câncer levando em consideração as condições ambientais, a extensão territorial e os contrastes do país. Ao mesmo tempo, gerava-se a certeza entre especialistas de que os sintomas eram a fase tardia do câncer, o que fundamentaria a discussão para a difusão de clínicas de prevenção e diagnóstico. Assim, o período desenvolvimentista traria, como contribuição às políticas de controle do câncer, a produção de soluções alternativas - face ao reconhecimento de que programas sanitários onerosos estavam em desacordo com a realidade do país - e o esforço simultâneo de uma relação mais harmoniosa entre investimentos em saúde e desenvolvimento econômico. O progresso das iniciativas do SNC e, por tabela, do INCA levaria, a partir de 1965, ao planejamento de reuniões anuais de Daniel Salgado Xavier representantes das organizações vinculadas à campanha anticâncer visando uma política unificada, com bases sólidas em todo o país, o que culminaria na institucionalização, pelo Decreto nº 61.968, de dezembro de 1967, da Campanha Nacional de Combate ao Câncer. Apesar dos avanços, o fim dos anos 60 veria renascerem os conceitos da medicina liberal, que entendia o câncer como problema individual. O Plano Nacional de Saúde, formulado pelo ministro Leonel Miranda, transferiria o INCA, braço executivo do SNC, para o Ministério da Educação. Essa nova dinâmica deixava à iniciativa privada um rentável campo de incursão médico-cirúrgica. O período também traria o esvaziamento gradual do vocábulo câncer, que estaria associado à morbidez, em favor de terminologia menos comprometida, como "doenças crônico-degenerativas". A interrupção autoritária das políticas anticâncer, que havia colhido consenso entre o público e o privado, fortalecendo o privado em detrimento do público, resultariam, em 1970, na decadência do INCA e na extinção do SNC, transformado pelo Decreto nº 66.623 em Divisão Nacional de Câncer, de caráter Fisioterapia Oncológica para a graduação. 15 técnico-normativo, administrada de Brasília e vinculada à Secretaria de Assistência Médica. Em 1980, uma ação administrativa inédita, denominada co- gestão, aprimoraria, com agilidade e flexibilidade, o controle do câncer no Brasil. Era uma combinação administrativo-financeira entre os ministérios da Saúde e da Previdência Social para implementação de programas da Campanha Nacional de Combate ao Câncer. Um deles, o Programa de Oncologia (Pro- Onco), originado da necessidade de o sistema de saúde unificar a produção de informações em câncer, estruturaria e ampliaria as bases técnicas em âmbito nacional nas áreas de educação, informação e controle do câncer. A Constituição Federal de 1988 mudaria significativamente a estrutura sanitária brasileira, destacando-se a caracterização dos serviços e das ações de saúde como de relevância pública e seu referencial político básico. Esta diretriz seria regulamentada pela Lei Orgânica da Saúde (nº 8.080), em 1990. Em relação ao câncer, no conjunto das demandas do SUS, coube papel diferenciado ao INCA, entendido como agente diretivo na política nacional no controle de câncer no Brasil. Daniel Salgado Xavier Ações de controle e desafios no combate ao câncer no Brasil. A tendência de crescimento de câncer no Brasil é inquestionável. A diferença no risco absoluto e na sobrevida por câncer existe entre as diversas regiões brasileiras e, se não houver uma intervenção maciça no controle, esta diferença será maior ainda em termos de acesso aos serviços adequados para tratamento dos pacientes com câncer. Um grande desafio diante do país é a minimização das disparidades na ocorrência de câncer em todas as localidades e em todos os estratos sociais. Em teoria, as soluções para enfrentar a disparidade podem ser objetivas a partir de melhora na educação e na comunicação, com mais investimento econômico para aumento do acesso ao cuidado em todos os níveis. No entanto, para que isto seja alcançado é necessário um esforço na organização do SUS, com participação efetiva da sociedade na construção de uma rede ampla e dinâmica que tenha como objetivo principal o controle do câncer. Em se tratando de países com recursos limitados, como o Brasil, em que indiretamente competem outros graves problemas de saúde pública, a definição de prioridades deveria Fisioterapia Oncológica para a graduação. 17 ser o primeiro passo do plano de controle do câncer. Estas prioridades devem ser traçadas não apenas em função do peso que representamno perfil epidemiológico de uma população, mas, sobretudo, porque são medidas de intervenção com custo- efetividade já comprovado e que certamente terão impacto na mortalidade, incidência ou qualidade de vida. Nesta perspectiva é que tornaram prioridades de saúde pública, pelo governo brasileiro, o controle dos cânceres de colo do útero e da mama e o controle do tabagismo. Em toda a área de prevenção, deve ser estimulada a abordagem multisetorial para promoção de modos de vida e ambientes saudáveis. Sugere-se que a implementação efetiva da prevenção de câncer em diferentes níveis seja parte do controle de câncer e da prevenção de doenças crônicas e outros problemas relacionados, o que implica que o processo necessariamente considere as inter-relações entre fatores de risco e proteção para doenças crônicas. Os agentes e as condições de maior potencial de risco para câncer têm pesos diferentes de região para região, o que torna Daniel Salgado Xavier imprescindível, no planejamento das ações de prevenção, a caracterização da realidade local. As estratégias de comunicação devem assegurar que as medidas propostas sejam bem planejadas, com estímulo a formas socializantes na adoção de comportamentos saudáveis. A parceria com movimentos sociais organizados é crucial para a adesão e a reformulação contínua dos processos de comunicação, educação e defesa da causa – a chamada advocacy. A construção de uma rede de atenção ao câncer, que tem por finalidade gerar, disseminar, articular e executar políticas e ações de atenção oncológica, deve incluir não apenas gestores e profissionais das diversas áreas e setores envolvidos, mas também universidades e centros de pesquisa, as sociedades científicas e toda a sociedade civil organizada. Com isto é possível a união de projetos, instituições e pessoas interessadas em estratégias de âmbito nacional, regional ou local que contribuam para a consolidação de um sistema de saúde eqüitativo e eficaz com forte participação social. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 19 A veiculação de informação em todos os campos, incluindo na saúde, é sem dúvida crescente, com a ampliação do acesso à internet. No entanto, nem sempre este veículo assegura qualidade de conteúdo: muitas vezes é de confiabilidade variável, cabendo aos profissionais de saúde e educação estabelecerem formas precisas de informarem a população dos riscos para o câncer e demais doenças crônicas. É preciso entender que interações entre comunicação de risco, motivação e mudança de comportamento são complexas e ainda pouco entendidas. As condições que determinam o comportamento dos indivíduos são subjetivas, não-mensuráveis. Muitas vezes as intervenções preventivas podem dar certo em alguns lugares e não em outros. A interpretação da informação transmitida pode variar em função da escolaridade, de fatores culturais, emocionais e sociais. Justamente por isso, o trabalho integrado entre educação e saúde é o primeiro passo para a efetividade da política de prevenção. No Brasil, o critério de integralidade do SUS já vem permitindo que as ações sejam planejadas de forma transversal, Daniel Salgado Xavier o que implica multidisciplinaridade de ações, ao mesmo tempo em que se investe no trabalho intersetorial. Em relação à prevenção secundária, o rastreamento deve privilegiar os cânceres cuja ocorrência pode ser modificada a médio e longo prazo, como é o de colo do útero, mama e cólon e reto. Para os demais tipos, enquanto não houver testes de detecção precoce eficientes, deve-se priorizar o monitoramento de grupos populacionais de maior risco pela história familiar ou por condições especiais de saúde. A tomada de decisão em estratégias de rastreamento populacional deve levar em conta os recursos necessários, as condições dos serviços de saúde e as implicações das questões éticas – inclusive a decisão de não se rastrear. A decisão pelo rastreamento populacional pode representar a peça-chave mais desafiante para os serviços de saúde. Apenas a partir de um plano estruturado com ações qualificadas e sistema de referência e contra-referência ampla podem alcançar as metas propostas. O rastreamento só se torna eficiente quando, de fato, as pessoas rastreadas podem se beneficiar do diagnóstico precoce e com isso alterar sua possibilidade de cura. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 21 Nas estratégias de prevenção de câncer do colo do útero, a chegada ao mercado da vacina anti-HPV abre novas perspectivas de eliminação do risco de infecção por alguns subtipos deste vírus, responsáveis por 75% dos casos de carcinoma. A discussão de incorporação da vacina pelo SUS merece assim ser encarada como prioritária, e deve levar em conta que alguns passos precisam ser percorridos até que se definam as regras para que a vacina seja incluída no calendário nacional de imunizações. Estes passos exigem estudos sobre a distribuição da prevalência de infecção dos diferentes subtipos de HPV em diferentes regiões do país. É importante salientar que, instituída a vacinação anti-HPV, o rastreamento convencional com base no exame Papanicolau deve ser mantido mesmo entre meninas vacinadas: o efeito em longo prazo da vacina ainda é desconhecido, não só em relação ao tempo de proteção conferido, mas também quanto ao comportamento dos subtipos do vírus não incluídos na vacina. Precisamos evoluir nos sistemas de informação, integrando os registros de câncer aos outros sistemas existentes no SUS, Daniel Salgado Xavier garantindo o monitoramento, a regulação e a avaliação das condições de saúde dos pacientes e os resultados alcançados. A vigilância do câncer deve ser consolidada e aprimorada pelo aumento da cobertura, da qualidade e da disseminação das informações para os profissionais e para a sociedade, permitindo o monitoramento das diversas condições de risco relacionadas à ocorrência do câncer. Além de permitir que se conheça a distribuição de risco no país, o acompanhamento contínuo das informações geradas neste sistema integrado tornará possível a avaliação direta, de grande interesse para gestores de saúde. No caso dos registros de base hospitalar pode ser avaliada a qualidade da assistência e, no caso dos de base populacional, de uma forma mais ampla, podem ser feitas comparações com outras regiões do mundo em relação à sobrevida dos pacientes. Os avanços no tratamento (cirurgia, radioterapia e quimioterapia), com certeza, têm sido responsáveis em países desenvolvidos pela redução da mortalidade dos principais tipos de câncer. A prioridade do tratamento deve estar ligada à detecção precoce, com foco em cânceres de grande potencial de Fisioterapia Oncológica para a graduação. 23 cura e o estabelecimento de padrões de cuidado segundo prioridades e diferentes fontes de recurso. Com certeza, o acúmulo exponencial de conhecimento produzido nos campos da biologia molecular e da genética, especialmente com o seqüenciamento genômico, vai permitir, em futuro próximo, a determinação de variantes genéticas que se relacionam aos riscos de diversos tipos de câncer. Para que isto se torne uma ferramenta importante no controle do câncer é necessário o estímulo a estudos que confiram a consistência dos resultados encontrados com desenhos cuidadosos e melhores estimativas de associação. Assim, será possível compreender a patogênese e avançar no desenvolvimento de fármacos com intervenções mais individualizadas. Grandes benefícios serão possíveis para melhora do tratamento do câncer. A grande questão é que isso tudo aconteça sem que cresçam as diferenças que já marcam hoje o acesso a terapias mais eficazes.É necessário ainda o estabelecimento da lógica da rede de pesquisa oncológica em âmbito nacional, na busca de grupos emergentes em regiões cuja pesquisa em câncer seja incipiente, Daniel Salgado Xavier permitindo-se o envolvimento da massa crítica nacional de pesquisadores em saúde na problemática do câncer. Cobertura assistencial, avanços tecnológicos, qualidade da atenção ao câncer, ampliação das medidas de controle: todas e cada uma dessas iniciativas dependem de esforços redobrados na área de formação de recursos humanos e de educação permanente, orientados pela articulação sinérgica entre gestão do SUS e instituições formadoras. Por fim, o grande desafio está no campo da mobilização social. Como garantir a articulação de políticas de saúde com políticas de educação, rompendo preconceitos e quebrando o paradigma de que o câncer é sinônimo de morte? A difusão de experiências bem-sucedidas, com engajamento de voluntariado e captação de recursos por ações integradas, é essencial para que alcancemos os objetivos propostos e para a sustentabilidade das estratégias de mobilização que visam à redução dos casos e óbitos por câncer e para a efetiva melhora da qualidade de vida dos pacientes. Fisioterapia Oncológica para a graduação. Capítulo II - Introdução a Oncogênese Fisioterapia Oncológica para a graduação. 25 Introdução a Oncogênese. Daniel Salgado Xavier Justifica-se a necessidade de se conhecer com clareza os mecanismos de formação da célula tumoral pela perspectiva de utilização desses conhecimentos para melhorar a prevenção, o diagnóstico, o prognóstico e o tratamento do câncer. Segundo Ferreira et al, podemos definir que o câncer é conseqüência de alterações moleculares que conferem à célula modificações em seu comportamento e resultam em alterações na fisiologia celular que, em última instância, são responsáveis pela biologia do câncer. Neste Tópico, abordaremos de forma sintética as alterações morfológicas e funcionais apresentadas pelas células dos tumores malignos. Para tanto, com o propósito de facilitar a compreensão dessas alterações, assinalam-se alguns postulados referentes ao comportamento biológico das células normais. As células normais de todo organismo vivo coexistem em perfeita harmonia citológica, histológica e funcional, harmonia esta orientada no sentido da manutenção da vida. De acordo com suas características morfológicas e funcionais, determinadas pelos seus próprios códigos genéticos, Fisioterapia Oncológica para a graduação. 27 e com sua especificidade, as células estão agrupadas em tecidos, os quais formam os órgãos. Os mecanismos que regulam o contato e a permanência de uma célula ao lado de outra, bem como os de controle do seu crescimento, ainda constituem uma das áreas menos conhecidas da biologia. Sabe-se que o contato e a permanência de uma célula junto à outra são controlados por substâncias intracitoplasmáticas, mas ainda é pouco compreendido o mecanismo que mantém as células normais agregadas em tecidos. Ao que parece elas se reconhecem umas às outras por processos de superfície, os quais ditam que células semelhantes permaneçam juntas e que determinadas células interajam para executarem determinada função orgânica. Sabe-se também que o crescimento celular responde às necessidades específicas do corpo e é um processo cuidadosamente regulado. Esse crescimento envolve o aumento da massa celular, duplicação do ácido desoxirribonucléico (DNA) e divisão física da célula em duas células filhas idêntica (mitose). Tais eventos se processam por meio de fases conhecidas como G1 - S - G2 - M, que integram o ciclo celular. Daniel Salgado Xavier Nas células normais, restrições à mitose são impostas por estímulos reguladores que agem sobre a superfície celular, estímulos estes que podem resultar tanto do contato com as demais células como da redução na produção ou disponibilidade de certos fatores de crescimento. Fatores celulares específicos parecem ser essenciais para o crescimento celular, mas poucos deles são realmente conhecidos atualmente. É certo que fatores de crescimento e hormônios, de alguma forma, estimulam as células para se dividirem. Entretanto, eles não têm valor nutriente para as células nem desempenham um papel conhecido no metabolismo. Presumivelmente, apenas sua capacidade de ligar-se a receptores específicos de superfície celular os capacita a controlar os processos celulares. O mecanismo de controle do crescimento celular parece estar na dependência de fatores estimulantes e inibidores e ele normalmente estaria em equilíbrio até o surgimento de um estímulo de crescimento efetivo, sem ativação do mecanismo inibidor. Tal estímulo ocorre quando há exigências especiais como, por exemplo, para reparo de uma alteração tissular Fisioterapia Oncológica para a graduação. 29 (tecidual). As células sobreviventes se multiplicam até que o tecido se recomponha e, a partir daí, quando ficam em íntimo contato umas com as outras, o processo é paralisado. Em algumas ocasiões, entretanto, ocorre uma ruptura dos mecanismos reguladores da multiplicação celular e, sem que seja necessário ao tecido, uma célula começa a crescer e a dividir-se desordenadamente. Pode resultar daí um clone de células descendentes, herdeiras dessa propensão ao crescimento e divisão anômalos, insensíveis aos mecanismos reguladores normais, que resulta na formação do que se chama tumor ou neoplasia, que pode ser benigna ou maligna. A carcinogênese refere-se ao desenvolvimento de tumores malignos, estudada com base nos fatores e mecanismos a ela relacionados. A Oncogênese O organismo humano encontra-se exposto a múltiplos fatores carcinogênicos, com efeitos aditivos ou multiplicativos. Sabe-se que a predisposição individual tem um papel decisivo na resposta final, porém não é possível definir em que grau ela Daniel Salgado Xavier influencia a relação entre a dose e o tempo de exposição ao carcinógeno e a resposta individual à exposição. Independentemente da exposição à carcinógenos, as células sofrem processos de mutação espontânea, que não alteram o desenvolvimento normal da população celular como um todo. Estes fenômenos incluem danos oxidativos, erros de ação das polimerases e das recombinases e redução e reordenamento cromossômico. Há também que se considerar a vigilância imunológica como mecanismo de correção ou exclusão das células mutantes. Os fenômenos de mutação espontânea podem condicionar uma maior ou menor instabilidade genômica, que pode ser crucial nos processos iniciais da carcinogênese, como conseqüência de aneuploidia e amplificações genéticas. Em síntese, a carcinogênese pode iniciar-se de forma espontânea ou ser provocada pela ação de agentes carcinogênicos (químicos físicos ou biológicos). Em ambos os casos, verifica-se a indução de alterações mutagênicas e não mutagênicas ou epigenética nas células. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 31 A incidência, a distribuição geográfica e o comportamento de tipos específicos de cânceres estão relacionados com múltiplos fatores, incluindo sexo, idade, raça, predisposição genética e exposição à carcinógenos ambientais. Destes fatores, os ambientais são, provavelmente, os mais importantes. Os carcinógenos químicos (particularmente aqueles presentes no tabaco e resultantes de sua combustão e metabolismo), bem como determinados agentes, como os azocorantes, aflatoxinas e benzeno, foram claramente implicados na indução de câncer em homens e em animais. Certos vírus de DNA do grupo herpes e papiloma, bem como vírus de ácido ribonucléico(RNA) do tipo C, foram também implicados como agentes produtores de câncer em animais, podendo ser igualmente responsáveis por alguns cânceres nos homens. O tempo para a carcinogênese ser completada é indeterminável, podendo ser necessários muitos anos para que se verifique o aparecimento do tumor. Teoricamente, a Daniel Salgado Xavier carcinogênese pode ser interrompida em qualquer uma das etapas, se o organismo for capaz de reprimir a proliferação celular e de reparar o dano causado ao genoma. Seria redundante salientar que a suspensão da exposição a agentes carcinogênicos é condição sine qua non para a interrupção da carcinogênese. Células cancerígenas, fundamentalmente diferem das células normais por serem imortalizadas (modificações moleculares que conferem às células capacidade de crescerem indefinidamente), transformadas (são células independentes dos mecanismos usuais das células normais como ancoragem, de fatores de crescimento e de inibição por contato) e capazes de gerarem metástases (capacidade de invadir e gerar colônias de células-filhas a distância). Fisioterapia Oncológica para a graduação. Figura 1 - As etapas da carcinogênese.Fonte: Instituto Nacional do câncer/MS Acúmulo de alterações genéticas vantajosas O processo de desenvolvimento neoplásico pode ser dividido em 3 etapas: iniciação, promoção e progressão tumoral. Durante a iniciação, ocorrem modificações no genótipo da célula que levam à imortalização. Na promoção, essa célula gera Fisioterapia Oncológica para a graduação. 33 : Instituto Nacional do O processo de desenvolvimento neoplásico pode ser dividido em 3 etapas: iniciação, promoção e progressão tumoral. Durante a iniciação, ocorrem modificações no genótipo da célula que levam à imortalização. Na promoção, essa célula gera Daniel Salgado Xavier um clone com vantagens proliferativas que promoverão a progressão tumoral (etapa 3). De maneira geral, são necessárias múltiplas alterações genéticas para dar origem ao câncer. Tumorigênese é um processo de múltiplos eventos, e cada evento reflete uma progressiva transformação da célula normal para a célula maligna, passando por uma série de estados pré-malignos. Quanto maior o número de mutações e mais danificado for o DNA, mais requisitado é o sistema de reparo, aumentando a chance dos erros passarem despercebidos. Esta instabilidade genômica produz alterações adicionais no DNA que podem conferir à célula vantagens seletivas para seu crescimento e proliferação. 1. Evasão da apoptose e do sistema imune. O fenômeno da apoptose (morte celular normal) permite a manutenção controlada do número de células em um determinado tecido. De maneira simplificada, pode-se considerar que a quantidade de células que morrem em um tecido é em função da atividade conjunta dos produtos gênicos Fisioterapia Oncológica para a graduação. 35 que bloqueiam (genes anti-apoptóticos) e promovem a morte celular programada (genes pró-apoptóticos). Assim a relação entre a taxa de proliferação celular e a taxa de morte celular determina a capacidade das populações de células tumorais se expandirem. O maior contingente de morte celular é representado pela apoptose, um fenômeno natural que ocorre em todos os tipos de células do corpo e faz parte do desenvolvimento normal dos tecidos, mas a resistência a ela é uma habilidade adquirida pela célula cancerosa. O programa de evasão da apoptose pode ser engatilhado por um oncogene superexpresso . Pode-se considerar que a apoptose é a barreira máxima que deve ser burlada pela célula do câncer. Além da capacidade de evadir-se da apoptose, a célula tumoral também deve adquirir a capacidade de escape da imunidade inata do organismo. A interação entre as células tumorais e as do sistema imune leva a trocas recíprocas que culminam em um sistema imune menos efetivo ou incapaz de uma resposta efetiva contra um clone celular imunoresistente. Daniel Salgado Xavier Durante o curso de múltiplos passos da progressão tumoral, um clone de células pré-malignas atinge o limite de sua capacidade de duplicação, mas precisa vencer a barreira da mortalidade para adquirir o potencial de replicação ilimitado. O que rege o potencial de duplicação celular está relacionado às porções terminais dos cromossomos, os telômeros. Contam-se as duplicações celulares pelas perdas de DNAs teloméricos da porção terminal de todo cromossomo durante cada ciclo celular. Atribui-se o encurtamento progressivo à inabilidade do DNA polimerase em replicar completamente o DNA cromossômico. Na célula maligna, a manutenção do telômero é um fato constatado em 85 -90% das vezes. As células tumorais mantêm os telômeros em tamanhos acima do tamanho crítico, o que permite a multiplicação ilimitada das células descendentes. 2. Indução de angiogênese tumoral É crucial o suprimento vascular de oxigênio e nutrientes para que as células executem as suas funções e sobrevivam. Com o objetivo de progredir em tamanho, as células tumorais Fisioterapia Oncológica para a graduação. incipientes têm de desenvolver habilidade para a angiogênese (produção ou indução à formação de vasos sanguíneos). A neovascularizacão é um pré-requisito para a rápida expansão clonal associada à formação de tumores macroscópicos. As células tumorais usam as respostas inflamatórias teciduais para gerar mais expansão do clone por meio da angiogênese e dos mecanismos de reparo tecidual. Figura 2 – A Angiogênese tumoral Fonte: www.revistacorpore.com.br/imagens/pt/site Fisioterapia Oncológica para a graduação. 37 incipientes têm de desenvolver habilidade para a angiogênese (produção ou indução à formação de vasos sanguíneos). requisito para a rápida al associada à formação de tumores macroscópicos. As células tumorais usam as respostas inflamatórias teciduais para gerar mais expansão do clone por meio da angiogênese e dos mecanismos de reparo tecidual. Daniel Salgado Xavier 3. Oncogênese física A energia radiante, solar e ionizante, é o mais importante carcinógeno físico. Cânceres de mama, ossos e do intestino são menos suscetíveis à carcinogênese por este tipo de radiação. O mecanismo da carcinogênese pela radiação reside na sua capacidade de induzir mutações. Essas mutações podem resultar de algum efeito direto da energia radiante ou de efeito indireto intermediado pela produção de radicais livres a partir da água ou do oxigênio. As radiações na forma de partículas (como partículas alfa e nêutrons) são mais carcinogênicas do que a retenção eletromagnética (raios X, raios gama). Raios ultravioletas (RUV) - A radiação ultravioleta natural, proveniente do sol, pode causar câncer de pele. Há que se considerar dois tipos de RUV: os RUV-A (320-400nm) e RUV- B (280-320nm). Os RUV-B são carcinogênicos e sua ocorrência tem aumentado muito com a destruição da camada de ozônio. Por sua vez, os RUV-A não sofrem influência da camada de ozônio e causam câncer de pele em quem se expõe a doses altas e por um longo período de tempo. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 39 Dois mecanismos podem estar envolvidos na indução do câncer por raios ultravioleta: lesão do DNA pela formação de dímeros de pirimidina e imunossupressão. Radiação ionizante - As radiações eletromagnéticas e na forma de partículas são todas carcinogênicas e a sua ação perniciosa é evidenciada em várias circunstâncias: - Os mineiros que trabalham com elementos radioativos apresentam risco aumentado de câncer de pulmão. - A incidência de certas formas de leucemia esteve e está acentuadamente aumentada em sobreviventes das bombas atômicas lançadas sobre o Japão e do acidenteatômico ocorrido em Chernobyl. Oncogênese química A oncogênese química é um processo seqüencial, dividido em duas fases: a iniciação e a promoção. A primeira etapa (iniciação) consiste de um fator iniciador ou carcinogênico que causa dano ou mutação celular. A mutação dos ácidos nucléicos é o fenômeno central da etapa de iniciação Daniel Salgado Xavier da carcinogênese. As células “iniciadas” permanecem latentes até que sobre elas atuem agentes promotores. A segunda etapa (promoção) estimula o crescimento da célula que sofreu mutação, e pode acontecer a qualquer momento, após a transformação celular inicial. Os fatores de promoção podem ser agentes químicos (exemplo: asbesto), processo inflamatório, hormônios, fatores que atuam no crescimento celular normal. É importante destacar que o agente promotor não tem ação mutagênica nem carcinogênica e que, para conseguir efeito biológico, deve persistir no ambiente. Isto significa que seus efeitos revertem-se, caso a exposição a ele seja suspensa, sendo esta a grande diferença existente entre ele e o agente carcinogênico, decisiva para as ações preventivas do câncer. Muitos dos agentes carcinogênicos químicos encontram-se no meio ambiente humano e, relacionam-se a hábitos sociais, alimentares ou ocupacionais. Nos processos de iniciação e promoção, a célula ainda pode encontrar-se sob a ação dos fatores de inibição do crescimento, e o resultado final dependerá do balanço obtido entre estes fatores Fisioterapia Oncológica para a graduação. 41 e a intensidade das alterações provocadas nas células pela ação dos agentes iniciadores e promotores. Oncogênese biológica. Diversos vírus de DNA e de RNA produzem cânceres em animais, e alguns foram implicados na gênese do câncer humano. Entre os vírus de DNA, encontram-se os do papiloma humano (HPV), de Epstein-Barr (EBV) e o da hepatite b (HBV). Os vírus de RNA (retrovírus) se relacionam mais raramente com o câncer humano. O único comprovadamente oncogênico é o retrovírus HTLV 1 responsável pela leucemia/linfoma da célula T do adulto e pelo linfoma cutâneo de célula T. Os vírus agem pela incorporação do seu DNA (ou, no caso dos retrovírus, do DNA transcrito de seu RNA pela enzima transcriptase reversa) ao da célula hospedeira, que passa a ser utilizada para a produção de novos vírus. Durante este processo, ou mesmo anos após ele, pode haver a inativação de antioncogenes celulares pelas proteínas virais (dando-se a imortalização da célula pela inibição da apoptose) ou a ativação Daniel Salgado Xavier de proto-oncogenes humanos ou virais (que estimulam a replicação celular). Diversos estudos demonstram que apenas essas alterações genômicas, isoladamente, não são capazes de induzir a transformação maligna de uma célula. Para que esta aconteça, são necessárias mutações adicionais, muito facilitadas pelas freqüentes mitoses que ocorrem nas células infectadas. Diversos outros agentes biológicos são suspeitos de promoverem a carcinogênese, entre eles o Helicobacter pylori, uma das bactérias mais prevalentes no homem, responsável pela gastrite crônica. Acredita-se que os agentes carcinogênicos biológicos atuem como promotores da proliferação celular, criando condições propícias para mutações por erros de transcrição do DNA. Fisioterapia Oncológica para a graduação. Fig – 3 Características emblemáticas do câncer Fonte: Weinberg,2000. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 43 Daniel Salgado Xavier Oncogenes A descoberta de que os oncogenes causadores de tumores estão relacionados aos genes normais levantou várias questões sobre o papel destes genes no crescimento e desenvolvimento (diferenciação) das células normais e tumorais. Parece certo que etapas da iniciação e promoção de um tumor e a própria existência de uma neoplasia maligna depende da expressão (manifestação do efeito) aumentada de oncogenes, ocasionada por amplificação (aumento do número de cópias do gene), por expressão alterada de genes repressores ou por mutações críticas em áreas de determinado oncogene. A estimulação da proliferação celular normal é quase sempre desencadeada por fatores de crescimento que se ligam aos receptores dispostos nas membranas celulares. O sinal recebido por esses receptores é transmitido para o citoplasma e, por fim, para o núcleo. Os fatores de crescimento (FC) são polipeptídios que regulam a proliferação celular, bem como outras funções celulares, como a deposição e resolução de proteínas da matriz extracelular, a manutenção da viabilidade celular, a Fisioterapia Oncológica para a graduação. 45 diferenciação celular, a quimiotaxia, a ativação de células da resposta inflamatória e o reparo tecidual. Os Fatores de Crescimento também são implicados na patogênese de determinadas doenças. A secreção anormal de Fatores de Crescimento resulta em doenças caracterizadas por resposta celular proliferativa ou por fibrose. A expressão aumentada de Fatores de Crescimento pode estar envolvida numa variedade de doenças, incluindo a aterosclerose, fibrose pulmonar, mielofibrose e neoplasias. Daniel Salgado Xavier Figura 2 – A carcinogênese/Oncogênese. Fonte: http://www.inca.gov.br/situacaodocancernobrasil/. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 47 Bibliografia Consultada: • Ferreira, FO. Castro RM. Biologia da célula tumoral.2ed.São Paulo:Tecmedd,2008. • Instituto Nacional de Câncer (INCA/MS). [homepage na internet]. Estimativa de Câncer 2006. Disponível em:http://www.inca.gov.br/estimativa/2006. • Instituto Nacional de Câncer (INCA/MS). [homepage na internet]. Situação do câncer no Brasil. Disponível em:http://www.inca.gov.br/situacaodocancernobrasil/. • Weinberg, RA. Cell,vol.100, 7 de janeiro de 2000. • Lopes, A. Iyeyasu,H. Castro,RM. Oncologia para a graduação.2ed.São Paulo.Tecmedd,2008. Daniel Salgado Xavier Capítulo III - Classificação, estadiamento e graduação dos tumores. Novos conhecimentos da biologia dos processos linfoproliferativos, como conseqüência de estudos multidisciplinares, imunológicos, moleculares e genéticos, associados à melhor compreensão da clínica e ao quadro morfológico, permitiram, nos últimos anos, grande avanço no entendimento da natureza destes processos, contribuindo muito para uma classificação das entidades clinicopatológicas.(PAES et al,2001). Verificam-se formas de crescimento celular controlado e não-controlado. A hiperplasia, a metaplasia e a displasia não serão aqui abordadas. As neoplasias correspondem às formas de crescimento não-controladas e, na prática, são chamadas de “tumores”. A palavra tumor tem um significado mais amplo na prática, representando um aumento de volume dos tecidos que, inclusive, pode não ser provocado por uma proliferação neoplásica verdadeira. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 49 No estudo das neoplasias, a primeira dificuldade enfrentada é a sua definição, pois ela se baseia nos aspectos descritos da morfologia e biologia do processo. Como alguns desses aspectos vêm se modificando à medida que os conhecimentos evoluem, também as definições se modificam. Hoje, define-se a neoplasia como sendo “uma proliferação anormal de tecido que foge parcial ou totalmente ao controle do organismo, tendendo à autonomia e à perpetuação, com efeitos agressivos sobre o hospedeiro”. Várias classificações foram propostas para as neoplasias. A classificação mais utilizada leva em consideração dois aspectos básicos: o comportamento biológico e a histogênese. Tumores benignos e malignos De acordo com o comportamento biológico, os tumores são divididos em benignose malignos (Figura 2). Uma das etapas mais importantes do estudo das neoplasias é estabelecer esta diferença. Algumas vezes esta diferença não é fácil de ser estabelecida e, nestes casos, adotamos o nome de tumores limítrofes ou Daniel Salgado Xavier bordelense. Os critérios que permitem estabelecer com segurança o diagnóstico são, na grande maioria dos casos, morfológicos. Figura1. Condições de malignidade de uma célula cancerígena. Fonte: Scientific american/Brasil. Ano2. N° 15.Agosto,2003.pg 41. bordelense. Os critérios que permitem estabelecer com segurança o diagnóstico são, na grande maioria dos casos, . Condições de malignidade de uma célula cancerígena. : Scientific american/Brasil. Ano2. N° 15.Agosto,2003.pg 41. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 51 � Encapsulação - Os tumores benignos geralmente não têm cápsulas verdadeiras, e sim pseudocápsulas fibrosas que se formam em decorrência da compressão dos tecidos vizinhos pelo crescimento lento e expansivo do tecido tumoral. Já no caso dos tumores malignos, o crescimento rápido, desordenado e infiltrativo do tecido não permitem a formação das pseudocápsulas. � Crescimento - Como todas as estruturas orgânicas, os tumores também têm parênquima, representado pelas células que os estão originando, e têm estroma, representado pelo tecido conjuntivo, vascularizado, que constitui a estrutura da sustentação e o veículo da nutrição do parênquima. Os tumores benignos freqüentemente exibem crescimento lento e expansivo, possuindo um estroma adequado, com um bom suprimento vascular, raramente mostrando necrose e hemorragia. Os tumores malignos, ao contrário, pela rapidez e desorganização no crescimento, pelo caráter infiltrativo e pelo alto índice de multiplicação celular, geralmente apresentam uma Daniel Salgado Xavier desproporção muito grande entre o parênquima tumoral e o estroma vascularizado. Tal comportamento explica a razão por que, com freqüência, esses tumores exibem áreas extensas de necrose ou hemorragia. A capacidade invasiva das neoplasias malignas é a principal responsável pela dificuldade da radicação cirúrgica das mesmas. � Morfologia - As células parenquimatosas dos tumores exibem graus variados de diferenciação. As dos tumores benignos são bem diferenciadas e reproduzem o aspecto das células do tecido original. Raramente observam-se atipias nas neoplasias benignas. Já as células dos tumores malignos apresentam menores graus de diferenciação e, conseqüentemente, não reproduzem as características dos tecidos que as originaram. Desse modo, as células malignas mostram caracteres morfológicos que se afastam, em grau variado, daqueles da célula de origem. As alterações anaplásicas são mais evidenciadas nos núcleos das células, caracterizando-se pelo pleomorfismo nuclear, com variação de forma, tamanho e Fisioterapia Oncológica para a graduação. 53 cromatismo, assim como pelas modificações da relação núcleo/ citoplasma, pela proeminência dos nucléolos e pelo espessamento da membrana nuclear. � Mitoses - O número de mitoses expressa a atividade da divisão celular. Assim, quanto maior a atividade proliferativa de um tecido, maior é o número de mitoses verificadas. No caso dos tumores, o número de mitoses relaciona-se inversamente com o grau de diferenciação tumoral: quanto mais diferenciado o tumor, menor o número de mitoses observadas. � Antigenicidade - As células dos tumores benignos, por serem bem diferenciadas, não apresentam a capacidade de produzir antígenos. No entanto, as células cancerosas podem apresentar esta capacidade. Esta propriedade da célula maligna vem permitindo a identificação de alguns antígenos tumorais e, conseqüentemente, tem trazido progressos ao estudo da imunologia das neoplasias. Os antígenos tumorais vêm sendo utilizados no diagnóstico de alguns tipos de câncer. Por exemplo, sabe-se que, no caso do Daniel Salgado Xavier câncer hepático, que normalmente não são produzidos pelos hepatócitos. � Metástases - Os tumores malignos têm capacidade de invasão e disseminação que resulta na produção das metástases, principal característica do câncer. A metástase constitui o crescimento neoplásico secundário, à distância, sem continuidade com o foco primitivo. Figura 2 – Diferenciação entre tumores benignos e malignos. Fonte: Instituto nacional do câncer Fisioterapia Oncológica para a graduação. 55 Nomenclatura dos tumores. A designação dos tumores baseia-se na sua histogênese e histopatologia. Sua nomenclatura depende do tecido que lhes deu origem. A Figura 3 mostra a etapas da formação do embrião tridérmico do qual derivam todos os tecidos do corpo humano. Figura 3 – O Embrião tridérmico. Embrião Tridérmico Ectoderme Tecidos de revestimento externo: Glândulas e Sistema nervoso Mesoderme Mesênquima Tecidos: ósseo, cartilaginoso, muscular, hematopoiético, vascular, fibroso Endoderme Epitélio de revestimento interno: Glândulas Daniel Salgado Xavier O tumor benigno pode apresentar mais de uma linhagem celular e, neste caso, recebe via de regra, o nome dos tecidos que o compõe acrescido do sufixo - oma. Exemplos: • tumor benigno do tecido cartilaginoso - condroma; • tumor benigno do tecido gorduroso - lipoma; • tumor benigno do tecido glandular - adenoma. Quanto aos tumores malignos, é necessário considerar a origem embrionária dos tecidos do qual deriva o tumor, para aplicar as regras de nomenclatura. Os tumores malignos originados dos epitélios de revestimento externo e interno são denominados carcinomas. Quando o epitélio de origem for glandular, passam a ser chamados adenocarcinomas. Exemplos: • carcinoma basocelular da face; • adenocarcinoma de ovário. O nome dos tumores malignos originários dos tecidos conjuntivos (mesenquimais) é formado pelo nome do tecido mais a determinação sarcoma. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 57 Exemplos: • tumor maligno do tecido cartilaginoso - condrossarcoma; • tumor maligno do tecido gorduroso - lipossarcoma; • tumor maligno do tecido muscular liso - leiomiossarcoma; • tumor maligno do tecido muscular estriado - rabdomiossarcoma. A dificuldade de enquadrar todos os tumores nessa classificação simplificada, assim como a consagração pelo uso de alguns termos diferentes daqueles que seriam esperados segundo as regras, acabaram por determinar as exceções da nomenclatura. Vários critérios que fogem às regras antes descritas são utilizados: � Origem embrionária dos tumores Por este critério, são classificados os tumores originados de células blásticas, que ocorrem mais freqüentemente na infância. São os chamados blastomas, como, por exemplo, hepatoblastoma, nefroblastoma, neuroblastoma, retinoblastoma e osteoblastoma. Daniel Salgado Xavier São classificados também sob este critério os tumores originados de células primitivas totipotentes que antecedem o embrião tridérmico. Eles são agrupados em quatro principais tipos: teratomas, seminomas, coriocarcinomas e carcinoma de células embrionárias. Os teratomas podem ser tumores benignos ou malignos, dependendo do seu grau de diferenciação. Quando benignos, mostram 100% de células diferenciadas, principalmente de pele e anexos (cistosdermóides). � Uso de epônimos Há tumores cuja nomenclatura utiliza o nome dos cientistas que os descreveram pela primeira vez, ou porque sua origem demorou a ser esclarecida ou porque os nomes ficaram consagrados pelo uso. São exemplos: o linfoma de Burkitt, o sarcoma de Ewing, o sarcoma de Kaposi, o tumor de Wilms (nefroblastoma), o tumor de Krukemberg (adenocarcinoma mucinoso metastático para ovário)etc. � Morfologia tumoral Os carcinomas e adenocarcinomas recebem nomes complementares que melhor classificam sua morfologia macro Fisioterapia Oncológica para a graduação. 59 ou microscópica. Assim, podem ser utilizados termos como epidermóide, papilífero, seroso, mucinoso, cístico, medular, lobular etc. Diante da variedade de classificações usadas de modo não sistematizado, em todo o mundo, é evidente que se tornou difícil fazer estudos comparativos entre diferentes regiões do globo. Na tentativa de minimizar essas dificuldades e permitir um melhor entendimento entre os especialistas, fazendo, conseqüentemente, com que seus dados possam ser comparados, a Organização Mundial da Saúde (OMS) vem tentando uniformizar a nomenclatura mundial, tendo lançado, em vários idiomas, edições do CID-O (Código Internacional de Doenças - Oncologia), nas quais se permite utilizar toda a sinonímia de topografia e nomenclatura dentro de códigos numéricos. Essa nomenclatura vem sendo usada por grande número de especialistas em todo o mundo e é adotada pelo Registro Nacional de Patologia Tumoral do Ministério da Saúde (RNPT/Pro-Onco/MS), que cadastra um numeroso grupo de laboratórios de Anatomia Patológica do Brasil. Daniel Salgado Xavier Figura 3 – Classificação dos tumores. Fonte: Instituto nacional do câncer/MS. Fisioterapia Oncológica para a graduação. 61 Graduação e estadiamento dos tumores. O câncer é um conjunto de diferentes doenças de variadas localizações topográficas e, mesmo dentro de uma mesma topografia, de diferentes tipos morfológicos que guardam em comum duas características biológicas principais: o crescimento celular descontrolado e a capacidade de se estender para além do tecido em que se originam. Essas características são resultado de eventos diversos, que, por conta de fatores igualmente diversos, se iniciam no âmbito molecular e, progressivamente, evoluem para o ambiente gênico, cromossômico, nuclear, celular, tecidual, orgânico e sistêmico. Por estas etapas poderem variar em velocidade e intensidade e ainda não serem conhecidas ou identificáveis para todas as neoplasias malignas, existe também variabilidade quanto ao estágio em que o câncer torna-se detectável pelos meios diagnósticos disponíveis, dos moleculares ao exame físico. Porém, essas diferenças e variabilidade tornam-se características comuns em sistemas de classificação que buscam organizar a informação sobre o estágio evolutivo em que uma Daniel Salgado Xavier neoplasia maligna está sendo diagnosticada, dos quais o mais utilizado, em todo o mundo, é o Sistema TNM de Classificação de Tumores Malignos, da União Internacional de Combate ao Câncer, que, no Brasil, passou a ser conhecido como estadiamento. A adequada aplicação desse Sistema é essencial para a qualidade e confiabilidade de registros médicos, protocolização de condutas terapêuticas, parametrização de processos avaliativos e comparativos de resultados terapêuticos, e troca de informação fluente entre especialista e instituições, em todo o mundo. O Sistema TNM e seus objetivos O estadiamento nada mais é que a avaliação da extensão anatômica da doença e dos órgãos acometidos pelo carcinoma. O estágio da doença na ocasião do diagnóstico pode refletir a taxa de crescimento e extensão da doença (envolvimento da mama, linfonodos axilares e metástases distantes), como também o tipo do tumor e a relação tumor-hospedeiro tão essencial (CAMARGO e MARX, 2000). Fisioterapia Oncológica para a graduação. 63 O TNM é um sistema de classificação anatômico utilizado para tumores sólidos, universalmente aceito, simples e de fácil aplicabilidade. O Sistema TNM foi idealizado nos anos 1940 e assumido pela União Internacional Contra o Câncer nos anos 1950 e, desde então, vem sendo continuamente revisado e publicado, estando em sua 6ª edição, de 2002, com a versão em Português Brasileiro em 2004. O estadiamento tem os seguintes objetivos: • Auxiliar o médico no planejamento do tratamento; • Estimar o prognóstico; • Uniformizar a linguagem médica; • Facilitar o intercâmbio entre os centros de tratamento; • Contribuir para pesquisas na área de oncologia. Com o sistema TNM é possível agrupar os pacientes por estádios clínicos e, com isso, uniformizá-los. Pacientes classificados no mesmo estádio apresentam prognóstico semelhante. Daniel Salgado Xavier Com seguimento adequado por longo período de tempo, obtêm-se dados referentes à sobrevida livre da doença e sobrevida global, possibilitando a comparação entre os diferentes grupos ou estádios. Dessa forma o estadiamento é imprescindível ao planejamento terapêutico em oncologia. Bases para o estadiamento. Tumores sólidos têm a capacidade de invadir tecidos circunjacentes. A propagação do tumor por extensão local pode ser dada pela continuidade; contigüidade e por implantes. A disseminação do tumor pode acontecer por via linfática, atingindo os linfonodos regionais, ou por via hematogênica (órgãos à distância) de acordo com o seu comportamento biológico. Por exemplo, sarcomas são tumores que se propagam preferencialmente por via hematogênica, fazendo parte de seu estadiamento a utilização da tomografia computadorizada de tórax para avaliação pulmonar. Portanto, o estadiamento de um tumor sólido leva em consideração três eventos importantes na história natural do câncer: Tamanho e/ou grau da extensão local do tumor primário Fisioterapia Oncológica para a graduação. 65 (T), presença ou ausência de metástases para linfonodos regionais (N) e presença ou ausência de metástase à distância (M). Estádio 0- carcinoma in situ; Estádio I - invasão local inicial; Estádio II - tumor primário limitado ou invasão linfática regional mínima; Estádio III - tumor local extenso ou invasão linfática regional extensa; Estádio IV – tumor localmente avançado com presença de metástases à distância. Segundo a União Internacional contra o Câncer (1998), no sistema TNM cada região anatômica é descrita de forma singular, conforme mostrado a seguir: Regras para classificação, com procedimentos para avaliar as categorias T, N e M. - Sub-regiões anatômicas. - Definição dos linfonodos regionais. - TNM – Classificação Clínica – Tumor / Nódulo / Metástase. - pTNM – Classificação Patológica Daniel Salgado Xavier - G – Graduação Histopatológica - Classificação R - Grupamento por estádios - Resumo esquemático O Sistema TNM admite duas classificações: a clínica (TNM ou cTNM), estabelecida antes de qualquer terapêutica ter sido aplicada, e a patológica (pTNM), a partir da análise da peça operatória. O pTNM só se aplica, obviamente, aos casos operados e pode, ou não, coincidir com o cTNM, porém jamais modificá-lo. A pTMN é essencial para definir o prognóstico, baseado nas informações pré tratamento complementadas por informações pós cirúrgicas e exames histopatológicos. Uma das Regras Gerais do Sistema TNM, é que, uma vez definidas as categorias T (de tumor), N (de node, linfonodo) e M (de metástase) e estabelecidos a classificação TNM e o estágio tumoral (este, como já ressaltado, é classificável de 0 a IV na quase totalidade dos tumores), a categorização e o estádio devem ser imutáveis, ou seja, permanecer inalterados no prontuário médico. Os casos em que essa informação é ou torna- se indisponível, o Sistema TNM recomenda que sejam Fisioterapia Oncológica para a graduação. 67 analisados separadamente (da mesma forma que os casos de tumores malignos múltiplos e os inicialmente identificados por autopsia), classificando-os como casos especiais. O estágio em que uma neoplasia malignaé diagnosticada é dependente de variáveis tumorais (tipo histopatológico, localização anatômica, velocidade de crescimento e potencial de invasão e disseminação), das condições de resistência imunológica do organismo e da acessibilidade e qualidade dos serviços de saúde. E a aplicação de um sistema de classificação de tumores malignos permite inferir sobre o comportamento biológico do tumor, selecionar condutas terapêuticas, prever complicações, estimar prognósticos, organizar a avaliação dos resultados terapêuticos, padronizar a publicação desses resultados, facilitar a troca de informações entre os especialistas e contribuir para a pesquisa oncológica. Porém, o principal objetivo diz respeito à comparação entre os resultados terapêuticos, por estádio, obtidos nos diversos centros de tratamento do câncer, nacionais e internacionais, o que se torna inviável se, a cada episódio evolutivo da neoplasia, o seu estádio se modifique. Daniel Salgado Xavier Tipos de câncer mais prevalentes na população brasileira Câncer de ânus Estrutura Ânus é o nome dado à região da extremidade do intestino grosso. Trata-se de um músculo que abre e fecha para controlar a saída das fezes. O câncer anal pode originar-se de diferentes tipos de células. O mais freqüente é o carcinoma de células escamosas. Os outros são: carcinoma de células basais, adenocarcinoma ou melanoma. Fatores de risco As causas do câncer anal ainda não são totalmente conhecidas. Sabe-se que o papiloma vírus humano (HPV) tem um papel importante no seu desenvolvimento, sendo mais freqüente em mulheres. Sintomas Os sintomas mais comuns são:- dor e sangramento anal; desconforto, coceira ou ardor (sintomas semelhantes aos de hemorróidas); - incontinência fecal mais prevalentes na população brasileira. As causas do câncer anal ainda não são totalmente papiloma vírus humano (HPV) tem um papel importante no seu desenvolvimento, sendo mais dor e sangramento anal; - melhantes aos de Fisioterapia Oncológica para a graduação. 69 Em alguns casos, o câncer anal surge na forma de pequenas úlceras, que podem se espalhar para as nádegas. Diagnóstico Para confirmar o tipo de tumor, será feita uma biópsia, com a retirada de uma amostra do tecido, para ser examinada à luz do microscópio. O médico poderá solicitar alguns exames, como raios-X, ultra-sonografia, ressonância magnética, exame neurológico para saber a extensão exata do tumor e seu grau de comprometimento. Com esses dados, ele poderá definir a melhor estratégia de tratamento. Tratamento Radioterapia e quimioterapia são os tratamentos mais utilizados. Aplicados de forma combinada, simultaneamente ou um, seguido do outro, estes têm apresentado bons resultados. A intervenção cirúrgica não tem sido o tratamento de escolha para a grande maioria dos casos de câncer retal. Daniel Salgado Xavier Costuma-se recorrer à cirurgia quando o tumor não responde à quimioterapia e/ou radioterapia. Nesse caso, os tipos de cirurgia podem ser: - ressecção local: para remover pequenos tumores localizados na área externa do ânus. O músculo (esfíncter) que controla a passagem das fezes não é afetado, o que preserva o trânsito intestinal normal do paciente. - ressecção abdominoperineal: envolve a retirada do ânus e do reto. Este procedimento requer uma colostomia permanente. Isto implica em desviar o trânsito intestinal com uma abertura no abdome (estoma) para a passagem das fezes, que serão recolhidas por uma bolsa receptora. Os tratamentos para o câncer anal costumam provocar efeitos colaterais desagradáveis, como diarréia, incontinência fecal e flatulência (gases). Estes sintomas costumam ser temporários e tendem a diminuir até o final do tratamento. A alimentação tem um papel fundamental para o paciente em tratamento. É importante seguir a dieta indicada pelo médico e/ou nutricionista, para aliviar os sintomas e manter o organismo bem nutrido. Câncer de boca e da garganta. Estrutura O câncer de boca pode desenvolver-se nos lábios ou na Fisioterapia Oncológica para a graduação. 71 cavidade oral. A ocorrência de câncer de lábio é maior em pessoas brancas e mais freqüente no lábio inferior do que no superior. A cavidade oral abrange as gengivas, a língua, o assoalho bucal (embaixo da língua), a mucosa oral (parte interna das bochechas) e o palato duro (céu da boca). Fatores de Risco Os fatores que podem levar ao câncer de boca são: - tabagismo; - mascar fumo; - consumo exagerado de álcool; - higiene bucal inadequada; - próteses dentárias mal ajustadas; - hábito de morder a língua, lábios ou bochecha constantemente; - dentes com bordos cortantes. Os fatores de risco mais específicos para desenvolver câncer labial são: - exposição excessiva ao sol; - fumar cachimbos; - mascar fumo. Prevenção Para a prevenção e detecção precoce de câncer de boca, tome as seguintes medidas: - faça uma consulta odontológica de controle a cada ano; - mantenha uma dieta saudável, rica em vegetais e frutas; Daniel Salgado Xavier - evite expor-se ao sol sem proteção (filtro solar e chapéu de aba longa); - faça o auto-exame da boca a cada seis meses. Sintomas O principal sintoma deste tipo de câncer é o aparecimento de feridas na boca, geralmente indolores, que não cicatrizam em uma ou até duas semanas. Outros sintomas podem ser: - manchas esbranquiçadas ou avermelhadas nos lábios ou na mucosa bucal; - irritações embaixo de próteses; - dificuldades na fala, mastigação e/ou deglutição; - dor e presença de gânglios aumentados na região cervical (íngua no pescoço). A presença de qualquer um destes sintomas pode caracterizar uma série de patologias benignas, que merecem atenção e devem ser avaliadas por um especialista com a maior brevidade possível. Diagnóstico Como as lesões da boca são visíveis, têm grande chance de Fisioterapia Oncológica para a graduação. 73 serem diagnosticadas em sua fase inicial, com altas possibilidades de cura, sem seqüelas significativas. Tratamento A cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia são os métodos terapêuticos aplicáveis ao câncer de boca, que podem ser utilizados isoladamente ou associados entre si. Em se tratando de lesões iniciais, sem extensão a tecidos ou estruturas vizinhas, a cirurgia costuma ser a opção mais indicada. A cirurgia do câncer de boca tem evoluído muito com a incorporação de técnicas de reconstrução imediata, amenizando possíveis deformidades, na maioria dos casos. Quando já se verifica a presença de células tumorais nos linfonodos (gânglios) do pescoço, a cirurgia costuma ser indicada, associada à radioterapia. Se o tumor encontra-se em local impossível de ser removido cirurgicamente, a radioterapia é o tratamento mais indicado, com altas chances de cura. A quimioterapia é empregada nos casos mais avançados, com o objetivo de reduzir o tumor e possibilitar um tratamento cirúrgico e/ou radioterápico posterior, com finalidade paliativa (de amenizar o sofrimento), na maioria dos casos. Daniel Salgado Xavier Câncer de colo do útero. Estrutura O colo do útero assemelha-se à boca de um balão. É a parte mais baixa do útero e conecta a vagina à cavidade uterina. O tecido vaginal é fino e elástico, adaptado para enfrentar os desafios físicos e biológicos apresentados pelas relações sexuais e partos. Para poder abrigar um óvulo fertilizado, crescendo, durante nove meses, o tecido uterino precisa ser extremamente sensível e receptivo, de uma textura completamente diferente da do tecido da vagina. O colo do útero representa uma área de transição, onde o tecido relativamente invulnerávelda vagina passa a ter as características necessárias para que o útero possa hospedar o feto enquanto ele se desenvolve. Esta área de transição é particularmente vulnerável a diversos agentes agressores, inclusive aos que podem desenvolver o câncer do colo do útero. Geralmente, o câncer do colo do útero se desenvolve de uma maneira metódica, lenta e previsível, o que possibilita sua detecção precoce. Quando não detectado, o câncer do colo do útero tende a infiltrar-se mais profundamente no colo, passando a invadir o útero, a vagina e gânglios linfáticos, por onde células cancerosas podem entrar na Fisioterapia Oncológica para a graduação. 75 circulação linfática e migrar para partes distantes do corpo, instalando-se nos pulmões, por exemplo. Fatores de risco São vários os fatores de risco para a incidência de câncer do colo do útero. Os fatores sociais, ambientais e os hábitos de vida, tais como baixas condições sócio-econômicas, atividade sexual precoce, múltiplos parceiros sexuais, vício de fumar e falta de higiene. O uso de anticoncepcionais orais apresenta um risco relativo baixo, mas também deve ser considerado. Há 15 anos, estudos vêm demonstrando que o papilomavírus humano (HPV) tem papel importante no desenvolvimento da displasia das células cervicais e na sua possível transformação em células cancerosas. O papilomavírus humano (HPV) está presente em praticamente 100% dos casos de câncer do colo do útero. Sintomas Nas fases iniciais, este tipo de câncer não apresenta sintomas. Quando não se faz prevenção e o câncer do colo do útero não é diagnosticado em sua fase inicial, ele progredirá, apresentando alguns sinais e sintomas. Os principais sintomas do câncer do colo do útero, já localmente invasivo, são o Daniel Salgado Xavier sangramento no início ou no fim da relação sexual e a ocorrência de dor durante a relação. Com a progressão do tumor invadindo estruturas adjacentes surgem, também, os sintomas urinários e no intestino baixo. Diagnóstico O diagnóstico das lesões iniciais NIC I, NIC II e NIC III é feito através de exame periódico de Papanicolaou, da colposcopia e de biópsia dirigida. Nas fases mais avançadas da doença, contamos com a cistoscopia, retossigmóidoscopia, urografia excretora, raio X de tórax e a tomografia computadorizada, para a complementação do diagnóstico clínico. Quando o resultado do exame de Papanicolaou aponta lesões pré cancerosas NIC I, o médico solicita a repetição do teste ou uma colposcopia. Se nada for detectado, o Papanicolaou deve ser feito a intervalos menores, com a regularidade indicada pelo médico responsável. Em casos de lesões pré cancerosas NIC II e III, a colposcopia será necessária para detalhar as lesões e indicar ao médico o tratamento mais adequado para saná-las. O tratamento das lesões precursoras pode ser feito por Fisioterapia Oncológica para a graduação. 77 meio de criocirurgia, que implica em congelamento por meio de um instrumento apropriado, que pode ser feito no próprio consultório. O mesmo efeito pode ser atingido com altas temperaturas, que chamamos de cauterização. Quando a área lesionada é maior, o médico, geralmente, opta pela remoção cirúrgica do colo do útero. Estes tratamentos costumam apresentar resultados satisfatórios, atingindo quase 100% de cura. Tratamento A extensão da doença é o fator determinante na escolha do tipo de tratamento, que pode ser curativo ou paliativo. Cirurgia Quando o tumor está restrito à região cervical, a cirurgia (às vezes, complementada com a radioterapia) leva à cura, na maioria dos casos. Em pacientes com necessidade de remoção uterina (histerectomia) e nas que estão na pré-menopausa, a conservação dos ovários deve ser sempre tentada, a fim de se retardar os efeitos da menopausa. Radioterapia - A radioterapia costuma ser utilizada para atingir a cura total, quando o tumor ainda está localizado e pequeno. Daniel Salgado Xavier Em tumores maiores, a radioterapia é aplicada com o objetivo de controlar a doença e aliviar sintomas, o que nem sempre levará à cura. Braquiterapia - Braquiterapia é uma forma de radioterapia em que materiais radioativos são implantados nas proximidades do tumor. É uma modalidade de tratamento em que doses de radiação são liberadas para atacar as células tumorais, tentando- se evitar que células sadias sejam afetadas. Classicamente, os implantes são mantidos no organismo por alguns dias, período no qual a paciente permanece com material radioativo. Por isso, o tratamento é realizado no hospital, com a paciente internada, mantida em quartos especiais, longe de crianças e gestantes. Na última década, já vem se popularizando a chamada braquiterapia de "alta taxa de dose", cujo implante permanece no organismo da paciente por um curto espaço de tempo, sem que ela tenha que permanecer hospitalizada durante este período. Quimioterapia - Até o momento, ainda não há drogas quimioterápicas eficazes para a maioria dos casos de câncer do colo do útero. Ela pode ser utilizada em alguns casos específicos, porém, com resultados pouco satisfatórios. Em Fisioterapia Oncológica para a graduação. 79 estadios mais avançados, quando a cirurgia é inviável, o médico opta pela radioterapia exclusiva, ou complementada com quimioterapia, conforme a progressão do câncer, com índices de cura menores. Leucemia. Leucemia é uma doença provocada pela desordem generalizada na produção de células sangüíneas anômalas que se acumulam no sangue e na medula óssea. Há, basicamente, quatro tipos de leucemia: mielóide crônica, linfóide crônica, linfoblástica aguda e mieloblástica aguda. A medula óssea é um tecido esponjoso que fica no interior dos ossos, onde se produzem as células que compõem o sangue. Normalmente, as células em formação não entram na corrente sangüínea enquanto não estiverem completamente amadurecidas. Por esta razão, pode-se encontrar, na medula óssea, células em todas as suas fases de desenvolvimento. A partir deste ponto, abordaremos, especificamente, LEUCEMIA LINFÓIDE CRÔNICA. Daniel Salgado Xavier leucemia linfóide crônica (LLC) O tipo mais comum de leucemia é a linfóide crônica, conhecida como câncer de linfócitos (glóbulos brancos). Os linfócitos passam a multiplicar-se rápido demais na medula e entram na circulação sangüínea antes de estarem completamente amadurecidas, quando ainda não têm condições de desempenhar sua função corretamente. Depois de um certo tempo, estas células impedem a produção dos eritrófilos e das plaquetas. Causas As causas da leucemia linfóide crônica ainda são desconhecidas, mas, assim como os demais tipos de câncer, não há perigo de contágio. Geralmente, a doença progride lentamente e costuma afetar pessoas com idade acima de 40 anos. A LLC ainda não é considerada uma doença curável. Entretanto, novos tratamentos, menos tóxicos e mais eficazes vêm sendo desenvolvidos, com sucesso, em períodos de tempo cada vez mais curtos. Sintomas Devido à sua lenta progressão, a detecção precoce da LLC raramente acontece. Às vezes, ela é assintomática. Alguns Fisioterapia Oncológica para a graduação. 81 portadores de LLC não apresentam qualquer sinal ou sintoma e só descobrem sua existência ao receberem o resultado de um exame de sangue, feito por uma outra razão qualquer. Em outros casos, há presença de sintomas, que podem ser: - infecções freqüentes; - cansaço constante; - falta de ar; - sangramentos e hematomas; - edema (inchaço) de gânglios linfáticos; - edema abdominal; - febre e suores noturnos; - perda de peso. Pacientes com LLC ficam mais suscetíveis a infecções pela quantidade insuficiente de linfócitos
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