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O Mal-Estar na Civilização - Síntese do Prof

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1 
 
Freud e “O Mal-Estar na Civilização”1 
 
[NOTA: este texto é uma síntese de “O Mal-Estar na Civilização”. Mais do que uma síntese, é 
um conjunto de notas feitas por mim sobre o texto de Freud e arrumadas minimamente de modo 
a parecer um texto coeso. A leitura desta síntese não substitui a leitura do texto original.] 
 
Sigmund Freud nasceu em 1856, no Império Austro-Húngaro, no que hoje seria a região da 
Morávia, na atual República Tcheca. Veio a falecer em 1939, em Londres. Apesar de médico e 
neurologista, Freud se tornou famoso por ser o criador da psicanálise. Um de seus mais notórios 
trabalhos é “O Mal-Estar na Civilização”, traduzido para o inglês como “Civilization and its 
Discontents” e para o espanhol como “El Malestar en la Cultura”. Trata-se de um trabalho não 
apenas médico e psicológico, senão também sociológico e filosófico. Foi escrito entre 1929 e 
1931. 
O trabalho tem como tema principal o antagonismo entre as exigências do instinto e as restrições 
da civilização, e, como veremos, oferece contribuições importantes à nossa discussão sobre a 
felicidade. De modo esquemático, poderíamos dizer que duas visões são gestadas dentro do 
Iluminismo europeu, uma mais otimista, e outra mais pessimista. A otimista seria aquela que 
desemboca em Marx, e que postula que o Iluminismo e a modernidade levariam à emancipação 
humana. A pessimista desemboca em Nietzsche, e, depois, em Freud. Nessa perspectiva, grande 
parte da moldura filosófica e antropológica do Iluminismo é aceita, mas essa aceitação produz 
uma visão do ser humano e da condição humana mais pessimista do que otimista. Freud deixará 
isso bem claro. 
Logo no início do texto, Freud faz referência a outra obra sua, na qual trata a religião como uma 
ilusão
2
. Essa ideia ecoará ao longo de “O Mal-Estar...”. Freud se vê como um cientista, e diz que, 
para um amigo seu, o fundamento último da religiosidade seria um sentimento “oceânico”, um 
sentimento de eternidade. Para Freud, porém, do ponto de vista científico, isso seria apenas um 
sentimento, e, portanto, algo sem base real. Freud se questiona sobre o que poderia ser esse 
sentimento “oceânico” e se ele seria a fonte da religião. Freud acha que não o é. Para ele, a 
origem da religião estaria no sentimento de desamparo do bebê e do anseio pelo pai que esse 
sentimento desperta. Diz Freud: “a origem da atitude religiosa pode ser remontada, em linhas 
muito claras, até o sentimento de desamparo infantil” (p. 81). 
 
1
 O presente texto se baseia na Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, 
Volume XXI, 2ª edição, tradução de Jayme Salomão. 
2
 Trata-se da obra O Futuro de uma Ilusão. 
2 
 
A visão de Freud sobre a religião é assaz negativa. Logo no início da parte II, Freud observa que 
a ideia de uma Providência divina seria apenas a projeção da figura de um pai ilimidatamente 
engrandecido. Diz ele que apenas esse Ser 
“pode compreender as necessidades dos filhos dos homens, enternecer-se com suas preces e 
aplacar-se com os sinais de seu remorso. Tudo é tão patentemente infantil, tão estranho à 
realidade, que, para qualquer pessoa que manifeste uma atitude amistosa em relação à 
humanidade, é penoso pensar que a grande maioria dos mortais nunca será capaz de superar essa 
visão da vida. Mais humilhante ainda é descobrir como é vasto o número de pessoas de hoje que 
não podem deixar de perceber que essa religião é insustentável e, não obstante isso, tentam 
defendê-la, item por item, numa espécie de lamentáveis atos retrógrados.” (p. 82) 
Freud apresenta sua visão sobre a religião para argumentar que, por mais falsa que seja, ela acaba 
desempenhando algum papel para os seres humanos. Isso porque “a vida, tal como a 
encontramos, é árdua demais para nós; proporciona-nos muitos sofrimentos, decepções e tarefas 
impossíveis. A fim de suportá-la, não podemos dispensar as medidas paliativas” (p. 83). O que 
seriam essas medidas paliativas? As ciências, as artes, as substâncias tóxicas, entre outras. A 
religião também entraria aí, ainda que, para Freud, tenha um status claramente inferior ao das 
outras citadas. 
É interessante que, logo em seguida, Freud afirma que “a questão do propósito da vida humana já 
foi levantada várias vezes”, mas que nunca “recebeu resposta satisfatória e talvez não a admita” 
(p. 83, grifo meu). Ou seja: para Freud, não parece haver propósito na vida humana. Só a religião 
poderia dar alguma resposta nesse sentido, mas já vimos qual é o apreço que tem por ela. A 
questão sobre o propósito é, portanto, muito ambiciosa, e Freud decide, então, voltar-se para uma 
outra: 
“O que pedem [os homens] da vida e o que desejam nela realizar? A resposta mal pode provocar 
dúvidas. Esforçam-se para obter felicidade; querem ser felizes e assim permanecer. Essa empresa 
apresenta dois aspectos: uma meta positiva e uma meta negativa. Por um lado, visa a uma 
ausência de sofrimento e de desprazer; por outro, à experiência de intensos sentimentos de prazer. 
Em seu sentido mais restrito, a palavra ‘felicidade’ só se relaciona a esses últimos.” (p. 84) 
A busca pelo prazer definiria o propósito da vida. Não é que Freud diga necessariamente que o 
propósito da vida é o prazer – o que, no fim das contas, significaria dizer que a vida humana tem 
algum propósito. O que ele parece dizer é que, sendo o propósito da vida algo incognoscível, o 
que permanece, o que é visível, é a busca pelo prazer. Há um componente trágico nessa 
constatação, pois, para Freud, a busca pelo prazer ou felicidade 
“se encontr[a] em desacordo com o mundo inteiro, tanto com o macrocosmo quanto com o 
microcosmo. Não há possibilidade alguma de [a felicidade ser encontrada]; todas as normas do 
universo lhe são contrárias. Ficamos inclinados a dizer que a intenção de que o homem seja 
‘feliz’ não se acha incluída no plano da ‘Criação’. O que chamamos de felicidade no sentido mais 
restrito provém da satisfação (...) de necessidades represadas em alto grau, sendo, por sua 
3 
 
natureza, possível apenas como uma manifestação episódica. Quando qualquer situação desejada 
pelo princípio do prazer se prolonga, ela produz tão-somente um sentimento de contentamento 
muito tênue. Somos feitos de modo a só podermos derivar prazer intenso de um contraste” (p. 
84). 
Vê-se, pois, que Freud tem uma visão trágica da possibilidade de felicidade humana. Por 
definição, diz ele, atingir um alto grau de felicidade só seria possível num instante efêmero. 
Estaríamos condenados, então, a levar uma vida infeliz, tendo apenas alguns momentos de 
prazer. Se a felicidade é, por princípio, algo muito restrito, o mesmo, diz Freud, não se pode 
dizer da infelicidade. 
“O sofrimento nos ameaça a partir de três direções: de nosso próprio corpo, condenado à 
decadência e à dissolução, e que nem mesmo pode dispensar o sofrimento e a ansiedade como 
sinais de advertência; do mundo exerno, que pode voltar-se contra nós com forças de destruição 
esmagadoras e impiedosas; e, finalmente, de nossos relacionamentos com os outros homens. (...). 
Não admira que sob a pressão de todas essas possibilidades de sofrimento, os homens se tenham 
acostumado a moderar suas reivindicações de felicidade” (pp. 84-85). 
Essa moderação se dá a tal ponto, diz Freud, que um ser humano se considera feliz pelo simples 
fato de ter escapado de grandes sofrimentos. A ausência de sofrimento já seria, por si só, algo 
bom, sendo a obtenção de prazer uma meta demasiado difícil. Pois como consegui-la? Freud 
argumenta que, num primeiro momento, poderíamos ser tentados a buscar uma satisfação 
irrestrita de todas as nossas necessidades. Isso, porém, certamente traria consequências negativas 
para nós mesmos. É necessário, então, buscar outros métodos para obter prazer ou fugir do 
desprazer. Uma possibilidade de se proteger do sofrimento provenientedos relacionamentos 
humanos seria o isolamento. Porém, esse método só traria uma felicidade limitada. Podemos, ao 
contrário, viver em comunidade e tentar sujeitar a natureza à nossa vontade. Podemos tentar 
influenciar nosso próprio organismo, manipulando nossas sensações de desprazer e prazer. Esse 
último método seria o do uso de produtos químicos, ou, nos termos de Freud, a “intoxicação”. 
Para ele, “[o] serviço prestado pelos veículos intoxicantes na luta pela felicidade e no 
afastamento da desgraça” é “altamente apreciado como um benefício” pelos seres humanos (p. 
86). 
Um outro método reconhecido por Freud para nos libertarmos do sofrimento seria agir sobre 
nossos impulsos instintivos, aniquilando nossos impulsos. Algo como o que prescrevem as 
religiões do Oriente. Porém, diz Freud, a felicidade proveniente desse método é apenas a 
felicidade da quietude, ou seja, a ausência de infelicidade. Podemos, também, tentar controlar 
nossa vida instintiva, não abandonando completamente a busca pela satisfação dos instintos, mas 
garantindo certa proteção contra a não-satisfação. Algo nesse sentido ocorre quando sublimamos 
nossa libido. Quando isso acontece, diz Freud, “o destino pouco pode fazer contra nós”. Um 
cientista trabalhando, por exemplo, está relativamente imerso em seu mundo e, embora obtenha 
prazer de modo limitado, consegue se blindar consideravelmente do desprazer. Porém, lembra 
Freud, a intensidade desse prazer “se revela muito tênue quando comparada com a que se origina 
4 
 
da satisfação de impulsos instintivos grosseiros e primários” (p. 87). Não obstante, mesmo esse 
método não nos protege de todo sofrimento. 
Um outro método possível, diz Freud, “considera a realidade como a única inimiga e a fonte de 
todo sofrimento, (...), de maneira que, se quisermos ser de algum modo felizes, temos de romper 
todas as relações com ela” (p. 88). Freud dá como exemplo o eremita que rejeita o mundo e 
rompe relações com ele. Porém, diz ele, é possível ir além: “pode-se tentar recriar o mundo, [e] 
em seu lugar construir um outro mundo, no qual os seus aspectos mais insuportáveis sejam 
eliminados e substituídos por outros mais adequados” (Idem). Freud dá a entender que todos nós, 
em alguma medida, distorcemos algum aspecto do mundo que nos é insuportável, distorcendo, 
assim, a realidade. Há, mais uma vez, o caso das religiões, e aqui ele parece se referir às religiões 
monoteístas, em que se vê “a tentativa de obter uma certeza de felicidade e uma proteção contra 
o sofrimento através de um remodelamento delirante da realidade”; “[a]s religiões da 
humanidade devem ser classificadas entre os delírios de massa desse tipo. É desnecessário dizer 
que todo aquele que partilha um delírio jamais o reconhece tomo tal.” (p. 89) 
O último método listado por Freud, e que, segundo ele, talvez seja o mais exitoso, é o “da 
modalidade da vida que faz do amor o centro de tudo, que busca toda satisfação em amar e ser 
amado” (idem). Para Freud, o amor sexual “nos proporcionou nossa mais intensa experiência de 
uma transbordante sensação de prazer, fornecendo-nos assim um modelo para nossa busca da 
felicidade” (idem). O ponto negativo desse método, porém, seria o de que nunca nos achamos tão 
indefesos contra o sofrimento como quando amamos. E, então, Freud conclui, pode-se ver que 
são muitos os caminhos para obter a felicidade ou evitar o sofrimento, e que as pessoas 
necessariamente buscarão caminhos diferentes. 
No início da parte III, Freud reconhece a existência de certo desapontamento com as recentes 
conquistas humanas. Diz ele que, nas últimas gerações (ou seja, final do século XIX), a 
humanidade efetuou um “progresso extraordinário nas ciências naturais e em sua aplicação 
técnica” (p. 94). Porém, os seres humanos perceberam também que “o poder recentemente 
adquirido sobre o espaço e o tempo, a subjugação das forças da natureza, (...), não aumentou a 
quantidade de satisfação prazerosa que poderiam esperar da vida e não os tornou mais felizes” 
(idem). A resposta de Freud a essa questão parece ser que as conquistas humanas foram 
acompanhadas pela aumento das expectativas humanas. Hoje, podemos falar de modo 
instantâneo com alguém que mora na Antártida. Porém, isso só se tornou uma ‘conquista’ 
porque... O ser humano foi capaz de habitar a Antártida! É como se as conquistas carregassem 
consigo novas necessidades. É cabível, então, a pergunta: até que ponto a civilização nos é 
confortável e nos aproxima da felicidade? 
Por civilização, Freud entende “a soma integral das realizações e regulamentos que distinguem 
nossas vidas das de nossos antepassados animais, e que servem a dois intuitos, a saber: o de 
proteger os homens contra a natureza e o de ajustar os seus relacionamentos mútuos” (p. 96). 
Freud observa que “[a] substituição do poder do indivíduo pelo poder de uma comunidade 
5 
 
constitui o passo decisivo da civilização. Sua essência reside no fato de os membros da 
comunidade se restringirem em suas possibilidades de satisfação, ao passo que o indivíduo 
desconhece tais restrições.” (pp. 101-2) 
Uma observação importante de Freud, e que se constitui num aspecto importante de O Mal-Estar 
na Civilização, é a da semelhança existente entre os processos civilizatórios e o desenvolvimento 
libidinal do indivíduo. “A sublimação do instinto constitui um aspecto particularmente evidente 
do desenvolvimento cultural; é ela que torna possível às atividades psíquicas superiores, 
científicas, artísticas ou ideológicas, o desempenho de um papel tão importante na vida 
civilizada” (idem). A repressão e sublimação dos instintos teriam um impacto decisivo sobre a 
vida sexual do “homem civilizado”, que, para Freud, “encontra-se severamente prejudicada; dá, 
às vezes, a impressão de estar em processo de involução enquanto função, tal como parece 
acontecer com nossos dentes e cabelos” (p. 110). O que Freud fará na parte IV, então, é 
investigar até que ponto é crível a hipótese de que o indivíduo e o processo civilizatório se 
desenvolvem de forma parecida. Ele mesmo esclarece, porém, que são apenas conjecturas. 
Tudo começa quando o primeiro homem descobriu que poderia melhorar sua sorte neste mundo 
por meio do trabalho. Ao ter esse “insight”, diz Freud, “não lhe pode ter sido indiferente que 
outro homem trabalhasse com ele ou contra ele” (p. 105). Ou seja: o uso do trabalho deve ter 
revelado ao homem também a possibilidade da cooperação por meio do trabalho. Freud supõe 
que a família provavelmente começou porque, em algum momento, o macho observou que 
satisfaria melhor seu impulso sexual se tivesse uma ou mais fêmeas ao seu lado 
permanentemente. Ao mesmo tempo, deve ter sido observado pela mulher (não é claro se Freud 
está falando do homo sapiens ou não) que, para proteger seus rebentos indefesos, era preferível 
permanecer com o macho. 
Freud diz, de forma clara, que os dois prováveis fundamentos da vida comunitária humana foram 
a cooperação pelo trabalho (criada pela necessidade externa) e o desejo do homem em 
permanecer com seu “objeto sexual”, a mulher, que, por sua vez, também tinha interesse em 
proteger sua prole. Dado, diz Freud, que o amor sexual proporcionaria as mais intensas 
experiências de satisfação ao ser humano, isso deve ter feito com que o homem (macho) 
buscasse essa satisfação como o ponto central da sua vida. Porém, ao fazer isso, tornou-se 
dependente de uma parte do mundo externo (a mulher), expondo-se a um sofrimento extremo, 
caso a perdesse de alguma forma. 
Freud faz algumas observações interessantes sobre um outro tipo de amor. Não mais o amor 
sexual, mas o do caso das pessoas que deslocam o foco do ‘ser amado’ para o ‘amar’. Ele dá 
como exemplo São Francisco de Assis. É muito curioso o que Freud diz aqui: 
“De acordo com determinado ponto de vista ético, (...) essa disposição para o amor universal pela 
humanidade e pelo mundo representa o ponto maisalto que o homem pode alcançar.” Porém, diz 
ele, “gostaria de apresentar minhas duas principais objeções a essa opinião. Um amor que não 
6 
 
discrimina me parece privado de uma parte de seu próprio valor, por fazer uma injustiça a seu 
objeto, e, em segundo lugar, nem todos os homens são dignos de amor.” (p. 108) 
Freud diferencia o amor sexual do “amor inibido em sua finalidade”. Porém, para ele, o “amor 
com uma finalidade inibida foi de fato, originalmente, amor plenamente sensual, e ainda o é no 
inconsciente do homem” (p. 108). 
Freud dá a entender que o desenvolvimento da civilização refreia, nega, oprime a busca humana 
pelo satisfação sexual. Não é apenas o impulso para o sexo em si que deve ser refreado, senão 
também o impulso agressivo em geral. Aqui, Freud fará uma análise muito interessante e 
reveladora do seu pensamento. Ele se detém a analisar o que seria a ‘exigência ideal’ da 
sociedade dita civilizada: “amarás a teu próximo como a ti mesmo”. Segundo Freud, tal 
exigência não é muito antiga. Do ponto de vista histórico, seria recente. Para Freud, essa 
exigência nos causa surpresa e perplexidade. Por que, diz ele, amar o próximo como a si mesmo? 
Que bem isso nos trará? “Se amo uma pessoa, ela tem de merecer meu amor de alguma maneira. 
(...). Ela merecerá meu amor, se for de tal modo semelhante a mim, em aspectos importantes, que 
eu me possa amar nela” (p. 114), ou se for mais perfeita do que eu, diz ele. Mas, se não for 
assim, será muito difícil amá-la. 
“Na verdade, eu estaria errado agindo assim, pois meu amor é valorizado por todos os meus como 
um sinal de minha preferência por eles, e seria injusto para com eles, colocar um estranho no 
mesmo plano em que eles estão. (...). Qual é o sentido de um preceito enunciado com tanta 
solenidade, se seu cumprimento não pode ser recomendado como razoável?” (idem) 
Freud continua: na verdade, esse estranho não apenas é provavelmente indigno de meu amor, 
como também deve possuir mais direito à minha hostilidade do que qualquer outra coisa. Não 
tem amor por mim e não demonstra a mínima consideração para comigo. Diz Freud: “se aquele 
imponente mandamento dissesse ‘Ama a teu próximo como este te ama’, eu não lhe faria 
objeções.” (p. 115). Para Freud, pois, a exigência de amar ao próximo como a si mesmo é 
absurda. 
“Os homens não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que, no máximo, podem defender-
se quando atacadas; pelo contrário, são criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em 
conta uma poderosa quota de agressividade. Em resultado disso, o seu próximo é, para eles, não 
apenas um ajudante potencial ou um objeto sexual, mas também alguém que os tenta a satisfazer 
sobre ele a sua agressividade, a explorar sua capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo 
sexualmente sem o seu consentimento, apoderar-se de suas posses, humilhá-lo, causar-lhe 
sofrimento, torturá-lo e matá-lo. – Homo homini lupus
3
.” (p. 116) 
Assim, Freud dá a entender que a inclinação humana para a agressão exige, para ser contida, um 
dispêndio tão elevado de energia, que exige quase toda a pulsão libidinal dos seres humanos. 
 
3
 “O homem é o lobo do homem”. 
7 
 
“Daí, portanto, o emprego de métodos destinados a incitar as pessoas a identificações e 
relacionamentos amorosos inibidos em sua finalidade, daí a restrição à vida sexual e daí, também, 
o mandamento ideal de amar ao próximo como a si mesmo, mandamento que é realmente 
justificado pelo fato de nada ir tão fortemente contra a natureza original do homem” (p. 117). 
O processo de amadurecimento do indíviduo teria um caminho semelhante ao do 
desenvolvimento da civilização. A agressividade instintiva da criança seria negada e reprimida 
pela sociedade – por meio principalmente da figura do pai –, até o ponto de ser introjetada no 
próprio ego (ou consciência) da criança. Essa repressão se desenvolveria no que Freud chama de 
super-ego, uma estrutura repressora que faria parte do aparelho psíquico de todo ser humano. É 
esse aparelho repressor o responsável pelo sentimento humano de culpa. De forma semelhante ao 
desenvolvimento humano, a sociedade humana precisou reprimir as pulsões primárias dos seus 
membros para que eles pudessem viver em comunidade.

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