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O cuidado odontológico à gestante e puérpera na Rede Cegonha O cuidado em saúde da gestante e da puérpera deve ser proporcionado por uma equipe multiprofissional, de modo a garantir a assistência integral, humanizada e necessária ao bem-estar da mulher, do bebê e de seus familiares. A Rede Cegonha consiste numa rede de cuidados que visa assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis. ● Rede cegonha Tem um recorte de atenção à gestante e de atenção à criança até 24 meses. ● Rede de Atenção às Urgências e Emergências Busca ampliar e qualificar o acesso humanizado e integral aos usuários em situação de urgência/emergência. ● Rede de Atenção Psicossocial Com prioridade para o enfrentamento do álcool, crack e outras drogas. ● Rede de Atenção às Doenças e Condições Crônicas Iniciando-se pelo câncer (a partir da intensificação da prevenção e do controle do câncer de mama e colo do útero). ● Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência Com atenção às pessoas com deficiência física, auditiva, intelectual, visual, ostomia e múltiplas deficiências. A Rede Cegonha é estruturada a partir de quatro componentes e em cada um desses componentes deverá conter ações de saúde bucal para garantir o cuidado. A estruturação dos serviços de saúde em redes possibilita a superação dos elevados níveis de segmentação e fragmentação dos sistemas de atenção à saúde das mulheres e crianças. Possibilita ainda a redução da mortalidade materna e infantil, por meio da ampliação e qualificação das ações e dos serviços de saúde, do combate à violência obstétrica, da oferta de boas práticas e da redução da medicalização e mercantilização do parto. É relevante considerarmos que o atendimento odontológico pode funcionar como agente potencializador da qualidade de vida da gestante por meio da percepção subjetiva de bem-estar e, ainda, como agente promotor de estilos de vida mais saudáveis, tanto para si quanto para seus filhos e família. Classificação de risco gestacional Os serviços organizados em redes, em especial a Rede Cegonha, implicam disponibilidade e boa estruturação dos serviços nos diferentes níveis de complexidade. Isso inclui a assistência no pré-natal de baixo e de alto risco, sendo muito importante, então, que o cirurgião-dentista reconheça os sinais de alerta na gestação. A assistência às gestantes pressupõe o acompanhamento por parte da Atenção Primária à Saúde mesmo nos casos de alto risco, e em conjunto com o atendimento dos serviços de referência/especializados. A classificação do risco gestacional implicará diretamente na assistência odontológica. O cirurgião-dentista deverá tomar as medidas adequadas em cada situação: ● Gestantes cuja gravidez tenha curso normal, bom prognóstico e cujo tratamento envolva apenas a prevenção, profilaxia e restauração simples, deverão ser atendidas na USF, pois o tratamento não oferece riscos a ela ou ao bebê; ● Quando identificadas gestantes com alterações sistêmicas não controladas, como diabetes e outras condições que implicam risco maior, encaminhá-las para Centros de Atendimentos Especializados em Odontologia, a exemplo dos CEO, para que seja realizado atendimento necessário e adequado, de acordo com sua fase gestacional. ● É importante ressaltar que nas situações de encaminhamento, o cirurgião-dentista da USF continuará acompanhando essa gestante nas consultas de pré-natal de rotina. O trabalho das equipes de Atenção Primária em Saúde na assistência integral à gestante e puérpera As consultas odontológicas conduzidas durante o período gestacional não se restringem somente à redução dos efeitos da cárie ou das doenças periodontais, mas também podem proporcionar uma ótima ocasião para ações de promoção da saúde da gestante e de sua família. Trata-se, portanto, de uma boa oportunidade para os profissionais de saúde investirem em estratégias de educação e cuidado em saúde, visando ao bem-estar da mulher e da criança, assim como a inclusão do parceiro ou parceira (quando houver) e família, desde que esse seja o desejo da mulher. O Ministério da Saúde deixa claro que todas as gestantes deverão realizar pelo menos uma consulta odontológica durante o pré-natal. Assim, na atenção à gestante no pré-natal de baixo risco, temos: ● Acolhimento com escuta qualificada; ● Avaliação global; ● Plano de cuidado. Pele e mucosas: Avaliar na primeira consulta, no 2º e 3º trimestre. Observar cor, hidratação, presença de lesões, turgor, cloasma, tumorações e manchas.Realizar orientações específicas e encaminhar para avaliação médica na presença de achados anormais. Exame bucal: Avaliar na primeira consulta dentes, língua, gengiva, bochecha, assoalho da boca, orofaringe e palato. Verificar alterações da cor da mucosa, hidratação, esmalte dentário, cárie, presença de lesões, sangramento, inflamação e infecção. Caso seja visualizada alguma alteração no exame, prestar assistência conforme a necessidade; e caso seja um grau maior de complexidade, realizar o encaminhamento aos serviços de média e alta complexidade. Baixo Peso (BP) Investigue a história alimentar da paciente, se há casos de hiperêmese gravídica, infecções, parasitoses, anemias e doenças debilitantes. Alimentação Ofereça à gestante orientação nutricional, visando à promoção do peso adequado e de hábitos alimentares saudáveis. Agendamento Remarque as consultas em intervalo menor do que o fixado no calendário habitual. Primeiro trimestre: Neste período, deve-se priorizar a avaliação odontológica, as orientações de higiene oral e a definição de plano de tratamento. As tomadas radiográficas, principalmente, devem ser evitadas, devido às principais transformações embriológicas. Segundo trimestre: Período mais adequado para a realização de intervenções clínicas e procedimentos odontológicos essenciais, sempre de acordo com as indicações. Terceiro semestre: Momento de maior risco de síncope, hipertensão e anemia. É frequente o desconforto na cadeira odontológica, podendo ocorrer hipotensão postural e compressão da veia cava. Medidas como manter a mulher inclinada para seu lado esquerdo, alternar frequentemente as posições da gestante na cadeira e realizar consultas breves podem reduzir problemas. funções do cirurgião-dentista da APS no cuidado durante o pré-natal e puerpério: ● Orientar as mulheres e suas famílias sobre a importância do pré-natal, da amamentação e da vacinação. ● Verificar o fornecimento do Cartão da Gestante e checar o preenchimento (o cartão deve ser verificado e atualizado a cada consulta de pré-natal). ● Realizar a consulta odontológica de pré-natal de gestação de baixo risco. ● Solicitar exames complementares e orientar o tratamento, caso necessário. ● Orientar a gestante sobre a realização dos testes rápidos de sífilis e HIV. ● Orientar a vacinação das gestantes (contra tétano e hepatite B). ● Realizar a avaliação geral da gestante, observando o período de gravidez. ● Avaliar a saúde bucal da gestante, a necessidade e a possibilidade de tratamento, observando os cuidados indicados em cada período da gravidez. ● Adequar o meio bucal e realizar o controle do biofilme, cujas práticas constituem boas condutas odontológicas preventivas e podem ser indicadas, garantindo conforto à gestante e a continuidade do tratamento após a gravidez. ● Identificar os fatores de risco que possam impedir o curso normal da gravidez. ● Atender às intercorrências/urgências odontológicas, observando os cuidados indicados em cada período da gravidez e encaminhar a gestante para níveis de referência de maior complexidade, caso necessário. ● Favorecer a compreensão e a adaptação às novas vivências da gestante, do companheiro e dos familiares, além de orientá-los em relação aos cuidados neste período. ● Orientar as gestantes e a sua equipe quanto aos fatores de risco e à vulnerabilidade em relação à saúde bucal. ● Identificar as gestantes de alto risco e encaminhá-lasao serviço de referência. ● Desenvolver atividades educativas e de apoio à gestante e aos seus familiares. ● Orientar as gestantes sobre a periodicidade das consultas odontológicas e os trimestres de gestação indicados para a realização de tratamento odontológico. ● Realizar busca ativa das gestantes faltosas de sua área de abrangência. ● Realizar visitas domiciliares durante o período gestacional e puerperal. ● Acompanhar o processo de aleitamento materno e os cuidados com o futuro bebê, enfatizando a importância do papel da amamentação na dentição e no desenvolvimento do aparelho fonador, respiratório e digestivo da criança. ● Orientar a mulher e seu parceiro ou parceira, quando houver, sobre hábitos alimentares saudáveis e de higiene bucal. Idealmente estima-se que a gestante seja atendida pelo menos uma vez por trimestre, com foco na saúde bucal da própria gestante e também do bebê. Nesse momento, sugere-se abordar assuntos que tratem sobre: dieta, higiene bucal, profilaxia profissional, aplicação tópica de fluoretos e outros assuntos correlatos. A construção de um Projeto Terapêutico Singular (PTS) possui quatro fases: Fase 1 Definição de Hipóteses Diagnósticas ● avaliação orgânica ● avaliação psicológica ● avaliação social A equipe deve compreender como o indivíduo entende suas doenças, os desejos e os interesses, assim como o trabalho, a cultura, a família e a rede social, para identificar também suas potencialidades. Após diagnóstico, é o momento de propor estratégias de curto, médio e longo prazo, que serão negociadas com o indivíduo doente pelo membro da equipe que tiver com ele um vínculo melhor. Fase 2 Definições de Metas Fase 3 Divisão de Responsabilidades É importante que as tarefas de cada um estejam definidas com clareza. Fase 4 Reavaliação Momento em que se discutirá a evolução e serão feitas as devidas correções de rumo. É simples, mas alguns aspectos precisam ser observados. ● A escolha dos casos para reuniões do PTS; a ideia é de que usuários ou famílias alvos do PTS se encontrem em situações mais graves ou difíceis. Qualquer membro da equipe pode propor um caso para discussão. ● As reuniões para discussão do PTS; Na execução do Projeto Terapêutico Singular, há definição de responsabilidades, e cada membro da equipe, a partir dos vínculos que construiu, trará para a reunião aspectos distintos e poderá também receber tarefas diferentes, de acordo com a intensidade e a qualidade desse vínculo além do núcleo profissional. O que vai definir a coordenação do PTS é esse vínculo. Assim, um cirurgião-dentista poderá, sim, assumir essa responsabilidade; ● Horário protegido; É essencial para equipes na Atenção Primária à Saúde e centros de especialidades que seja reservado um tempo fixo, semanal ou quinzenal, para reuniões exclusivas do Projeto Terapêutico Singular. ● O tempo de um PTS; Em geral, não se estipula um tempo mínimo ou máximo para formulação e acompanhamento do Projeto Terapêutico Singular, pois isso varia conforme cada serviço e as necessidades de cada usuário. Muitas informações essenciais surgem no decorrer do seguimento e a partir do vínculo com o usuário ● PTS e mudança; Quando ainda existem possibilidades de tratamento para uma doença, não é muito difícil provar que o investimento da equipe de saúde faz diferença no resultado. O encorajamento e o apoio podem contribuir para evitar uma atitude passiva por parte do usuário. Uma pessoa menos deprimida, que assume um projeto terapêutico solidário como projeto em que se (re)constrói e acredita que poderá ser mais feliz, evidentemente tende a ter um prognóstico e uma resposta clínica melhor. Se esta participação do usuário é importante, é necessário persegui-la com um mínimo de técnica e organização. Não bastam o diagnóstico e a conduta padronizados. Alterações fisiológicas, emocionais e doenças orais frequentes na gestação Atendimento durante a gestação Orientação sobre possibilidade de atendimento durante a gestação. Gengivite e doença periodontal Diagnóstico de gengivite ou doença periodontal crônica e necessidade de tratamento. Diagnóstico de lesões de cárie Diagnóstico de lesões de cárie e as respectivas ações de controle da doença e reparo relacionado às perdas das estruturas. Hábitos alimentares e higiene bucal Orientações sobre hábitos alimentares (ingestão de açúcares) e higiene bucal. Exame dos tecidos moles Exame dos tecidos moles e identificação de risco à saúde. Mudanças bioquímicas: ● Aumento do número de células sanguíneas; ● Aumento dos fatores de coagulação; ● Aumento da atividade fibrinolítica; ● Deficiência de ferro e anemia. Mudanças no sistema cardiovascular: ● Taquicardia; ● Aumento de débito e frequência cardíaca; ● Aumento do volume sistólico. Mudanças no sistema respiratório: ● Deslocamento do diafragma para cima; ● Diminuição da capacidade de reserva funcional; ● Aumento do risco de apneia e dispneia; ● Hiperventilação. Mudanças no sistema gastrointestinal: ● Náuseas e vômitos; ● Azia e acidez; ● Diminuição da motilidade gástrica. Mudanças endocrinológicas: ● Aumento de estrogênio, progesterona, esteroides, tiroxina (T4), níveis de insulina e aumento do 1,25-diidroxicolecalciferol (Vitamina D). Mudanças gerais: ● Mudanças comportamentais; ● Aumento da demanda nutricional. As mudanças no sistema imunológico, especialmente a supressão da função dos neutrófilos, podem estar associadas à doença periodontal, além de poder ser a causa provável da exacerbação da ação da placa bacteriana na indução da inflamação gengival. ● Aumento do volume sanguíneo e vasodilatação. ● Favorecimento da disseminação bacteriana e aumento da possibilidade de desenvolver infecções. ● Elevação do nível de progesterona, com aumento da permeabilidade vascular e alteração da resposta imune ● Alteração da taxa e do tipo de colágeno produzido na gengiva, o que influencia na redução do potencial reparador e na manutenção tecidual. ● O nível de estrogênio, que também está elevado, diminui a queratinização e a efetividade da barreira epitelial. A gestação também traz mudanças psicológicas para a mulher. Além das alterações hormonais, ainda existem os medos e a ansiedade que cercam esse momento. É um período de transformação da rotina da mãe e de toda a família.Podem ocorrer mudanças socioeconômicas, como o abandono da escola por mães adolescentes ou de atividades laborais remuneradas para aquelas que já estão no mercado de trabalho, o que as deixa em situação de vulnerabilidade social. Tendo em vista os fatores apresentados até aqui, os cirurgiões-dentistas devem aproveitar esse ciclo de vida de maior aproximação das mulheres com os serviços de saúde para estabelecer vínculo e criar um círculo virtuoso de educação e promoção de saúde individual e coletiva, empoderando, responsabilizando e ajudando na construção da autonomia dos cuidados em saúde para a própria mãe e seu bebê. É importante que a equipe de saúde bucal ofereça à gestante um atendimento seguro e acolhedor, desmistificando questões culturalmente postas, de forma clara. É fundamental que esta equipe conheça as doenças que acometem a cavidade bucal de gestantes e puérperas com mais frequência e sua possível relação com complicações à saúde do bebê. ➔ Doenças periodontais: gengivite, hiperplasia gengival, granuloma piogênico ◆ A elevação dos níveis de estrogênio, o que aumenta a permeabilidade capilar, predispõe as gestantes à gengivite e à hiperplasia gengival. Embora esses fatores não levem à periodontite, eles podem piorar as condições preexistentes. ◆ As mudanças gengivais ocorrem geralmente entre o 3º e o 8º mês de gestação e diminuem gradativamente após o parto. São decorrentes da associação de higiene bucal pobre e irritantes locais provenientes do biofilme dental. ◆ Aumento da profundidade de sondagem, aumento do fluido cervical gengival, aparecimento ou exacerbação de inflamação gengival preexistente, aparecimento ou aumento da mobilidade dentária preexistente ◆ A gengivite é a patologia periodontal mais frequenteem gestantes, apresentando estimativas entre 30% e 100%. A gengivite gestacional se inicia geralmente no terceiro mês de gestação e é caracterizada por: ● Gengiva de cor vermelho-escura (hiperemiada), edemaciada, sangrante e sensível. ◆ A terapia periodontal supragengival e/ou subgengival deve ser imediatamente instituída e a educação em higiene bucal iniciada uma vez que a doença periodontal pode elevar os níveis plasmáticos de prostaglandina, que é um mediador da inflamação e também responsável pela indução do parto. ◆ Granuloma piogênico: Localizado predominantemente na gengiva, na face vestibular, podendo envolver também língua e palato; Lesão tipicamente eritematosa, pediculada, lobulada ou plana; Desenvolve-se geralmente entre o primeiro e segundo trimestre da gestação e regride após o parto. ➔ Doença cárie ◆ Durante a gestação, devido aos episódios de náusea e vômito, frequentes entre 70% a 85% das grávidas, o meio bucal torna-se mais ácido, aumentando a probabilidade da desmineralização do esmalte dental por erosão. Além disso, muitas gestantes sentem náuseas durante a realização da escovação. ◆ Recomenda-se atenção na prática de higiene bucal com dentifrícios fluoretados para controle da doença cárie nessas gestantes, devendo-se considerar a possibilidade do uso de flúor tópico profissional. O reforço dos hábitos de higiene reduzirá o acúmulo do biofilme dental, medida essencial não só para o controle da doença cárie, como também da gengivite e da doença periodontal. ➔ Erosões dentárias ◆ Além da cárie, a hiperêmese também pode levar à erosão dentária, manifestando-se principalmente nas faces linguais e palatinas, podendo provocar hipersensibilidade dentária. ◆ Recomenda-se o uso de escovas com cerdas macias para evitar danos adicionais ao esmalte. ◆ Antiácidos, como o hidróxido de alumínio ou mesmo os inibidores da bomba de prótons e fármacos antieméticos, também podem ser prescritos. ➔ Alterações salivares ➔ Melasmas Prescrições medicamentosas e exames radiográficos durante a gestação A automedicação deve ser exaustivamente desencorajada, principalmente durante a gravidez. Essa prática é considerada a segunda principal causa de teratogênese fetal, superada apenas por defeitos genéticos. ORGANOGÊNESE: é o período de desenvolvimento do feto no qual os principais órgãos e sistemas estão sendo formados. Ocorre entre a 4ª e a 8ª semana de vida intrauterina, e muitos medicamentos têm a capacidade de atravessar a membrana placentária, por difusão passiva (dissolução na membrana lipídica). No período da organogênese, que compreende o primeiro trimestre da gestação, podem ocorrer abortos espontâneos, principalmente por defeitos de desenvolvimento do feto. Nesse caso, o próprio organismo da mulher expulsa o feto por considerá-lo inviável. O Food and Drug Administration (FDA), órgão que fiscaliza e estabelece normas para o uso seguro de medicamentos nos Estados Unidos, com vistas a prescrever fármacos da maneira correta, propôs uma classificação em cinco categorias, considerando os riscos e seus efeitos na gestação. São elas: A, B, C, D, X. ● A solução anestésica mais utilizada na prática da odontologia é a lidocaína 2% com epinefrina na concentração de 1:100000 ● Embora a articaína reúna características farmacocinéticas, como baixa lipossolubilidade, alta taxa de ligação protéica, rápida metabolização e eliminação renal, ainda não há evidências clínicas que justifiquem seu uso. ● A prilocaína deve ser utilizada com cautela, uma vez que possui capacidade de atravessar a placenta com velocidade superior aos demais sais anestésicos disponíveis no mercado brasileiro, e de ter a capacidade, em doses elevadas, de provocar metahemoglobinemia maternal e/ou fetal; além de estar associada a um vasoconstritor derivado de vasopressina (felipressina) que, por sua semelhança estrutural com a ocitocina, em doses bem elevadas, poderia agir sobre a musculatura lisa uterina, provocando contrações. ANALGÉSICOS A partir do momento que o cirurgião-dentista julgar necessária a medicação via oral, supõe-se que o benefício de sua utilização pode superar os riscos. No entanto, é importante lembrar que o tratamento medicamentoso das infecções odontogênicas é coadjuvante, e não resolve o problema por si só. Dessa maneira, a indicação para qualquer odontalgia é o tratamento local, auxiliado, se necessário, pela terapia medicamentosa. Toda intervenção cirúrgica odontológica provoca destruição tecidual, gerando uma resposta inflamatória aguda, caracterizada pela presença de dor, que pode estar acompanhada ou não por edema e limitação da função mastigatória. Veja abaixo as indicações para cada caso: ● Analgésicos de ação periférica: Procedimentos pouco invasivos. A resposta inflamatória é simples e auto limitada, e podem ser prescritos. ● Fármacos com propriedades anti-inflamatórias: Intervenções mais complexas serão necessárias para prevenir a hiperalgesia e o controle do edema pós-operatório. ➔ Paracetamol: Analgésico para dor suave a moderada; Fármaco de uso em qualquer período da gestação; Deve ser prescrito na concentração de 500mg - 750mg, a cada 6 horas. ➔ Dipirona sódica: É o segundo fármaco de escolha; A indústria farmacêutica não recomenda seu uso no 1° trimestre nem no último trimestre; Risco de provocar fechamento prematuro do ducto arterial e de complicações perinatais devido ao prejuízo da agregação plaquetária do binômio mãe-bebê. ➔ Analgésicos opióides (tramadol e codeína): São classificados nas categorias C ou D; Devem ser evitados, pois o uso prolongado ou doses altas estão associados a anomalias congênitas e à depressão respiratória. ANTI-INFLAMATÓRIOS Os anti-inflamatórios, assim como os analgésicos, podem ser classificados de acordo com o mecanismo de ação farmacológica, como você pode ver abaixo: ● Fármacos que inibem a síntese da cicloxigenase (cox): Anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), que podem ser inibidores não seletivos para cox-2 (ibuprofeno, cetoprofeno, diclofenaco, cetorolaco, piroxicam e tenoxicam), ou inibidores seletivos para cox-2 (etoricoxibe, meloxicam e nimesulida); ● Fármacos que inibem a ação da fosfolipase A2: Corticosteroides (Prednisona, Dexametasona e Betametasona); ● Fármacos que deprimem as atividades dos nociceptores: Dipirona, Diclofenaco. Entre os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), a substância padrão é o ácido acetilsalicílico, que é contraindicado na gestação, assim como os demais AINEs, principalmente no último trimestre de gestação, pois podem causar hemorragias na mãe e no feto, inércia uterina (contração insuficiente do útero durante ou após o parto) e fechamento prematuro dos canais arteriais do feto. O uso dos AINEs no último trimestre da gravidez está associado também ao prolongamento do trabalho de parto, devido à inibição da síntese de prostaglandinas relacionadas às contrações uterinas. ➔ Quando houver necessidade do uso de um anti-inflamatório, empregar Dexametasona ou Betametasona, em dose única de 2-4mg. Essa indicação se justifica porque há evidências de que os corticoides não apresentam riscos de teratogenicidade em humanos. ANTIBIÓTICOS Em casos de infecções bacterianas, o principal tratamento consiste na remoção da causa, como a drenagem de um abscesso periodontal ou endodôntico. Mas se as infecções apresentarem sinais locais de disseminação e manifestações sistêmicas do processo (febre, mal-estar geral), deve-se complementar a descontaminação local com o uso sistêmico de antibióticos. ● Penicilinas: Antimicrobianos de primeira escolha; Apresentam ação específica contra substâncias da parede celular das bactérias; Não causam danos às mães nem aos fetos; As mais indicadas são a amoxicilina e a ampicilina (categoria B). ● Estearato de eritromicina, macrolídeos ou cefalosporina: Em casos de pacientes alérgicas às penicilinas, utilizar, preferencialmente, o estearato de eritromicina, pois o estolato tem maior efeito hepatotóxico; Macrolídeos ou cefalosporinas também são indicados em casos de gestantescom alergia às penicilinas. Em casos de infecções mais avançadas, associar a penicilina ao metronidazol ou ao clavulanato de potássio. E, se a paciente for alérgica, optar pela clindamicina. ➔ As tetraciclinas são contraindicadas, pois atravessam a membrana placentária e são capazes de se ligar à hidroxiapatita, provocando uma coloração que vai do amarelo-claro ao marrom-escuro e que pode afetar os dentes decíduos. ➔ A dentição decídua se torna suscetível quando as tetraciclinas são administradas às mães entre o 4° mês da gestação até cerca de nove meses após o nascimento do bebê; e os dentes permanentes, quando a tetraciclina é administrada em crianças de 3 meses a 8 anos de idade. ➔ As tetraciclinas também podem ser depositadas no tecido ósseo do feto, provocando retardo no crescimento; e, durante as primeiras semanas do pós-parto, podem induzir a um quadro de anemia hemolítica ou de icterícia no neonato. ➔ Em resumo, pode-se afirmar que o cirurgião-dentista tem à sua disposição fármacos SEGUROS para realizar o tratamento odontológico da gestante em qualquer período da gestação. FLUORTERAPIA O maior benefício do uso de fluoretos é seu efeito local, que age nos processos de desmineralização e remineralização do esmalte dentário. Não há evidência científica que justifique um efeito sistêmico da suplementação de flúor. Logo, a suplementação pré-natal é contraindicada. A associação de flúor com complexos vitamínicos que contêm cálcio diminui a absorção em 50% dos dois elementos (a diminuição da absorção de flúor não traz nenhuma consequência séria, mas a de cálcio sim, pois este é um elemento extremamente importante para a gestante e para o bebê). Veja as indicações de tratamento com flúor voltadas para a gestante: ● Mães podem apresentar refluxo gástrico severo causado por náuseas e vômitos durante a gravidez, o que pode provocar erosão do esmalte dentário; ● Recomenda-se a Aplicação Tópica de Flúor (ATF) para diminuição da sensibilidade dentinária, dessensibilizantes, indicação de dentifrícios para dentes sensíveis e até mesmo tratamento restaurador em casos mais graves para recobrimento de dentina exposta. Contudo, o flúor gel pode causar náuseas, sendo mais recomendado o uso de vernizes. ● “Não há razão para a prescrição de flúor pré-natal, e esses produtos deveriam ser retirados do mercado pelo simples fato de não estarem associados a nenhum benefício de sua utilização, são deseducativos. A Odontologia deve estar inserida numa equipe de saúde que prepare a futura mãe para o controle da doença, e não para acreditar em uma medicação inócua”. EXAMES RADIOGRÁFICOS ORAIS DURANTE A GESTAÇÃO A anamnese e o exame físico detalhado são ações primordiais na clínica. A primeira medida para evitar problemas com tomadas radiográficas é a realização de uma anamnese bem elaborada sobre a vida sexual da paciente, já que poucas mulheres têm consciência da gravidez nas primeiras oito semanas de gestação, coincidindo com o período crítico da organogênese. No entanto, muitas vezes, os exames de imagem são essenciais para que seja feito o correto diagnóstico e o tratamento. Nesses casos, o cirurgião-dentista não deve ter medo de lançar mão do exame radiográfico, mesmo nas gestantes, tomando todos os cuidados necessários. O estudo de Martins et al.12 mostrou que, dentre os profissionais pesquisados, 45,3% não realizavam tomadas radiográficas para diagnóstico em gestantes, sob a justificativa de acreditarem que há risco de efeitos teratogênicos, ou por insegurança profissional ou por recusa da paciente. Esses dados sugerem que a realização de tomadas radiográficas em gestantes acontece muito mais por considerações emocionais carregadas pelo profissional do que pelo conceito legítimo da ciência. ➔ Evitar repetições por erro da técnica ➔ Recobrir a barriga da gestante por completo com um avental de chumbo e utilizar a dose recomendada de radiação segura para cada contexto; ➔ Uso do protetor de tireóide; ➔ Regulação da dose e duração dos raios-x; ➔ Uso de filmes radiográficos ultrassensíveis (se possível). Apesar de ainda serem encontrados no mercado filmes de sensibilidade D, também estão disponíveis filmes de sensibilidade E, que reduzem o tempo de exposição em 52%, em comparação com o de sensibilidade D e com sensibilidade F (ultrassensíveis), que necessitam de 20% menos tempo de exposição que as de sensibilidade E. Cuidados Odontológicos no pré-natal O pré-natal odontológico foi um termo criado para designar a importância da gestante visitar o cirurgião-dentista, seja para seu autocuidado, seja para receber orientações sobre a saúde bucal do bebê. Esse conjunto de ações faz parte do Programa de Atenção à Saúde da Mulher, seguindo as Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB). Contudo, alguns fatores contribuem para o enfraquecimento dessa estratégia, como: ● Falta de consultórios odontológicos nas unidades de saúde, bem com contratação de profissionais, valor dos equipamentos ligados a essa profissão e valorização da saúde bucal pelos gestores municipais; ● Medo que os funcionários têm de serem responsabilizados por qualquer fatalidade que possa ocorrer com o bebê; ● Baixo referenciamento da gestante à consulta odontológica por desconhecimento da importância da avaliação odontológica durante e após as consultas de pré-natal com médicos/enfermeiros; Esses comportamentos corroboram a perpetuação de crenças e mitos acerca da segurança do atendimento odontológico das gestantes. O tratamento odontológico pode e deve acontecer em qualquer momento da gestação. É importante lembrar que a persistência de um quadro de infecção é mais prejudicial para mãe e para o bebê que qualquer tratamento que possa ser iniciado pelo cirurgião-dentista. 1º trimestre: principais transformações embriológicas estão acontecendo com o bebê. 2º trimestre: período mais estável. 3º trimestre: maior risco de formação de cálculos para a mamãe. Maior frequência urinária e desconforto na posição de decúbito-dorsal. O fato de o primeiro trimestre constituir o período de organogênese, no qual as principais transformações embriológicas estão acontecendo; e do terceiro trimestre exigir do profissional alguns cuidados para garantir um tratamento odontológico sem intercorrências para a gestante, entende-se que, todos os trimestres são compatíveis com qualquer tratamento odontológico que necessário para restabelecer a saúde bucal da gestante. O tratamento odontológico da gestante pode ser feito em qualquer trimestre gestacional. Contudo, é importante que algumas medidas sejam tomadas para que esse atendimento ocorra da melhor maneira possível. Consultas em um ambiente acolhedor: Sabe-se que as grávidas estão mais sensíveis ao gosto, cheiro e temperatura ambiental. Os gostos e odores desagradáveis podem causar náuseas severas e vômitos, e o calor pode levar a desmaios. Alimentação e hidratação antes da consulta: A hipoglicemia também pode causar desmaios, por isso, a paciente deve ser orientada a alimentar-se corretamente antes da consulta e não se esquecer de se hidratar. As consultas devem ser as mais breves possíveis. Cuidados no primeiro trimestre No primeiro trimestre, a mulher ainda está se adaptando à gravidez. Pode apresentar náuseas e vômitos e estar mais temerosa por ser um período mais delicado da gestação. Esse é o período de formação dos órgãos do bebê, e a mulher se vê culturalmente inserida em mitos e crenças. Logo, este não é o momento mais confortável para a futura mamãe realizar as intervenções, mas é um bom momento para a primeira consulta do pré-natal odontológico. Observe abaixo algumas orientações que podem ser apresentadas nesse momento: ● Informar sobre as mudanças que ocorrerão em seu corpo e a repercussão na cavidade bucal; ● Instruções de higiene bucal, reforçando o controle do biofilme dental; ● Exame clínico e profilaxia. Cuidados no segundo trimestre No segundo semestre, a organogênese já está completa e a barriga ainda não está tão grande. Esse é um bom momento para a realização deprocedimentos eletivos mais invasivos, caso sejam necessários. É seguro realizar: Raspagem; Alisamento radicular; Restaurações; Exodontias; Tomadas radiográficas. Durante as consultas, é importante reforçar as orientações sobre controle do biofilme dental e realizar terapia periodontal. Cuidados no terceiro trimestre Todos os procedimentos realizados no segundo trimestre podem ser realizados também no terceiro, mas não devem ultrapassar a metade deste período. As maiores limitações para o atendimento se referem ao desconforto da mãe, como: dificuldades respiratórias, inchaço nos membros inferiores, aumento de peso e outras queixas específicas deste período. Embora não seja muito frequente, algumas gestantes podem apresentar a síndrome hipotensiva, da posição supina, devido à compressão da veia cava inferior e da aorta pelo útero gravídico. ➔ Essa síndrome é caracterizada pela diminuição do débito cardíaco e, inicialmente, pode levar a um aumento da frequência cardíaca e da pressão sanguínea, seguida de hipotensão, bradicardia e síncope, podendo ser acompanhada de tontura e náusea. Também ocorre a diminuição da perfusão uteroplacentária. ➔ Além disso, a posição supina pode causar uma diminuição da tensão arterial de oxigênio (PaO2) e aumentar a incidência de dispepsia do refluxo gastroesofágico. A posição ideal é a de decúbito lateral para esquerda, em um ângulo de, aproximadamente, quinze graus (15°). O cirurgião-dentista deve elevar ligeiramente o encosto e pedir para a gestante se virar sobre o braço esquerdo. Educação em saúde bucal no pré-natal e puerpério A gestação deve ser um momento para construir a educação em saúde, voltada para o bem-estar do binômio mãe-filho. No momento em que a mãe está voltada para o feto e disposta a apreender novos conhecimentos para a sua saúde e a do seu bebê, informações importantes para a prevenção de doenças e promoção da saúde devem fazer parte da consulta odontológica. Quanto maior for o conhecimento dela sobre os bons hábitos de cuidados com a saúde bucal, melhores serão os resultados em seus filhos. As mães desempenham um papel fundamental na formação do bom comportamento para a saúde bucal de seus filhos, e quanto maior o conhecimento delas sobre atitudes positivas em relação aos hábitos bucais, melhor a condição bucal das crianças. É preciso lembrar que toda a família deve ser envolvida nesse processo. Uma questão a ser tratada nas consultas diz respeito ao conhecimento das gestantes sobre a própria saúde bucal e a interferência que este fato pode ter na saúde bucal da criança nos primeiros anos de vida, e na relação com a cárie precoce na infância, além de suas implicações futuras, como prejudicar o desenvolvimento cognitivo e a qualidade de vida da criança. Atitudes dos pais em relação às práticas alimentares são decisivas na prevenção da cárie na primeira infância. Nesse sentido, ressalta-se: ● O consumo de açúcares de adição deve ser evitado ou pelo menos reduzido como forma de prevenção da cárie e da obesidade, e possivelmente de outras doenças não-transmissíveis, incluindo o risco cardiovascular e a diabetes; ● Medicamentos para asma, aplicados principalmente por inaladores de dose medida (MDI), apresentam natureza ácida e reduzem a função salivar, criando um ambiente favorável para as bactérias cariogênicas; ● A asma é claramente associada à cárie em crianças É preciso intervir precocemente, além de motivar os pais sobre os benefícios de adquirir bons hábitos de higiene bucal. É importante que se oriente a gestante em relação à instalação de hábitos saudáveis no núcleo familiar visando a construção de um ambiente compatível com a saúde. Além destes pontos, o consumo frequente de bebidas ricas em açúcar de adição também está associado ao risco de hipertensão, e seu consumo na gestação vem sendo associado ao nascimento pretermo. Essas mudanças comportamentais terão benefício adicional na saúde bucal dos bebês no futuro. Hoje a recomendação mais relevante nesse período é a de orientar os pais para evitarem a introdução de açúcar na vida das crianças menores de 2 anos de idade e realizarem controle efetivo de biofilme a partir da erupção do primeiro dente na cavidade bucal. A amamentação tem um claro efeito de proteção contra infecções, na má oclusão, no aumento da inteligência; além da redução do sobrepeso e da diabetes nas crianças amamentadas por mais tempo. Além disso, há o benefício da proteção contra o câncer de mama e de ovário e da diabetes tipo 2 nas mulheres que amamentam. O risco de cárie na primeira infância está relacionado ao alto teor de car - boidratos das fórmulas infantis e aos fatores que determinam a duração do con - tato entre estas fórmulas e a dentição em erupção, como a alimentação noturna e as práticas de higiene dental para controle do biofilme. O risco muda à medida que a dieta da criança começa a incluir alimentos e bebidas que não sejam leite materno ou fórmulas, dependendo do teor de carboidratos, acidez e frequência de consumo da dieta introduzida. Um olhar mais cuidadoso deve ser dado às crianças que fazem aleitamen to materno após os 12 meses de vida em alta frequência e no período noturno, pois estas crianças podem ter um risco aumentado de apresentar a doença cárie19. Para controle da doença cárie em casos específicos de crianças cárie-a tivas, quando verificadas práticas de aleitamento prolongadas e noturnas, estas devem ser desestimuladas, devendo ser prontamente estabelecidas medidas de higiene bucal para essas crianças com dentifrícios fluoretados de pelo menos 1000 ppm F e sempre analisando o uso concomitante de fontes de consumo de sacarose por essas crianças. A higiene bucal do bebê deve ter início tão logo irrompa o primeiro dente decíduo na cavidade bucal. Sobre a adequada higiene bucal do bebê, atentar para: ● A higiene deve ser realizada com escova dental infantil de tamanho compatível com a idade da criança e com cerdas macias. ● O fio dental deve ser utilizado para limpeza entre os dentes. ● Em relação ao dentifrício, o fluoretado é considerado um dos métodos mais racionais de prevenção da cárie, pois alia a remoção do biofilme dental à exposição constante ao flúor, portanto deve ser introduzido com a erupção dos primeiros dentes. A higienização com dentifrício fluoretado deve ser realizada ao menos duas vezes ao dia, para que a criança possa se beneficiar do uso do fluoreto. Os hábitos orais deletérios podem desencadear más oclusões alterando seu padrão respiratório de deglutição e fala. Dentre eles, podemos encontrar: ● Sucção de chupeta; ● Sucção digital; ● Objetos; ● Onicofagia; ● Bruxismo; ● Respiração bucal; ● Deglutição atípica. Os primeiros 1000 dias de vida como uma oportunidade para a prevenção das DCNT bucais e sistêmicas: o que o cirurgião-dentista precisa saber? Os primeiros 1000 dias de vida compreendem desde o momento da concepção do indivíduo até os dois anos de idade da criança. Esse período é crucial para o crescimento e para o desenvolvimento infantil, pois corresponde a uma “janela de oportunidades” para prevenir e/ou reverter a programação metabólica e melhorar os resultados maternos, fetais, do nascimento, da infância e até mesmo reduzir o risco das crianças desenvolverem DCNT no futuro. Fatores ambientais presentes no período gestacional (alimentação não saudável, estresse, exposição ao fumo e ao álcool) podem ter impactos negativos nos indicadores de saúde da gestante, como ganho de peso excessivo, hipertensão, diabetes gestacional, doença periodontal, dentre outras DCNT , bem como resultar em efeitos negativos ao final da gestação, tais como prematuridade (< 37 semanas), bebês grandes para a idade gestacional ou macrossômica (≥ 4000g), ou na sua prole a curto prazo (asma, atraso no desenvolvimento neuropsicomotor) e também a longo prazo (DCNT). ➔ Sabendo disso, o cirurgião-dentista pode orientar as gestantes para um estilo de vida mais saudável, haja vista que suas atitudes e comportamentos nesses primeiros 1000 dias de vida são determinantes parauma gestação mais saudável, com reflexos na sua saúde e na saúde de seu filho. Similarmente, fatores ambientais presentes nos primeiros dois anos de vida (nascer de cesárea, aleitamento artificial, exposição precoce aos açúcares e uso de antibióticos) podem causar impactos imediatos na primeira infância (ganho de peso excessivo, desenvolvimento de asma, cárie e gengivite) e ao longo da vida (DCNT). Teoria DoHad ➔ A Teoria Desenvolvimentista da Saúde e das Doenças - DOHaD baseia-se nas evidências da origem precoce das DCNT, em especial nos efeitos das exposições ambientais intrauterinas e nos primeiros anos de vida, o que aumenta o risco futuro de DCNT, como a dislipidemia, diabetes tipo II, depressão e doenças cardiovasculares. ➔ A teoria DOHaD propõe que o risco de desenvolvimento de DCNT seja influenciado por modificações ambientais, especialmente no período intrauterino e nos primeiros dois anos de vida da criança, resultando em alterações permanentes no organismo. Essa teoria propõe uma ligação entre a concepção, a fase fetal e a infância com as alterações no desenvolvimento em longo prazo. ➔ Além disso, a teoria DOHaD também dá suporte à prerrogativa de que o melhor momento para promover intervenções para prevenção de DCNT com redução substancial de risco são os períodos de maior desenvolvimento: vida intrauterina, infância e, em menor potencial, a adolescência. Os primeiros 1000 dias de vida caracterizam-se por serem uma janela de oportunidades para prevenção de DCNT. Estressores ambientais presentes nesse período podem levar a desfechos negativos no desenvolvimento da criança e ao longo de sua vida. Assim, o cirurgião-dentista deve reconhecer esses fatores de risco e suas repercussões nos primeiros mil dias de vida, bem como saber como atuar na comunidade de modo a realizar a prevenção. Estressores ambientais na gestação ● Na gestação, estressores ambientais, como uma alimentação não saudável e exposição ao fumo e ao álcool, podem levar a desfechos sistêmicos e bucais desfavoráveis. ● Uma alimentação inadequada, com adição de açúcares, tem sido apontada como um importante fator de risco para o desenvolvimento de DCNT. O consumo abusivo de bebidas ricas em açúcares de adição, por exemplo, está associado a um maior ganho de peso na gestação, o que pode desencadear o desenvolvimento de hipertensão e diabetes gestacional, doenças crônicas bucais (cárie dentária e doença periodontal), e até mesmo o nascimento prematuro da criança e o desenvolvimento de sintomas de asma na prole. ● Além disso, os pais têm uma influência importante nos comportamentos de saúde dos seus filhos. Crianças expostas ao açúcar tendem a seguir o mesmo padrão de dieta dos pais. ● A exposição ao cigarro durante a gestação pode levar a prejuízos para a gestante – hipertensão, desenvolvimento de trombose venosa e doença periodontal; para o feto, pode resultar em má formação da membrana placentária, o que aumenta a chance de nascimento pré-termo e de bebê pequeno para a idade gestacional – e para a criança – desenvolvimento de transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. ● Na gestante, a exposição ao álcool pode levar ao parto prematuro, redução do leite materno, perda dentária e até mesmo ao aborto. O conjunto de complicações para o bebê, acarretado pela exposição ao álcool durante a gestação, é conhecido como Síndrome Alcoólica Fetal. ○ Essa condição leva a complicações como: anomalia facial, restrição de crescimento fetal, deficiências congênitas nos órgãos e anomalias relacionadas ao aprendizado, por exemplo, o desenvolvimento do transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. ● O uso de antibióticos no período da gestação pode aumentar o risco de asma na primeira infância, e já foi associado ao aumento do risco de epilepsia e de obesidade infantil. Orientações no pré-natal: ➢ Adotar uma alimentação saudável, livre de bebidas ricas em açúcares de adição; ➢ Não fumar durante o período gestacional e de amamentação; ➢ Evitar se expor de forma passiva à fumaça de cigarro; ➢ Não consumir bebidas alcoólicas no período gestacional e de amamentação. Estressores ambientais nos dois primeiros anos de vida da criança ● Nos dois primeiros anos de vida da criança, fatores ambientais, como o parto cesáreo, aleitamento artificial e exposição precoce aos açúcares de adição podem levar a desfechos sistêmicos e bucais desfavoráveis ao longo da vida. ● O parto cesáreo, eletivo ou de urgência, tem sido associado a um maior risco de desenvolvimento de doenças imunológicas e metabólicas durante a infância, como: asma, alergia alimentar, diabetes tipo I e obesidade. ● O aleitamento artificial está associado ao desenvolvimento de obesidade tardia. A obesidade é um importante fator de risco metabólico para o desenvolvimento de DCNT ao longo da vida.16, 18 Nesse sentido, o cirurgião-dentista e a equipe da Estratégia de Saúde da Família devem orientar as mães a não introduzirem fórmulas sem a indicação do pediatra. Nesses atendimentos, deve ser ressaltado que o aleitamento artificial só deve ocorrer quando a amamentação não pode ser realizada. ● A amamentação exclusiva é recomendada nos primeiros 6 meses de vida da criança e deve ser continuada até os dois anos ou mais, pois, além de aumentar o vínculo entre a mãe e o filho e de proteger contra infecções, trata se de um fator protetor para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis e seus fatores de risco, como menor risco para sobrepeso, obesidade, asma e diabetes do tipo 2. ● Durante as consultas odontológicas, o cirurgião-dentista deve orientar aos pais e cuidadores para que a criança não consuma açúcares adicionados até os dois anos de vida, visto que este padrão de consumo pode levar a problemas bucais, como a cárie dentária e a gengivite – marcador precoce da doença periodontal – e ao desenvolvimento de DCNT sistêmicas no decorrer da vida do indivíduo. PREVENÇÃO PRECOCE DAS DCNT: AÇÕES DO CIRURGIÃO-DENTISTA NOS PRIMEIROS 1000 DIAS DE VIDA Serão destacadas a seguir as importantes ações do cirurgião-dentista nos primeiros 1000 dias de vida para prevenção precoce das DCNT bucais e sistêmicas: ● Realizar o pré-natal odontológico das gestantes, com orientações de saúde bucal e saúde geral; ● Durante as consultas de pré-natal, incentivar a gestante a optar pelo parto vaginal, se não houver contraindicação médica; ● Orientar a gestante a não se expor ao cigarro e ao álcool durante a geração; ● Prescrever antibióticos para tratamentos odontológicos de forma consciente, para os casos realmente necessários e com base em evidências científicas da real necessidade de cada caso; ● Durante as consultas da gestante, incentivar o aleitamento materno exclusivo durante os primeiros seis meses de vida e a continuidade da amamentação até os dois anos de idade ou mais, conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde; ● Orientar o núcleo familiar a ter hábitos saudáveis de dieta, com a forte recomendação de que crianças até dois anos de idade NÃO DEVEM SER EXPOSTAS AOS AÇÚCARES DE ADIÇÃO para prevenção não só das doenças bucais (cárie e doença periodontal/ gengivite), mas também visando à redução de risco cardiovascular, da obesidade e de DCNT; ● Orientar os pais quanto aos doze passos para uma alimentação saudável, para que eles possam implantar hábitos de dieta adequados aos filhos. ● Incentivar a consulta odontológica no primeiro ano de vida da criança para promoção de saúde bucal na primeira infância.
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