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53 7ºAula Currículo: os critérios de Sucesso e as questões atuais Boa aula! Fonte: Google Imagem, acesso em 20 out 2012. Vimos, na aula anterior, que o sucesso, o planejamento, enfim, todo o processo depende tanto do currículo e de todo o sistema educacional, cultural, político, quanto da subjetividade humana. O artigo deixou claro que o planejamento do currículo, pode e tem diferentes vertentes e cabe a cada indivíduo, acatar ou não, tal planejamento. Porém, estudado e cuidadosamente analisado, pode, realmente, contribuir para a melhoria da educação, só o currículo bem formulado, como um todo. Nesta aula, trataremos dos critérios e das questões atuais que englobam os estudos sobre Currículo! É extremamente necessário que cada um de vocês agora se atente a essas indispensáveis informações que, certamente, irão contribuir de maneira satisfatória para uma reflexão e uma melhoria da prática pedagógica. 55 Escola, Currículo e Avaliação Institucional 54 Objetivos de aprendizagem 1 - Só o currículo, nada mais que o currículo. 2 - Sucesso escolar ou sucesso educativo: uma confusão 3 - Levar todos a obterem sucesso quaisquer que sejam os critérios 4 - Recusar que a avaliação defina o currículo 5 - Currículo e questões atuais 6 - Documentos de Identidade. 6 - Documentos de Identidade Ao término desta aula, vocês serão capazes de: • compreender critérios de sucesso que transformações no currículo podem proporcionar, e seus desafios do currículo na atualidade; • entender a importância do planejamento de ensino e do plano para o currículo no campo educacional. Seções de estudo 1 currículo O debate incessante e atualmente muito acalorado sobre os critérios de sucesso testemunha, a seu modo, a dificuldade das democracias quanto: • à adoção de textos precisos; não por ausência de rigor, mas pelo cálculo que textos abertos a interpretações diversas podem ser mais amplamente objeto de um relativo consenso; • ao limite da contestação pública e da crítica dissimulada das regras em vigor, mesmo sendo elas instituídas por procedimentos legítimos. O projeto do sistema escolar encarna no seu currículo um conjunto de objetivos e de conteúdos de formação. Apesar das controvérsias a respeito, nunca extintas, o currículo está inscrito em textos que têm força de lei e não podem ser inconsequentes, mesmo se subsiste certa margem de interpretação. Parece-me de bom senso tomar o currículo como a referência última, à qual se reportam as formas e as normas de excelência escolar. Isso é mais ou menos óbvio. Na realidade, entre o enunciado do currículo formal e cada julgamento de excelência referente a um aluno em particular, as etapas intermediárias são numerosas. Cada uma se presta a variações possíveis, com frequências pouco visíveis e difíceis de estabelecer. 1. a definição das normas e das formas de excelência não aparece sempre explicitamente no currículo. É preciso então “deduzi-la” dos objetivos e dos programas. 2. há certa arbitrariedade na tradução das formas e das normas de excelência em provas, questões, problemas e tarefas destinadas a manifestar “objetivamente” os conhecimentos, as capacidades ou as competências dos alunos. 3. a distinção dos diversos níveis de excelência e sua codificação em índices ordinais ou métricos (notas, conceitos, porcentagens de aquisição) abrem outra porta à arbitrariedade. 4. a confecção de tabelas e a determinação do limiar que separa os alunos com desempenho satisfatório daqueles com desempenho insatisfatório são, por sua vez, o resultado de decisões nunca inteiramente ditadas pelos textos, mas com frequência tomadas em função da curva de desempenho efetivo dos alunos. 5. modula-se o sucesso e o fracasso ponderando e combinando, de certa maneira, os resultados obtidos em diversas provas múltiplas, e, mais ainda, ponderando diversas formas de excelência para elaborar sínteses. 6. alguns sistemas adotam procedimentos como recursos ou modos informais de negociação, que fazem do julgamento final um produto dependente de transações com os alunos e as famílias, enquanto em outros sistemas predomina a lógica da medida não negociável. 7. em muitos sistemas educacionais são introduzidos procedimentos de “moderação” das avaliações feitas por certos professores e por certos estabelecimentos muito severos ou muito complacentes. Muda-se a imagem do sucesso segundo os procedimentos de moderação, os pesos respectivos da avaliação feita em classe e os resultados das provas padronizadas. 8. mais recentemente, tem-se procurado harmonizar as avaliações correntes e os resultados das avaliações de sistema, para reduzir a eventual defasagem entre a eficácia da escola apreendida no âmbito cotidiano e as apreciações externas. 56 55 Nenhuma dessas escolhas é feita ao acaso, mas os desafios são muito complexos e diversos de modo que não convém perder o currículo de vista ou inventar normas que estão mais voltadas para a tradição escolar, para as obrigações de funcionamento, para as escolhas metodológicas ou para as considerações político-estratégicas, que para uma leitura rigorosa dos programas. Ao contrário, é mais importante que: 1. o currículo tenha precedência e se fundamente naquilo que pareça essencial para ensinar e aprender, em vez de fundamentar-se na obsessão de avaliar de modo preciso ou na preocupação de fazer boa figura diante de uma concorrência que passa por tantas mediações; 2. o sucesso escolar se fundamente numa avaliação equitativa do conjunto das dimensões do currículo. Só o currículo e nada mais que o currículo. As dificuldades metodológicas e as preocupações táticas não justificam nenhuma renúncia. Os riscos, já presentes no cotidiano, de reduzir o currículo a um núcleo cognitivo tradicional, seriam fortemente acentuados pelas provas que privilegiam as aquisições mais facilmente mensuráveis e que não levam em consideração competências, atitudes, relação com o saber, desenvolvimento social ou dimensão reflexiva. 2 - Sucesso escolar ou sucesso educativo: uma confusão Torna-se discutível dissociar sucesso escolar e sucesso educativo. O sucesso escolar deveria coincidir com o conjunto das missões da escola, portanto, cobrir uma parte da ação educativa, aquela que caberia à escola assumir. Seria desejável que essa expectativa fosse explicitada e remetesse a objetivos de formação, em sentido amplo, em vez de permanecer subentendida, o que impede a escola de construir os meios para suas ambições educativas, como se vê a propósito da cidadania. Seria conveniente também romper com uma distinção simplista entre uma instrução essencialmente cognitiva e uma educação essencialmente afetiva, social ou relacional. Todas as aprendizagens fundamentais associam, de uma parte, conceitos, conhecimentos e, de outra, uma relação com o mundo, um projeto, atitudes, valores. Quem poderia, por exemplo, dizer que trabalhar a relação com o saber, a curiosidade, o direito ao erro ou a capacidade de formular hipóteses depende da instrução ou da educação? A educação não é apenas física, musical, artística, cívica, moral, religiosa, ela é também matemática, linguística, científica, histórica, geográfica, epistemológica. O duplo sentido do conceito de “disciplina” deveria lembrar-nos que o conhecimento não está dissociado de uma relação com o mundo, consigo próprio e com os outros. Seria bom, portanto, não retomar uma oposição simplista e ultrapassada entre a educação e a instrução, e perceber que, se persiste em estabelecer uma distinção, ela não corresponde e nunca correspondeu a uma estrita partilha de tarefas entre a escola e a família. Desde seu nascimento, a escola se definiu como uma empresa educativa, tanto do ponto de vista religioso quanto cívico. Ela, de imediato, interveio no mesmo terreno que as famílias; em parte para prolongar ou “redirecionar” sua ação educativa. Limitar a escola à transmissão de saberes é desconhecersua missão de civilização, com toda a ambiguidade desse programa: liberar e normalizar. Em resumo, educativo e escolar não são antinômicos e não há razão alguma para limitar o sucesso escolar às aprendizagens mais tradicionalmente associadas à ideia de instrução. Em contrapartida, a escola não tem o monopólio da instrução. Parte dos saberes e do saber-fazer aparentemente mais “escolares” são, parcialmente, construídos fora da escola, sobretudo nas famílias, começando pelo saber ler. Quer se trate de educação ou de instrução, a escola não deve furtar-se à obrigação de fazer a sua parte específica dentro de um conjunto de influências - favoráveis ou desfavoráveis - em relação às quais ela não pode ser considerada a única responsável. global”, incluindo a ação da escola e, também, levando em consideração o trabalho das outras instâncias - a família, a mídia, a rede de associações, a comunidade, os clubes esportivos etc.? 57 Escola, Currículo e Avaliação Institucional 56 O retorno do interesse pela educação do cidadão ou a voga da educação para a saúde parecem justificar essa ampliação. Notemos, entretanto, que não se poderia avaliar o sucesso educativo da sociedade sem normalizar a definição de uma educação bem-sucedida. Enquanto cada sociedade moderna fornece uma definição formal do sucesso escolar, concretizado no currículo e nas normas de excelência, nada existe de equivalente para o “sucesso educativo global”. Tentar medi-lo colocaria em evidência a diversidade de concepções de vida e, portanto, de educação, que coexiste numa sociedade pluralista. Os profissionais da medicina preventiva, os higienistas, os ecologistas, os especialistas da segurança nas estradas ou da violência, os moralistas, os economistas, os psicólogos tentam, todos, definir a boa educação como aquela que preserva o que a eles importa: a saúde, o ambiente, a integridade, a paz, a justiça, o crescimento, o equilíbrio, a felicidade etc. Cada uma dessas normas é ou abertamente combatida ou negada na prática. Querer medir o sucesso educativo de uma sociedade ameaçaria o pluralismo dos valores, dos modos de vida, dos graus e estilos da integração. O “melhor dos mundos” não estaria muito distante. A escolarização obrigatória e o desenvolvimento de uma legislação, que definiu as finalidades e o currículo da escola, produziram uma exceção histórica. Pode-se circunscrever o sucesso escolar porque a escola é uma instituição pública, à qual a sociedade designa, no quadro da constituição e da legislação, objetivos definidos de formação, educação, socialização, qualificação. Mergulhar o conceito relativamente claro de sucesso escolar no nebuloso “sucesso educativo” só pode misturar as cartas, colocando, no mesmo plano, uma vontade política explícita, decorrente de procedimentos democráticos e de empresas educativas plurais, que não possuem o mesmo estatuto jurídico. É também questionar a demarcação histórica entre o que advém da sociedade global e o que advém de comunidades mais específicas, sejam elas religiosas, linguísticas, étnicas ou simplesmente familiares. Falar de sucesso educativo em vez de sucesso escolar poderia contribuir para privatizar ou para “comunitarizar”, senão a escola, pelo menos, sua missão. Talvez a existência de um sistema de educação que siga as finalidades designadas pela lei corresponda a um momento da história das sociedades modernas. Percebe-se a tendência de transformar a escola em um simples serviço que ofereça às famílias ou a outras comunidades recursos baratos para, à sua maneira, educar suas crianças. Que se aceite então as implicações dessa escolha: haverá tantas concepções de sucesso educativo quantas forem as famílias ou as comunidades. A sociedade ocupar-se-à, então, de oferecer a cada um certo meio de realizar seu próprio projeto educativo, do mesmo modo que os transportes públicos facilitam os deslocamentos sem ditar o destino dos passageiros. Já que cada um viria a procurar na escola, o que quisesse, e sairia quando julgasse oportuno. A noção de sucesso escolar não teria mais um “sentido comum”; designaria o sucesso das estratégias de escolarização de tal ou tal família, como o sucesso econômico designa o sucesso de uma pessoa ou de uma empresa diante da concorrência. Ou então, variante totalitária ou integrista, os pais e os outros adultos se tornariam os agentes de um empreendimento educativo unificado. Num país que rompeu com todo e qualquer pluralismo, os educadores são levados a moldar os seres humanos na mesma forma. Pode-se, então, definir o sucesso educativo: é aquele que o partido, a junta militar ou a igreja no poder definem como tal. É preciso sublinhar que essa unanimidade autoritária na visão da educação está associada aos piores momentos da história humana. O sucesso escolar, na sua forma atual, só tem sentido se articulado a: • uma definição coletiva e democrática dos objetivos da escolaridade; • uma limitação desses objetivos, deixando um amplo espaço para a diversidade cultural. Pode-se compreender que sociedades minadas pelo individualismo, por conflitos étnicos ou por movimentos de contestação sejam tentadas a definir um sucesso educativo mais global que o da escola. Não se oculte, então, que se toca aí num difícil equilíbrio entre cultura comum e diversidade. A ideia de “sucesso educativo” tem um significado eminentemente político; deixemos de ser ingênuos a esse respeito! É de uma concepção de democracia que se trata. 58 57 3 - Levar todos a obterem sucesso quaisquer que sejam os critérios Os debates e combates a propósito do currículo, as normas de excelência e os critérios de sucesso são legítimos, mas se desviam muito, frequentemente, do essencial: a procura de uma escola mais eficaz e mais justa. Enquanto pessoas discutem longamente sobre o que vão fazer juntas, sem chegar a um consenso, há sempre quem diga: “façamos isso ou aquilo, não importa, mas chega de discussão”. Esse mecanismo de regulação não funciona no âmbito do sistema educacional por duas razões: 1. O consenso buscado não é puramente prático, há ninguém está disposto a parar de combater. sucesso não impedem seu funcionamento. Esse debate permanente capta imensas energias, desviadas de um outro problema, talvez, mais importante: como fazer com que cada um obtenha sucesso não importa quais sejam os critérios de sucesso? Como tornar a escola mais justa e Poderíamos nos perguntar se a paixão com a qual se debatem as finalidades da escola e os critérios de sucesso não são um modo de mascarar nossa impotência para atingi-los, ou de recusar todo o questionamento dos métodos e da organização do trabalho, deslocando a discussão para questões ideológicas menos ameaçadoras ou desencorajadoras. A solução não consiste em separar os debates. O modo de definir as normas de excelência escolar, as exigências e os critérios de sucesso, pode favorecer ou emperrar a luta pela democratização do ensino e, mais amplamente, do acesso aos saberes. Podem-se dar três exemplos: 1. A democratização do ensino passa pelos currículos direcionados para o essencial, visando a objetivos de formação explícitos e sensatos. É importante que os critérios de sucesso sejam coerentes e, sobretudo, que deem prioridade às aprendizagens essenciais e duráveis, opondo-se à incorporação de desempenhos facilmente mensuráveis, que resultariam de uma aprendizagem decorada, de uma forma de repetição, ou seja, de uma pedagogia bancária que consideraria os saberes e as competências como aquisições isoladas, a serem trabalhadas e avaliadas uma após a outra. A abordagem por competências deveria estimular a ir nessa direção (PERRENOUD, 2000; ROEGIERS, 2000). 2. Privilegiar didáticas construtivistas e dispositivos pedagógicos capazes de criar situações de aprendizagem fecundas não é compatível com critérios de sucesso que dão prioridade a tarefas simples, fechadas, individuais. a afrontara complexidade do real no momento da aprendizagem, se devemos responder corretamente a uma 3. Desenvolver uma organização do trabalho escolar colocada prioritariamente a serviço de uma pedagogia diferenciada é, sobretudo, afastar as urgências avaliativas, trabalhar em ciclos de aprendizagem plurianuais (PERRENOUD, 2000a, 2002). É preciso que a avaliação seja formativa ao longo do ciclo de aprendizagem dele e leve, ao final, às aquisições essenciais e duráveis. Certos sistemas educacionais podem, atualmente, ser flagrados em verdadeiro delito de contradição: afirmam querer aumentar a eficácia da ação pedagógica, tomando medidas - sobretudo relativas aos critérios de sucesso - que resultam em fins contrários. É o caso, por exemplo, de quando se privilegiam as aquisições demonstráveis a curto prazo ou quando os estabelecimentos são levados a se desembaraçar, o mais rápido possível, dos alunos com dificuldade para melhorar seus indicadores de sucesso no exame final. No quadro da luta contra as desigualdades e o fracasso escolar, é, pois, necessário e urgente debater critérios de sucesso e sua relação com as estratégias mais promissoras. Quanto a isso, três observações merecem ser formuladas: 1. Critérios de sucesso que favoreçam pedagogias ativas, diferenciadas, construtivistas e uma avaliação formativa são condições absolutamente necessárias. 59 Escola, Currículo e Avaliação Institucional 58 Realizar essas condições não impede de trabalhar com o núcleo do problema: otimizar a organização do trabalho, as situações didáticas, a consideração das diferenças, as regulações formativas. É absurdo esperar que os critérios de sucesso sejam inteiramente satisfatórios para trabalhar com essas questões. 2. É importante trazer constantemente o debate sobre os critérios de sucesso para essa abordagem pragmática: eles permitem ou emperram as estratégias de formação eficazes? São ou não coerentes com as concepções mais promissoras da aprendizagem e do currículo? Na democracia, as finalidades da escola e os critérios de sucesso são escolhas políticas, às quais professores e pesquisadores devem se submeter. Eles podem, por sua vez, dizer em que e explicar por que certas orientações estão em contradição com a ambição declarada de tornar a escola mais justa e eficaz. 3.Uma parte das questões é igual em todos os sistemas, quaisquer que sejam os governos no poder, o currículo ou os critérios de sucesso. Pode-se, pois, visar a certa continuidade na pesquisa e na inovação - por exemplo, em leitura ou em matemática – sem parar de refletir a cada mudança de ministério ou de programa. Os objetivos da formação são, em larga medida, muito parecidos. O problema maior é que não se consegue atingi-los em relação a todos os alunos. 4 - currículo A questão política maior é continuar a democratizar o ensino. O problema teórico maior continua o de explicar as desigualdades de sucesso escolar, ou melhor, de compreender por que alguns obtêm êxito na escola e outros fracassam, em particular quando as condições de escolarização parecem as mesmas. Contudo, não se pode ignorar que o sucesso é um julgamento feito pela instituição, para distinguir rigorosamente o que sabem ou o que não sabem fazer os alunos, na realidade. Portanto, a explicação das desigualdades não pode ignorar essa construção social do sucesso e do fracasso. Se cada um é livre para definir o sucesso escolar “ideal”, segundo seu interesse, a definição institucional tem força de lei e exerce, queiramos ou não, uma forte influência sobre o destino dos alunos (progressão, orientação, certificação etc). Como vimos, a definição institucional do sucesso, das formas e normas de excelência escolar varia segundo os sistemas educacionais e, no interior de cada um, segundo as épocas. Ela não é imutável, ao contrário, varia, conforme os parâmetros de ensino, os níveis e as disciplinas. Cada julgamento feito sobre o sucesso de um aluno se baseia em formas e normas de excelência institucionalmente definidas, mas resulta, também, de uma transação – com armas desiguais - entre os atores envolvidos, na qual intervém a representação que estes têm do sucesso e do fracasso. A definição institucional não é somente modulada na sua interpretação e na sua aplicação, mas aberta ou veladamente contestada por uma parte dos atores. São aqueles que recusam, sejam as finalidades da escola, o currículo correspondente, sua tradução em formas ou normas de excelência, as exigências que fixam o limite entre o sucesso e o fracasso, os procedimentos de avaliação, ou ainda, as consequências de um fracasso (repetência, exclusão seleção, orientação, não certificação ou estigmatização). Cada reforma do currículo, cada debate sobre as estruturas ou sobre a democratização aviva os confrontos sobre o que deveria ser a definição institucional do sucesso escolar. Passado um pouco mais de uma década, o debate sobre a eficácia ou eficiência dos sistemas educacionais, a instituição da prestação de contas sobre os resultados e o impulso das avaliações internacionais do tipo Pisa acrescentam a esse concerto discordante um elemento novo: uma dupla definição institucional do sucesso. De um lado, a que rege a avaliação escolar no cotidiano, provas e exames “normalmente” organizados pela escola; de outro, a definição a que se referem os organismos governamentais ou internacionais quando avaliam os estabelecimentos ou os sistemas educacionais. Por razões diferentes, cada uma dessas concepções deforma e empobrece o currículo. Não somente no momento de avaliar as aquisições, mas também no momento de ensinar, avaliação é o verdadeiro programa”? 60 59 sucesso são portadoras de efeitos perversos. Como, por exemplo, afastar a tentação de dar prioridade crescente àquilo que as avaliações internacionais ou as comparações entre estabelecimentos colocam em evidência? Em vez de fazer malabarismos com os indicadores e de salvar as aparências, os sistemas educacionais fariam melhor se esclarecessem seus objetivos de formação e se colocassem a avaliação de acordo com seus objetivos, e não o inverso. O currículo deveria vir em primeiro lugar e a avaliação deveria se encarregar de discernir se ele está sendo assimilado de maneira inteligente e duradoura, para além das rotinas escolares e sem se tornar estreitamente dependente de 5 - Currículo e questões atuais Retomemos algumas questões referentes ao planejamento de ensino. “O planejamento de ensino é uma prática (re) negada no Destacaremos, agora, duas pedagogias distintas, Pedagogia marxista e Pedagogia liberal A primeira, como pedagogia marxista, em que a autora ressalta que, para esta, cabia, na maioria das vezes, a crítica à reprodução social das escolas, considerando assim, muito mais as práticas pedagógicas do que as políticas, tais como, as práticas de avaliar e de planejar o ensino, as quais, diante dessa pedagogia, era considerada como algo mecânico, tecnicista, com a finalidade de controlar e disciplinar o trabalho docente e as ações dos educandos. Por outro lado, na pedagogia liberal, o que realmente importa são os aspectos emergentes dos interesses, das necessidades morais e das capacidades cognitivas dos educandos, o que também, facilita para deixar o plano de ensino de lado, pois se considera as demonstrações espontâneas dos educandos muito mais interessantes e, assim, as transformarem em ações que direcionam a prática pedagógica. Mas e então, planejar ou não? Por que planejar? Planejar porque a prática pedagógica é uma forma de política cultural, exigindo, assim, uma intervenção intencional que é, sem dúvida, de ordem ética. Ética que aqui significa respeito e responsabilidade diante de qualquer ação e para com os sujeitos que dela fazem parte, assim como seus grupos e suas culturas. E que diante de tantas atribuições, sentimo-nos -- e realmente somos -- responsáveis, desde o momento em que nos pré-dispomos a ensinar, já que, esse lugar de educador exige que tenhamos ainda alguma consideração social e, também, por nossos alunos. Por isso, como se dirigir para a escola sem planejar ações, sendo que o mínimo que se espera de um bom professor é que ele realmente saiba o que vai ensinar e tenha isso de maneira organizada? Importa ressaltar que, apesar de muitos educadores utilizarem a expressão ‘planejamento’ e ‘plano’, como sinônimo, estes não o são. O planejamento do ensino é o processo que envolve “a atuação concreta dos educadores no cotidiano do seu trabalho pedagógico, envolvendo todas as suas ações e situações, o tempo todo, envolvendo a permanente interação entre os educadores e entre os próprios educandos” (FUSARI, 1989) Enquanto que: O plano de ensino é um momento de documentação do processo educacional escolar como um todo. Plano de ensino é, pois, um documento elaborado pelo(s) docente(s), contendo a(s) sua(s) proposta(s) de trabalho, numa área e/ ou disciplina específica. O plano de ensino deve ser percebido como um instrumento orientador do trabalho docente, tendo-se a certeza e a clareza de que a competência pedagógico política do educador escolar deve ser mais abrangente do que aquilo que está registrado no seu plano (FUSARI, 1989). 61 Escola, Currículo e Avaliação Institucional 60 A autora enfatiza ainda que a ação consciente, competente e crítica do educador é que transforma a realidade, a partir das reflexões vivenciadas no planejamento e, consequentemente, do que foi proposto no plano de ensino. Um profissional da Educação bem preparado supera eventuais limites do seu plano de ensino. O inverso, porém, não ocorre: um bom plano não transforma, em si, a realidade da sala de aula, pois ele depende da competência compromisso do docente. Desta forma, planejamento e plano se complementam e se interpenetram, no processo ação- reflexão-ação da prática social docente (FUSARI, 1989). Planejar é essencial porque é dessa forma que organizamos e selecionamos os objetos de estudos, experiências, linguagens, práticas, vozes, narrativas, relações sociais e identidades. Planejar, mas também apresentar nossos planos sob crítica, pois deve estar claro que ao selecioná-los e, posteriormente, realizá- los, estamos diretamente envolvidos com o poder- fazer, que é parte integrante da ação de planejar. Deve-se, ainda, atentar-se para o fato de que, ao planejar e ensinar, estamos implicados por determinados interesses, privilégios, sentidos e que, desse modo, somos fabricadores ativos de culturas, subjetividades, identidades e significações. Portanto, cabe a nós, educadores, o papel de sermos cada vez mais críticos, em qualquer que seja nossa ação, pois, como vimos nos transformamos muitas vezes nos maiores responsáveis pela construção e continuidade do poder-fazer. Esteja engajada (o) a fazer da educação uma mola propulsora a conscientização de todos é que, com certeza, teremos homens mais capazes e comprometidos com o futuro do nosso país. 6 - Documentos de Identidade Finalizaremos nossa disciplina com a leitura da resenha intitulada “Documento de Identidade”, escrita por Cerezer às teorias do currículo”, de Tadeu Silva (2002). Façam anotações sobre o artigo e procurem discuti-lo com plataforma A obra intitulada Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo, de Tomaz Tadeu da Silva, (2002), faz uma importante análise sobre as teorias do contribuição destas nos estudos sobre o currículo e suas implicações na formação da subjetividade e identidade dos de determinados conhecimentos e saberes em detrimento de outros, considerados menos importantes. Documento de Identidade Para a teoria tradicional, o currículo deveria conceber uma escola que funcionasse de forma semelhante a qualquer empresa comercial ou industrial. Sua ênfase estava voltada para a eficiência, produtividade, organização e desenvolvimento. O currículo deve ser essencialmente técnico e a educação vista como um processo de moldagem. Na década de 1960 surgem as teorias críticas que questionam o status quo visto como responsável pelas injustiças sociais e procura construir uma análise que permita conhecer não como se faz o currículo, mas compreender o que o currículo faz. Seguindo Althusser, a escola é compreendida como aparelho ideológico do Estado, que produz e dissemina a ideologia dominante através, principalmente, dos conteúdos. Bowles e Gintis dão ênfase à aprendizagem por meio da vivência e das relações sociais na escola que irão repercutir na formação de atitudes necessárias no mercado de trabalho capitalista. Bourdieu e Passeron desenvolvem o conceito de “reprodução” e “capital cultural”, onde a cultura dominante incorpora, introjeta e internaliza determinados valores dominantes através do currículo escolar. Na década de 1970, o movimento de reconceptualização critica o currículo por considerá- lo tecnocrático. Este se limitou às questões fenomenológicas, hermenêuticas e autobiográficas de crítica aos currículos tradicionais. Na concepção fenomenológica o currículo é concebido como um lugar de experiência e como local de interrogação e questionamento da experiência. A hermenêutica contesta a existência de um significado único e determinado e defende a ideia de interpretação múltipla dos textos não só escritos, mas qualquer conjunto de significado. Na autobiografia, o currículo é entendido de forma ampla, como experiência vivida. Aqui se entrelaçam o conhecimento escolar, as histórias de vida e o desenvolvimento intelectual e profissional, permitindo a transformação do próprio eu. 62 61 Para Michael Apple, o currículo representa, de forma hegemônica, as estruturas econômicas e sociais mais amplas. Assim, o currículo não é neutro, desinteressado. O conhecimento por ele corporificado é um conhecimento particular. Importa saber qual conhecimento é considerado verdadeiro. A reprodução social não se dá de forma tranquila, há sempre um processo de contestação, conflito, resistência. Henry Giroux concebe o currículo como política cultural, sustentando que o mesmo não transmite apenas fatos e conhecimentos objetivos, mas também constrói significados e valores sociais e culturais. Vê o currículo por meio dos conceitos de emancipação e libertação. Paulo Freire critica o currículo existente através do conceito de “educação bancária”. Nesse contexto, o currículo tradicional está afastado da situação existencial das pessoas que fazem parte do processo de conhecer. O currículo deve conceber a experiência dos educandos como a fonte primária para temas significativos ou geradores. Sua teoria é contestada na década de 1980 por Dermeval Saviani na pedagogia histórico-crítica ou pedagogia crítico-social dos conteúdos. A educação só será política quando esta permitir às classes dominadas se apropriarem dos conhecimentos transmitidos como instrumento cultural que permitirá uma luta política mais ampla. A crítica de Saviani à pedagogia libertadora de Paulo Freire está na ênfase dada por esta aos métodos e não à aquisição do conhecimento. Ao analisar as influências da “nova sociologia da educação” sobre os estudos curriculares, Tomaz Tadeu da Silva salienta que a preocupação da mesma estava voltada para as questões de relação entre currículo e poder, entre a organização do conhecimento e a distribuição do poder. O currículo é visto como uma “construção social”. Basil Bernstein analisa o currículo a partir de duas distinções fundamentais: o currículo tipo coleção e o currículo integrado. Para o primeiro, as áreas e os campos do conhecimento são organizados de forma isolada. No segundo, há uma diminuição das distinções entre as áreas do conhecimento. A classificação determina o que é legítimo ou ilegítimo incluir no currículo. A classificação para Bernstein é uma questão de poder. O autor, ao abordar o currículo oculto, analisa-o como sendo aquele que, embora nãofaça parte do currículo escolar, encontra-se presente nas escolas através de aspectos pertencentes ao ambiente escolar e que influenciam na aprendizagem dos alunos. Na visão crítica, o currículo oculto forma atitudes, comportamentos, valores, orientações etc., que permitem o ajustamento dos sujeitos às estruturas da sociedade capitalista. Na perspectiva das abordagens sobre diferença e identidade, o currículo multiculturalista se apresenta como uma possibilidade de abordagem e inclusão dos grupos raciais e étnicos, pois representa um importante instrumento de luta política. A análise crítica divide o currículo multiculturalista entre as concepções pós-estruturalista e materialista. Para a primeira, a diferença é um processo linguístico e discursivo. Para o materialismo de inspiração marxista, os processos institucionais, econômicos e estruturais, fortalecem a discriminação e desigualdades baseadas na diferença cultural. Importa compreender como as diferenças são produzidas através das relações de desigualdade. Para obter a igualdade, é necessário uma modificação substancial do currículo existente. As perspectivas críticas sobre relações de gênero e pedagogia feminista passaram a ser questionadas por não levarem em consideração a questão de gênero e da raça no processo de produção e reprodução das desigualdades. Nesse contexto, o currículo refletia e reproduzia uma sociedade masculina. A pedagogia feminista passa a desenvolver formas de educação que levassem em consideração os valores feministas, para contrapor- se à pedagogia tradicional de valorização do masculino. O currículo é visto como um artefato de gênero, pois corporifica e ao mesmo tempo produz relações de gênero. Em relação ao currículo como narrativa étnica e racial, a questão central consistia em compreender e analisar os fatores que levavam ao fracasso escolar as crianças e jovens pertencentes a grupos étnicos e raciais minoritários. Na perspectiva crítica, o currículo lidaria com a questão da diferença como uma questão histórica e política, pois não importa apenas celebrar a diferença e a diversidade, mas questioná-la. Para a teoria queer, a identidade sexual, assim como a de gênero, é uma construção social. Para ela, a identidade é sempre uma relação dependente da identidade do outro. Não existe identidade sem significação, assim como não existe identidade sem poder. A teoria queer pretende questionar os processos discursivos e institucionais, as estruturas de significação sobre o que é correto ou incorreto, o que é moral ou imoral, o que é normal ou anormal. O movimento pós-moderno toma como referência social a transição entre a modernidade iniciada com o Renascimento e Iluminismo e a pós-modernidade iniciada na metade do século XX. Questiona as pretensões totalizantes de saber do pensamento moderno. Nesse contexto, o pensamento moderno prioriza as grandes narrativas, vistas como vontade de domínio e controle dos 63 Escola, Currículo e Avaliação Institucional 62 modernos. Nesta perspectiva, a pós-modernidade questiona as noções de razão e racionalidade. Duvida do progresso, nem sempre visto como algo desejável e benigno. Critica o sujeito racional, livre, autônomo, centrado e soberano da modernidade. Para o pós-modernismo, o sujeito não é o centro da ação social. Ele não pensa, fala e produz: ele é pensado, falado e produzido. Fundamentado em Foucault, Derrida entre outros, o pós-estruturalismo coloca sua ênfase na indeterminação e na incerteza sobre o conhecimento. Destaca o processo pelo qual algo é considerado verdade, ou seja, como algo se tornou verdade. Seguindo Derrida, o pós- estruturalismo questionaria as concepções de masculino/feminino; heterossexual/homossexual; branco/negro; científico/não científico dos conhecimentos que constituem o currículo. Já a teoria pós-colonial dá ênfase ao hibridismo, mestiçagem, entendendo a cultura nos espaços coloniais e pós-coloniais como uma complexa relação de poder onde ambas, dominadora e dominada são modificadas. Com as teorias críticas e pós-críticas, não podemos mais ver o currículo como algo inocente, desinteressado. Retomando a aula Esta aula proporcionou compreendermos a necessidade do currículo em nossa prática escolar, se fazendo imprescindível seu entendimento e utilização. E ainda, nos deu subsídios para observar a importância do planejamento de ensino para a efetivação do ensino/ aprendizagem no cotidiano A partir de agora podemos dialogar com a Pedagogia marxista e Pedagogia liberal compreendendo-as e diferenciando-as. 1 - Só o currículo, nada mais que o currículo Nesta seção observamos a importância e profundidade das questões referentes ao currículo, dialogando com pontuações imprescindíveis para que o currículo se efetive na prática escolar. 2 - Sucesso escolar ou sucesso educativo: uma confusão Nesta seção diferenciamos sucesso escolar de sucesso educativo, observando que o sucesso escolar só tem sentido se articulado a uma definição coletiva e democrática dos objetivos da escolaridade Marx e a Pedagogia Moderna - 2ª Ed. Autor: Manacorda, Mario Alighiero Editora: Alinea, 2002 Campinas Vale a pena Vale a pena ler Fonte: https://www. google.com.br/ imghp?hl=pt-BR&tab=wi e quando deixa um amplo espaço para a diversidade cultural. 3 - Levar todos a obterem sucesso quaisquer que sejam os critérios Nesta seção foi possível perceber que todos têm o direito ao sucesso escolar é necessário que sejam garantidos os meios para que esse sucesso ocorra. 4 - Recusar que a avaliação defina o currículo Nesta seção percebeu-se que a avaliação necessita estar de acordo com os objetivos do sistema escolar e tenha um real sentido. 5 - Currículo e questões atuais Nesta seção dialogamos com questões contemporâneas que necessitam estarem presentes quando se refere ao termo currículo. 6 - Documentos de Identidade Nesta seção foi possível dialogar com diversas definições de currículo. • O Sorriso de Monalisa Vale a pena assistir 64
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