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Caso Nando - ato inconsciente nos assassinatos em série

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Psicologia Jurídica
Geisiany Garnes de Andrade
Caso Nando: o ato inconsciente nos assassinatos em série
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Em 2016 Campo Grande conheceu Luiz Alves Martins Filho, o Nando. Levado a julgamento 15 vezes, foi condenado a mais de 175 anos de prisão por matar pelo menos 16 pessoas. Em todos os casos as vítimas eram estranguladas e depois enterrar em um cemitério “particular” no Jardim Veraneio.
A história de terror vivida pelos moradores do Bairro Danúbio Azul revelou um personagem ardiloso, com um passado marcado pela violência e que conseguia envolver as pessoas em sua rede de crimes com facilidade. A complexidade do caso Nando ultrapassou os limites da lei e evidenciou a necessidade da psicanálise para se construir o discurso coeso para entendes, mas também garantir de fato pena justa ou compatível com a brutalidade das mortes. 
Foi justamente a partir do laudo com diagnostico de psicopatia grave que o Ministério Público trabalhou sua tese, que mais de uma vez foi acatada de júri: Nando precisava ser mantido afastado da sociedade.
No entanto, ao se analisar o perfil serial killer, encontramos muitos outros traços psicológicos que vão além do perceptível, do consciente, na personalidade de Nando e principalmente, no modo como cometia dos crimes.
Aos 11 anos, conta, viu a mãe ser assassinada a facadas pelo padrasto. Na vida adulta, já depois de preso, ainda era fácil ouvir o Nando já assassino relatar a história de trauma em meio a frases desconexas. Se esquecendo das mortes que ele mesmo cometeu, relata ter “medo de sangue” desde o dia que presenciou o crime brutal.
De fato, a cena da mãe esfaqueada e o sangue dela reproduziram consequências complexas na criança de 11 anos. Nando conviveu com a violência, a morte se banalizou e quando o impulso violento assumiu lugar em sua personalidade, ganhou espaço de “justiça”. Para o outros, afirmava ser a punição por crimes pequenas no bairro: furtos e roubos em sua maioria.
Internamente, Nando era movido por uma “justiça” inconsciente, feita para extravasar o ressentimento que ele próprio carregava pela vida de dor e tortura que sofreu. Essa linha de pensamento é perceptível apenas nos depoimentos do serial killer a própria justiça. Cada vez que foi questionado sobre uma das mortes atribuídas a ele, contou da perda da mãe, de uma prisão por estupro que alega nunca ter cometido, da violência de tortura que sofreu dentro da cadeia, grave o suficiente para deixar sequelas permanentes. 
Ao falar de cada morte, o discurso inconscientemente retorna as dores que passou, como se a vida que tirou fosse insignificante ao próprio sofrimento. De maneira ideológica, vemos a expressão exata do texto de Freud em A interpretação dos sonhos (1900), quando descreve os mecanismos (deslocamento, condensação, simbolismo) de representações do inconsciente e sua função de realização do desejo.
É neste momento então que aplicamos a teoria ao direito, como defende o jurista Rodrigo da Cunha Pereira, o “inconsciente produz efeitos e é exatamente a partir desses efeitos que ele é reconhecido - lapso, ato falho... efeitos que, embora inconscientes, repercutem no Direito”.
Os episódios dramáticos refletem também em um ponto prático nos crimes de Nando: o modo de matar. Quase todas as vítimas, com exceção de um caso em que o serial killer foi inocentado, foram estranguladas com uma correia de máquina de lavar. Nenhuma gota de sangue foi derramada.
Depois das mortes, cada corpo foi enterrado de cabeça para baixo, em buracos cavados em um terreno do Jardim Veraneio. Muitas das vítimas, assim como o próprio assassino, foram abandonas pelas famílias e estavam imersas ao mundo das drogas. Em entrevistas à imprensa, Nando culpava as mães pelas mortes dos filhos, por não fazerem nada para impedi-los de praticar crimes. 
Esse comportamento do serial killer pode ser enquadrado na psicologia do destino de Leopold Szondi e no conceito de inconsciente familiar, ou seja, a família como fator determinante na vida e até no espaço de liberdade que existe para ir além.
No caso de Nando, a violência que marcou sua família se perpetuou na sua própria história. O abandono da mãe influenciou na escolha até mesmo de suas vítimas. Sua morte, na maneira como anos depois assassinou outras pessoas. Sem perceptiva de futuro, usou o inconsciente para criar a própria linha de justiça e promoveu onda de assassinatos, influenciando um grupo de moradores da mesma região a participar efetivamente dos casos. 		
Durante as investigações e buscas pelas vítimas, ainda em 2016, Nando era o único que sabia apontar a direção em que estava cada corpo. Mesmo assim, em tribunal, negou a autoria dos assassinatos.

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