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Dor aguda abdominal da infância

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Caso 2 – Resumo
· Dor aguda abdominal na infância 
A dor abdominal aguda é uma queixa frequente em crianças. Tem início súbito e pode apresentar características diversas quanto à localização, à intensidade e aos sintomas associados. Inúmeras afecções podem resultar em dor abdominal súbita. A grande maioria dos casos é benigna e autolimitada; entretanto, alguns requerem tratamento clínico específico ou podem necessitar de intervenção cirúrgica. Dessa forma, a definição diagnóstica e a conduta terapêutica imediatas, seja esta cirúrgica ou não, são importantes para minimizar a morbidade desses pacientes, principalmente quando recebidos em unidade de emergência. Na pediatria, o desafio da dor abdominal aguda é ainda maior, pois a reduzida capacidade de cooperação dos pacientes e a grande variedade de etiologias podem dificultar o diagnóstico preciso.
-Epidemiologia:
Dados sobre a prevalência da dor abdominal aguda são escassos. Estudos mostram resultados conflitantes entre a prevalência das principais etiologias e, de forma geral, correlacionam a dor a doenças respiratórias, gastroenterite aguda e constipação intestinal; entre as patologias cirúrgicas, a apendicite aguda apresenta maior frequência.
Em um estudo realizado por Erkan et al., foram revisados retrospectivamente prontuários de 1.141 crianças com idades entre 2 e 12 anos, que procuraram o serviço de emergência com queixa de dor abdominal aguda, e as causas mais frequentes foram doenças respiratórias, infecção urinária e hepatite A. Aproximadamente 9,2% das crianças necessitaram de hospitalização e 44% tiveram diagnóstico de apendicite. Do mesmo modo, Tseng et al. avaliaram 3.980 crianças que procuraram o serviço de emergência com queixa de dor abdominal aguda e encontraram a frequência de 10% de abdome agudo de causas traumáticas e não traumáticas. A etiologia mais frequente no grupo com abdome agudo não traumático em menores de 1 ano foi hérnia inguinal encarcerada, seguida de intussuscepção. A apendicite aguda foi mais frequente em maiores de 1 ano de idade.
Por outro lado, Loening-Baucke e Swidsinski encontraram a constipação intestinal como causa mais comum de dor abdominal aguda em crianças de 4 a 17 anos de idade. Outros estudos destacam a gastroenterite aguda como etiologia frequente de dor abdominal aguda.
-Fisiopatologia:
A dor abdominal pode ser classificada em três grupos: dor visceral, dor parietal e dor referida. Os receptores viscerais podem ser estimulados por isquemia, distensão, congestão, inflamação e tensão nas fibras nervosas viscerais, e estão localizados na superfície serosa, no mesentério, dentro das fibras musculares e na mucosa dos órgãos ocos. A dor visceral geralmente é mal localizada e percebida na linha média ou periumbilical, pois as fibras nervosas não são mielinizadas e adentram a medula espinal bilateralmente e em múltiplos níveis. Geralmente, as dores do esôfago inferior e estômago são referidas no epigástrio; as afecções no intestino delgado possuem dor periumbilical; e as dores no baixo-ventre são reflexo do intestino grosso.
A dor parietal, ou somática, tem seus receptores localizados na parede do peritônio, nos músculos e na pele. É decorrente de estímulo doloroso no peritônio parietal e pode ser secundária à isquemia, à inflamação ou à distensão. Nesse tipo de dor, o estímulo doloroso peritoneal é transmitido pelas fibras aferentes mielinizadas ao gânglio dorsal, do mesmo lado da espinha dorsal ou correspondente ao dermátomo da dor. Caracteristicamente, a dor é em pontada, intensa, localizada e pode ser agravada com movimento ou tosse.
A dor referida tem características semelhantes à parietal; no entanto, a sensação de dor ocorre em uma área distante ao órgão afetado, porém geralmente no mesmo dermátomo. Um exemplo clássico é a pneumonia, que pode se apresentar com dor abdominal, pois a distribuição do dermátomo T9 é a mesma no pulmão e no abdome.
-Etiologia:
A dor abdominal pode ser sintoma de uma infinidade de diagnósticos na infância. As diversas etiologias incluem patologias clínicas e cirúrgicas. As patologias clínicas podem ser divididas entre causas intra e extra-abdominais. Ou, ainda, as etiologias podem ser divididas entre causas gastrointestinais e outras causas.
-Abordagem diagnóstica:
Na fase inicial do quadro, é frequente encontrar certa dificuldade em definir sua causa precisa. Nessas situações, a faixa etária do paciente pode auxiliar no estabelecimento do diagnóstico, pois a prevalência de cada etiologia pode variar de acordo com a faixa etária. Nas adolescentes, a história ginecológica deve ser abordada na anamnese, com atenção aos seguintes pontos da história: fase do ciclo menstrual, presença de atividade sexual, antecedente de doença inflamatória pélvica e uso de métodos contraceptivos, para afastar possibilidade de gravidez ectópica. Nessa faixa etária, a dor aguda pode se tratar de dismenorreia com localização clássica em baixo-ventre e caracteristicamente em cólicas. Ainda nessa faixa etária, a dor unilateral no meio do ciclo menstrual, no período ovulatório, com ou sem pequeno sangramento vaginal pode se tratar de Mittelschmerz.
Além da faixa etária, a sistematização da abordagem do paciente também pode facilitar o diagnóstico. Para isso, alguns autores propõem a abordagem do paciente em alguns passos:
-Primeiro passo: afastar emergências cirúrgicas;
-Segundo passo: descartar causas obstrutivas;
-Terceiro passo: avaliar a possibilidade de afecções infecciosas;
-Quarto passo: investigar doenças hepatobiliares;
-Quinto passo: identificar possíveis doenças funcionais.
Para o sucesso da avaliação do paciente com dor abdominal aguda, a história clínica detalhada e o exame físico minucioso são fundamentais.
-Afastar emergências cirúrgicas:
É importante enfatizar o padrão da dor, fatores desencadeantes, sua progressão, localização, intensidade, fatores de melhora e piora, assim como os sintomas associados. Durante o exame físico, avaliar o estado geral do paciente, além de dados vitais, temperatura, pulso, pressão arterial, frequência respiratória e cardíaca. Os sinais precoces mais comuns de uma enfermidade abdominal grave são: alteração dos sinais vitais, fácies de dor associada a palidez, sudorese, prostração, hipotermia, náuseas e vômitos. A atitude da criança em relação à dor também pode auxiliar na determinação do diagnóstico; geralmente, nos quadros com peritonite, o paciente tende a ficar imóvel, pois a movimentação provoca piora da dor; por outro lado, a dor visceral provoca inquietude e o paciente muda de posição frequentemente, contorcendo-se de dor.
O exame do abdome precisa ser realizado com cuidado, a palpação deve se iniciar nas áreas menos dolorosas e lentamente se dirigir à área de maior sensibilidade, com a intenção de avaliar sinais de defesa, rigidez e distensão da parede abdominal, além da presença de massas e visceromegalias.
Os sinais de peritonite são: rigidez da parede abdominal, movimentos de defesa involuntários causados pela dor, hiperestesia cutânea, descompressão brusca do abdome dolorosa e ausência dos ruídos hidroaéreos.
Os principais sinais indicativos da necessidade de uma avaliação cirúrgica estão listados na Tabela 3.
Na apendicite aguda, a dor geralmente se inicia de forma súbita na região epigástrica ou periumbilical, seguida de vômitos e febre. Na sequência, a dor pode localizar-se na fossa ilíaca direita. Está frequentemente associada a náuseas, vômitos, febre e parada de eliminação de gases. Os sinais de Blumberg (descompressão brusca dolorosa no terço inferior da linha entre a crista ilíaca anterossuperior direita e o umbigo) e Rovising (dor na fossa ilíaca direita após compressão do quadrante inferior esquerdo em decorrência da distensão da coluna gasosa) geralmente são positivos.
Neste primeiro passo, os seguintes exames complementares podem auxiliar na avaliação:
-Hemograma completo: os valores hematimétricos auxiliam na suspeita de quadros hemorrágicos;
-Coagulograma: sempre deve ser solicitado mediante a necessidade de preparo para intervençãocirúrgica;
-Radiografia simples de abdome: deve ser realizado em posição ortostática e em decúbito dorsal e lateral com raios horizontais para obter informações a respeito da distribuição gasosa, presença de níveis líquidos em casos de obstrução ou ar na cavidade em casos de perfuração de alça. Avalia-se ainda a presença de posição antálgica e se há acúmulo de fezes com distensão de alça na região do ceco, que podem indicar apendicite aguda;
-Descartar causas obstrutivas:
Na obstrução intestinal aguda, não há relato de febre, a dor visceral apresenta-se em surtos (cólicas) e a presença de vômitos biliosos sugere obstrução alta. Nos casos de obstrução mais distal ou colônica, as náuseas geralmente são constantes, porém os vômitos aparecem mais tardiamente e suas características podem evoluir de conteúdo gástrico para bilioso e posteriormente podem se tornar fecaloides.
No exame físico, observam-se peristaltismo visível, ausência de ruídos hidroaéreos ou ruídos com timbre metálico.
Os exames de imagem são extremamente úteis. A radiografia simples de abdome evidencia alças de intestino delgado dilatadas com níveis líquidos e diminuição ou ausência de gás no colo; na obstrução cólica, as alças do colo estão distendidas. Sinais sugestivos de obstrução intestinal com dilatação de alça também podem ser visualizados à ultrassonografia de abdome.
Diversas patologias como volvo, hérnia encarcerada, intussuscepção, bridas, doença de Crohn, impactação fecal e íleo paralítico podem se apresentar de forma semelhante com sinais obstrutivos.
O principal diagnóstico diferencial das obstruções intestinais é o íleo paralítico, que pode ser secundário a: hipocalemia, uremia, intoxicação por chumbo, medicamentos, pós-operatório, pós-choque e gastroenterite viral. O paciente pode apresentar distensão abdominal, dor abdominal leve, náuseas, aumento da eliminação de gases e fezes; os vômitos são raros. À radiografia, são visualizados vários níveis hidroaéreos, sem evolução radiológica de piora do quadro. A tomografia computadorizada evidencia apenas distensão gasosa e líquida de alças de intestino delgado e colo.
-Avaliar a possibilidade de afcções infecciosas:
Afastadas as enfermidades cirúrgicas, é importante ressaltar que quaisquer síndromes virais com sintomas variados como febre, náuseas, vômitos, diarreia, inapetência, cefaleia, tosse, rinorreia e dor de garganta podem estar associadas a cólicas e dor abdominal difusa, geralmente autolimitada, que pode se intensificar durante ou logo após a alimentação, e ser referida em região epigástrica ou periumbilical. Nesses casos, o abdome está flácido ou normotenso, com ruídos hidroaéreos geralmente aumentados, pouco doloroso à palpação, mas sem sinais localizatórios ou de peritonite.
Os principais diagnósticos diferenciais da gastroenterite viral são: enterocolite bacteriana, intoxicação alimentar, infecção aguda por Helicobacter pylori, pneumonia aguda, pielonefrite, cetoacidose diabética, púrpura de Henoch-Schönlein, síndrome hemolítico-urêmica e angioedema.
Deve-se suspeitar de enterocolite bacteriana quando há início súbito de febre alta e dor abdominal difusa seguida de diarreia de pequeno volume, mas com presença de sangue e muco. Na palpação do abdome, frequentemente há dor difusa, sem sinais de irritação peritoneal.
Já na intoxicação alimentar, além da dor difusa e de vômitos frequentes, a diarreia é caracteristicamente aquosa e profusa, frequentemente associada ao Clostridium perfringens ou Staphylococcus aureus.
Neste passo, há grande variedade de diagnósticos diferenciais e, dessa forma, os sintomas específicos associados ao quadro da dor auxiliam na determinação da etiologia. Na presença de dispneia, tosse e ausculta pulmonar alterada, suspeita-se de pneumonia, pleurite ou pneumotórax. Os sintomas da infecção do trato urinário ou pielonefrite em crianças pequenas são muito inespecíficos, simulando uma gastroenterite viral. Já em crianças maiores, a dor pode se localizar nos flancos acompanhada de disúria, nictúria e urgência miccional em raros casos.
Na púrpura de Henoch-Schönlein, a dor abdominal difusa e os vômitos muitas vezes estão acompanhados de hematoquezia, lesões cutâneas, dor articular, hematúria e proteinúria.
Os exames complementares já realizados nos passos anteriores auxiliam o diagnóstico, e de acordo com a sintomatologia alguns exames são acrescentados.
O hemograma completo auxilia na avaliação infecciosa. O exame simples de urina avalia a possibilidade de litíase ou púrpura quando a hematúria está presente e indica infecção na presença de leucocitúria. Nas situações de dor intensa e queda do estado geral, a solicitação de eletrólitos e gasometria venosa ou arterial são fundamentais na estabilização do paciente.
A radiografia simples de tórax pode evidenciar quadros pulmonares e pleurite diafragmática, que podem mimetizar a dor do abdome agudo.
Algumas vezes, a ultrassonografia identifica a presença de adenite mesentérica, que não deve ser interpretada como um diagnóstico, mas sim como secundária à gastroenterite viral ou bacteriana.
-Investigar doenças hepatobiliares:
Caso a dor seja referida na região epigástrica ou em hipocôndrio direito, é importante descartar doenças hepatobiliares e pancreatite aguda. Assim, deve-se questionar a presença de acolia, colúria, história de icterícia e antecedentes pessoal e familiar de doenças hepáticas. Quando há sintomas gerais como febre, anorexia, fadiga, prostração, náuseas e vômitos associados à hepatomegalia, suspeita-se de hepatite aguda. Nas situações de dor em cólica, com piora no período pós-prandial, há a possibilidade de colelitíase, colangite e pancreatite. A dor na colecistite pode irradiar para a região subescapular direita e estar associada a febre baixa; com a evolução do quadro, surge a icterícia e torna-se positivo o sinal de Murphy (dor à inspiração profunda ou tosse durante a palpação da linha hemiclavicular direita abaixo do último arco costal).
A pancreatite aguda frequentemente se manifesta com dor em abdome superior, epigástrica ou em faixa, com irradiação para o dorso, acompanhada de vômitos e sensibilidade epigástrica. O diagnóstico clínico é estabelecido pela presença de dois dos seguintes critérios: dor abdominal típica, amilase e/ ou lipase aumentadas por mais de três vezes do limite superior, e achados de imagem compatíveis à ultrassonografia ou à tomografia computadorizada. As causas mais comuns de pancreatite são: litíase ou lama biliar, sepse, trauma e medicamentos (p.ex., ácido valproico, L-asparaginase, prednisona e 6-mercaptopurina).
Os seguintes exames são úteis na investigação: amilase, lipase, transaminase glutâmico-oxalacética (TGO), transaminase glutâmico-pirúvica (TGP), gama-glutamiltransferase (gama-GT), fosfatase alcalina e bilirrubinas. Nessas situações, a ultrassonografia fornece informações sobre fígado, vias biliares e pâncreas. Em determinadas situações, a colangiopancreatografia endoscópica retrógrada (CPRE) ou colangiorressonância são úteis para estabelecer o diagnóstico de coledocolitíase.
-Identificar possíveis doenças funcionais:
Algumas doenças funcionais podem apresentar episódio de dor mais intensa a ponto de motivar a procura ao atendimento de urgência. Entre elas, estão a constipação intestinal, a aerofagia e a dor abdominal funcional. Geralmente, na história há relato de episódios anteriores de dor em menor intensidade.
A constipação intestinal pode se iniciar de forma súbita após uma gastroenterite viral, em decorrência de alterações de motilidade e dieta obstipante, ou ainda como consequência de fissura anal, que, ao provocar dor às evacuações, resultam em comportamento de retenção fecal e consequentemente leva à constipação. Nessa condição, a dor situa-se na fossa ilíaca direita, ou suprapúbica, associada à diminuição da frequência evacuatória. Pode ocorrer, ainda, sensação de urgência para evacuar, tenesmo ou dor retal. Ao exame do abdome, pode- se encontrar fecaloma palpável. A realização da radiografia simples do abdome não é mandatória e revelaapenas quantidade aumentada de fezes no colo sigmoide.
Além da constipação, a aerofagia e o excesso de gases intestinais provocados pela intolerância a carboidratos (mais frequentemente a lactose e frutose) podem resultar em distensão das alças intestinais e, consequentemente, dor.
Na possibilidade de doença funcional, o pediatra deve garantir à família que o exame físico da criança está normal, sem sinais de alarme, orientar a família a retornar ao serviço de emergência caso haja piora da dor ou mudança do quadro clínico, e sugerir a procura ao especialista para acompanhamento da dor.
-Tratamento:
Como as possibilidades de etiologia da dor abdominal aguda são diversas, o tratamento deverá ser avaliado caso a caso. O seguimento clínico desses pacientes é sempre importante para evitar complicações.
A frequência de pacientes com dor abdominal aguda que necessitam de intervenção cirúrgica é baixa; no entanto, a possibilidade de não realizar um diagnóstico que pode ser grave gera insegurança ao pediatra. Assim, a avaliação cuidadosa e a busca por sinais e sintomas do paciente são fundamentais para prevenir significativamente a morbimortalidade desses pacientes.
· Abdome agudo
O abdome agudo pode abranger todas as especialidades, incluindo cirurgia, medicina, ginecologia, geriatria e psiquiatria. É um quadro clínico abdominal caracterizado por dor, de início súbito ou de evolução progressiva, que necessita de definição diagnóstica e de conduta terapêutica imediata. Para essas condições agudas, é importante fazer um diagnóstico rápido, a fim de reduzir a morbidade e a mortalidade. A maioria dos casos requer encaminhamento cirúrgico.
-Fisiopatologia e etiologia:
As causas mais comuns de abdome agudo são apendicite aguda, gastroenterite aguda, síndrome do intestino irritável, várias cólicas e dor na ovulação (mittelschmerz). A adenite mesentérica é comum em crianças.
Podemos dividir o abdome agudo em "síndromes": inflamatória, perfurativa, obstrutiva, vascular e hemorrágica.
-Inflamatório: a dor é de início insidioso, com agravamento e localização com o tempo. O paciente apresenta sinais sistêmicos, tais como febre e taquicardia. As doenças mais comuns são: apendicite aguda, colecistite aguda, diverticulite aguda, pancreatite, anexite aguda. A apendicite é a causa mais comum de abdômen agudo cirúrgico no mundo. Pode ocorrer em qualquer faixa etária, mas é mais comum em adolescentes e adultos jovens.
-Perfurativo: a dor é súbita e intensa, com defesa abdominal e irritação peritoneal. Há derrame do conteúdo de víscera oca no peritônio, geralmente secundário à úlcera gastroduodenal, diverticulite, corpos estranhos e neoplasias.
-Obstrutivo: dor em cólica, geralmente periumbilical. Associadamente surgem náuseas, vômitos, distensão abdominal, parada da eliminação de flatos e fezes. Acontece na oclusão mecânica por bridas, hérnias, neoplasias e invaginação.
-Vascular: dor difusa e mal definida, há desproporção entre a dor e o exame físico e as causas mais comuns são embolia e trombose mesentérica, com isquemia intestinal.
-Hemorrágico: dor intensa, com rigidez e dor à descompressão; há sinais de hipovolemia, tais como hipotensão, taquicardia, palidez e sudorese. As causas mais comuns são gravidez ectópica rota, ruptura de cistos, ruptura de aneurismas, rotura de baço.
-Clínica:
-Dor:
A dor de cólica é uma dor rítmica, com espasmos regulares de dor recorrente, chegando a um clímax e desaparecendo. É virtualmente patognomônico da obstrução intestinal. A cólica uretérica é uma verdadeira dor abdominal cólica, mas as chamadas cólicas biliares e cólicas renais não são verdadeiras cólicas.
-Localização:
A dor epigástrica geralmente decorre de distúrbios do esôfago, estômago e duodeno, estruturas hepatobiliares, pâncreas e baço. No entanto, à medida que alguns distúrbios progridem, a dor tende a se deslocar da linha média para a direita (vesícula biliar e fígado) ou para a esquerda (baço). A dor periumbilical geralmente decorre de distúrbios das estruturas do intestino médio embriológico, enquanto as estruturas do intestino posterior tendem a referir dor à região inferior do abdômen ou suprapúbica.
Os receptores sensoriais intra-abdominais podem ser considerados como inervando o peritônio visceral ou parietal. Os mecanorreceptores viscerais são desencadeados pela distensão intestinal ou tensão no mesentério ou vasos sanguíneos, enquanto os nociceptores são desencadeados por estímulos mecânicos, térmicos e químicos. A dor das vísceras é sentida como difusa e mal localizada, enquanto a estimulação dos nociceptores peritoneais parietais causa uma dor que é experimentada diretamente no local do insulto.
-Diagnóstico:
A maioria das causas do abdome agudo é grave e o diagnóstico precoce é obrigatório para reduzir a mortalidade e a morbidade. É vital não diagnosticar incorretamente uma gravidez ectópica rota, que causa dor abdominal inferior ou suprapúbica de início súbito, ou as causas vasculares com risco de vida, como aneurisma roto ou dissecante da aorta, oclusão da artéria mesentérica e infarto do miocárdio (que podem se apresentar como dor epigástrica).
As úlceras perfuradas e o intestino estrangulado, como o vólvulo do sigmóide e o aprisionamento do intestino delgado em um orifício herniário ou em torno de aderências, também exigem um diagnóstico precoce.
Uma armadilha muito comum é diagnosticar erroneamente a apendicite aguda, especialmente em idosos, em crianças, em gestantes e naqueles que tomam esteroides, pois a apresentação pode ser atípica. Apendicite precoce apresenta tipicamente com dor abdominal central que se desloca para a fossa ilíaca direita cerca de 4 a 6 horas depois. Isso causa confusão no início. Pode causar diarréia com dor abdominal, especialmente se for um apêndice pélvico, e pode ser diagnosticada erroneamente como gastroenterite aguda.
-Anamnese:
A dor deve ser analisada de acordo com sua qualidade, quantidade, local e irradiação, início, duração e deslocamento, fatores de melhora e piora e sintomas e sinais associados.
Atenção especial deve ser dada a: (1) anorexia, náusea ou vômito; (2) micção; (3) função intestinal; (4) menstruação / contracepção; (5) ingestão de drogas.
-Exame físico:
A rapidez e objetividade do exame depende do estado clinico do paciente. Em pacientes instáveis fazemos uma avaliação rápida e monitorização cardioscópica, oximetria de pulso e acesso periférico. Em pacientes estáveis podemos fazer uma avaliação mais completa.
No exame abdominal devemos fazer a inspeção, ausculta, palpação e percussão (nessa ordem). Pode se realizar também alguns testes clínicos, como sinal de Murphy (sinal de sensibilidade peritoneal com colecistite aguda); sinais iliopsoas e obturadores.
Os sinais físicos podem ser reduzidos em idosos, grosseiramente obesos, gravemente doentes e pacientes em terapia com corticosteróides.
-Tratamento:
O tratamento é dependente da etiologia da dor abdominal. Deve-se verificar sinais vitais e estabilidade clínica com monitorização para pacientes com condições potencialmente instáveis. É importante fazer dois acessos calibrosos, com coleta de exames e tipagem sanguínea, em caso de dor abdominal severa.
O objetivo do manejo do abdome agudo, principalmente no departamento de emergência, é descartar patologias com risco maior para o paciente como o abdome agudo cirúrgico. Os pacientes podem receber medicações sintomáticas como analgésicos e antiespasmódicos como a combinação de dipirona e hioscina. Mas em casos de dor incontrolável, pode usar morfina, 0,05 mg/kg a cada 20 minutos até controle da dor (cuidado com pacientes com náuseas e vômitos, pois o medicamento pode piorar esses sintomas podem piorar). Em pacientes com quadros de litíase urinária, podemos usar anti-inflamatórios.
Há uma menor probabilidade de que a dor abdominal com duração de mais de 48 horas precise de cirurgia em comparação com a dor de menor duração. Um paciente com patologia cirúrgica aguda pode piorar rapidamente. Dessa maneira, os sintomas graves persistentesnas primeiras horas requerem uma cuidadosa investigação e um acompanhamento de perto. Além disso, pode-se considerar a laparoscopia diagnóstica para os pacientes clinicamente estáveis e que não foram submetidos à cirurgia por falta de uma causa óbvia. A laparoscopia diagnóstica pode ser considerada em pacientes selecionados. A laparoscopia não apenas é uma ferramenta útil para o diagnóstico, mas é cada vez mais usada como uma modalidade terapêutica de escolha para condições como apendicite, colecistite, lise de adesão, reparo de hérnia e muitas causas ginecológicas de abdome agudo.
· Antiemeticos
Os anti-histamínicos H1 também podem ser utilizados no tratamento da cinetose, náusea e vômitos associados à quimioterapia e insônia. Ao inibir os sinais histaminérgicos do núcleo vestibular para o centro do vômito na medula oblonga, os anti-histamínicos H1 como o dimenidrinato, a difenidramina, a meclizina e a prometazina mostram-se úteis como agentes antieméticos. Em virtude de seus efeitos depressores proeminentes no SNC, os anti-histamínicos H1 de primeira geração, como a difenidramina, a doxilamina e a pirilamina, também são utilizados no tratamento da insônia.
A ondansetrona é um antagonista do 5HT3R. Esse fármaco possui interesse particular, visto que, entre todos os receptores monoamínicos atualmente identificados, apenas o 5HT3R é receptor ionotrópico que pertence à superfamília de receptores pentaméricos nicotínicos de acetilcolina. Os 5HT3R são expressos no sistema nervoso entérico, nas terminações nervosas do vago e no SNC, particularmente na zona de gatilho quimorreceptora. A ondansetrona é um poderoso antiemético, que é especificamente utilizada como adjuvante na quimioterapia do câncer ou em casos de náusea refratária. Em virtude de seu mecanismo de ação, exerce pouco efeito sobre a náusea provocada pela vertigem.
Por vezes, a linha que separa o abuso do uso indevido é indistinta. Por exemplo, a maconha, que durante muito tempo foi considerada droga de abuso, vem tendo seu uso terapêutico legitimado como antiemético em pacientes submetidos à quimioterapia contra câncer; alguns estados permitem a prescrição da maconha para esse fim.

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