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Aula 1: Doenças do Esôfago 1. Disfagia e Dispepsia a) Disfagia = dificuldade de deglutição A disfagia pode ser de dois tipos: a que ocorre no início da deglutição e a que ocorre do meio para o final. 1- Disfagia orofaríngea = transferência O paciente, nesse caso, tem dificuldade de iniciar a deglutição, ou seja, ele engasga – há regurgitação nasal e traqueal e consequentemente tosse. É a disfagia relacionada com o musculatura estriada (1/3 superior), ou seja, SNC. É a porção do esôfago que conseguimos controlar, então em um paciente com AVE por exemplo pode ocorrer este tipo de disfagia. 2- Disfagia esofagiana = de condução A dificuldade, nesse caso, está no transporte dos alimentos pelo esôfago até o estômago. Geralmente é relatada como uma sensação de interrupção e estagnação do bolo alimentar, ou seja, o paciente se sente entalado. Aqui, há relação com os 2/3 inferiores de musculatura lisa, ou seja, SNA. É a disfagia da gastrologia. b) Dispepsia = queimação Há 2 tipos de dispepsia: no esôfago, por não ser preparado para receber conteúdo ácido e no estômago, por não estar adequadamente protegido. A dispepsia ocorre principalmente por distúrbios no EEI. · Esôfago = pirose: queimação retroesternal · Estômago = azia: queimação epigástrica 2. Distúrbios Motores Doenças da peristalse = acalasia e espasmo esofagiano difuso. 2.1 Acalasia A acalasia, termo que significa “não relaxamento” é o distúrbio motor primário mais comum do esôfago. Pode ocorrer em pacientes jovens. a) Patogenia As alterações encontradas na acalasia são decorrentes da degeneração do plexo de Auerbach, o grande responsável pela coordenação motora do esôfago. A disfagia costuma surgir insidiosamente, desenvolvendo-se ao longo de meses ou anos. Pode ser primária ou secundária. · Primária: idiopática – mais comum · Secundária: Chagásica – nas questões é sempre importante observar se o paciente vem ou não de área endêmica b) Manifestações clínicas · Disfagia de condução · Perda de peso em anos: no CA a perda de peso ocorre em meses, sendo um diagnóstico diferencial a ser descartado inicialmente · Tríade clássica: disfagia, regurgitação e emagrecimento Obs.: o paciente pode ter halitose, mas essa é mais comum e mais marcada nos pacientes com divertículo de Zenker (mais próximo da boca). c) Diagnóstico 1- Esofagomanometria = padrão-ouro É o principal exame diagnóstico. Os principais achados manométricos na acalasia são: · Aperistalse: as ondas tem peristalse tem a amplitude reduzida · Não relaxamento do EEI: é o achado mais importante e que caracteriza a doença · Graus variados de hipertonia do EEI 2- EDA: útil para fazer o diagnóstico diferencial com CA de esôfago (afastar) 3- Esofagografia baritada: faz o estadiamento da acalasia, mostrando o quanto o esôfago está dilatado e guiando o tratamento. É através dela que se faz a classificação de Rezende-Mascarenhas. · Dilatação do corpo esofágico (megaesôfago) · Imagem de estreitamento em bico de pássaro ou chama de vela na topografia do EEI · Atraso no esvaziamento esofagiano · Presença de contrações esofagianas não peristálticas d) Tratamento O objetivo do tratamento é promover o relaxamento do EEI e será decidido a partir da classificação de Rezende-Mascarenhas. Classificação Rezende-Mascarenhas Conduta Grau 1 Forma anectásica: esôfago normal < 4cm Medicamentoso Nitrato, nifedipina, botóx (duração de 3-6 meses) Grau 2 Esôfago discinético: entre 4-7cm – megaesôfago leve Dilatação pneumática por balão em EEI Grau 3 Esôfago fracamente dilatado: entre 7-10cm – megaesôfago clássico Cardiomiotomia a Heller +/- fundoplicatura para evitar refluxo Grau 4 Dolicomegaesôfago: > 10cm Esofagectomia: abordagem cérvico-abdominal (menos agressiva) É um fator de risco para CA 2.2 Espasmo Esofagiano Difuso O espasmo esofagiano difuso é um distúrbio na motilidade esofágica de etiologia neurogênica, no qual o peristaltismo normal é substituído por intensas contrações não propulsivas, principalmente nos 2/3 inferiores do esôfago. a) Patogenia Ocorrem contrações esofágicas simultâneas, vigorosas e longas que podem ter como gatilho estresse e até mesmo alguns alimentos. b) Manifestações clínicas · Dor retroesternal: cólica esofagiana – faz diagnóstico diferencial com IAM (pedir enzimas cardíacas + ECG na abordagem), então é muito importante reconhecer essa possibilidade · Disfagia de condução: para líquidos e sólidos c) Diagnóstico 1- Esofagomanometria: é o melhor exame para avaliação objetiva. No entanto, ele não consegue por si só flagrar o espasmo, sendo então necessário um teste provocativo (com betanecol, ingestão de alimentos sólidos, entre outros). · Contrações descoordenadas · Vigorosas / de grande amplitude: P > 120mmHg · Prolongadas: > 2,5 seg · Repetitivas 2- EDA: normal 3- Esofagografia baritada: durante a crise, observa-se esôfago em saca-rolhas d) Tratamento · Conservador: ansiolíticos (única classe medicamentosa que mostrou efetividade), nitratos, nifedipina, antidepressivos tricíclicos (amitriptilina) · Em último caso, quando houver sintomas incapacitantes e refratários: esofagomiotomia longitudinal Obs.: quando amplitude pressórica ≥ 180mmHg = esôfago em quebra-nozes 3. Distúrbios inflamatórios 3.1 DRGE: Doença do Refluxo Gastroesofágico a) Aspectos gerais · Corresponde a 75% das esofagopatias · Sua prevalência aumenta com a idade, apesar de poder aparecer em qualquer idade · Os sintomas tendem a ser mais frequentes e intensos na vigência de obesidade, assim como na gestação (a progesterona promove o relaxamento do EEI + aumento na pressão intra-abdominal) b) Patogenia Existem 3 anormalidades básicas que podem originar o refluxo, que levam a perda dos mecanismos antirrefluxo. · Relaxamentos transitórios do EEI: mais comum · Hipotonia verdadeira do EEI · Desestruturação anatômica: hérnia de hiato – tende a ser mais grave (não podemos esquecer que nem todo paciente com hérnia de hiato necessariamente terá DRGE) c) Manifestações clínicas Existem 2 tipos de sintomatologia, os sintomas típicos que são aqueles provenientes do esôfago e os atípicos, que são extraesofágicos. 1- Típicos = esofagianos · Pirose = queimação retroesternal: é o principal sintoma da DRGE, ocorrendo geralmente 3h após as refeições e ao deitar · Regurgitação = percepção de um fluido salgado ou ácido na boca: pode ou não acompanhar a pirose 2- Atípicos = extraesofagianos · Erosão do esmalte dentário, aftas · Faringite: irritação da garganta, globo faríngeo · Rouquidão, tosse · Pneumonia de repetição · Otalgia Obs.: rinite não é uma manifestação atípica Uma queixa menos frequente, mas que assusta bastante o paciente é a dor precordial, que pode ser indistinguível da dor coronariana, fazendo diagnóstico diferencial com angina pectoris. A DRGE é uma das principais etiologias de “dor torácica não cardíaca”. d) Diagnóstico 1- Prova terapêutica: é o principal teste confirmatório O DRGE é uma doença simples e fácil de tratar, além de ser muito comum. Então, em pacientes com pirose pelo menos uma vez na semana por um período mínimo de 4 a 8 semanas vale a pena fazer. · É o melhor método diagnóstico · Redução sintomática > 50% após 1-2 semanas de uso – 40mg de IBP 1- pHmetria de 24h: método padrão-ouro para confirmação diagnóstica do DRGE · Indicada nos casos de dúvida, sintomas refratários ao tratamento clínico, avaliação de sintomas atípicos · Não são todos os pacientes que vão precisar da pHmetria Obs.: impedanciometria – é um exame capaz de detectar refluxo independentemente do pH do material refluído. A grande indicação de se associar impedanciometria com pHmetria está nos pacientes refratários ao tratamento com inibidores de bomba de próton = refluxos não ácidos. 2- EDA: sua principal finalidade é identificar as complicações da DRGE · Sintomas refratários ao tratamento · É indicada na presença de sinais de alarme: anemia, odinofagia, perda de peso, icterícia, disfagia, idade ≥ 45 anos · Mostraa presença de esofagite e) Tratamento 1- Medidas antirrefluxo: comportamental MEDCURSO: Gastrologia 20/05/2020 · · Elevação da cabeceira · Dieta · Esperar de 2-3h após a refeição para deitar · Evitar comer muito, fracionar a dieta: comer mais vezes ao dia, em menores quantidades · Perder peso 2- Tratamento farmacológico: IBP (omeprazol, pantoprazol) · Deve ser tomado 1x/dia 20-40mg por 8 semanas: “azois” · Tomar em jejum, 30min antes do café da manhã · Melhora da pirose em 80-90% dos casos · Se não melhorou: DOBRAR a dose do IBP – 30min antes do café da manhã e 30min antes do jantar Se mesmo dobrando a dose o paciente continuar sintomático = refratário. Obs.: antes de dizermos que o paciente é refratário, é muito importante tomarmos conhecimento de como ele está tomando a medicação – se tomar após as refeições, por exemplo, obviamente não fará efeito. 3- Tratamento cirúrgico · Objetivo: reestabelecimento da competência do EEI · Indicações: refratariedade ao tratamento clínico, sintomas recorrentes e complicações (estenose) · Refratário: não responde ao IBP, mesmo dobrando a dose · Recorrente: não vive sem IBP – ele melhora a sintomatologia, mas quando o IBP é retirado volta tudo · Complicado: estenose, úlcera · Sintomatologia extra-esofágica Obs.: paciente jovem, com sintomas importantes de refluxo gastroesofágico (com sinal de alarme, disfagia), esofagite importante e refluxo em ortostase documentado pelo pHmetria há indicação para tratamento cirúrgico nas seguintes situações: sintomas pulmonares recorrentes, impossibilidade do uso de terapia de manutenção, complicações, entre outros. · Exames pré-operatórios 1) pHmetria de 24h: o refluxo deve ser obrigatoriamente documentado por uma pHmetria de 24h = confirma – é o exame padrão-ouro 2) EDA: costuma ser feita para descartar complicações 3) Esofagomanometria: feita para selecionar o tipo de fundoplicatura = escolha da técnica – dependendo da motilidade esofágica do paciente, ele não poderá realizar a fundoplicatura a Nissen · Técnica: fundoplicatura total ou parcial 1) Total: só pode ser feita quando a manometria estiver normal, usando-se a técnica de Nissen – é a técnica de maior eficácia 2) Parcial: feita quando a manometria mostra dismotilidade esofagiana · Anterior: Dor e Thae · Posterior: Lind e Toupet Obs.: teoricamente, fundoplicaturas parciais teriam menor incidência de disfagia no pós-operatório comparadas com a total (Nissen). Entretanto, ensaios clínicos não notaram diferença na incidência de disfagia, e recidiva maior nos pacientes submetidos a fundoplicatura parcial. Sendo assim, a cirurgia de escolha na maioria dos casos continua sendo a fundoplicatura a Nissen, mesmo nos pacientes com dismotilidade – lembrando que a indicação clássica é para pacientes com boa periltalse na manometria. 3.2 Esôfago de Barret Definição: metaplasia intestinal por exposição excessiva ao ácido, havendo a substituição do epitélio escamoso normal por um epitélio colunar de padrão intestinal altamente resistente ao pH ácido. Na biópsia, um achado muito importante desse epitélio são as células caliciformes. a) Manifestações clínicas · Obesidade é fator de risco independente para EB · Pacientes costumam ser assintomáticos Obs.: H. pylori é um fator de proteção contra esôfago de Barret b) Diagnóstico · EDA: “línguas” de coloração vermelho-salmão · Biópsia: encontram-se células caliciformes – define a metaplasia intestinal c) Tratamento Sem displasia EDA de 3-5 anos Acompanhamento (?) Displasia de baixo grau EDA 6-12 meses Ressecção endoscópica Displasia de alto grau Muito difícil de diferenciar de AC in situ Ressecção/ablação endoscópica Carcinoma in situ Esofagectomia · A cirurgia antirrefluxo é capaz de controlar a progressão do esôfago de Barret, sendo superior ao tratamento com IBP Exemplo1: paciente 53 anos faz seguimento por carcinoma espinocelular de esôfago com acometimento linfonodal regional. Depois do tratamento neoadjuvante, foi realizado novo estadiamento com endoscopia e TC, não visualizando a lesão. O PET/CT mostrou linfonodo regional com captação positiva. Qual é a conduta? Esofagectomia com linfadenectomia. 4. Distúrbios neoplásicos É um CA que predomina no sexo masculino e geralmente se apresenta a partir dos 40 anos de idade. Atualmente se conhecem 2 tipos histológicos principais de câncer de esôfago: carcinoma escamoso (ou epidermoide) e adenocarcinoma. a) Fatores de risco · Escamoso = esôfago proximal: hábitos de vida (etilismo e tabagismo), HPV e acalasia · Adenocarcinoma = esôfago distal: esôfago de Barret, esofagite de refluxo (DRGE, obesidade) b) Manifestações clínicas · Principal: disfagia – inicialmente para sólidos e evolui para líquidos · Perda ponderal: achado clássico – nesse caso ocorre em meses (na acalasia ocorre em anos) c) Diagnóstico · EDA + biópsia · Esofagografia baritada: irregularidade da mucosa e súbita transição entre esôfago normal e a obstrução (“sinal do degrau”) A USG endoscópica, especialmente quando acompanhada por biópsia por aspiração com agulha fina, é o exame mais sensível para avaliar a profundidade da invasão do tumor primário, bem como comprometimento dos linfonodos regionais. d) Estadiamento e tratamento · Melhor exame para avaliar estadiamento: USG endoscópico · T1a: invasão apenas de mucosa = mucosectomia EDA · T4b ou M1: invasão de estruturas adjacentes, TU irressecável = paliação (prótese esofágica) · > T1b: esofagectomia + linfadenectomia +/- QT e RT neoadjuvante 5. Divertículo de Zenker Hipertonia do cricofaríngeo + herniação da mucosa/submucosa É um distúrbio obstrutivo. Também é referido como entalo, como se fosse uma “acalasia cricofaríngea”, pois há uma hipertonia do EES (corresponde ao músculo cricofaríngeo).Há um triângulo de fraqueza = trígono de Killian, em que a base é formada pelo musculo cricofaríngeo e as arestas pelo músculo tireofaríngeo. É um divertículo falso, formado por pulsão, ou seja, é empurrado de dentro para fora. O fato de ele ser definido como falso é por ele não possuir muscular e serosa na herniação (apenas mucosa e submudosa). · Mais comum em idosos: é um processo insidioso · Sensação de entalo: há obstrução da luz pelo divertículo Obs.: EDA é contraindicada, pois há alto risco de ruptura. a) Clínica · Clínica principal: halitose · Disfagia, regurgitação, pneumonias de repetição · Massa cervical b) Diagnóstico · Esofagografia baritada: padrão-ouro – tem que ser bário c) Tratamento · Se < 2cm: miotomia · Se ≥ 2cm: miotomia + diverticulopexia (até 5cm: prende o divertículo na fáscia pré-vertebral, fixando-o para cima e não permitindo mais o acúmulo de comida) ou ectomia (tira o divertículo e fecha-se o defeito – trígono de Killian) · Se > 3cm: EDA (miotomia + diverticulotomia) – é como se grampeasse
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