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Doutrina A Crise do Inquérito Policial: Breve Análise dos Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal AURY CELSO L. LOPES JR. Doutor em Direito Processual pela Universidad Complutense de Madrid e Professor de Direito Processual Penal da Fundação Universidade Federal do Rio Grande. I Introdução;II Análise dos sistemas de investigação preliminar;A) Considerações prévias;a) Problema terminológico;b) Caracteres determinantes: instrumentalidade e autonomia;c) Fundamento da existência da investigação preliminar;B) Órgão encarregado: investigação policial, juiz instrutor ou promotor investigador;a) Investigação preliminar policial;b) Instrução preliminar judicial juiz instrutor;c) Investigação preliminar a cargo do MP: "promotor investigador";C) Objeto e grau de cognição da investigação preliminar;D) Forma dos atos da investigação preliminar;III Contornos de um sistema "ideal" de investigação preliminar para o processo penal brasileiro;A) Investigação preliminar a cargo do MP e a figura do juiz de garantias;B) Determinar a situação do sujeito passivo;C) A necessidade de uma instrução efetivamente sumária e a pena de inutilizzabilità;D) Forma dos atos;IV Conclusões. I INTRODUÇÃO A investigação preliminar é uma peça fundamental para o processo penal. No Brasil, provavelmente por culpa das deficiências do sistema adotado (o famigerado inquérito policial), tem sido relegada a um segundo plano. Inobstante os problemas que possa ter, a fase préprocessual (inquérito, sumário, diligências prévias, investigação, etc.) é absolutamente imprescindível, pois um processo penal sem a investigação preliminar é um processo irracional, uma figura inconcebível segundo a razão e os postulados da instrumentalidade garantista. 1 Não se deve julgar de imediato, principalmente em um modelo como o nosso, que não contempla uma "fase intermediária" contraditória. Em primeiro lugar, devese preparar, investigar e reunir elementos que justifiquem o processo ou o nãoprocesso. É um grave equívoco que primeiro se acuse, para depois investigar e ao final julgar. O processo penal encerra um conjunto de "penas processuais" que fazem com que o ponto nevrálgico seja saber se deve ou não acusar. http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30047 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30049 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30051 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30053 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30055 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30057 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30059 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30061 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30063 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30065 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30067 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30069 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30071 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30073 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30075 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30077 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30079 http://www.bdr.sintese.com/NXT/gateway.dll?f=hitdoc$hitdoc_dt=document-frameset.htm$hitdoc_p=RDP/10484/10485/10487/10488/10492$hitdoc_s=contents$global=hitdoc_g_$hitdoc_g_hittotal=0$hitdoc_g_hitindex=-1$hitdoc_an=0-0-0-30081 javascript:openPopup('IDS4M01RGPCN4NN14BECDSKZKSDFUH1E2QLJP51ZRAAQVRAABJQFK','Janela-flutuante',324,216); 40 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Atualmente existe um consenso: o IP está em crise. Os juízes apontam para a demora e a pouca confiabilidade do material produzido pela polícia, que não serve como elemento de prova na fase processual. Os promotores reclamam da falta de coordenação entre a investigação e as necessidades de quem, em juízo, vai acusar. O inquérito demora excessivamente e nos casos mais complexos, é incompleto, necessitando novas diligências, com evidente prejuízo à celeridade e à eficácia da persecução. Por outro lado, os advogados insurgemse, com muita propriedade, da forma inquisitiva como a polícia comanda as investigações, negando um mínimo de contraditório e direito de defesa, ainda que assegurados no art. 5º, LV da CF, mas desconhecidos em muitas delegacias brasileiras. No meio policial, ainda domina o equivocado entendimento de que a CF é que deve ser interpretada restritivamente, para adaptarse ao modelo previsto no CPP (de 1941), e não ao contrário, com o CPP adaptandose à nova ordem constitucional. Em torno ao tema, proliferam trabalhos jurídicos. Inobstante a qualidade de muitos desses artigos, todos pecam em um mesmo aspecto: foram pontuais, limitados a analisar apenas o sujeito, ou seja, se o MP deve ou não ser a autoridade encarregada do IP. Por questão de simetria, 2 o problema jurídicoprocessual é mais bem analisado quando decomposto em três partes. No processo, o trinômio sujeito, objeto e atospermite estudar o fenômeno em toda sua dimensão. Por isso, entendemos que carece a doutrina atual de um enfoque que observe o problema na sua totalidade e que analise a instrução de forma sistemática, não só a partir do sujeito, mas também e principalmente sob o ponto de vista do objeto e dos atos. Pretendendo contribuir para o preenchimento dessa lacuna, oferecemos o presente trabalho, ainda que de forma resumida por questões óbvias. A exposição começará analisando os sistemas de instrução preliminar no plano teóricoabstrato para, a partir dessas breves considerações, chamar a atenção para determinados aspectos e sugerir um modelo ideal para o processo penal brasileiro. II ANÁLISE DOS SISTEMAS DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR A) Considerações prévias a) Problema terminológico Para definir essa atividade prévia ao processo, com uma clara conotação instrumental, os legisladores adotam diversos nomes jurídicos. Assim, denominase IP no Brasil; sumario, diligencias previas ou instrucción complementaria em Espanha, indagine preliminare na Itália; inquérito preliminar em Portugal; vorverfahrem e ermittlungsverfahren na Alemanha; l'enquete preliminaire e l'instruction na França; procedimiento preparatorio no CPP Modelo para IberoAmérica, apenas para citar alguns exemplos. Ao pretender fazer uma análise sistemática, impõese, por questão de método e rigor científico, a adoção de um termo que seja suficientemente amplo para abranger a diversidade de sistemas existentes. A expressão que javascript:openPopup('IDPSV5HY4DV5ULN4XC545DSAKI4GCHEQ31W4OTTEDE3S02EQI42IL','Janela-flutuante',324,216); nos parece mais adequada é a de instrução preliminar. O primeiro vocábulo instrução alude ao fundamento e à natureza da atividade desenvolvida. Faz referência ao conjunto de conhecimentos adquiridos no sentido jurídico de atividade de cognição e reflete a existência de uma concatenação de atos logicamente organizados, um procedimento. Para uma análise de sistemas abstratos é melhor utilizar o termo instrução do que investigação, não só pela maior abrangência do primeiro (pois pode referirse tanto a uma atividade judicial juiz instrutor como também a uma sumária investigação policial), mas também, porque seria uma incoerência lógica falar em investigação preliminar quando não existe uma investigação definitiva. RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 41 O termo de instruir vem do latim instruere, que significa ensinar, informar. Por isso, ao vocábulo instrução devese acrescentar o preliminar, para distinguir da instrução realizada também na fase processual instrução definitiva e apontar para o caráter prévio com que é levada a cabo. Preliminar vem do latim prefixo pre (antes) e liminaris (umbral da porta) expressando claramente que essa instrução vem antes da porta, antes do processo penal. Sem embargo, no Brasil é tradicional o emprego de investigação criminal. A doutrina brasileira prefere utilizar investigação, reservando instrução para a fase processual. A nosso juízo, o termo instrução pode ser utilizado desde que acompanhado do adjetivo preliminar, evitando assim qualquer confusão com a instrução definitiva realizada na fase processual. Contudo, vencidos pela tradição brasileira, tivemos que adotar a designação de investigação preliminar. Por tudo isso, em definitivo, utilizaremos indistintamente as expressões investigação/instrução preliminar, atendendo a natureza do inquérito policial e a terminologia adotada no Brasil. Chamaremos de investigação/instrução preliminar "o conjunto de atividades desenvolvidas concatenadamente por órgãos do Estado, a partir de uma notíciacrime, com caráter prévio e de natureza preparatória com relação ao processo penal, e que pretende averiguar a autoria e as circunstâncias de um fato aparentemente delituoso, com o fim de justificar o processo ou o não processo." b) Caracteres determinantes: instrumentalidade e autonomia A autonomia vem dada pela natureza dos atos levados a cabo na instrução preliminar, bem distintos daqueles praticados no processo penal, principalmente no que se refere a natureza da intervenção dos sujeitos (não existem partes), ao objeto (notíciacrime e não a pretensão acusatória) e à forma dos atos (predomínio da escritura e do segredo). Em definitivo, a autonomia está no fato de que o procedimento préprocessual pode não originar um processo penal (casos de arquivamento prévio ao exercício da pretensão acusatória), e naqueles em que o processo penal pode nascer e se desenvolver sem a prévia instrução (sistemas de instrução preliminar facultativa, como no modelo brasileiro). Ao seu lado, a instrumentalidade fundamenta porque a instrução existe. O processo penal é um meio para chegar à satisfação da pretensão jurídica acusatória, que permitirá ao Estado aplicar a pena e tornar efetivo o poder de punir. A instrução preliminar não tem como fundamento a pena e tampouco a satisfação de uma pretensão jurídica. Não faz em sentido próprio justiça, senão que tem como objetivo imediato garantir a eficácia do funcionamento da justiça. Por isso, tratase de uma instrumentalidade qualificada, pois a instrução preliminar está a serviço do instrumentoprocesso. Nesse sentido, podese perfeitamente aplicar a magistral doutrina de CALAMANDREI 3 de que estamos ante uma instrumentalidade eventual e qualificada, por assim dizer, elevada ao quadrado. É eventual porque predomina nos sistemas modernos o javascript:openPopup('IDETLEA40CTVGMIKWNFDAIGNDVENDDQHPPQPCINEFCE4EA5GRM5SOI','Janela-flutuante',324,216); caráter facultativo da instrução. É de segundo grau porque não é um fim em si mesma, mas um instrumento a serviço do instrumentoprocesso. 42 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Considerando que a instrução preliminar serve lato sensu ao processo, entendemos que seu objetivo estará cumprido tanto quando se produzir a acusação, como também quando não se produzir (non procedere). c) Fundamento da existência da investigação preliminar O fundamento da existência do processo penal é a instrumentalidade garantista e desse marco a instrução preliminar não se pode afastar. CARNELUTTI 4 defende que a "...encuesta preliminar no se hace para la comprobación del delito sino solamente para excluir una acusación aventurada". Explica o autor que para evitar equívocos a função do procedimento preliminar não deve ser entendida no sentido de uma preparação ao procedimento definitivo, mas ao contrário, no sentido de um obstáculo a superar antes de poder abrir o processo penal. Também colocando em relevo a finalidade de proteção, LEONE 5 afirma que a instrução preliminar tem duas finalidades: assegurar a máxima genuinidade das provas; evitar que o imputado inocente seja submetido ao processo, que com sua publicidade (ainda que se conclua favoravelmente a ele) constitui uma causa de grave descrédito e humilhação. Preocupado com o caráter utilitarista, MANZINI 6 afirma que a instrução preliminar deve recolher e selecionar o material que deverá servir para o processo, eliminando tudo que resulte "embarazoso, superfluo o inatendible". Basicamente, a instrução preliminar deve evitar os debates inúteis e preparar um material selecionado para os debates necessários. Partindo dessas diferentes doutrinas e considerando a instrumentalidade garantista, entendemos que das funções de averiguar e comprovar a notíciacrime, justificar o processo ou o nãoprocesso e proporcionar uma resposta estatal imediata ao delito cometido, podese extrair as três razões que fundamentam a instrução preliminar:a) Buscar o fato oculto: esclarecendo em grau de probabilidade a autoria e a materialidade. b) Salvaguardar a sociedade: ao assegurar a paz e a tranqüilidade social pela certeza de que todas as condutas possivelmente delitivas serão objeto de investigação. Essa garantia de que não existirá impunidade manifestase também através da imediata atividade persecutória estatal. javascript:openPopup('IDNE0WYPHXFFB5QY2XLYIHH1LWM51V5ORDYQCIJW13GFCVHAB1WJ','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDERCG2US5VJUKKTWBXMXZMSDUNCZ0YMLG34Z2NONCJJUOX4QUILT','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDG4DQSYHLRJ2QKZGI1SK2NKJ12D3I15T55TWPCCLCG1JZARIVYLZF','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 43 c) Evitar acusações infundadas: é a função de filtro processual, evitando que acusações sem um mínimo de verossimilhança prosperem. Além de evitar para o Estado um custo desnecessário, é especialmente importante para o sujeito passivo, pois impede que se produza toda gama de penas processuais (como a estigmatização social, o stato di prolungata ansia, etc.). B) Órgão encarregado: investigação policial, juiz instrutor ou promotor investigador A instrução preliminar está nas mãos do Estado, que poderá realizála através da Polícia Judiciária, de um Juiz Instrutor ou do MP (promotor investigador). Qualquer dos três órgãos encarregados apresentam vantagens e inconvenientes, que devem ser sopesados segundo as variáveis próprias de cada Estado, isto é, segundo os aspectos estruturais e de política interna de um país. A construção de um modelo ideal, necessariamente, deve partir do reconhecimento das vantagens e inconvenientes de cada um dos sistemas. a) Investigação preliminar policial É o modelo adotado pelo direito brasileiro, que atribui à polícia a tarefa de investigar e averiguar os fatos constantes na notíciacrime. Essa atribuição é normativa 7 e a autoridade policial atua como verdadeiro titular da instrução preliminar. No modelo agora analisado, a polícia não é um mero auxiliar, senão o titular, com autonomia para decidir sobre as formas e os meios empregados na investigação e, inclusive, não se pode afirmar que exista uma subordinação funcional em relação aos juízes e promotores. É um sistema arcaico e totalmente superado, cuja ineficiência é patente. Excepcionalmente, em países como Inglaterra, atendendo às especiais características sociais, políticas e de estrutura judicial, esse sistema pode ser considerado como satisfatório. Obviamente não é o caso do Brasil. São "vantagens" da instrução policial: a) A abrangente presença e atuação policial, que lhe permite atuar em qualquer rincão do país, dos grandes centros aos povoados mais isolados. Tal caráter confere à polícia, principalmente em países de grandes dimensões territoriais, uma nota de eficácia da perseguição, pois a polícia está em todos os lugares e sua atividade é mais ampla e penetrante que a dos juízes de instrução ou promotores. Esse foi o principal argumento dos legisladores brasileiros de 1941 Exposição de Motivos do CPP para justificar a manutenção do IP. Segundo eles, a realidade brasileira da época e as grandes dimensões territoriais impossibilitariam que o juiz de instrução pudesse atuar de forma rápida e eficaz nos mais remotos povoados, a grandes distâncias dos centros urbanos, que exigiam "vários dias de viagem". b) A polícia está mais próxima ao povo, está em todos os lugares, e por isso dispõe de meios mais rápidos e eficazes para conduzir a investigação. c) Partindo de um enfoque puramente econômico, o sistema de instrução preliminar policial é muito mais barato para o Estado. Com o salário de um juiz ou promotor, o Estado pode manter quase uma equipe policial inteira. javascript:openPopup('IDTWBJ03FX2NKKDLIU5U23RVHGNMC315PJIHKZEXNXASGWU3BOMVN','Janela-flutuante',324,216); 44 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA d) Por fim, para o governo, a instrução policial é mais vantajosa, porque o Poder Executivo dispõe totalmente do poder de mando e desmando, sem que se precise explicar o alcance negativo desse fato para a sociedade. Como "argumentos contrários", entre muitos outros, apontamos: a) A polícia é o símbolo mais visível do sistema formal de controle da criminalidade, e, em regra, representa a firstline enforcer8 da norma penal. Por isso, dispõe de uma "discricionariedade de fato" para selecionar as condutas a serem perseguidas. Esse espaço de atuação está muitas vezes na zona cinza, no sutil limite entre o lícito e o ilícito. Em definitivo, não se deve atribuir à polícia ainda mais poderes (como a titularidade da instrução), mas sim exercer um maior controle por parte dos juízes, tribunais e membros do MP. A polícia deve ser um órgão auxiliar e não o titular da instrução preliminar, pois quanto maior é o controle real dos Tribunais e do MP sobre a atividade policial, menor é essa discricionariedade, e o inverso também é verdadeiro. b) A eficácia da atuação policial está associada a grupos diferenciais, isto é, mostrase mais ativa quando atua contra determinados escalões da sociedade (obviamente os inferiores) e distribui impunidade em relação à classe mais elevada. Também a subcultura policial possui seus próprios modelos preconcebidos: estereótipo de criminosos potenciais e prováveis; vítimas com maior ou menor verossimilitude; delitos que "podem" ou não ser esclarecidos, etc. O tratamento do imputado é diferenciado, e conforme ele se encaixe ou não no perfil prefixado, o tratamento policial será mais brando e negligente ou mais rigoroso. Essa última situação é constantemente noticiada, em que a polícia, frente ao "perfil de autor ideal" daquela modalidade de delito, atua com excessivo rigor e inclusive age ilicitamente, para alcançar todos os meios de incriminação (muitas vezes inexistentes). Assim são cometidas as maiores barbáries, refletindose nas elevadas cifras da injustiça da atuação policial. c) A polícia está muito mais suscetível de contaminação política (especialmente os mandos e desmandos de quem ocupa o governo) e de sofrer a pressão dos meios de comunicação. Isso leva a dois graves inconvenientes: a possibilidade de ser usada como instrumento de perseguição política e as graves injustiças que comete no afã de resolver rapidamente os casos com maior repercussão nos meios de comunicação. d) O baixo nível cultural e econômico de seus agentes faz com que a polícia seja um órgão facilmente pressionável pela imprensa, por políticos e pelas camadas mais elevadas da sociedade. Também é responsável pelo embrutecimento da polícia e o completo desprezo dos direitos fundamentais do suspeito, que de antemão já é considerado como culpado pela subcultura policial. Por fim, a credibilidade de sua atuação é constantemente colocada em dúvida pelas denúncias de corrupção e de abuso de autoridade. javascript:openPopup('IDU2XXDBCIOW0QIWTDGZGQ03COPHRAGQGNJFMIBBXCJJL4XPFMNLN','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 45 A discricionariedade de fato da polícia é uma realidade que viola completamente qualquer ideal de igualdade jurídica. Como apontam FIGUEIREDO DIAS e COSTA ANDRADE, 9 ela possui algumas variáveis: a) Gravidade do delito a discricionariedade da polícia varia conforme a gravidade do delito, de modo que a eficácia aumenta nos delitos graves. Mas o próprio conceito de gravidade varia conforme o grau cultural e as circunstâncias sociais do agente policial. Por isso, a escala de gravidade do policial de rua é diferente da realizada pelo juiz ou promotor. Também existe uma tendência de valorar mais os delitos de impacto social imediato em detrimento dos delitos sem vítima concreta ou afastados da sua realidade, como podem ser osdelitos econômicos (whitecollar). b) A atitude do denunciante10 a polícia evita de forma sistemática a perseguição de delitos contra a vontade expressa da vítima (ainda que públicos e incondicionados) solucionando de forma unilateral entre as partes materiais (principalmente em delitos contra o patrimônio ou de pequena gravidade). c) Distância social da polícia pode ocorrer um distanciamento entre a realidade social da polícia e a subcultura onde se produz o delito. Dessa forma, quanto maior é o nível profissional e burocrático da polícia, maior será a dificuldade de averiguar os delitos cometidos nas favelas. No sentido inverso, os agentes de uma delegacia no meio de um bairro pobre tendem a absorver os critérios e as tendências subculturais do meio. Nos dois casos é patente o prejuízo do princípio da legalidade. d) Atitude do suspeito o ponto nevrálgico da atuação policial não é a razão, mas sim o poder. Por isso, a polícia tende a ser mais compreensiva e menos rigorosa com os suspeitos que exibem humildade, postura servil e respeito à "autoridade". No sentido inverso, o tratamento será duro para os que adotem uma atitude contrária e, principalmente, apresentem uma postura desafiante, independente de sua culpabilidade ou inocência. O fato de pretender exercer um determinado direito como o de defesa muitas vezes é interpretado como um desafio ao poder e à autoridade, ocasionando graves prejuízos para o suspeito. e) Relação com os Juízes, Tribunais e o MP entre a polícia e os membros da Magistratura e do MP existe um contraste substancial no que se refere à situação econômica, cultural e, principalmente, concepção do Direito e da própria sociedade. Os membros da polícia em geral pertencem e/ou são provenientes dos estratos mais baixos da sociedade e revelam um grande apego ao positivismo e à rigidez da norma (que lhes convém), identificandose facilmente com movimentos como o law and order e o chamado EstadoPolicial (em contraste com o Estado de Direito). Como conseqüência, tendem a ser menos respeitosos com os direitos fundamentais do imputado e a censurar a postura dos Tribunais como excessivamente benevolente com os que eles consideram "delinqüentes". A presunção de inocência é uma fantasia retórica, vista como uma demagógica criação política e, por isso, é totalmente menosprezada pelos policiais. Os juízes e promotores são vistos como burocratas, que não compreendem a "justiça de rua" e acabam por desmoralizar em juízo o trabalho policial. Isso, além de criar um descompasso entre autoridades que deveriam caminhar num mesmo sentido, pode acabar gerando animosidades e graves prejuízos para o esclarecimento do fato. Em definitivo, essa falta de entrosamento só pode gerar uma coisa: elevar os índices de criminal case mortality e as cifras da injustiça. javascript:openPopup('ID2ZV2VB3GRUVJLKSCW0AQXLIT0O5J54ZFTDFUZHQMBS2VRZ2BJYC','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID5XI0VI3KZNCEEXZL2DVHWGPQGIAC5LDCB5NPJJG1MKQHYDRAQQU','Janela-flutuante',324,216); 46 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA f) Interiorização das normas legais a polícia assimila as normas de forma completamente diferente dos juízes e promotores e isso influi no grau e na forma do intervencionismo policial. A grande maioria das normas constitucionais de proteção ou garantia do sujeito passivo são interpretadas no meio policial de forma restritiva, numa atitude de resistência aos avanços democráticos da CF. Interpretar as normas constitucionais de forma a adaptálas ao CPP, restringindo com isso a esfera de proteção, e não ao contrário como deve ser, é uma realidade constante nas delegacias de todo país. Em nome do poder, habitualmente a polícia nega efetividade às garantias constitucionais. Ademais, nas comunidades afastadas dos centros de produção legislativa, a polícia tende a adaptar a norma ao perfil da pequena comunidade, ainda que não seja essa a melhor interpretação ou aplicação. g) Poder relativo do infrator não existem dúvidas de que o status econômico e social do suspeito influi definitivamente na atividade policial, até porque a polícia é muito mais suscetível de pressões políticas e econômicas. Existe uma "distribuição diferenciada da imunidade" e também um diferente grau de respeito pela imagem, privacidade, integridade e direitos fundamentais do imputado. A polícia normalmente desenvolve suas atividades junto a uma determinada classe da população (por suposto a mais baixa) e isso faz com que existam os "clientes preferenciais" sobre os quais ela exerce seu poder e faz valer sua autoridade com máxima severidade. Em sentido inverso, frente a um indivíduo de uma classe sociocultural elevada, a atuação policial poderá ir para um dos dois perigosos extremos: a conivência ou o arbítrio. No último caso, frente a uma posição de superioridade (social e econômica), liberdade de atuação e falta de servilismo, o policial pode submeter o indivíduo a toda classe de cerimônia degradante, excessivo rigor e arbítrio. Toda essa gama de problemas que possui a instrução policial leva ao necessário descrédito probatório do material recolhido e à necessidade de completa repetição em juízo. Pior ainda, não cumpre com sua função principal: aclarar em grau de probabilidade a notíciacrime para fundamentar o processo ou o nãoprocesso. Como relação ao nosso inquérito policial, podese afirmar, ademais de todas as críticas anteriormente feitas, que: Não serve para o MP, pois ao ser levado a cabo por uma autoridade diversa daquela que irá exercer a ação penal, não atende a suas necessidades. Além disso, é patente o descompasso na relação promotor policial. RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 47 Não serve para a defesa, pois a polícia nega qualquer possibilidade de o sujeito passivo participar da investigação e solicitar diligências de descargo. Também, em regra geral, a autoridade policial nega arbitrariamente o contraditório e o direito de defesa (ainda que em grau mínimo e previsto na Constituição). Não serve para o juiz, porque a própria forma de atuar da polícia não permite dar maior credibilidade ao material recolhido. Por isso, entendemos que existe uma crise da instrução policial, e mais concretamente, do nosso IP, exigindo uma imediata revisão de sua estrutura e titularidade. Para isso, contribuirá a análise dos modelos de instrução preliminar a cargo do juiz e do promotor, como se verá a continuação. b) Instrução preliminar judicial juiz instrutor O juiz instrutor é o principal protagonista nesse modelo de instrução preliminar e detém todos os poderes necessários para levar a cabo toda a investigação que buscará aportar os elementos necessários para o processo ou o nãoprocesso. Ao contrário do que pensam alguns defensores do modelo, nesse sistema a prova não é apenas produzida na presença do juiz instrutor, senão que é colhida e produzida por ele mesmo. O juiz de instrução obra como um verdadeiro investigador, atuando de ofício e sem estar submetido ou vinculado a petições do MP ou da defesa, que são meros colaboradores. Caberá a ele decidir sobre a utilidade das diligências solicitadas para os fins da investigação, denegando as que, a seu juízo, forem desnecessárias. Para levar a cabo essa atividade de investigação, é imprescindível que à sua disposição esteja a polícia judiciária, totalmente dependente no aspecto funcional. Cumpre destacar que nos delitos públicos, o juiz de instrução poderá atuar de ofício inclusive para adotar medidas cautelares pessoais ou reais ainda que contra a vontade do MP. Dessa forma, o instrutor poderá investigarmesmo que o titular da futura ação penal entenda que não existem motivos razoáveis para isso. Em síntese, o juiz de instrução é o titular da instrução preliminar e cabe a ele receber direta ou indiretamente a notíciacrime, buscar as fontes de informação e investigar os fatos apontados. Dirigirá de perto a atividade policial e atuará pessoalmente, indo ao local do delito, determinando as perícias necessárias, interrogando os suspeitos, ouvindo a vítima e testemunhas, etc. Antes de apontar as vantagens e inconvenientes desse sistema, cumpre destacar o grave problema que representa essa figura do juizinvestigador para a imparcialidade. Atualmente, na maior parte dos países em que é adotado esse sistema existe uma presunção absoluta de parcialidade do instrutor, de modo que "o juiz que instrui jamais poderá julgar" a causa. Os diversos prejulgamentos que ele efetua no curso da instrução levam à prevenção como causa de exclusão de sua competência para julgar o futuro processo. Principais "vantagens" do sistema judicial de instrução preliminar: a) A imparcialidade e independência do juiz instrutor é uma garantia de que a instrução preliminar não servirá por exemplo como instrumento de perseguição política por parte do Poder Executivo. b) O fato de ser a investigação conduzida por um órgão suprapartes. 48 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA c) Maior efetividade da investigação e qualidade (credibilidade) do material recolhido. d) O produto final poderá servir tanto para a acusação como também à defesa, pois advém de um órgão imparcial e preocupado em aclarar o fato, tanto buscando as provas de cargo como também as de descargo. e) Garantia de que o juiz que instrui não julga e a observância do princípio de nullum iudicium sine accusatione. f) Na investigação é necessário adotar medidas que limitam direitos fundamentais (cautelares, busca e apreensão, etc.) e que por essa razão necessitam que sejam adotadas por um órgão com poder jurisdicional. Logo, nada melhor que seja o próprio titular da instrução dotado desse poder. Alguns dos graves "inconvenientes" que apresenta o juiz de instrução: a) É um modelo superado e intimamente relacionado à figura histórica do juiz inquisidor, pois sua estrutura outorga a uma mesma pessoa as tarefas de (ex officio) investigar, proceder à imputação formal (o que representa uma acusação lato sensu) e inclusive defender. Isso levou a uma crisis de la instrucción preparatoria y del juez instructor, 11 pois esse modelo é apontado como o mais grave impedimento à plena consolidação do sistema acusatório. b) O grave inconveniente que representa o fato de uma mesma pessoa decidir sobre a necessidade de um ato de investigação e valorar a sua legalidade. 12 Nesse sentido, a Exposição de Motivos do Código Processual Modelo para IberoAmérica aponta que "não é suscetível de ser pensado que uma mesma pessoa se transforme em um investigador eficiente e, ao mesmo tempo, em um guardião zeloso da segurança individual; o bom inquisidor mata o bom juiz ou, ao contrário, o bom juiz desterra o inquisidor". c) Transforma o processo penal (lato sensu) em uma luta desigual entre o inquirido, o juizinquisidor, o promotor e a polícia judiciária. Essa patologia judicial 13 acaba por criar uma grave situação de desamparo, pois se o juiz é o investigador, quem atuará como garante? d) Por vício inerente ao sistema, a instrução judicial tende a se transformar em plenária, comprometendo seriamente a celeridade que deve nortear a fase préprocessual. javascript:openPopup('IDBIZGLXLOLABOMFF1NJBXYRL4PC2MUXCXLYPC1PBYBMEFFZGWEHJJ','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDTTHBI0RGU4WBL51LMVWGLLSHTIXKRK0TKFDZOXEW0CQRA3WVUIAO','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDOJ0SCJI5IBABEJ4OYFJWRJKQPI5LPFFGK5W2R1GLJQI2UOPZE2MF','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 49 e) Representa uma gravíssima contradição 14 lógica, pois o juiz investiga para o promotor acusar, e o pior, muitas vezes contra ou em desacordo com as convicções do titular da futura ação penal. Em definitivo, se a instrução preliminar é uma atividade preparatória que deve servir, basicamente, para formar a opinio delicti do acusador público, deve estar a cargo dele e não de um juiz, que não pode e não deve acusar. f) Gera uma confusão entre as funções de acusar e julgar, com inegável prejuízo para o processo penal. g) Por fim, outro grave problema da instrução judicial está no fato de converter a instrução preliminar em uma fase geradora de provas, algo absolutamente inaceitável frente ao seu caráter inquisitivo. A maior credibilidade que normalmente geram os atos do juiz instrutor pode levar a que a prova não seja produzida no processo, mas meramente ratificada. O resultado final é a monstruosidade jurídica de valorar na sentença elementos recolhidos em um procedimento preliminar em que predomina o segredo e a ausência de contraditório e defesa. Não se pode olvidar que a instrução preliminar serve para aclarar o fato em grau de probabilidade, e está dirigida a justificar o processo ou o nãoprocesso, jamais para amparar um juízo condenatório. c) Investigação preliminar a cargo do Ministério Público: "promotor investigador" Atualmente, existe uma tendência de outorgar ao MP a direção da instrução preliminar, de modo a criar a figura do promotor investigador, que poderá obrar pessoalmente e/ou por meio da Polícia Judiciária (necessariamente subordinada a ele). A instrução preliminar a cargo do MP tem sido adotada nos países europeus como um substituto ao modelo de instrução judicial anteriormente analisado. Nesse sentido, a reforma alemã de 1974 suprimiu a figura do juiz instrutor para dar lugar ao promotor investigador. A partir de então, outros países, com maior ou menor intensidade, foram realizando modificações legislativas nessa mesma direção, como sucedeu, v.g., na Itália (1988) e em Portugal (1987 e novamente em 1995). Na Espanha, a Lei Orgânica (LO) 7/88, que instituiu o procedimento abreviado, deu os primeiros passos nessa direção, ao outorgar ao fiscal maiores poderes na instrução preliminar. Sem embargo, é fundamental frisar, ao contrário do que afirma equivocadamente alguma doutrina brasileira mal informada, "na Espanha ainda vigora o sistema de juiz instrutor", pois as alterações legislativas, ao mesmo tempo em que atribuíam mais poderes ao promotor, não romperam com a tradição da instrução judicial. O que existe na atualidade é que o promotor até pode iniciar e praticar atos de investigação, mas a partir do momento em que o juiz de instrução passar a atuar, ele automaticamente assume o mando 15 total da instrução preliminar, devendo o fiscal remeter para ele todas as informações obtidas e cessar sua intervenção. Apesar de existir uma tendência de implementar os poderes da Fiscalia, a figura do juez de instrucción não foi abandonada. javascript:openPopup('IDSDLS4V2CN1LMJMZYKHHWITBY4L15NE2WONE45VLXQMNRNT3BNXEE','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID5HQHQF3HXOCXHKZB4KR1G2VDUC5TSNQN2IUDJTDQHNG1WBNNGR5M','Janela-flutuante',324,216); 50 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Nesse modelo de instrução, o promotor é o diretor da investigação, cabendolhe receber a notíciacrime diretamente ou indiretamente (através da polícia) e investigar os fatos nela constantes. Para isso, poderá dispor e dirigir a atividade da Polícia Judiciária (dependência funcional), de modo que tanto poderá praticar por si mesmo as diligências, como determinar que as realize a polícia segundo os critérios que ele (promotor) determinou.Assim formará sua convicção e decidirá entre formular a acusação ou solicitar o arquivamento (visto como nãoprocesso em sentido lato). Em regra (e assim é aconselhável que seja), dependerá de autorização judicial para realizar determinadas medidas limitativas de direitos fundamentais, como podem ser as medidas cautelares, entradas em domicílios, intervenções telefônicas, etc. Caberá ao juiz da instrução (que não se confunde com a anterior figura do juiz instrutor) decidir sobre essas medidas. Esse juiz atua como um verdadeiro órgão suprapartes, pois não investiga, senão que intervém quando solicitado como um controlador da legalidade (e não da conveniência) dos atos de investigação levados a cabo pelo promotor. A essa figura denominamos juiz garante da instrução preliminar. Para seus defensores, o sistema de promotor investigador surge como uma salvação ante a crise e a superação do modelo de juiz instrutor. Como "principais vantagens" da instrução preliminar a cargo do MP, destacamos: a) Representa uma aproximação à estrutura dialética do processo, apesar de algumas naturais limitações da publicidade e do contraditório (que seriam inerentes à própria natureza da instrução preliminar). b) Essa instrução preliminar do acusador é uma imposição do sistema acusatório, pois mantém o juiz longe da investigação e garante a sua imparcialidade 16 (ao juiz cabe julgar e não investigar). Com isso, cumprese com os postulados garantistas do nullum iudicium sine accusatione e ne procedat iudex ex officio. Em última análise, o sistema fortalece a figura do juiz, cuja atividade na instrução fica reservada a julgar (decidindo sobre as medidas restritivas e a admissão da própria acusação). c) A imparcialidade do MP leva à crença de que a investigação buscará aclarar o fato a partir de critérios de justiça, de modo que o promotor agirá para esclarecer a notíciacrime resolvendo justa e legalmente se deve acusar ou não. Inclusive deverá diligenciar para obter também eventuais elementos de descargo, que favoreçam a defesa. 17 Na síntese de GUARNIERI, 18 o MP constituye una figura que si bien tiene el cuerpo de parte, ofrece el alma de juez. javascript:openPopup('ID5PEROVLFSKWNYBBITEN0R4MBNWJQ3RZOWSJUQE0FZLQAGYTZDIN','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDMQGMFMEUENKHHXMI0ZFWBZPWBFJJJDIK4BJW35ECMIYTEFIE21YK','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDSW3DPBPRH2OHI3RTSOFAY5ZREPG3B2H54PSTV5KWACWMMBYG312B','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 51 d) A própria natureza da instrução preliminar, como atividade preparatória ao exercício da ação penal, deve, necessariamente, estar a cargo do titular da ação penal. Por isso, deve ser uma atividade administrativa dirigida por e para o MP, sendo ilógico que o juiz (ou a polícia em descompasso com o MP) investigue para o promotor acusar. Em resumo, melhor acusa quem por si mesmo investiga. e) Como atividade destinada a formar um juízo sobre o processo ou o nãoprocesso, a instrução preliminar a cargo do MP tende a ser, verdadeiramente, uma cognição sumária. Com isso, também se evita que os atos de investigação sejam considerados como atos de prova e, por conseqüência, valorados na sentença. f) A impossibilidade de que o MP adote medidas restritivas de direitos fundamentais distribui melhor o poder (antes concentrado nas mãos do juiz instrutor) e permite criar a figura do juiz garante da instrução, como instância judicial de controle da legalidade dos atos de investigação. Em suma, representa uma melhor distribuição do poder, e com isso beneficia a situação jurídica do sujeito passivo e evita o autoritarismo típico da estrutura inquisitiva do juiz instrutor. Como "argumentos contrários" a esse sistema de instrução preliminar: a) Historicamente, o modelo está associado ao utilitarismo judicial, o combate da criminalidade a qualquer custo, pretendendo o Estado justificar os fins com o uso abusivo dos meios. Nesse sentido, a reforma processual levada a cabo na Alemanha em 1974 19 foi produto da pressa do legislador em combater o terrorismo do grupo BaaderMeinhof. O que importava era dar armas para a acusação, aumentando a eficácia da instrução quanto ao fim punitivo pretendido, ainda que com claros prejuízos para o sujeito passivo. No mesmo sentido, a Itália do pósguerra estava completamente assolada pela corrupção dos órgãos públicos, a máfia e o crime organizado. A reforma realizada em 1988 pretendia, de uma vez por todas, mudar esse panorama a qualquer custo. E os frutos não tardaram. Já em 1992, quando o promotor ANTONIO DI PIETRO começa a investigar um "caso de menor importância" culmina por colocar em relevo um escândalo de corrupção política sem precedentes (tangentópolis). A partir de então, a operazione mani pulite inicialmente levada a cabo por sete promotores de Milão e posteriormente por uma ampla equipe processa em menos de um ano a seis ministros e mais de uma centena de parlamentares e os dirigentes das mais importantes empresas da Itália. Em 1997, esse número é elevado a cinco mil pessoas, os interrogatórios passam de vinte mil e as cartas rogatórias a outros países superam as quinhentas. 20 São números elevados e preocupantes, não só pelo nível de criminalidade que representam, mas principalmente porque por trás deles está uma elevada cifra da injustiça (pessoas inocentes injustamente submetidas ao processo). O que parece ser a supremacia da lei reflete na realidade o império do MP. As cifras indicam não só uma suposta eficácia da perseguição, mas também reais e elevadas cifras dos casos de abuso de autoridade, perseguição política, desnecessária estigmatização e todo tipo de prepotência. Em síntese, é um modelo típico de utilitarismo judicial, de um Estado de Polícia e não de um Estado de Direito. javascript:openPopup('IDTDQ4YBRLWO5WO0UKA0EYK2JEADD2GZYN5VIYQQFGN0IN1FFUBS5H','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDJO1K4HG3VA4QHRMHAJY2EAPHPGYACDRZI2ZDURLF4YMTAER51M3J','Janela-flutuante',324,216); 52 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA b) Levada ao extremo, a transferência de poderes faz com que o juiz instrutor deixe de ser o temível, e passa a sêlo o promotor, gerando a não menos criticável inquisição do próprio acusador. 21 c) O argumento da imparcialidade do MP é uma frágil construção técnica facilmente criticável, pois é contrário à lógica pretender a imparcialidade de uma parte. Provavelmente o maior crítico foi CARNELUTTI, 22 que frisava a impossibilidade da "quadratura do círculo: Não é como reduzir um círculo a um quadrado, construir uma parte imparcial?" Para o autor, o MP é um juiz que se faz parte, mas ao invés de ser uma parte que sobe, é um juiz que baixa. Em outra passagem, CARNELUTTI 23 explica que se o MP exercita verdadeiramente a função de acusador, querer fazer dele um órgão imparcial não representa no processo mais que "una inútil y hasta molesta duplicidad". Além disso, o MP é uma parte fabricada para cumprir com os requisitos do sistema acusatório, para ser o contraditor natural do imputado. Só assim nasce o conflito do qual brota a luz da verdade para o juiz. Logo, a pretendida imparcialidade do MP vai de encontro à necessidade natural de sua existência. Como golpe derradeiro, J. GOLDSCHMIDT 24 explica que essa exigência de imparcialidade dirigida a uma parte acusadora "cae en el mismo error psicológico que ha desacreditado el proceso inquisitivo". A pergunta que surge é: em que difere a inquisição do promotor daquela realizada pelo juiz instrutor? Que "mecanismos" subjetivosde proteção tem o promotor e de que carece o juiz instrutor? Em síntese, o argumento da imparcialidade de uma parte acusadora não se sustenta. d) Somente um MP institucionalmente calcado na independência em relação ao Poder Executivo e sem que exista hierarquia funcional interna pode ser o titular da instrução preliminar, sob pena de contaminar politicamente o processo penal com os mandos e desmandos do governo. E isso nos leva a um questionamento: se para atribuir a instrução ao MP é necessário dotálo das garantias de um autêntico juiz, por que não encarregar logo a um juiz instrutor? javascript:openPopup('IDYSOQKRWDADAYBWMMRHLBWGXXTPNKVHFRD3LIZNI0CPZ5GZMZXK0J','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID3OKDP0ZB1Q4ILFUWNSGSTB2GJIKXE5YJP15KMHC1UBPRYTJPBPAI','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDGJLMS1IKLCJUNOEG1GJKHDXZUK3O1JKM55VGNOJ3UO2QNVTILDKG','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDXIWLWB3NSGXPGOTKUICNQZXSHFJX3AS2YSUY1LOC5BWFBRPCOQAK','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 53 e) Na prática, o promotor atua de forma parcial e não vê mais que uma direção. Como afirma GUARNIERI, 25 por sua própria índole, o promotor está inclinado a acumular tãosomente provas contra o imputado. Ao transformar a instrução preliminar numa via de mão única, estáse acentuando a desigualdade das futuras partes, com graves prejuízos para o sujeito passivo. É convertêla em uma simples e unilateral preparação da acusação, uma atividade minimalista e reprovável, com inequívocos prejuízos para a defesa. f) Por fim, cumpre destacar que o fato de atribuir normativamente a instrução preliminar ao MP não significa que ela será efetivamente levada a cabo pelo parquet (eterna luta entre normatividade e efetividade). Como foi constatado em um estudo realizado pelo Instituto MaxPlanck de Freiburg em 1978, 26 nos países cuja instrução preliminar está nas mãos do MP como na Alemanha na grande maioria dos casos ela realmente havia sido realizada inteiramente pela Polícia Judiciária, sem qualquer intervenção do MP. O promotor só toma conhecimento depois que as atuações policiais já estão conclusas, e como já está acabado o trabalho caráter inibitório ele não investiga e se conforma com o material apresentado. Como aponta ARMENTA DEU, 27 constitui uma prática habitual que a investigação recaia exclusivamente sobre a polícia, limitandose o MP a uma mera revisão formal posterior. Em definitivo, representa uma volta ao famigerado sistema de instrução preliminar policial. C) Objeto e grau de cognição da investigação preliminar O objeto 28 da instrução preliminar não é o seu fim, mas sim a matéria sobre a qual recai o complexo de elementos que a integram, isto é, os fatos narrados na notitia criminis ou obtidos ex officio29 pelos órgãos de investigação estatal. Delimitado o objeto, cumpre verificar o nível ou grau de conhecimento do objeto que se pretende obter com a instrução preliminar. Para isso, devemos levar em consideração seu caráter instrumental e preparatório relacionado ao processo penal, isto é, que a instrução não é um fim em si mesma. Ademais, existe uma íntima relação entre o nível de conhecimento que se busca e a natureza dos atos que devem ser praticados para alcançar esse conhecimento. Outra importante relação está entre o grau da cognição e a natureza do juízo que se pretende: juízo de verossimilhança ou de certeza. Assim, classificamos a instrução preliminar em: a) Plenária: é aquela que se produz nos sistemas em que o conteúdo da fase processual não é outro que o mero controle do material recolhido na instrução preliminar, pois é nesta última que se esgota totalmente a coleta da prova. Nesse sistema, a instrução preliminar não prepara o processo penal, mas objetivamente prepara a sentença, e o processo existe exclusivamente para impor a sanção penal. Dessa forma, a fase préprocessual acaba por converter se no verdadeiro juízo, com o gravame de que, em regra, não são observados o contraditório e as garantias fundamentais do sujeito passivo. É um retrocesso ao sistema inquisitivo. Nesse modelo, a instrução tem como objeto uma cognição total, plena, que pretende um juízo de segurança e não de verossimilhança. Em síntese, transforma a instrução não em um meio, mas sim um fim em si mesma. javascript:openPopup('IDIVL5TJGONFPDNAZZZUWU1JND3LVFBMIQ4NZRA1L3JQ5E004QR4MC','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDH4XDDZ0OFHBIHL1AOTLR2D401JB0VYGZ5KLTMGF4JJTUIPUBZN5P','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDM0MYBXIXKZWQB1NQBDRMK1XOJLROS3204NDB4B3O4VCS2QNUAGI','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID4J3VMGHDQLCCGGHSW5BWAUCJNFUAKEKC2NPN1TIICHIWJHFHLTI','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID5DL4OZGUEA5RD1HAWBXCD2VXWMLCOYB1LDQPHDI3AXAUDTZ0F2TD','Janela-flutuante',324,216); 54 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA b) Sumária: 30 a summaria cognitio significa uma limitação na atividade instrutória, que deve responder a uma indagine limitata o superficiale. 31 O nível de conhecimento é limitado, pois se busca um juízo de verossimilhança e não de certeza. Posteriormente, no processo, a cognição será plena, suprindo as limitações da atividade anterior. Esse juízo de verossimilitude é provisional, podendo ser alterado pelo posterior processo plenário. Inclusive, na expressão de CALAMANDREI, o procedimento sumário è dunque un provvedimento provvisorio che aspira a diventar definitivo. Ela está limitada ao imprescindível, 32 já que reserva para o processo propriamente dito a investigação dos dados complementares, assim como a sua verificação, proporcionando ao julgador o convencimento quanto à exatidão e certeza dos mesmos. Interessanos a "instrução sumária", mais de acordo com os fins da instrução preliminar e com os postulados do moderno processo penal. A sumariedade implica uma limitação, que poderá operar no plano qualitativo ou quantitativo, ou ainda em ambos. javascript:openPopup('ID3ADPVOHH1WDXM3LAJY4SBGSIFPLE3WDP5FSG0TCDHJKF2IACPZDD','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDPTVRN0GI25YMJ2KMZKL1FTZ4QGX0QIFEOY4UFHDJNNPM4FZKOSHK','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDLZRDCT3511ATIRALSQLPKKOKIC4PKTHOCKTKUOLXXVWTXOMU5RVB','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 55 A limitação qualitativa pode se operar em dois planos (vertical e/ou horizontal). 33 No processo penal, entendemos que no plano horizontal está o campo probatório, ou seja, os dados acerca da situação fática descrita na notíciacrime e sobre os quais irá recair a atividade de averiguação e comprovação. Uma limitação dessa natureza impede o instrutor (juiz, promotor ou polícia) de analisar a fundo a notíciacrime, de comprovar de forma plena todos os elementos necessários para emitir um juízo de certeza sobre a materialidade e a autoria. No plano vertical está o direito, visto como os elementos jurídicos referentes à existência formal do crime (tipicidade, ilicitude e culpabilidade). Logo, a limitação qualitativa significa que o instrutor está limitado a comprovar a verossimilhança do fato, isto é, a probabilidade do fumus commissi delicti. A antítese dessa cognição seria, no plano horizontal, a certeza sobre o fato, e no plano vertical, a certeza sobre a tipicidade, ilicitude e culpabilidade. Em definitivo, significa que a instrução preliminar está limitada à atividade mínima, 34 de comprovação e averiguação da materialidade e da autoria, necessária para justificar o exercício ou o não exercício da ação penal, isto é, para decidir sobre o processo ou o nãoprocesso. A limitaçãoquantitativa está refletida na adoção de um critério temporal, isto é, impor uma limitação temporal para a duração 35 da instrução preliminar. Não se trata propriamente de sumariedade mas sim de celeridade, e a limitação da cognição resulta da restrição temporal e não das técnicas de sumarização horizontal e vertical. É uma forma de evitar que as investigações sejam eternas ou se prolonguem excessivamente no tempo. Todavia, como critério único, é imperfeito. O sistema misto36 surge como o mais adequado, pois limita a instrução preliminar em dois aspectos: grau da cognitio (sumariedade) e tempo de duração da atividade. É, em síntese, o resultante da aplicação concomitante dos dois métodos anteriormente analisados. D) Forma dos atos da investigação preliminar Em Direito Processual, os atos devem ser analisados segundo o lugar, o tempo e a forma. Na instrução preliminar, o lugar e o tempo não oferecem maiores problemas. O ponto nevrálgico está na forma e nela nos centraremos. A instrução poderá ser obrigatória ou facultativa, segundo condicione o exercício da ação penal a sua prévia existência ou não. Também é possível conceber um sistema misto, em que a instrução preliminar seja obrigatória para os delitos graves e facultativa para os de menor potencial lesivo. A produção dos atos de investigação poderá ser levada a cabo oralmente ou por escrito. Como explica J. GOLDSCHMIDT, 37 a oralidade deve ser vista como o princípio de que la resolución judicial puede basarse sólo en material procesal proferido oralmente, e mantém uma íntima relação com as formas de publicidade/segredo e imediação/mediação. O contraste está na forma escrita, em que a decisão se baseia na matéria reduzida por escrito nos autos. A instrução preliminar está dirigida a uma decisão: o juízo de pré javascript:openPopup('IDEG4NCULTJSE3BLD5V3PJDJ3BZJZ20OJ3IL0JW2PP0GFMLA2MC1OE','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDDZEAA00BVVI2GPGMTBDUMQA4BNHTRRULOJRZWOM2XWREKZJO11DC','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID12EPJ4TRMTVPMILY1E45QFDZOJJL1YBLJY1L5PYMOSQT3T2VOG','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDQ3FV4AZ2NAVSI3MBXCOZHIIHWJWPPJQFFJFWXDKLCKG2PFWFK0BC','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID0TSHXA5VUUV5PE2EGX424YPHG3VRJHBR025QJZVOEHEG4U2VPN','Janela-flutuante',324,216); admissibilidade da acusação, isto é, o momento em que o juiz decide se recebe ou não a ação penal com base nos elementos recolhidos na instrução preliminar. Por suposto, uma instrução verdadeiramente oral só pode existir nos sistemas em que exista uma fase intermediária contraditória. A instrução preliminar poderá ser ainda dominada pela publicidade ou pelo segredo dos atos. No plano doutrinal, explica ARAGONESES ALONSO, 38 propugnase por um sistema misto, em que sejam secretas as primeiras investigações ou nos delitos graves, e nos demais casos deve prevalecer a publicidade (principalmente a interna). Ainda, deverá ser observado se o segredo é interno ou externo, total ou parcial. Destacamos que o tema, além de crucial, é muito amplo e desborda os estritos limites do presente artigo, de modo que nos limitaremos apenas a citar, sem analisar as vantagens e os inconvenientes do segredo. javascript:openPopup('ID5VMMPSLQCX4RP0X44DT41HC2TOQQ2IY21JKZFAMCGWD1AJFTAFZN','Janela-flutuante',324,216); 56 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Sumamente importante é definir claramente a eficácia probatória dos atos da instrução preliminar. Para isso, o sistema pode considerar a atividade desenvolvida na instrução preliminar como atos de prova ou atos de investigação. Os primeiros, apesar de produzidos na fase préprocessual, integram os autos do processo e podem servir para o convencimento do juiz na sentença (juízo de certeza). Em síntese, podem amparar um juízo condenatório ou absolutório sem necessidade de repetição em juízo. Infelizmente, na prática, sob o argumento de que foram "cotejados com as demais provas" os atos do nosso inquérito acabam por converterse em atos de prova, pois costumeiramente são valorados na sentença. É um grave erro. Outros sistemas atribuem ao material recolhido na instrução preliminar o valor de meros atos de investigação, limitando sua eficácia aos limites da instrução. Dessa forma, os atos de investigação servem apenas para formar um juízo de probabilidade (e não de certeza) sobre a acusação e por isso não estão dirigidos à sentença. Por isso, consideramos que sua função é endoprocedimental, 39 no sentido de que esses atos têm eficácia interna, somente servindo para amparar as decisões interlocutórias tomadas nessa fase (como medidas cautelares, busca e apreensão, etc.) e a decisão sobre a admissibilidade da acusação. Ainda no que se refere à eficácia probatória, destacamos a importância da produção antecipada da prova, como um instrumento processual destinado a disciplinar a reprodução ante a impossibilidade de repetição dos atos. Infelizmente, o instrumento está parcamente disciplinado no processo penal brasileiro (art. 225 do CPP) e exige uma urgente reformulação. III CONTORNOS DE UM SISTEMA "IDEAL" DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR PARA O PROCESSO PENAL BRASILEIRO O sistema policial é nosso velho conhecido, e por isso mesmo não precisa de nenhuma apresentação: é unânime o rechaço. A pouca credibilidade e eficácia, aliada ao fato de que não agrada a ninguém (nem a quem vai acusar, muitos menos à defesa e tampouco a quem vai julgar) exige uma imediata reformulação. A discussão deve centrarse entre os outros dois possíveis titulares: juiz de instrução ou promotor investigador. A primeira figura juiz de instrução é histórica e vem sendo paulatinamente substituída, por estar completamente superada. A evolução das idéias liberais vai minguando os poderes do temível juiz inquisidor até privarlhe de todo poder de iniciativa (nemo iudex sine actore). O problema começa quando esses poderes são retirados do juiz e outorgados ao promotor, deixando o juiz instrutor de ser o temível, ao mesmo tempo em que o passa a ser o promotor. Ao final, sucede que o promotor acaba convertendose em juiz de instrução. javascript:openPopup('IDSLJZDDG0XGCBHW3I0RZIRQWN3JH4LIB0QZIZ1SOYJ1MI5R54UXE','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 57 Explica ARAGONESES ALONSO 40 que "el sistema de instrucción por el fiscal, que parece más ortodoxo con el acusatorio, oculta, en definitiva, si se refuerzan sus poderes, un 'sistema inquisitorial'. Si, por el contrario, no se le conceden facultades al fiscal, la instrucción puede ser ineficaz". A solução está, uma vez mais, em "encontrar um equilíbrio na distribuição de poderes". A conclusão é: "não se resolve o problema só substituindo o juiz instrutor (ou a polícia) pelo promotor investigador, pois em última análise isso preservaria as deficiências da instrução preliminar" (valoração probatória, contraditório e defesa mitigados, segredo interno, ausência de efetiva sumariedade, etc.). Além disso, é fundamental alcançar o equilíbrio de poderes através de uma clara definição da figura do "juiz garante da instrução preliminar". Por tudo isso, em continuação desenharemos uma sugestão de modelo ideal a partir dos três elementos básicos: sujeito, objeto e atos. A) Investigação preliminar a cargo do Ministério Público e a figura do juiz garante ou juiz de garantias Apesar das críticas que gera a instrução a cargo do MP, entendemos que é o sistema que menos defeitos apresenta, ou ao menos aquele cujos defeitos são mais facilmente resolvidos ou tolerados. A investigação preliminar está basicamente dirigida a decidir sobre o processo ou o nãoprocesso, e por isso deve ser uma atividade administrativa a cargo do titular da ação penal. Ninguém melhor do que ele para preparar o exercício da futura acusação. É uma incongruência lógica que o juiz investigue para o promotor acusar. Se o MP é o titular constitucional da ação penal pública atividadefim obviamente deve ter ao seu alcance os meios necessários para lograr com mais efetividade esse fim, de modo que a investigação preliminar, como atividade instrumental e de meio, deverá estar ao seu mando. Atribuir ao MP o comando da investigação preliminar é a melhor solução para o processo penal brasileiro, principalmente se levarmos em conta que o MP no Brasil é independente, gozando das mesmas garantias da Magistratura. Possui poderes tanto no plano constitucional (art. 129 da CB), como também no orgânico (especialmente nos arts. 7º e 8º da Lei nº 75/93 e art. 26 da Lei nº 8.625/93), para participar da investigação ou realizar seu próprio procedimento administrativo préprocessual. Sem embargo, é imprescindível que a polícia judiciária esteja a serviço do MP, com clara subordinação funcional (ainda que não orgânica). O "controle externo da atividade policial" está timidamente disciplinado pela LC nº 75/93 e não corresponde ao esperado e muito menos ao necessário. Continua faltando um dispositivo que diga de forma clara que "o MP exercerá o controle externo da atividade policial, dando instruções gerais e específicas para a melhor condução do IP", as quais estarão vinculados os agentes da polícia judiciária. As "instruções gerais" correspondem às grandes linhas da instrução preliminar, de forma genérica e abstrata, conforme os critérios de política criminal traçados pela instituição. Um dos maiores problemas que enfrenta o MP para acompanhar o IP é a falta de informação, mais especificamente, o fato de não javascript:openPopup('IDEMDXXEFGC01UMFM1FNPEK2SAKFQKVSTIMLP1IIEZHBGAZNPZZGWB','Janela-flutuante',324,216); canalizar a notíciacrime. Através das instruções gerais, o MP poderia, por exemplo, determinar que todos os BO relacionados com determinados tipos de delito crime organizado, homicídio, etc. fossem imediatamente enviados à promotoria correspondente, para que definisse a linha de investigação ou simplesmente tivesse ab initio plena ciência da investigação. No segundo caso, o MP se reservaria o poder de intervir diretamente em um caso concreto, isto é, dando instruções específicas sobre como deverá ser realizado o IP naquele caso, atendendo a suas especiais circunstâncias. 58 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Isso não significa que todos os fatos devam ser obrigatoriamente noticiados direto ao MP e tampouco que o promotor deva ficar 24 horas por dia na delegacia. Nada disso. Caberá ao MP definir instrumentos para um controle periódico de tudo que chegar ao conhecimento da polícia, estabelecendo quais delitos por sua gravidade ou complexidade devam ser imediatamente levados ao seu conhecimento, para que ab initio controle toda a investigação. Nesses delitos graves, a presença do promotor será imprescindível e se fará notar pela sua constante intervenção e estrito controle da atividade policial. Nos demais casos, o promotor poderá definir uma espécie de procedimento padrão, estabelecendo que investigações devem ser realizadas e de que forma, assim como que diligências não poderão ser realizadas sem a sua presença. Em linhas gerais, assim atua o promotor nos sistemas em que a investigação preliminar está a cargo do MP. Em suma, entendemos que a figura do promotor investigador é a mais adequada para a nossa realidade, exigindose apenas uma melhor definição do que se entende por controle externo da atividade policial, para permitir ao MP dar as instruções gerais e específicas necessárias para o satisfatório desenvolvimento da instrução preliminar. Mas então, com isso estaria resolvido o problema, bastando com o MP 41 assumir o mando da investigação? A resposta é não. Com igual importância que atribuir (ou meramente reconhecer) a titularidade do MP, está definir os contornos da figura do juiz garante da instrução preliminar, ou, como preferem os italianos, giudice per le indagini preliminari. O juiz garante não investiga e tampouco julga no processo, até porque a prevenção deve excluir a competência por claríssimo comprometimento da imparcialidade (nisso reside um dos grandes equívocos do nosso sistema). Ao livrarse da função de instruir (alheia à sua natureza), o juiz garante da instrução ou juiz de garantias concreta sua superioridade como órgão suprapartes, fortalecendo no plano funcional e institucional a própria figura de julgador. Esse juiz da instrução (e não de instrução) será quem, mediante prévia invocação do MP, decidirá sobre todas as medidas e atos que impliquem a restrição dos direitos fundamentais do sujeito passivo, isto é, decidirá sobre as medidas cautelares de natureza pessoal ou real, colherá a prova no incidente de produção antecipada, autorizará a busca e apreensão, a intervenção telefônica, etc. Também, mediante invocação da defesa, decidirá sobre a legalidade dos atos de investigação levados a cabo pelo MP. É um verdadeiro "controlador da legalidade dos atos praticados pelo promotor na instrução preliminar". javascript:openPopup('IDZSXC22LKNV2TBEC1XXI2JNKECHDC5TJ2PY1UTCKGXLDGPFOCJO4G','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 59 O promotor investiga por si mesmo ou através da polícia, ouvindo testemunhas (e até mesmo interrogando o sujeito passivo, desde que observadas as garantias da defesa técnica e pessoal), determinando a realização de perícias, etc., mas não pode determinar, por exemplo, uma prisão preventiva. Esse tipo de restrição de direitos fundamentais somente pode partir de um órgão jurisdicional que decidirá mediante prévia invocação. Também será esse juiz garante da instrução quem, na fase intermediária e necessariamente contraditória, fará o juízo de préadmissibilidade da acusação, que, uma vez admitida, dará início ao processo penal. Nesse caso, a acusação será distribuída ao juiz criminal competente para presidir o processo e ao final julgar. Destacamos que a atual posição do juiz frente ao IP é similar ao modelo garantista aqui propugnado (pois não atua de ofício, não investiga nem dirige a investigação e basicamente está para decidir sobre as medidas restritivas de direitos fundamentais), mas com uma fundamental distinção: o juiz que de qualquer modo intervém na instrução preliminar não poderá atuar (instruir e julgar) na fase processual, ao contrário do modelo em vigor. Para não deixar dúvidas: o juiz da instrução não pode atuar no processo penal, porque nesse caso sua imparcialidade estaria comprometida. Basta recordar que no sistema de juiz instrutor, o que instrui não julga, não tanto porque instruiu, mas porque decidiu sobre os incidentes da instrução preliminar. Em síntese e seguindo a DRAGONE, 42 ao juiz garante da instrução preliminar incumbe: a) Função de garantia da liberdade pessoal e da liberdade das comunicações. b) Controle da duração da instrução preliminar e dos requisitos formais da ação penal exercida pelo MP (na fase intermediária contraditória). c) Garantia da formação antecipada da prova no respectivo incidente probatório. d) Função de decisão e controle do resultado da instrução preliminar na audiência contraditória que forma a fase intermediária. Somente com essa repartição de poderes e o estabelecimento de um sistema de controle recíproco, impedirseáa temível figura do promotor inquisidor, tão reprovável como a seu tempo foi a do juizinquisidor. A quase totalidade das críticas ao sistema de promotor investigador caem por terra com essa divisão racional de poderes. Este sistema é o que mais se aproxima a um grau razoável 43 de transferência da estrutura dialética do processo para a instrução preliminar. javascript:openPopup('IDGZ0ME3LVF5EOHG23NYLIANTR1KHCTI42CZB3MWNVJT2QVECALW1H','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDM5QYVSMTKWL3JP0RGPDUB45V3CIRNRECSFR0SNEBTRXA5WVEMRHF','Janela-flutuante',324,216); 60 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA B) Determinar a situação do sujeito passivo Outro gravíssimo problema do IP é o mais completo confusionismo acerca da situação jurídica do sujeito passivo. Sobre a figura do indiciamento pairam inúmeras dúvidas, principalmente quando não existe uma prisão cautelar. Em nenhum momento o CPP define claramente a situação do sujeito passivo não submetido a uma prisão cautelar. Entre as inúmeras incertezas, questionamos: a) A partir de que momento alguém deve ser considerado como sujeito passivo? b) Que circunstâncias devem concorrer para que se produza a situação de imputado? c) De que forma se deve formalizar essa situação? d) Que conseqüências endoprocedimentais produz o indiciamento? e) Que cargas assume o sujeito passivo? f) Que direitos lhe cabem? Enfim, reina a mais absoluta incerteza, 44 em inequívoco detrimento da sua situação jurídica, do seu status libertatis e da sua própria dignidade pessoal. São graves os prejuízos para a defesa, tanto pessoal como técnica. Isso tudo sem falar na aberração jurídica de alguém ser acusado sem antes haver sido formalmente imputado. Ou ainda, o que é pior, o sujeito passivo comparece ante a autoridade policial na situação de testemunha quando deveria fazêlo na condição de imputado, com todas as garantias inerentes a essa figura. Isso é uma repugnante práxis policial, que, aliada à lacuna legal, deve ser abolida. Em linhas gerais, devemos caminhar para uma maior eficácia do direito de defesa e contradição contido no art. 5º, LV, da CF. Tal dispositivo, no que se refere a sua aplicação no inquérito policial, tem sido objeto de interpretações absurdamente restritivas. Esse é um ponto básico a ser revisto. É incrível a resistência no âmbito policial em respeitar os direitos constitucionalmente assegurados, negando que o CPP deva adequarse à CF e não ao contrário. O tema é de fundamental importância e transcendência, mas extrapola os estritos limites da presente exposição. Entretanto, como ponto de partida para disciplinar o tema, é imprescindível que: a) Tãologo como exista uma imputação contra uma pessoa determinada ou elementos suficientes que permitam identificar o possível autor do delito, este deve ser chamado a comparecer perante a autoridade encarregada da instrução preliminar. b) Na comunicação deverá constar uma síntese da imputação e esclarecer em que qualidade comparece para declarar. javascript:openPopup('ID5BD25NNKEZUQBERQLP2A32O25LGAEVN2EN0WD0BBYAHHSMPOGPFD','Janela-flutuante',324,216); RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA 61 c) Deverá serlhe comunicado do direito de comparecer acompanhado de advogado ou solicitar a nomeação caso não tenha condições econômicas para constituir. d) No momento do interrogatório, deverá serlhe comunicado o direito que lhe assiste a não declarar, sem que o exercício do direito de silêncio acarrete qualquer conseqüência jurídica. e) Deverá a autoridade advertir do direito que assiste ao imputado de indicar provas e solicitar diligências. Após ser ouvido, a autoridade policial deverá proceder ao indiciamento caso existam suficientes indícios. É importante destacar três aspectos: a) necessidade de que o suspeito seja ouvido tãologo surja a imputação; b) que sejam respeitadas certas garantias no momento do interrogatório policial; c) imediatamente após, manifestese a autoridade policial sobre o indiciamento, momento em que o sujeito passivo passa a participar do procedimento. O indiciamento deve ser um dos primeiros atos do inquérito e não o último. Neste sentido, citamos como exemplo o art. 118 da LECrim espanhola: 45 "Toda pessoa a quem se impute 46 um ato punível poderá exercitar o direito de defesa, atuando no procedimento, qualquer que seja este, desde que se lhe comunique sua existência, tenha sido objeto de detenção ou de qualquer outra medida cautelar. A admissão de uma notíciacrime ou qualquer atuação policial 47 ou do Ministério Público, da qual resulte a imputação de um delito contra uma pessoa ou pessoas determinadas, será levada imediatamente ao seu conhecimento. Para exercitar o direito de defesa, 48 a pessoa interessada deverá designar um defensor e não o fazendo, deverá serlhe nomeado um, que lhe assistirá em todos os atos da instrução preliminar." Por fim, também disciplinando a situação do sujeito passivo, merece ser transcrito parte do art. 7º do anteprojeto de reforma do nosso CPP: "Art. 7º Logo que reúna os elementos suficientes, a autoridade policial, fundamentando devidamente, procederá ao indiciamento. § 1º O indiciado será interrogado com observância das garantias constitucionais." javascript:openPopup('ID4BQBTQ0THSAHLYXNHBEK2BABHJQDWBI1GFWXAZIMIVI1G35IDBWB','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDM2WZSTVRIARMOGJQ00BECT2XBOTUHBMUIFWWITL1K5VFJNLH4KPN','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('IDATFJCA35U1G2HG3QA4W2PWX1MIMJHBOSM0P50CIKH22S1PWI0OH','Janela-flutuante',324,216); javascript:openPopup('ID54B50T2B4S3WF11MWO04YOLGAOHHEPZ0ZHMZ1QC0TCXF2DCRVFNK','Janela-flutuante',324,216); 62 RDP Nº 4 OutNov/2000 DOUTRINA Apesar de representar um avanço em relação ao sistema atual, principalmente ao disciplinar o momento do nascimento da situação de indiciado, entendemos que o § 1º merece maior atenção. Seria aconselhável, tendo em vista a larga tradição de desrespeito aos direitos do indiciado pela polícia judiciária, que constasse de forma expressa o direito à defesa técnica e à autodefesa negativa (silêncio). Ademais, é importante permitir o acesso prévio do advogado aos autos do inquérito e também possibilitar que o sujeito passivo indique provas e solicite diligências. C) A necessidade de uma instrução efetivamente sumária e a pena de inutilizzabilità No que se refere ao objeto, a instrução preliminar deve ser sumária, e a restrição da cognição deve ser qualitativa e também operarse no aspecto temporal. Por isso, a primeira limitação deve estar incluída na própria definição legal do instituto, visto como a atividade mínima de comprovação e averiguação dos fatos e da autoria. Como isso, está limitada a proporcionar o fumus commissi delicti necessário para formar a opinio delicti do MP (acusar, solicitar o arquivamento ou ainda fundamentar o pedido de medidas restritivas) e também para justificar o processo ou o nãoprocesso (fornecendo elementos para a fase intermediária). A instrução preliminar aliada a fase intermediária contraditória, funciona como um verdadeiro filtro processual, somente permitindo o ingresso no mundo jurídicoprocessual daquelas condutas que revistam uma aparência de delito que justifique o custo do processo. É sabido que a efetividade deriva da normatividade, ainda que o inverso nem sempre se produza. Por isso, entendemos que ao atribuirse a instrução ao promotor, se lhe pode exigir que também realize investigações sobre os elementos de descargo, é dizer, a favor e no sentido de comprovar a veracidade da tese defensiva. Por isso, é aconselhável incluir esse dever, nos mesmos moldes do existente no art. 358 do CPP italiano e no § 160 da StPO alemã. A limitação
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