Buscar

Teoria_e_Prática_na_Pedagogia_Hospitalar_RANIEL

Prévia do material em texto

CIRCULAÇÃO INTERNA 
UNICOIMBRA 
''...Tem gente que está do mesmo lado que 
você 
Mas deveria estar do lado de lá 
Tem gente que machuca os outros 
Tem gente que não sabe amar 
Tem gente enganando a gente 
Veja nossa vida como está 
Mas eu sei que um dia a gente aprende 
Se você quiser alguém em quem confiar 
Confie em si mesmo 
Quem acredita sempre alcança...'' 
Renato Russo 
 
2 
SUMÁRIO 
APRESENTAÇÃO, 03 
CAPÍTULO I - CONEXÃO PARADIGMÁTICA DA SAÚDE E EDUCAÇÃO: desafio do reencontro 
possível,04 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 13 
CAPÍTULO II- AVALIAR A APRENDIZAGEM NO HOSPITAL: uma experiência possível? , 14 
EXERCÍCIO DE REFLEXÃO, 19 
CAPÍTULO III - O ADOLESCENTE HOSPITALIZADO COM CÂNCER: a importância do trabalho do 
professor de classe hospitalar para esse alunado, 20 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 28 
CAPÍTULO IV - A IMPORTÂNCIA DAS INTERFACES NOS AMBIENTES VIRTUAIS DE 
APRENDIZAGEM PARA CRIANÇAS HOSPITALIZADAS, 29 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 35 
CAPÍTULO V- TECENDO A REDE DA COMPLEXIDADE ENTRE: o hospital, os saberes pedagógicos e a 
confirmação de um espaço educativo, 36 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 43 
 CAPÍTULO VI - O BRINCAR DE CRIANÇA COM CÂNCER NA CLASSE HOSPITALAR: um olhar sobre 
os saberes importantes ao professor que brinca, 44 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 58 
CAPÍTULO VII - A CLASSE HOSPITALAR NA EXPERIÊNCIA DA APRENDIZAGEM COOPERATIVA: 
tutoria entre iguais, 59 
EXERCÍCIO DE REFLEXÃO, 66 
CAPÍTULO VIII - HUMANIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO HOSPITALAR: transformando a realidade nas 
pediatrias, 67 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 75 
CAPÍTULO IX - POSSIBILIDADES DE ATENÇÃO À APRENDIZAGEM INFANTIL EM CONTEXTO 
HOSPITALAR, 76 
CAPÍTULO X - A EDUCAÇÃO HOSPITALAR: impasses ideológicos e possibilidades de construção , 85 
CAPÍTULO XI - ATENDIMENTO EDUCACIONAL DOMICILIAR: reflexão de limites e possibilidades, 89 
CAPÍTULO XII - TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A PEDAGOGIA HOSPITALAR , 95 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 105 
CAPÍTULO XIII - UM OLHAR INTEGRADO EM AMBIENTE HOSPITALAR, 106 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 108 
CAPÍTULO XIV - PEDAGOGIA HOSPITALAR: inclusão digital, novas linguagens e novos cenários 
favorecendo o escolar hospitalizado, 109 
CAPÍTULO XV - TRABALHO PEDAGÓGICO: a práxis de profissionais da educação no hospital, 113 
CAPÍTULO XVI - O JOGO NO ENSINO DA MATEMÁTICA: recurso didático para aprendizagem de crianças 
e adolescentes hospitalizados, 121 
CAPÍTULO XVII - CAMINHOS E DESCAMINHOS DA CLASSE HOSPITALAR: buscando compreender os 
projetos educativos em disputa , 129 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 136 
CAPÍTULO XVIII - O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO-HOSPITALAR NO INSTITUTO NACIONAL DO 
CÂNCER, 137 
EXERCÍCIO DE REFLEXÃO, 144 
CAPÍTULO XIX - A IMPORTÂNCIA DO PAPEL MEDIADOR DO PROFESSOR ENTRE O AVA E O 
ESCOLAR HOSPITALIZADO, 145 
EXERCÍCIO DE SÍNTESE, 149 
 
ATIVIDADES AVALIATIVAS, 150
 
3 
APRESENTAÇÃO 
A educação apresenta-se em novos cenários, necessitando ser considerada em todas as esferas sociais, as 
quais não podem se furtar a uma reavaliação de seus espaços e representações. Numa esfera que visa a 
integrar humanização e competências para agir diante destes desafios, o fazer do pedagogo como um agente 
de mudanças, apoiado na lei do CNE/2001, contribuiu com as instituições hospitalares para integração de 
propostas educacionais diferenciadas. 
Atuar de forma a fornecer melhores e maiores condições à humanidade é um compromisso ético do 
educador. Elevar a existência humana a possibilidades antes despercebidas, como na situação de auxílio a 
crianças ou adolescentes hospitalizados, requer, contudo, uma ação especializada. Conhecer o cenário e 
contexto hospitalar, as condições implicadas nas enfermidades, a disponibilidade de ferramentas pedagógicas, 
os desafiadores limites entre a escola formal e esses novos espaços de ação se encontram entre os muitos 
saberes necessários ao profissional que irá atuar no contexto hospitalar. A necessidade de refletir a inserção 
do pedagogo nesse contexto, de informar/formar sua ação, possui caráter prioritário em uma sociedade em 
constantes mudanças. 
Os saberes e fazeres multiprofissionais integrando educação e saúde se tornam aliados diante dos 
desafios relacionados à humanização. A promoção de projetos de atendimento pedagógico nas realidades 
hospitalares desperta o interesse dos diversos atores do processo ensino-aprendizagem para pesquisas e 
publicações. A própria evolução das relações nas questões de saúde impulsiona a disseminação de 
informações, pesquisas e novas percepções que projetam esses fazeres sociais. Parafraseando Gilberto Freyre, 
o saber sem um fim social é uma grande futilidade. 
Professores e educadores têm buscado inovar em suas práticas nos processos de ensino-aprendizagem de 
crianças e adolescentes hospitalizados. Diversas instituições e organizações que também compartilham desses 
desafios pedagógicos almejam alcançar um nível cada vez mais elevado de excelência e qualidade 
educacional. 
Este material pretende levar o leitor a reflexões sobre os diversos cenários e formações peculiares que 
integram educação e saúde. O entrelaçamento da teoria e da prática conduz a organização dos capítulos do 
material. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
CAPÍTULO I 
CONEXÃO PARADIGMÁTICA DA SAÚDE E 
EDUCAÇÃO: desafio do reencontro possível 
 
A investigação voltada à formação de professores que atuam na escolarização de crianças e adolescentes 
que se encontram nos hospitais ou em ambientes similares levou o grupo de pesquisa PEPRATEC — 
Paradigmas Educacionais na Prática Pedagógica com Tecnologias —, a pesquisar sobre a formação 
pedagógica que pode vir a auxiliar estes docentes na empreitada da reconstrução de uma ação docente voltada 
a um novo paradigma. O grupo PEPRATEC está inserido na linha de Teoria e Prática Pedagógica na 
Formação de Professores do Programa de Pós-Graduação em Educação de Mestrado e Doutorado da PUCPR. 
O grupo é composto por professores/pesquisadores que atuam na graduação, na especialização e no mestrado 
e doutorado em Educação e convidam grupos de docentes que atuam na escola pública, em seus diferentes 
níveis e contextos, para participar do processo investigativo. Nesta pesquisa, elegeram como parceiro um 
grupo de professores que atuam na escolarização em contextos hospitalares e comunitários, com a finalidade 
de contribuir para ampliar significativamente as ações e o preparo pedagógico que atendam a novos 
paradigmas na educação e na saúde. 
A investigação focalizada na problemática da formação pedagógica de professores que atuam em 
classes hospitalares levou a buscar uma fundamentação teórica, que foi complementada com as discussões 
críticas, realizadas pelo grupo PEPRATEC, em especial sobre as experiências vivenciadas pelas professoras 
envolvidas na pesquisa. Com este caminho trilhado, optou-se por apresentar e compartilhar os referenciais 
teórico-práticos que subsidiaram as temáticas pesquisadas para responder aos desafios que os professores 
enfrentam na atuação nos processos de escolarização no hospital. 
Amparo legal sobre o atendimento pedagógico na escolarização dentro do hospital 
A legislação brasileira reconhece o direito de crianças e adolescentes hospitalizados ao atendimento 
pedagógico-educacional. No texto da lei maior no Brasil, ou seja, na Constituição Federal de 1988, mais 
precisamente no Título VIII — Da Ordem Social, Capítulo III — Da Educação, da Cultura e do Desporto, 
Seção I, prescreve em seu artigo 205 que: “a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, será 
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu 
preparo para exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. 
As diretrizes da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394/96, também 
determinam a educação como direito de todo cidadão, e nela se destaca o Título II - Dos Princípios e Fins da 
Educação Nacional, como segue: 
Art. 2o.A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de 
solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o 
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. 
Art. 3o. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: 
I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; 
II- liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; 
III- pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas (...). 
Dentre os documentos legais que fundamentam este direito destaca-se o do Ministério da Educação e 
Cultura (BRASIL, 1994), que definiu, por meio das Políticas de Educação de Educação Especial, 
 
5 
responsabilidades quanto à execução do direito das crianças e adolescentes hospitalizados e à educação. 
Incluem-se neste rol as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial no Brasil (BRASIL, 2001), que 
também dedicam parte de sua proposição para recomendar o atendimento pedagógico para crianças que se 
encontram, por determinado ou por muito tempo, no hospital ou adoentadas e, por consequência, impedidas 
de frequentar a escola regular. Em 2002, o documento Classe hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar 
(BRASIL, 2002), apresenta um avanço legal no atendimento educativo nos hospitais que devem estar 
conectados à escola regular, do qual se destaca: 
Têm direito ao atendimento escolar os alunos do ensino básico internados em hospital, em sérvios 
ambulatoriais de atenção integral à saúde ou em domicílio; alunos que estão impossibilitados de 
frequentar a escola por razões de proteção à saúde ou segurança brigados em casas de apoio, casas de 
passagem, casas-lar e residências terapêuticas. 
Cabe destacar que a denominação classes hospitalares tem recebido críticas, pois aparenta uma situação 
paralela à escolarização nesta modalidade, mas, na realidade, trata-se da escola propriamente dita no hospital. 
Para tanto, exige matrícula regular dos alunos e alunas em suas respectivas séries de ensino e o 
encaminhamento da Secretaria Municipal ou Estadual de Educação de avaliações para que os alunos ou 
alunas possam lograr avanço em seus estudos. Este esclarecimento é importante, pois a alta do hospital 
precisa garantir continuidade de seus estudos, numa primeira etapa, quando necessário, com atendimento 
pedagógico domiciliar até atingir a fase de acompanhamento na reintegração na escola regular de origem 
desta criança ou adolescente. 
A legislação tem buscado garantir o direito à escolarização das crianças e dos adolescentes, mesmo 
quando se encontram em hospitais ou em ambientes similares, ou seja, fora do prédio institucionalizado da 
escola. A determinação legal existe e já foi promulgada há muito tempo, mas carece de ser atendida em 
plenitude, pois está dificultando o exercício e o atendimento a um direito legal conferido a qualquer cidadão 
brasileiro, em especial às crianças e adolescentes. 
O cenário e o enfrentamento para o cumprimento da legislação na escolarização de crianças e 
adolescentes hospitalizados 
O entendimento da dificuldade de exercer o direito à escolarização das crianças e dos adolescentes que 
se encontram hospitalizados ou em períodos de convalescença em suas residências — portanto, impedidos de 
frequentar a escola regular — leva a refletir sobre os motivos que impedem a consolidação deste atendimento 
necessário e legal. O impedimento pode decorrer da falta de conhecimento dos pais e responsáveis sobre o 
amparo legal deste direito, o que gera o afastamento das crianças e adolescentes adoentados da escolaridade. 
A lentidão de políticas públicas pode ser apontada como fator relevante na ausência da obrigatoriedade 
de oferta deste atendimento dentro dos hospitais. Dentro deste contexto, outro fator que atinge esta 
problemática prende-se à falta de concurso público para alocação de professores para exercer a docência nos 
hospitais e no atendimento pedagógico domiciliar destes alunos. E, mesmo depois de concursados, ainda em 
número reduzido para as necessidades brasileiras, os professores lutam para se manter nos ambientes de 
escolarização hospitalar, pois, em geral, equivocadamente são chamados para voltar a compor os quadros 
deficitários de profissionais da escola regular — como se o trabalho educativo no hospital ou no atendimento 
pedagógico domiciliar fosse menos importante do que o oferecido na escola regular. Acredita-se que a lógica 
administrativa, além de uma desumanidade, encara a escola regular com turmas mais numerosas com mais 
importância do que o atendimento mais personalizado no hospital, pois cada aluno precisa receber apoio 
pedagógico específico de acordo com sua série e nível de estudo. Este cuidado no atendimento diferenciado 
demanda preparação do (a) professor(a) que, em geral, envolve um profissional amoroso e humanitário, além 
de competente para realizar este trabalho educativo. 
 
6 
Com estas denúncias, alertam-se os gestores públicos, seja do Estado, do Município ou de instituições 
particulares, no sentido de valorizar e entender este trabalho docente qualificado e responsável e não retirar os 
professores alocados neste espaço da escola hospital por qualquer motivo. 
Acredita-se que os entraves são muitos e maiores do que a realidade tem demonstrado, pois os processos 
de inclusão, em geral, começam aparecer com mais ênfase no início do século XXI. Esse movimento de 
inclusão toma força no acolhimento à diversidade e na aceitação das diferenças, reforçado por uma nova visão 
paradigmática da ciência, da educação e da própria formação dos profissionais e, em especial, dos 
professores. 
 
A transição paradigmática do paradigma conservador para o paradigma inovador na educação e na 
saúde 
A mudança paradigmática depende da visão de homem, de sociedade e de mundo que cada profissional 
e gestor público carrega ao longo de sua vida. Assim, a visão paradigmática acompanha o mundo em uma 
determinada época. Para Thomas Kuhn (2001, p. 13), em sua obra intitulada A estruturas das revoluções 
científicas, os paradigmas podem ser entendidos como: “as realizações científicas universalmente 
reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de 
praticantes de uma ciência”. Em outro momento, refere-se aos paradigmas como o “conjunto de crenças e 
valores subjacentes à prática científica”. Segundo o autor, quando os fenômenos não se encaixam dentro deste 
padrão ou modelo ocorrem as anomalias, gerando crise na ciência e provocando as revoluções científicas, na 
busca de um novo paradigma que atenda aos anseios da comunidade científica, sinalizando a necessidade do 
surgimento de novas descobertas que podem gerar um novo paradigma (KUHN, 2001). 
A sociedade adentra o século XXI enfrentando a acelerada mudança paradigmática nas diferentes 
instituições sociais, em todos os níveis e contextos, levando a ponderar sobre a necessidade de buscar uma 
educação planetária, mundial e globalizante, mais humanizada. O advento da industrialização se fez 
acompanhar de processos competitivos que comprometeram ações como a solidariedade, a harmonia, a paz e 
a justiça social, entre outros. Educar nesse tempo de mundialização implica refletir sobre o processo de 
globalização que tem passado a integrar os sistemas educacionais, financeiros, econômicos, políticos e sociais 
das nações. 
O processo de competitividade se faz acompanhar da tecnologia da informação e da comunicação que 
propicia o acesso aos fatos em tempo real e possibilitam a denúncia e os anúncios 
que, em geral, assustam pela agressividade, pela visão de sangue e de agressão tratada, muitas vezes, 
com naturalidade. Assim, as crianças, adolescentes e adultos convivem diariamente com essa realidade e 
parecem se acostumar com essa situação nacional e mundial. São processos agressivos que precisam de 
urgenterepensar, pois a humanidade vem sendo desafiada a resgatar a convivência harmoniosa e solidária no 
planeta. Não se trata só da recuperação do meio ambiente, mas das relações respeitosas da própria população. 
Os profissionais da área da educação, mas com ênfase nos que atuam na área de saúde, convivem com 
pessoas doentes e infelizes, em geral em decorrência das más condições de saúde pública, de alimentação 
precária ou inexistente e de exploração no trabalho. Nestas últimas décadas, as acentuadas exigências de 
produtividade impostas pelo mundo do trabalho interferem na convivência familiar, pois os pais podem se 
encontram estressados e agressivos, e, assim, projetam nas crianças e nos adolescentes suas dificuldades e, 
muitas vezes, geram comprometimento emocional e até físico em seus filhos. 
A urgência de mudança paradigmática na busca de tratamento mais humano e solidário da população 
pode levar a superar processos de massificação, por exemplo, como o de enfrentar as longas filas de espera no 
atendimento em ambulatórios, centros de saúde, nos hospitais e clínicas, entre outros espaços. A gravidade da 
massificação leva os profissionais da área de saúde ao enfrentamento de discernir e escolher pessoas para 
atender com processos mais graves, e explicar, ou não, aos outros pacientes que eles podem esperar, como se 
 
7 
fossem menos importantes suas queixas. 
Nestes últimos tempos, invariavelmente os discursos de educadores e políticos vêm carregados de 
denúncias sobre a necessidade de processo de convívio mais pacífico, responsável e amoroso na sociedade. 
Caberia perguntar: para que se vive? “Para ser feliz” seria uma boa resposta, mas esta afirmação depende de 
muitos determinantes e, principalmente, torna-se desafiadora quando as pessoas ficam privadas de saúde e 
dependentes da competência de profissionais para salvar suas vidas. 
A realidade adversa acaba gerando iniciativas e mobilização da comunidade na busca de espaços que 
atendam às demandas educativas da sociedade, que tendem a reparar a ausência do Estado, como denuncia 
Paula (2006, p. 6): 
Nos últimos anos no Brasil, em função das transformações políticas, econômicas e sociais, a educação 
vem se expandido em contextos variados como: hospitais, sindicatos, nos meios de comunicação, nas 
ruas, nos presídios, abrigos e em outros espaços considerados até bem pouco tempo atrás inusitados 
para a ocorrência da educação. Estas práticas educativas estão relacionadas a movimentos da sociedade 
civil dos sindicatos, movimentos ecológicos, políticos, religiosos e de inclusão social. A maioria destes 
trabalhos é vinculada às Organizações Não Governamentais e aos movimentos da Educação Não 
Formal, que têm procurado complementar as práticas escolares ou preencher as “brechas” e funções 
que a escola e o próprio Estado têm deixado de cumprir. 
A educação, neste sentido, amplia seu lastro de ensino e de aprendizagem em ambientes diferenciados, e 
os profissionais que se propõem a trabalhar nestas organizações, de maneira geral, atuam na recuperação 
educacional, emocional, social e, principalmente, afetiva dos alunos. Neste sentido, incluem-se os 
profissionais que colaboram na escolarização dos alunos e alunas internados nos hospitais. 
A busca do atendimento à legislação que determina o atendimento das crianças e adolescentes 
hospitalizados enfrenta um grande desafio, dentre outros: a dificuldade da incorporação de uma visão 
paradigmática diferenciada dos profissionais que se propõem a exercer a docência neste ambientes. Neste 
sentido, cabe refletir sobre os paradigmas que caracterizam a formação dos profissionais em geral. 
 
Paradigmas conservadores e suas influências na atuação profissional dos profissionais que atuam na escolarização 
nos hospitais 
As atitudes pessoais e profissionais, bem como as opções teóricas e práticas, são contaminadas pelos 
pressupostos que caracterizam o paradigma que se apresenta em determinada época. Os paradigmas podem 
ser entendidos como a gama de crenças, valores e técnicas partilhadas pelos membros de uma comunidade 
científica. Portanto, os paradigmas caracterizam um determinado tempo histórico e contagiam todas as 
instituições que compõem a sociedade. Os paradigmas permitem entender os aportes teóricos, a explicação da 
prática dos profissionais e os costumes da população. Os paradigmas determinam o ser e o fazer das pessoas 
na sociedade. 
A matriz epistemológica que caracterizou a Ciência e, por sua vez, todas as áreas do conhecimento, 
desde o século XVIII até grande parte do século XX, fundamentou-se no paradigma newtoniano- cartesiano. 
Com forte influência racional e positivista, este paradigma tradicional e conservador impregnou a sociedade 
com processos focados na objetividade, na racionalidade e na visão fragmentada do conhecimento. Com a 
decomposição do todo em partes fragmentadas, gerou, entre outros determinantes, uma formação acadêmica 
racional, mecânica e reducionista (BEHRENS, 2005). Outro agravante deste paradigma conservador da 
ciência foi acentuado com o advento do mundo globalizado e do pensamento neoliberal, que redundou na 
formação sectária, competitiva e individualista. Pois, em nome da técnica e do capital, parece perder muito da 
função ética de buscar formar homens e mulheres responsáveis, sensíveis e que venham dar sentido à vida, ao 
destino humano e a uma sociedade justa e igualitária. Esse paradigma serviu ao seu tempo e à necessidade de 
organizar a ciência, mas repercute até hoje nas ações desenvolvidas pelos profissionais que atuam em todas as 
 
8 
áreas do conhecimento. 
A proposição da ciência no paradigma newtoniano- cartesiano permitiu criar uma visão artificializada de 
fragmentação, projetando dualidades entre ciência e fé, razão e emoção, subjetivo e objetivo, corpo e mente, 
entre outras. Esse processo dual acirrado pelo movimento científico baseado no pensamento positivo criou 
posicionamentos revolucionários em nome da cientificidade, do desenvolvimento da tecnologia, priorizando a 
realidade positiva e afastando a visão humanitária necessária para a formação de profissionais sensíveis e 
éticos. Na concepção de Cardoso (1995, p. 31), o avanço da ciência e da tecnologia levou ao “culto ao 
intelecto e ao exílio do coração”. Este pensamento levou a “comunidade científica a uma mentalidade 
reducionista, contaminando o homem e a mulher com uma visão fragmentada não somente da verdade, mas 
de si mesmos, dos seus valores e dos seus sentimentos” (BEHRENS, 2003, p. 18). 
O paradigma newtoniano-cartesiano tem sido motivo de um urgente repensar da sociedade, desde o 
início de século XX, mas toma força no início do século XXI, especialmente, por intermédio das propostas de 
cientistas como Boaventura Santos (1987), Capra (1996), Kuhn (2001) e de educadores que evidenciam a 
necessidade de mudança da concepção, em especial, para quem atua na área de educação e de saúde. 
A formação reducionista e competitiva dos profissionais que estão atuando nas instituições educativas e 
hospitalares merece urgente repensar, pois tal visão precisa ser superada ainda neste século. Acredita-se que, 
aliado à mudança paradigmática, não se pode ignorar os efeitos perversos de uma sociedade capitalista, 
desigual e injusta. Além dos efeitos econômicos e sociais do sistema capitalista, o paradigma newtoniano-
cartesiano formalizou uma falsa tensão entre teoria e prática, entre humanismo e tecnologia, entre ciência e fé, 
entre as áreas exatas, da saúde, humanas e sociais (BEHRENS, 2006). Numa visão equivocada, os saberes 
foram hierarquizados em cursos de mais valia e de menos valia, acessíveis ou não a determinadas camadas da 
população. Essa realidade afeta profundamente a formação dos profissionais e os desdobramentos de sua 
atuação na sociedade. 
Esse processo atinge profundamente todas as áreas do conhecimento e, em especial, reflete na educação 
e na área de saúde, tão importantespara a população. Os atendimentos nestas áreas dependem diretamente da 
formação paradigmática dos profissionais que atuam em diferentes ambientes e contextos. 
As repercussões do paradigma conservador nas áreas da saúde e da educação 
A formação paradigmática dos profissionais das áreas da saúde e da educação influencia sua vida e sua 
ação ao longo de sua caminhada. O posicionamento newtoniano-cartesiano que contaminou a formação da 
grande maioria dos profissionais que estão atuando hoje nas instituições, sejam elas educativas ou da área da 
saúde reflete as atitudes e procedimentos baseados na racionalidade e na abordagem técnica exigidos como 
ação competente inovadora na atuação dos profissionais. 
Cabe enfatizar que o paradigma conservador ainda tem dominado os meios acadêmicos e profissionais 
em muitas áreas do conhecimento. Por outro lado, é inegável que este paradigma levou ao desenvolvimento 
técnico e estabeleceu grandes avanços para sociedade, no que se refere à pesquisa, à informação e à 
automação, especialmente nos avanços que decorreram da Revolução Tecnológica e da disponibilização da 
rede de informação informatizada e globalizada, criando caminhos rápidos e competentes de atuar. As 
máquinas, em especial, os computadores e a rede informatizada, vieram para socorrer em processos que os 
homens não conseguiam adentrar, mas seu procedimento, ao ser racional, objetivo e eficiente, depende de 
programadores e operadores humanos, éticos e competentes. Mais importante do que a ênfase na utilização de 
equipamentos (exames, tomografias, recursos de informática), tão apregoada no ensino médico e na saúde em 
geral, tem sido a necessidade de superar a constância das queixas públicas sobre a distância entre o paciente e 
o médico, da frieza, da rapidez e da racionalidade com que são tratados os pacientes nas mais diversas 
situações. 
 
9 
Agrava-se a preocupação quando se encontram cursos de Medicina, Enfermagem, Fisioterapia, 
Fonoaudiologia, da própria Pedagogia, entre outros, voltados para um necessário e significativo 
desenvolvimento científico, para a incorporação de recursos tecnológicos necessários e expressivos, mas com 
uma visão reducionista no que se refere ao relacionamento humano. Torna-se questionável a dependência 
focada só nos recursos informatizados e técnicos para realizar uma atuação na educação e na saúde 
competente, pois a realidade brasileira não tem garantido este acesso à população em geral. 
Os ambientes de atendimento da área de saúde, seja nos centros médicos, nos hospitais ou nos 
ambulatórios, exigem sensibilidade e respeito humano, mas o grande volume de pessoas para serem atendidas 
reforça a formação técnica racional e objetiva no sentido de empreender rapidez e frieza no atendimento. 
Neste sentido, repensar a formação dos profissionais na busca de um paradigma inovador que leve a superar a 
visão “homem-máquina”, assentada na prática da técnica pela técnica. Esta denúncia implica uma realidade 
vivenciada também em várias situações que exigem o discernimento dos profissionais que atuam na área para 
eleger as prioridades na utilização dos recursos informatizados e das máquinas para o atendimento da 
população. Acredita-se que esta situação pesa eticamente na atuação dos profissionais da saúde, em especial, 
os que refletem sobre os direitos ao acesso legal das pessoas à saúde e à educação. 
O efeito dessa passagem da humanidade possibilitou a formação de profissionais com uma formação 
técnica razoável, mas, na sua grande maioria, desprovidos de sensibilidade para entender um universo 
complexo e os seres humanos com um todo, seres dotados de sentimentos, de emoções, de inteligências 
múltiplas, de amor e de solidariedade. 
A atuação dos educadores, recreacionistas e voluntários que se dedicam à educação das crianças e 
jovens hospitalizados, em geral, mesmo com uma visão mais humana e solidária, receberam uma formação na 
lógica newtoniano-cartesiana, com foco na técnica e na performance. Mas existem exceções, e em geral são 
profissionais que se distinguem pelo entusiasmo, seu humanismo e afetividade ao lidar no processo educativo 
com as pessoas que necessitam de ajuda, independente de suas idades. Outro aspecto a ressaltar trata das 
atitudes e ações dos gestores que atuam tanto na educação, como das instituições hospitalares, porque, em 
geral, esses profissionais ainda sentem dificuldade de entender as necessidades específicas nesta modalidade 
de ensino, seja por falta de alocação de professores, seja pela falta de recursos e apoio financeiros ou pela 
clareza da necessidade e direito dos cidadãos de usufruírem deste atendimento educativo dentro dos hospitais. 
A proposição das Secretarias de Educação, ainda restrita a poucos Estados do Brasil, luta pela 
implantação dessas práticas educativas nos hospitais, e de modo geral enfrenta dificuldades para garantir uma 
ação contínua, pois, segundo Paula (2006, p. 4), 
Os convênios entre os hospitais e as escolas são firmados com as Secretarias de Educação e 
Saúde dos Estados. Mas, tanto os órgãos públicos, os educadores e a sociedade em geral, 
ainda pouco conhecem esses espaços educativos como uma modalidade oficial de ensino em 
nosso país, pois são raras as Secretarias de Educação que implantam essas práticas 
educativas nos hospitais, garantindo-lhes apoio e assistência. 
Além dessa realidade institucionalizada, encontra-se a necessidade urgente da mudança da prática 
pedagógica dos profissionais que atuam com os estudantes que desejam continuar seus estudos, mesmo 
hospitalizados. Com propriedade de quem acompanha esta modalidade e luta pela sua qualidade, Paula (2006, 
p. 5) alerta: 
Quanto à organização do trabalho pedagógico, nestas escolas de tempo integral, os professores 
realizam trabalhos diários com as crianças. Nessas práticas, os professores são alocados para os hospi-
tais via prefeituras ou pelo Estado. Também existem os professores que trabalham nos Hospitais da 
Rede Sarah que estão relacionados ao Governo Federal. Entretanto, também existem práticas 
educativas as quais são realizadas de forma voluntária, uma vez por semana nas instituições 
hospitalares e que se intitulam de Pedagogia Hospitalar ou Classes Hospitalares. Normalmente, essas 
práticas priorizam o aspecto lúdico nas atividades com as crianças e adolescentes hospitalizados, o que 
é significativo para as crianças e adolescentes internados, mas insuficiente para atender às necessidades 
destes quanto aos objetivos da escolarização e acompanhamento destas no hospital. De modo geral, 
 
10 
quer sejam práticas educativas esporádicas ou cotidianas (reconhecidas oficialmente pelo Estado), na 
composição do currículo, elementos da Educação Formal e Não Formal se articulam no trabalho com 
os alunos. 
No âmbito da escolarização das crianças e dos adolescentes hospitalizados e do próprio acolhimento da 
disposição legal deste atendimento, é preciso que haja uma mudança de visão paradigmática dos professores e 
gestores para que as ações institucionais, políticas e governamentais façam cumprir este direito do cidadão e 
da cidadã. O atendimento educativo envolve várias atividades que podem ser realizadas dentro no hospital, 
salvaguardadas as condições de saúde dos alunos e alunas, mas cabe distinguir o papel dos (as) 
recreacionistas, que são bem vindos. Dentre eles, destaca-se o trabalho dos contadores de histórias e dos 
doutores da alegria. Mas cabe ressaltar que o processo de escolarização propriamente dita depende da ação 
docente e de uma prática pedagógica que atenda ao novo paradigma da ciência e da Educação. Com num 
novo olhar, pode-se avaliar a pertinência e a relevância do atendimento de escolarização dos estudantes em 
diferentes níveis de ensino. 
A influência do novo paradigma nas áreas da saúde e da educação 
O novo paradigma da ciência vem sendo denominado como Paradigma da Complexidade (MORIN, 
2000), mas é designadotambém como Paradigma Emergente (SANTOS, 1987,1999), Paradigma Holístico 
(CARDOSO, 1995; GADOTTI, 2000) e Paradigma Sistêmico (CAPRA, 1996; GUTIÉRREZ, 1999), dentre 
outras. Os autores indicados, entre outros, utilizam essas denominações como sinônimos, pois todas têm como 
pressupostos essenciais a superação da fragmentação do conhecimento e a busca da visão do todo. No mesmo 
sentido, a visão complexa exige uma composição pedagógica para atender ao paradigma inovador que leve a 
agregar várias abordagens para construir uma aliança, que, segundo Behrens (2000), envolve uma 
interconexão entre a abordagem progressista, a visão holística e o ensino com pesquisa, na busca da produção 
do conhecimento de maneira crítica, criativa e transformadora. 
Nesse sentido, o ato de ensinar e de aprender precisa apontar caminhos para lidar com as incertezas, 
com a resolução de problemas reais e com a busca de possíveis soluções para as indagações advindas das 
necessidades da população. 
As perspectivas para o século XXI indicam a educação como pilar para ideais de justiça, paz, 
solidariedade e liberdade. As transformações econômicas, políticas e sociais pelas quais o inundo vem 
passando são reais e irreversíveis, mas a busca da transição paradigmática envolve a visão de totalidade, de 
conexão, de interdependência, proposta por Capra (1996) como uma nova visão de mundo, denominado pelo 
autor como “teia da vida”. O atendimento ao paradigma inovador exige repensar o papel da educação e da 
saúde. Especialmente, no sentido de superar o ensino para a reprodução e buscar a produção do 
conhecimento. O conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade, pois, segundo Morin (2000, p. 38), 
 
Complexus significa o que foi tecido junto: de fato, há complexidade quando elementos diferentes são 
inseparáveis constituídos do todo. E há um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o 
objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si. 
A tessitura da mudança paradigmática não se restringe à alteração do espaço físico, nem a implantações 
de novos laboratórios e à utilização de técnicas sofisticadas, mas de repensar a função dos profissionais, dos 
homens e das mulheres, que precisam investigar novos caminhos para viver harmoniosamente no universo. 
A escola no hospital, como em outros espaços, num paradigma inovador, precisa, segundo Moran 
(2008, p. 1), “reaprender a ser uma organização efetivamente significativa, inovadora, empreendedora. A 
escola é previsível demais, burocrática demais, pouco estimulante para os bons professores e alunos. Não há 
receitas fáceis, nem medidas simples”. Na proposição do autor, a escola está envelhecida nos seus métodos, 
procedimentos, currículos. E, com esta visão, o autor complementa que a maioria das escolas e universidades 
 
11 
“se distanciam velozmente da sociedade, das demandas atuais. Sobrevivem porque são os espaços 
obrigatórios e legitimados pelo Estado. A maior parte do tempo freqüentamos as aulas porque somos 
obrigados, não por escolha real, por interesse, por motivação, por aproveitamento” (MORAN, 2008, p. 3). E 
com muita propriedade alerta: “A escola precisa partir de onde o aluno está, das suas preocupações, 
necessidades, curiosidades e construir um currículo que dialogue continuamente com a vida, com o cotidiano. 
Uma escola centrada efetivamente no aluno e não no conteúdo, que desperte curiosidade, interesse” (MO- 
RAN, 2008, p. 4). 
Nesse processo educativo, num paradigma da complexidade, a aprendizagem parte de situações-
problema que se apresentam com a finalidade de avançar e correlacionar diversos aportes teórico-práticos 
adequados aos conhecimentos que precisam ser produzidos pelos alunos e alunas em cada etapa e nível de 
ensino. 
A escola no hospital acompanha os mesmos requisitos da escola regular, da qual o aluno está afastado 
temporariamente, mas que depende do entendimento do (a) professor(a), pois, segundo Moran (2008, p. 6), 
Hoje, o professor, em qualquer curso presencial, precisa aprender a gerenciar vários espaços e a 
integrá-los de forma aberta, equilibrada e inovadora, pois antes ele só se preocupava com o aluno em 
sala de aula. Agora, continua com os estudantes no laboratório (organizando pesquisas, produzindo 
novos materiais), na Internet (atividades a distância) e no acompanhamento das práticas, dos projetos, 
das experiências que ligam o aprendiz à realidade, à sua profissão (ponto entre a teoria e a prática) — e 
tudo isso fazendo parte da carga horária da sua disciplina, estando visível na grade curricular, 
flexibilizando o tempo de estada em aula e incrementando outros espaços e tempos de aprendizagem. 
Esses cuidados e procedimentos metodológicos também precisam ser oferecidos para os alunos(as) que 
se encontram hospitalizados; para tanto, os docentes devem reconhecer o potencial oferecido pelo espaço no 
qual vão atuar, ou seja, adequar os recursos que estão no seu entorno. Cabe lembrar que os (as) alunos (as) 
podem, por exemplo, estar fazendo um período de diálise, aguardando um transplante, ou convalescendo de 
um transplante, ou ter se submetido a uma cirurgia cardíaca, entre outros casos, que envolvem um tempo 
grande dentro de um hospital. A competência do (a) professor(a) na escola no hospital está em adequar as 
necessidades e as condições de oferecer situações de aprendizagem em tempo, dosagem e locais diferenciados 
para os(as) alunos(as) aprenderem. As possibilidades metodológicas num paradigma da complexidade 
permitem mobilizar diversos referenciais teórico-práticos com o intuito de levar os alunos a acessar a temática 
e a entender que os problemas levantados e contextualizados indicam caminhos para a interconexão e inter- 
relação para produção dos conhecimentos respectivos a sua série de ensino, ou a outras aprendizagens. 
O paradigma da complexidade leva a fazer um chamado aos docentes que se encontram interessados em 
atuar com os alunos e alunas que se encontram hospitalizados; para tanto, aponta-se o desafio posto no 
documento Global Alliance for Transforming Education (GATE, 1991, p. 2), em que consta o seguinte: 
Fazemos um chamado a favor de um reconhecimento renovado dos valores humanos que tem sido 
corroído pela cultura moderna: harmonia, paz, cooperação, comunidade, honestidade, justiça, 
igualdade, compaixão, compreensão e amor. O ser humano é mais complexo que suas funções de 
produtor e cidadão. Se uma nação, por meio de suas escolas, de suas políticas de bem estar infantil e de 
seu desejo (vontade) de competição, não consegue sustentar o conhecimento de si mesmo, da saúde 
emocional e dos valores democráticos, em último termo seu êxito econômico será minado pelo colapso 
moral da sociedade. 
Os professores, num paradigma complexo, enfrentam a realidade e buscam tomá-la melhor e mais 
relevante a cada dia. Estes profissionais precisam retirar as etiquetas dos estudantes como, condenado, 
superdotado, doente, fraco, entre outros rótulos, para descobrir seu potencial pessoal. As oportunidades de 
atuar na escola hospital permitem ver e conviver com pessoas que acreditam até em um fio de esperança para 
manter suas vidas. Mesmo em situações de grave risco, os(as) alunos(as) lutam bravamente para viver e, 
invariavelmente, não abrem mão do processo educativo, pois pedem pela presença da professora e, assim, se 
tornam exemplos para serem seguidos. Estas experiências educativas são fantásticas e ensinam a encarar a 
 
12 
vida com outro olhar sensível e amoroso. Na mesma direção, o GATE (1991, p. 5) aponta o desafio posto 
para a humanidade neste século XXI: 
Desejamos que cada aluno jovem e adulto, seja reconhecido como único e valioso. Isso significa 
aceitar as diferenças pessoais e fomentar em cada aluno um sentido de tolerância, de respeito e de 
consideração pela diversidade humana. Cada indivíduo é inerentemente criativo, tem necessidadese 
habilidades físicas, emocionais, intelectuais e espirituais únicas, além do quê, possui uma capacidade 
ilimitada para aprender. 
Os professores na escola hospital convivem com os alunos e alunas que precisam acreditar em suas 
possibilidades, enfrentar as perdas e lutar bravamente com o “perigo de fracassar”. Por isso, são docentes 
diferentes, cheios de amor e fraternidade, competentes no ato educativo e merecem o reconhecimento público 
como profissionais relevantes para sociedade. Os atendimentos da criança e do adolescente na escola no 
hospital implicam optar por respeito ao direito da escolarização, da individualidade, das diferenças, das 
diversidades, entre outros desafios. 
Num processo contínuo, buscar uma construção conjunta de uma verdadeira comunidade educativa na 
qual cada um aprende de sua maneira, com visões múltiplas, em diferentes tempos e que considera com 
ênfase os pontos fortes. Os professores necessitam autonomia para projetar e estabelecer ambientes educativos 
apropriados para as necessidades de seus alunos em particular. A ação educativa conjunta depende dos 
profissionais da educação e da saúde para que se ajudem mutuamente na busca do bem-estar deste cidadão e 
cidadã que está temporariamente afastado da escola regular. 
A conexão paradigmática da saúde e educação pode se tornar num forte elo para o encontro possível na 
escolarização das crianças e dos adolescentes, que, além de ser um direito legal, merece ser desenvolvida com 
um paradigma inovador na prática pedagógica. Neste caminho, as universidades e faculdades em todo o País 
precisam considerar esta modalidade de ensino criando espaços para esta formação e discussão destas 
temáticas em seus cursos, bem como criar fóruns (reuniões) permanentes de formação pedagógica para os 
professores que já se alertaram para relevância da necessidade de atuar como docentes nos hospitais. 
Referências 
BEHRENS, M. A. Projetos de aprendizagem colaborativa num paradigma emergente. In: BEHRENS, M.; 
MORAN, J. M.; MASETTO, M. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2000. 
p. 67-132. 
BEHRENS, M. A. O paradigma emergente e a prática pedagógica. Petrópolis: Vozes, 2003. 
BEHRENS, M. A. Paradigma da complexidade: metodologia de projetos, contratos didáticos e portfólios. 
Petrópolis: Vozes, 2006. 
BRASIL. Constituição (1988). Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 
1988. 
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria da Educação Especial. Política Nacional de 
Educação Especial. Brasília, DF: MEC, 1994. Disponível em: 
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica. pdf>. Acesso em: 20 dez. 2009. 
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 
Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 dez. 1996. p. 
27833. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral. action?id=75723>. Acesso 
em: 23 nov. 2010. 
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. 
Brasília, DF: Secretaria de Educação Especial; MEC; SEESP, 2001. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/ 
seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2010. 
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria da Educação Especial. Classe hospitalar e 
atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações. Brasília, DF, 2002. 
CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 1996. 
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica.%e2%80%a8pdf
http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.%e2%80%a8action?id=75723
http://portal.mec.gov.br/%e2%80%a8seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf
http://portal.mec.gov.br/%e2%80%a8seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf
 
13 
CARDOSO, C. A canção da inteireza: uma visão holística da educação. São Paulo: Summus, 1995. 
GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. 
GLOBAL ALLIANCE FOR TRANSFORMING EDUCATION - GATE. Education 2000: a holistic 
perspective. Holistic Education Review, v. 4, n. 4, p. 1-12,1991. 
GUTIÉRREZ, F. Ecopedagogia e cidadania planetária. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 1999. 
KUHN, T. A estrutura das revoluções científicas. 16. ed. São Paulo: Perspectiva, 2001. 
MORAN, J. M. Aprendizagem significativa. Portal Escola Conectada. Disponível em: 
<http://www.eca.usp.br/prof/moran/significativa.htm>. Entrevista ao Portal Escola Conectada da Fundação 
Ayrton Senna, publicada em 01/08/2008. Acesso em: 17 nov. 2010. 
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2000. 
PAULA, E. M. A. T. de. O ensino fundamental na escola do hospital: espaço da diversidade e cidadania. In: 
REUNIÃO ANUAL DA ANPEd, 29., 2006, Caxambu, MG. Anais... Caxambu, MG: ANPEd, 2006. 
Disponível em: <http://www.anped.org.br/reuniões/29ra/trabalhos/trabalho/GTl3- 1869—Int.pdf>. Acesso 
em: 2 fev. 2010. 
SANTOS, B. de S. Um discurso sobre as ciências. Porto: Afrontamento, 1987. 
SANTOS, B. de S. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo: Cortez, 
1999. 
 
 
 
 
 
01- Explique o que são classes hospitalares e qual a sua fundamentação legal. _________________________ 
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________ 
 
http://www.eca.usp.br/prof/moran/significativa.htm
http://www.anped.org.br/reuni%c3%b5es/29ra/trabalhos/trabalho/GTl3-%e2%80%a81869%e2%80%94Int.pdf
 
14 
CAPÍTULO II 
AVALIAR A APRENDIZAGEM NO 
HOSPITAL: uma experiência possível? 
Encontramos uma vasta literatura sobre a avaliação da aprendizagem, todavia quando se trata de sua 
prática no espaço hospitalar, ainda há uma grande lacuna a ser preenchida. O número reduzido de pesquisas, 
bem como o pouco tempo de existência desse tipo de atendimento educacional apontam para a necessidade de 
se ampliar a reflexão sobre o tema. 
No Brasil, a oferta de educação no espaço hospitalar se dá apenas a partir de 1950 (FONSECA, 1999) e 
desde então, são poucos os espaços para debates a respeito de currículo, planejamento,avaliação, entre outras 
questões relativas ao processo educacional, considerando os aspectos relacionados à sua prática no contexto 
hospitalar. 
A avaliação deve ser compreendida de forma integrada com as demais práticas desenvolvidas no interior 
da escola, principalmente porque sua ocorrência não está restrita a esse espaço. A sociedade vem construindo 
mecanismos de classificação, escolha e exclusão, para separar, segundo o entendimento hegemônico, aqueles 
que têm daqueles que não têm competência, bom desempenho, capital, direito, etc. No caso da avaliação 
escolar, é importante compreender as relações entre as concepções que norteiam as práticas avaliativas e 
aquelas que organizam os conhecimentos a serem transmitidos, bem como com as próprias concepções do que 
seja conhecimento. Desse modo, planejamento, avaliação, currículo e concepções de conhecimento são 
indissociáveis. 
E nesse caminho que se pretende, aqui, fazer um exercício de reflexão acerca dos processos avaliativos 
que se desenvolvem no interior de uma escola em ambiente hospitalar. 
Cabe lembrar que se entende como Escola a instituição que produz e distribui uma determinada 
categoria de saberes; que produz e reproduz valores, que questiona e perpetua práticas socialmente aceitas. 
Sendo assim, suas ações não são aquelas que se restringem ao espaço com o qual está identificada, mas as que 
refletem, em forma e conteúdo, esses saberes, valores e práticas a ela relacionados. 
Para que se inicie o exercício proposto, é preciso compreender que, embora não seja o único traço que o 
constitua, qualquer que seja o modelo avaliativo, há uma concepção de conhecimento que lhe serve de 
pressuposto. Desse modo, é necessário recorrer à análise de alguns paradigmas epistemológicos, para 
compreendermos a relação que se deseja fazer aqui. 
Por um lado, há, tanto no positivismo clássico quanto em suas derivações, a ideia de que a ciência é a 
forma suprema de produção de conhecimento. Nesse contexto, as ciências naturais assumem caráter central e 
sua metodologia passa a guiar os modos de produção e legitimação desse conhecimento, pretendendo 
determinar uma unidade metodológica que regeria as demais ciências (TRIVINOS, 1987). O positivismo, 
além de afirmar essa unidade do método científico e a primazia deste como instrumento de formulação de 
conhecimento, igualmente atribui à ciência o caráter messiânico de solucionar todo e qualquer problema 
humano, o que acaba instituindo o costume social de se depositar uma confiança acrítica no conhecimento 
produzido por essa ciência (MONDIN, 1980, 1981; REALE; ANTISERE, 1991). 
Lembre-se aqui que, nesse percurso, o positivismo, que surge “como uma utopia crítico-revolucionária 
da burguesia antiabsolutista” (LÕWY, 2000, p. 18), assume um caráter ideológico conservador que se 
identifica de maneira clara com a ordem burguesa industrial. 
As ciências da sociedade, bem como as ciências da natureza, ao se pautarem por esse modelo, devem 
limitar-se à observação e à explicação causai dos fenômenos, de maneira objetiva e neutra, livre de valoração 
ou ideologias. Esse entendimento pressupõe que a sociedade seria regida por leis naturais e invariáveis, que se 
 
15 
constituem independentemente da vontade e da ação humanas. Isso significa igualmente que é imperativo 
compreender a sociedade a partir de fatos, que seriam isolados de tal forma que se neutralizasse a influência 
do sujeito. Tomar-se-ia como científico aquele conhecimento advindo de observações e aferições objetivas. 
Há, portanto, a determinação de uma neutralidade axiológica e epistemológica, a ser observada pelas ciências 
sociais, o que faz negar o condicionamento histórico-social do conhecimento, limitando, consequentemente, 
sua circulação e apropriação, concebendo-o tão somente como um capital a ser acumulado. 
Ao se pensar um modelo de avaliação sob esse ponto de vista, pensa-se em um processo centrado na 
coleta de informações. Ou seja, avaliar é medir, apurar, aferir objetivamente um determinado aspecto da 
realidade, seja ela educativa ou de outra ordem. 
A avaliação educacional passa, então, a ser regida por provas, testes e exames, que, segundo essa lógica, 
possam refletir o grau de acumulação de conteúdos transmitidos pelos professores a seus alunos. Essa maneira 
de compreender a avaliação, e a educação de modo geral, está associada à ideia de que planejar é definir com 
precisão todos os passos a serem seguidos, aproximando o processo educativo de uma determinada 
compreensão dos sistemas econômicos, produtivos e da própria ciência. Ao se planejar e dirigir todas as ações 
a serem realizadas, tanto no âmbito da produção fabril, quanto da educacional ou científica, controla-se os 
seus resultados. Sendo assim, as práticas avaliativas estariam a serviço da confirmação dos resultados 
esperados, determinados pelo planejamento. Avaliar seria, pois, verificar se os objetivos foram alcançados, 
nas condições determinadas e no tempo estabelecido. Em última análise, avaliar a aprendizagem é verificar se 
o conhecimento transmitido foi acumulado na medida certa e no tempo estipulado. 
Nessa perspectiva de sociedade, educação e conhecimento, várias concepções de avaliação se organizam 
e são teorizadas, acentuando um ou outro traço aqui trazido de forma esquemática e sumária, não cabendo 
nesse espaço fazer-lhes as distinções e identificar cada uma delas. 
Há, por outro lado, na perspectiva do materialismo dialético, considerado a partir do pensamento 
marxiano, bem como em alguns de seus desdobramentos, a compreensão de que toda produção humana, em 
qualquer que seja a área, encerra a materialidade a que está condicionado o ser humano. Desse modo, as 
representações sobre o mundo que não se fundam nesta materialidade acabam por refletir uma idealização 
sobre a realidade. 
Falando sobre a materialidade da história, Marx e Engels consideram que é necessário pensar o processo 
histórico não como fatos mortos, mas como uma representação da atividade prática, do processo do 
desenvolvimento prático dos homens. Sob esse ponto de vista, o ser humano passa a acumular conhecimento 
sobre o mundo depois de um longo percurso de intervenções objetivas na realidade material que o circunda. 
Sua própria existência diária o obriga a refletir sobre sua prática, na medida em que necessita produzir 
transformações nessa realidade material que o condiciona, no sentido de seu controle e domínio. 
A teoria e a prática configuram-se, portanto, como categorias que trazem os aspectos espiritual e 
material da atividade objetiva da humanidade, localizados no momento histórico e nas condições sociais em 
que se constroem. Esse entendimento, todavia, não significa dar ênfase às práticas sensoriais subjetivas como 
experimentação científica, mas compreender a construção do conhecimento como processo material de 
transformação da realidade objetiva. Não se trata, pois, de empirismo, mas de uma concepção de 
conhecimento que se volta para premissas e resultados políticos, manifestos nas condições reais de produção 
desse conhecimento. Concebendo o conhecimento desta forma, a especulação isolada da realidade é 
idealização e não corresponde às necessidades revolucionárias a que está atrelado o saber científico. 
Com base nessa perspectiva epistemológica, Paulo Freire concebe o conhecimento como algo que não 
se transfere, de forma mecânica e imediata, daquele que o detém para aquele que o ignora, ao contrário, sua 
construção se dá por meio das relações que são estabelecidas na sociedade. Relações estas que travam os seres 
humanos entre si e destes com o mundo que os cerca (FREIRE, 1992). Desse modo, compreende o 
conhecimento como uma construção coletiva, um bem social que deve estar a serviço da transformação da 
realidade. 
Partindo deste ponto de vista, planejar significa tomar decisões coletivas no sentido de antever e 
 
16 
implementar ações que transformem a realidade.O cenário a ser alcançado e os aspectos que envolvem as 
ações a serem empreendidas devem ser resultado de uma discussão coletiva, em que aos atores devem ser 
assegurados espaços de manifestação e participação, garantindo-lhes também a autonomia necessária à 
constituição de processos democráticos de tomada de decisão. Desse modo, a divisão do trabalho e os 
objetivos a serem alcançados passam a ser orientados por uma racionalidade política e não mais por um 
ordenamento supostamente técnico. 
A avaliação escolar que considere esse paradigma epistemológico não pode ser senão dialética, 
processual, coletiva e com objetivo de proporcionar a tomada de consciência e a emancipação, levando em 
conta as condições de materialidade em que se dá a construção do conhecimento e sua função política. Desse 
modo, avaliar significa reconhecer as condições objedvas em que se dá a vida dos sujeitos envolvidos no 
processo de construção do conhecimento e apontar caminhos para sua superação. Entende-se, pois, que 
cc
a 
questão que se coloca a nós é lutar em favor da compreensão e da prática avaliativa enquanto instrumento do 
que-fazer de sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo, da libertação e não da domesticação’
5
 (FREIRE, 
2002, p. 131). Vale ressaltar que que-fazer 
 
É um conceito que representa a teoria e a prática. E reflexão e ação, e não pode reduzir-se nem ao 
verbalismo, nem ao ativismo, tampouco distingue momentos na ação do educador/educando. Significa 
ser único na prática cotidiana, assumir toda e qualquer ação como uma forma de compromisso social 
(VASCONCELOS; BRITO, 2006, p. 162). 
Como se sabe, a escola vem, historicamente, avaliando com o propósito de controlar, selecionar, 
classificar e rotular. Neste sentido, utiliza a avaliação como instrumento segregador, incluindo alguns e 
excluindo outros. A função da avaliação escolar, portanto, seria prioritariamente a de verificar aqueles que 
passarão de ano e aqueles que ficarão reprovados (FERNANDES, 2007). E é importante dizer que a 
reprovação passa a ter seu sentido associado à qualidade de ensino. Como registra Fernandes: “Do ponto de 
vista político social, é forte e arraigada em nossa sociedade uma cultura escolar que tem como máxima que a 
boa escola, a escola 'forte
’
 é aquela que reprova” (FERNANDES, 2007, p. 106). 
Nessa perspectiva classificatória da avaliação, a reprovação e a disciplinarização dos alunos são 
considerados elementos indispensáveis para o sucesso escolar, gerando uma relação entre professor e aluno na 
qual a avaliação é utilizada como moeda de troca, fazendo parte do jogo de produção desse sucesso/fracasso. 
No hospital, o professor não tem o poder instituído para promover ou reter alunos, ou para classificá-los 
a partir de critérios estabelecidos a p r i o r i . A função clássica da avaliação, ou seja, de exercer o controle, 
materializado na disciplinarização dos corpos e mentes; no espaço educativo hospitalar não tem sentido, 
embora na escola tradicional ainda seja possível encontrar as condições objetivas para que tal fenômeno se 
verifique. Este lugar de superioridade é assumido pela equipe médica, que não divide este “poderio” com os 
outros profissionais. Quem exclui, quando exclui, bem como quem fala e quem decide é o médico, pois o 
paciente não conhece os procedimentos necessários para a recuperação da sua saúde. A “fonte de saber” é o 
médico. O lugar da criança/paciente requer apenas a paciência e a espera do resultado das intervenções 
médicas, de preferência, sem resistências, pois qualquer movimento pode atrapalhar seu restabelecimento. 
Na escola, de modo geral, o professor é a autoridade e, muitas vezes, encontra na avaliação o seu 
instrumento de coerção, garantindo seu lugar de soberania. Neste sentido, se o controle e a decisão sobre o 
'destino’ dos pacientes está nas mãos da equipe médica, qual é o lugar da avaliação no trabalho pedagógico 
realizado em espaço hospitalar? 
Uma possibilidade a ser tomada como ponto de partida é a da Avaliação Formativa, concepção esta que 
possibilita simultaneamente a significação da ação educativa hospitalar e a formação permanente de seus 
professores e alunos. 
Por ser identificada como um modo de investigação acerca da realidade educativa, centrada no processo 
e não no produto, considerando que o aluno aprende de diversas formas, em diferentes tempos e a partir de 
suas experiências cotidianas, essa concepção de avaliação possibilita mostrar a professores e alunos como 
 
17 
ocorrem seus processos de ensinar e aprender. 
Como explica Fernandes (2007, p. 107): 
A avaliação formativa é aquela em que o professor está atento para os processos e aprendizagens de 
seus alunos. O professor não avalia com propósito de dar uma nota, pois a nota é uma decorrência 
deste processo, mas não o seu fim último. O professor entende que a avaliação é essencial para dar 
prosseguimento aos percursos de aprendizagem. [...] Por fim, podemos dizer que a avaliação formativa 
é aquela que orienta os estudantes para a realização de seus trabalhos e de suas aprendizagens, 
ajudando-os a localizar suas dificuldades e suas potencialidades, redirecionando- os em seus percursos. 
A avaliação formativa, portanto, pressupõe o reconhecimento e a análise dos modos de aprender do 
aluno, bem como aponta para um processo de autoavaliação. Todavia, é preciso que se pense num processo 
avaliativo que considere outros elementos, além daqueles relacionados à dimensão cognitiva. Um processo de 
avaliação que se constitua a partir de uma concepção emancipadora, que esteja a serviço da libertação e não 
da domesticação, como quer Freire, deve produzir a descrição, a análise e a crítica da realidade, visando a 
transformá-la (SAUL, 2000). Essa concepção pressupõe a construção de práticas avaliativas que revelem o 
grau de autoconhecimento dos sujeitos em suas diversas dimensões. Esses sujeitos apuram a consciência de si 
e do mundo, na medida em que percebem criticamente sua inserção no contexto em que vivem. 
No hospital, isso significa conhecer sua condição de sujeito, não que se submete a um tratamento, mas 
que é seu partícipe, e principal interessado. Para isso, é preciso conhecer a natureza de sua enfermidade, suas 
manifestações, o funcionamento de seu corpo, os procedimentos terapêuticos, mas também seus direitos como 
paciente, a função de cada espaço, as relações que se estabelecem no hospital, etc. Os conhecimentos a serem 
construídos não devem ficar limitados a essas condições, todavia não se pode ignorá-las nem praticar um 
currículo que não as leve em conta. Diga-se o mesmo com relação às práticas pedagógicas desenvolvidas no 
espaço escolar. 
Esses elementos, portanto, passam a constituir o currículo escolar, praticado no espaço hospitalar. 
Entretanto, a avaliação não pode ser realizada para aferir a quantidade acumulada desses conhecimentos, mas 
para revelar o momento em que se encontra a criança no processo de construção desses conhecimentos, sua 
forma de elaboração e, principalmente, como esses conhecimentos participam da tomada de consciência da 
situação em que vive e como podem ser utilizados na intervenção a ser produzida para transformar essa 
realidade, no sentido de fazê-lo sair do estado de opressão em que se encontra. Nesse caso, o conhecimento 
científico não tem dimensão messiânica, como no positivismo, mas é um dos elementos que constituem as 
ações a serem empreendidas na busca pela transformação. 
Esse movimento ultrapassa o aspecto cognitivo e ganha dimensão existencial e política, na medida em 
que a criança reconhece sua condição de sujeito de direitos. A situação de opressão em que vive a criança 
hospitalizada deve ser motivo de permanente reflexão, tanto por parte do professor, quanto da própria criança. 
Não se trata de produzir uma interminável lista de queixas ou lamúrias, ou de se resignar diante dos fatos, mas 
de assumir uma atitude transformadora em buscade saídas para a superação desse estado. Cabe ao professor, 
pois, dialogar permanentemente para que possa, compreendendo esse contexto, ensinar aprendendo e aprender 
ensinando. Ou seja, cabe reconhecer que a avaliação é inerente a esse processo dialógi- co de aprendendo, 
ensinar. E, pois, um movimento de tomada de consciência e decisão diante da opressão sofrida e da 
mobilização necessária para sua superação. 
A avaliação, compreendida, portanto, como um processo permanente de revelação do grau de 
autoconhecimento dos sujeitos em suas diversas dimensões, ocorre durante todo o tempo em que a criança ou 
adolescente permanece hospitalizado e traz elementos que devem ser utilizados para subsidiar as ações 
pedagógicas. Nesse processo, é necessário que se adotem procedimentos e instrumentos diversos que 
propiciem a análise qualitativa do percurso percorrido por cada criança ou adolescente e do trabalho realizado 
pelo professor. 
Diversas são as atividades desenvolvidas e as possibilidades de promover um olhar atento sobre o 
processo de construção de conhecimento. Essas atividades, que podem ser individual ou coletivamente 
 
18 
realizadas, são alvo de permanente e sistemática observação e análise crítica, que são registradas de diversas 
maneiras. Esses registros, que tem o objetivo de documentar qualitativamente as práticas pedagógicas 
realizadas, podem ser feitos por meio de anotações pessoais realizadas pelo professor; montagem de 
portfólios, em que se agrupam os produtos das atividades realizadas; exercícios diversos que guardem traços 
importantes a serem considerados; fichas de avaliação, registro de autoavaliação realizada pela criança ou 
adolescente; bem como diários reflexivos do trabalho pedagógico ou qualquer outra forma de registro que 
acumule informações que possibilitem a construção de um Relatório Avaliativo. 
Esse processo ocorre de forma dialética, de modo que os professores e as crianças e adolescentes 
expressem suas impressões a respeito do trabalho realizado. São momentos que ocorrem diariamente, de 
maneira individual, em que cada criança ou adolescente se expressa de forma direta; ou coletiva, quando se 
discute o andamento do trabalho daquele dia. Vale lembrar que também é possível que ocorra, de forma 
específica, quando solicitado pela escola de origem da criança ou adolescente, a aplicação de um determinado 
instrumento de avaliação. Nesse caso nenhum outro procedimento é abandonado, fazendo-se igualmente a 
análise deste instrumento que fora aplicado. 
Quando a criança, ou adolescente, apresenta uma doença crônica, e, por consequência disto, é 
hospitalizado seguidamente, com intervalos regulares ou não, esses registros podem ser feitos por meio de 
Ficha de Acompanhamento, ou Portfólio, onde ficam arquivados os produtos das atividades realizadas e os 
demais registros feitos pelo professor. 
Os Relatórios Avaliativos são elaborados de acordo com a necessidade, podendo ser remetidos à escola 
de origem da criança ou adolescente. Estes relatórios devem conter a análise sobre os objetivos alcançados e 
não alcançados, bem como do processo em que se deu a construção desses objetivos e os procedimentos 
adotados pelo professor com vistas à superação dos desafios observados no decorrer do processo. 
Há outra prática, como a curricular, que é indissociável da avaliação: a de planejamento. Não é possível 
pensar, nesse modo de conceber o processo educativo, em ações pedagógicas rigidamente planejadas a 
p r i o r i : a participação de todos os atores envolvidos nesse processo pedagógico é imprescindível. E é 
preciso dizer, nesse momento, que tal pressuposto vale para o hospital e, igualmente, para a escola. Não é 
mais possível, concebendo o conhecimento como uma construção social, e, portanto, um bem de todos, que se 
pense num processo de planejamento sem que sua base seja dialógica (PADILHA, 2001), portanto, coletiva. 
No processo de gestão que vem sendo empreendido, ao se debater sobre currículo, planejamento e 
avaliação, na formação permanente dos professores do Programa Pedagogia Hospitalar da Fundação 
Municipal de Educação de Niterói - RJ, fica clara a disposição em buscar um caminho metodológico que 
possibilite o processo de ensinar e aprender, de alunos e professores, que seja resultado de uma construção 
coletiva. Neste sentido, há uma clara opção pela concepção freiriana. 
O trabalho pedagógico é organizado a partir de temas geradores, que resultam de um processo dialógico 
que alimenta e dá a dimensão democratizante da ação educativa. São etapas que se iniciam a partir da 
Investigação Temática, que consiste em uma pesquisa do universo do aluno, em que o professor busca 
compreender como este educando concebe o mundo que o cerca, lembrando, como entende Feitosa (1999), 
que o estudo da realidade não se limita à simples coleta de dados, mas deve, acima de tudo, perceber como o 
educando sente sua própria realidade, superando a simples constatação dos fatos, numa permanente atitude 
investigativa. Essa compreensão da realidade fará emergir aspectos diversos que irão se constituir em temas, 
que por sua vez convergirão para o tema gerador geral. 
Num segundo momento, o de Tematização, há a seleção dos temas geradores e palavras geradoras. 
Nessa fase, realiza-se a codificação e decodificação desses temas, buscando o seu significado social e 
subjetivo. Na terceira etapa, denominada de Problematização, busca-se superar a visão ingênua sobre a 
realidade por uma visão crítica capaz de produzir transformações no contexto. 
Como esclarece Gadotti (1991, p. 40): 
O objetivo final do método é a conscientização. A realidade opressiva é experimentada como um 
 
19 
processo passível de superação. A educação para a libertação deve desembocar na práxis 
transformadora, ato do educando, como sujeito, organizado coletivamente. 
Esta abordagem educativa traz em si dois princípios: a politização do ato educativo e a problematização 
da realidade. Tais princípios têm como base o reconhecimento da impossibilidade de uma educação 
politicamente neutra e a necessidade da permanente reflexão sobre seus pressupostos teóricos e sobre as 
práticas cotidianas que a constituem. Sendo assim, os processos pedagógicos, sejam eles desenvolvidos na 
escola, ou no hospital, precisam ser permanentemente revistos e questionados, no sentido de que consolidem 
seu caráter emancipador. 
Compreende-se, por fim, que o processo de avaliação traz uma dimensão política que não pode ser 
ignorada. Sua prática irá refletir toda uma série de pressupostos que a coloca em sintonia com um conjunto de 
objetivos que a fazem pertencer a um determinado campo social e político. A reflexão permanente sobre esses 
pressupostos e sobre as práticas que a constituem é imprescindível para compreender sua função e sua 
adequação ao projeto político-pedagógico a ser posto em prática. Assim, a opção que se faz quando se quer 
instituir uma avaliação emancipadora revela o claro entendimento de que a educação não pode servir de 
instrumento de exclusão social, mas da promoção permanente de cidadania. 
Referências 
FEITOSA, S. C. S. Método Paulo Freire: princípios e práticas de uma concepção popular de Educação. 
1999. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999. 
FERNANDES, C. O. Escola em ciclos: uma escola inquieta — o papel da avaliação. In: KRUG, A. R. F. 
(Org.). A construção de uma outra escola possível. Rio de Janeiro: WAK, 2007. v. 1. 
FREIRE, P. Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. 
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 
2002. 
FONSECA, E. S. da. A situação brasileira do atendimento pedagógico- educacional hospitalar. Educação e 
Pesquisa, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 117-129, jan./jun. 1999. 
GADOTTI, M. Convite à leitura de Paulo Freire. São Paulo: Scipione, 1991. 
LÕWY, M. Asaventuras de Karl Marx contra o Barão de Münch- hausen: marxismo e positivismo na 
sociologia do conhecimento. São Paulo: Cortez, 2000. 
MONDIN, B. Introdução à filosofia: problemas, sistemas, autores, obras. São Paulo: Paulinas, 1980. 
MONDIN, B. Curso de filosofia. São Paulo: Paulinas, 1981. 
PADILHA, P. R. Planejamento dialógico: como construir o projeto político-pedagógico da escola. São 
Paulo: Cortez, 2001. 
REALE, G.; ANTISERI, D. História da filosofia. São Paulo: Paulinas, 1991. 
SAUL, A. M. Avaliação emancipatória: desafio à teoria e à prática de avaliação e reformulação de currículo. 
São Paulo: Cortez, 2000. 
TRIVINOS, A. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1987. 
VASCONCELOS, M. L. C.; BRITO, R. H. P. Conceitos de educação em Paulo Freire. Petrópolis: Vozes, 
2006. 
 
 
 
01- É possível avaliar o aprendizado em um hospital? _____________________________________________ 
________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________
 
 
20 
CAPÍTULLO III 
O ADOLESCENTE HOSPITALIZADO COM 
CÂNCER: a importância do trabalho do 
professor de Classe Hospitalar para esse 
alunado 
O objetivo deste artigo é identificar a importância do trabalho do professor de Classe Hospitalar para 
adolescentes hospitalizados com câncer. Defender a ideia de que a escola hospitalar pode representar um 
importante e rico espaço de vivências e aprendizagens significa transpor a restrita visão de que a educação 
pertence aos muros escolares, pois o adolescente, mesmo hospitalizado, encontra-se em processo de 
desenvolvimento, em outras palavras, “na construção de uma educação de qualidade para todos não se pode 
deixar de considerar a escola hospitalar como respeito à cidadania, exemplo de atenção à diversidade e, 
também, um singelo modelo de inclusão” (FONSECA, 2003, p. 10). 
O câncer é uma célula que deixa de desempenhar suas funções normais, perde marcas que a identificam 
com determinado órgão e torna-se capaz de se transformar em qualquer tecido. Esta célula começa a se dividir 
e então nasce um aglomerado de células estranhas com acelerada capacidade de multiplicação. Algumas 
vezes, essas células se destacam deste aglomerado e caem na corrente sanguínea ou no sistema de circulação 
da linfa e começam a se reproduzir em outro local. Não fosse essa possibilidade de migração da doença, a 
maioria dos tipos de câncer seria curável (SCHILLER, 2000). 
No Brasil, o câncer é, atualmente, a segunda causa de morte por doença. Em 2000, as neoplasias foram 
responsáveis por 12,73% dos 946.392 óbitos registrados, sendo 53,97% destes óbitos ocorridos entre homens 
e 46,01 entre as mulheres. Verifica-se que desde 1970 as taxas de cura dos tumores da infância têm 
aumentado. Atualmente, crianças e jovens com leucemia linfática aguda curam-se em 70% a 80% dos casos. 
Paralelamente, tem-se observado um aumento das taxas de incidência de tumores da infância, principalmente 
da leucemia, tumores do sistema nervoso central, linfomas não-Hodgkin, tumor de Wilms e outros tumores 
renais. Supostamente, a criança tem mais anos a perder, ou a ganhar, uma vez que a sua expectativa de vida é 
maior do que a do adulto. Atualmente, as crianças com câncer só não têm um maior índice de anos de vida 
ganhos do que as mulheres com câncer de mama (INCA, 2008). 
Destaca-se que as causas que levam ao aparecimento de câncer nos jovens são diferentes das nos 
adultos. Estão muito mais ligadas a fatores genéticos do que a exposição no ambiente a agentes 
carcinogênicos. Em aproximadamente 10 a 15% dos casos são reconhecidos outros casos na família, ou a 
criança possui alguma doença genética que confere maior propensão a determinados tipos de câncer, por 
exemplo, na Síndrome de Down, onde os portadores têm maior chance de desenvolver leucemia. Outros 
fatores que estão associados ao aparecimento de câncer nesta idade seriam: exposição à radiação ionizante, 
vírus (Epstein-Barr], exposição intrauterina a hormônio [diethystilbestrol]. 
Embora o câncer seja hoje considerado uma doença crônica grave, mas passível de tratamento e 
recuperação, continua sendo vivido como uma sentença de morte. No caso do adolescente, o estresse que o 
diagnóstico de câncer, com todas as suas implicações, produz se toma quase insuportável para ele, por isso a 
escolha desta etapa do desenvolvimento humano neste estudo. Ou seja, por um lado sua exuberância vital lhe 
impõe uma maior percepção de sua condição física, isto é, de que ele tem um corpo, por outro lado, ele ainda 
não admite ver este corpo como um corpo que dói, sangra, definha e morre por causa dessa mesma 
exuberância física. 
 
21 
Dessa forma, a doença, a hospitalização e a possibilidade de morte na adolescência é uma ferida 
narcísica ainda maior do que para outros grupos etários (TORRES, 1999). 
Para o adolescente, entre as muitas implicações que acarreta, o diagnóstico de câncer pode prejudicar o 
desenvolvimento da sua identidade, levando-o a perder o sentido de sua continuidade histórica e a perspectiva 
de futuro, pois a hospitalização traz consigo a percepção da fragilidade, o desconforto da dor e a insegurança 
da possível finitude. E um processo de desestruturação do ser humano que se vê em estado de permanente 
ameaça. O distanciamento dos amigos, o afastamento de casa, o administrar o tratamento, o conviver com as 
condutas invasivas e cirúrgicas necessárias, o lidar com a mudança no ritmo e estilo de vida, o abandono de 
projetos, de sonhos e a inevitável interrupção dos estudos. Frente a esta realidade, como fica a vida escolar 
deste adolescente? 
E reconhecido pela legislação brasileira o direito da continuidade de escolarização àquelas crianças e 
adolescentes que se encontrem hospitalizados (BRASIL, 1995). 
Esta modalidade de atendimento denomina-se Classe Hospitalar e objetiva atender pedagógico-
educacionalmente às necessidades do desenvolvimento psíquico e cognitivo de crianças e adolescentes 
(BRASIL, 1994). 
A Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação instituiu as Diretrizes Nacionais para 
a Educação Especial na Educação Básica (Resolução CNE/CEB n. 2, de 11/09/2001, BRASIL, 2001) que, no 
artigo 13, se refere à escola no ambiente hospitalar. Essas diretrizes têm caráter obrigatório dtsde 2002. 
Ademais, a proposta implícita na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é a de que toda 
criança ou jovem disponha de todas as chances quanto possíveis para que os processos de desenvolvimento e 
aprendizagem não sejam interrompidos (BRASIL, 1996). 
Buscando adequar-se ao que prevê a legislação em vigor, o MEC por meio de sua Secretaria de 
Educação Especial procedeu a revisão de sua documentação no âmbito das estratégias e orientações para o 
trabalho pedagógico com os alunos com necessidades especiais. E a área de atendimento escolar hospitalar 
passou a dispor de publicação que regulamenta a implantação e implementação do trabalho escolar com 
crianças ou adolescentes enfermos (BRASIL, 2002). 
Destaca-se que crianças e adolescentes internados em hospitais, independente da patologia, são 
considerados alunos temporários de educação especial por se acharem afastados do universo escolar e 
privados da interação social propiciada na vida cotidiana e terem pouco acesso aos bens culturais. Portanto, 
elas correm um risco maior de reprovação e evasão, podendo configurar um quadro de fracasso escolar 
(BARROS, 1999). 
Neste contexto, surge uma nova área de atuação para os profissionais da educação: o hospital. O 
adolescente hospitalizado sofre uma profunda cisão nos seus laços sociais: de um lado a escola, os amigos e, 
do outro, o hospital e os procedimentos clínicos. Sua vida fica restrita aos espaços família/casa e 
hospital/doença. Para os adolescentes,

Continue navegando