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1 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 24/08/2021 Em resumo... 28000 acidentes ofídicos no Brasil, apresentando uma letalidade de 0,4% Dados são submetidos devido às subnotificações O número de óbitos gira entorno de 119 por ano Antes da produção e distribuição do soro antiofídico por Vital Brazil em 1901, era estimada uma letalidade de 25% entre as vítimas de acidentes ofídicos. Notificação compulsória, doença negligenciada Os acidentes por animais peçonhentos e, em particular, os acidentes ofídicos foram incluídos pela OMS na lista das doenças tropicais negligenciadas que acometem, na maioria dos casos, populações podres que vivem em áreas rurais. Em agosto de 20210, o agravo foi incluído na lista de notificação compulsória (LNC) do Brasil, publicada na portaria Nº 2.4472 de 31 de agosto de 2010. Alto número de notificações registradas no sistema de informações de agravos de notificação. Preenchimento de ficha SINAN para acidentes por animais peçonhentos (cobra, aranha e escorpião). A ficha ajuda a fazer um resumo sobre as manifestações clínicas. Resumo que ajuda na orientação do que deve ser feito pelo profissional de saúde... Introdução Ofidismo = acidente ofídico Acidentes por serpentes peçonhentas No Brasil há 380 espécies de serpentes, e dessas 60 são peçonhentas. Características dos gêneros de serpentes peçonhentas no Brasil - Fosseta loreal presente. Indica com segurança que a serpente é peçonhenta e é encontrada nos gêneros Bothrops, Crotalus e Lachesis. A identificação entre os gêneros referidos também pode ser feita pelo tipo de cauda. Epidemiologia A maioria dos acidentes ofídicos no Brasil é ocasionada por serpentes do gênero Bothrops, seguido pelo Crotalus. Poucos são os casos de acidentes por MIcrurus e Lachesis. As regiões brasileiras onde há maior incidência são Norte (52,6% por 100.000 habitantes) e Centro-Oeste (16,4% por 100.000 habitantes). Os meses de maior frequência de acidentes são os quentes e chuvosos, períodos de maior atividade em áreas rurais e de maior atividade também das serpentes. Os acidentes ofídicos são mais frequentes na população rural, no sexo masculino e em faixa etária economicamente ativa. Família Viperidae Gênero Bothrops (incluindo Bothriopsis e Porthidium) Compreende cerca de 30 espécies, distribuídas por todo o território nacional. São conhecidas popularmente por: jararaca, ouricana, jararacuçu, urutu-cruzeira, jararaca-do- rabo-branco, malha-de-sapo, patrona, surucucurana, combóia, caiçara, e outras denominações. Estas serpentes habitam principalmente zonas rurais e periferias de grandes cidades, preferindo ambientes úmidos como matas e áreas cultivadas e locais onde haja facilidade para proliferação de Ofidismo 2 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 roedores (paióis, celeiros, depósitos de lenha), parques e periferia de cidades. Têm hábitos predominantemente noturnos ou crepusculares. Podem apresentar comportamento agressivo quando se sentem ameaçadas, desferindo botes sem produzir ruídos. Gênero Crotalus Agrupa várias subespécies, pertencentes à espécie Crotalus durissus. Popularmente são conhecidas por cascavel, cascavel-quatro-ventas, boicininga, maracambóia, maracá e outras denominações populares. São encontradas em campos abertos, áreas secas, arenosas e pedregosas e raramente na faixa litorânea. Não ocorrem em florestas e no Pantanal. Não têm por hábito atacar e, quando excitadas, denunciam sua presença pelo ruído característico do guizo ou chocalho. São responsáveis por cerca de 7,7% dos acidentes ofídicos no Brasil. Tem o maior coeficiente de letalidade. Gênero Lachesis Compreende a espécie Lachesis muta com duas subespécies. São popularmente conhecidas por: surucucu, surucucu-pico- de-jaca, surucutinga, malha-de-fogo. É a maior das serpentes peçonhentas das Américas, atingindo até 3,5m. Habitam áreas florestais como Amazônia, Mata Atlântica e alguns enclaves de matas úmidas do Nordeste. Família elapidae Gênero Micrurus O gênero Micrurus compreende 18 espécies, distribuídas por todo o território. São animais de pequeno e médio porte com tamanho em torno de 1,0 m, conhecidos popularmente por coral, coral verdadeira ou boicorá. Apresentam anéis vermelhos, pretos e brancos em qualquer tipo de combinação. Na Região Amazônica e áreas limítrofes, são encontrados corais de cor marrom-escura (quase negra), com manchas avermelhadas na região ventral. Em todo o país, existem serpentes não peçonhentas com o mesmo padrão de coloração dos corais verdadeiros, porém desprovidas de dentes inoculadores. Diferem ainda na configuração dos anéis que, em alguns casos, não envolvem toda a circunferência do corpo. São denominados falsas- corais. Família Colubridae Algumas espécies do gênero Philodryas (P. olfersii, P. viridissimus e P. patogoniensis) e Clelia (C. clelia plumbea) têm interesse médico, pois há relatos de quadro clínico de envenenamento. São conhecidas popularmente por cobra- cipó ou cobra-verde (Philodryas) e muçurana ou cobra-preta (Clelia). Possuem dentes inoculadores na porção posterior da boca e não apresentam fosseta loreal. Para injetar o veneno, mordem e se prendem ao local. Local da picada O pé e a perna foram atingidos em 70,8% dos acidentes notificados e em 13,4% a mão e o antebraço. Faixa etária e sexo 15 a 49 anos (52,3%), que corresponde ao grupo etário onde se concentra a força de trabalho. O sexo masculino foi acometido em 70% dos acidentes, o feminino em 20% e, em 10%, o sexo não foi informado. Letalidade A letalidade geral para o Brasil foi de 0,45%. O maior índice foi observado nos acidentes por Crotalus, onde em 5.072 acidentes ocorreram 95 óbitos (1,87%). Epidemiologia: frequência de acidentes por gênero Predomínio do acidente botrópico que corresponde a 73,5% dos casos de ofidismo notificados no país. Seguidos do crotálico (7,5%) Laquético (3%) e elapídico (0,7%) Há pequenas variações de acordo com a região e a distribuição geográfica das serpentes. 11,8% dos acidentes ofídicos notificados como por serpente não identificada. Acidentes por serpentes não peçonhentas em 3%, provavelmente devido a não utilização de soro específico. Serpentes de importância médica o Bothrops (jararaca) o Crotalus (cascavel) o Lachesis (surucucu) o Micrurus (coral) o Algumas da família Colubridae Acidentes Botrópico Corresponde ao acidente com maior importância epidemiológica, devido a incidência de cerca de 90% dos envenenamentos no país. ➢ Ações do veneno Ação proteolítica: possui patogênese complexa e está associada com o aparecimento de edema, bolhas e necrose. Essas características, possivelmente, decorrem da atividade de proteases, hialuronidases e fosfolipases, da liberação de mediadores da resposta inflamatória, da ação das hemorraginas sobre o endotélio vascular e da ação pró- coagulante do veneno. Ação pró-coagulante: normalmente os venenos botrópico ativam o fator X e a protrombina. Possui também ação Gráfico do Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos da FIOCRUZ. 3 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 semelhante à trombina, convertendo o fibrinogênio em fibrina. Essas ações produzem distúrbios da coagulação, caracterizados por consumo dos seus fatores, geração de produtos de degradação de fibrina e fibrinogênio, podendo ocasionar incoagulabilidade sanguínea. Este quadro é semelhante ao da coagulação intravascular disseminada. Os venenos botrópicos podem também levar a alterações da função plaquetária bem como plaquetopenia. Ação hemorrágica: ocorre devido a ação das hemorraginas que provocam lesões na membrana basal dos capilares, associadas à plaquetopenia e alterações da coagulação (esgotamento dos fatores de coagulação).Por que tem ação pró-coagulante e ao mesmo tempo hemorrágica? O consumo dos fatores da coagulação de forma exagerada em determinados locais promove a falta desses fatores em sítio mais distantes, causando a hemorragia localizada nesses sítios. Manifestações locais Dor e edema endurado Instalação precoce e de caráter progressivo Equimose e sangramentos no ponto da picada Infarto ganglionar e bolhas, com ou sem necrose. Manifestações sistêmicas Hemorragias à distância como gengivorragias, epistaxes, hematêmese, equimoses à distância do local da picada, hemorragia em outras cavidades e hematúria. Em gestantes, há risco de hemorragia uterina. Podem ocorrer náuseas, vômitos, sudorese, hipotensão arterial e, mais raramente, choque. Pode ocorrer hipotensão decorrente do sequestro de líquido no membro picado ou hipovolemia consequente a sangramentos, que podem contribuir para a instalação de insuficiência renal aguda. Manifestações sistêmicas como hipotensão arterial, choque, oligoanúria ou hemorragias intensas definem o caso como grave, independentemente do quadro local. Complicações locais Síndrome Compartimental: é rara, caracteriza casos graves, sendo de difícil manejo. Decorre da compressão do feixe vásculo-nervoso consequente ao grande edema que se desenvolve no membro atingido, produzindo isquemia de extremidades. As manifestações mais importantes são a dor intensa, parestesia, diminuição da temperatura do segmento distal, cianose e déficit motor. o Como resolver uma síndrome compartimental? Fazendo uma fasciotomia, liberando a pressão sobre o músculo, permitindo com que ele seja perfundido adequadamente. Se necessário, indicar transfusão de sangue, plasma fresco congelado ou crioprecipitado. Abscesso: sua ocorrência tem variado de 10 a 20%. A ação “proteolítica” do veneno botrópico favorece o aparecimento de infecções locais. Os germes patogênicos podem provir da boca do animal, da pele do acidentado ou do uso de contaminantes sobre o ferimento. As bactérias isoladas desses abscessos são bacilos Gram negativos, anaeróbios e, mais raramente, cocos Gram-positivos. Necrose: é devida principalmente à ação “proteolítica” do veneno, associada à isquemia local decorrente de lesão vascular e de outros fatores como infecção, trombose arterial, síndrome de compartimento ou uso indevido de torniquetes. O risco é maior nas picadas em extremidades (dedos) podendo evoluir para gangrena. Complicações sistêmicas Coagulação intravascular disseminada (CIVD): ocorre pelo consumo de fatores da coagulação e de plaquetas que se dá em resposta ao veneno. A principal complicação da CIVD é a hemorragia à distância, principalmente, do trato gastrointestinal. Choque: é raro e aparece nos casos graves. Sua patogênese é multifatorial, podendo decorrer da liberação de substâncias vasoativas, do sequestro de líquido na área do edema e de perdas por hemorragias. Insuficiência Renal Aguda (IRA): também de patogênese multifatorial, pode decorrer da ação direta do veneno sobre os rins, isquemia renal secundária à deposição de microtrombos nos capilares, desidratação ou hipotensão arterial e choque. Classificação de gravidade Leve Moderada Grave Mais comum; dor e edema local ausente ou pouco intenso; manifestações hemorrágicas ausentes ou discretas; TAP normal ou alterado. Dor e edema evidente que ultrapassa o segmento picado. Manifestações hemorrágicas ausentes ou presentes (gengivorragia, epistaxe, hematúria); TAP normal ou alterado. Edema local endurado e extenso, com dor intensa; bolhas, necrose, abscesso, síndrome compartimental; hipotensão, choque, oligoanúria, hemorragias internas, insuficiência renal aguda. Manifestações e Tratamento Classificação Leve Moderada Grave Locais - Dor - Edema - Equimose discretas evidentes intensas** Sistêmicas: - Hemorragias - Grave choque - Anúria ausentes ausentes presentes Tempo de Coagulação (TC)* normal ou alterado normal ou alterado normal ou alterado Soroterapia (nº ampolas) SAB/SABC/SABL *** 2-4 4-8 12 Via de administração intravenosa * TC normal: até 10 min; TC prolongado: de 10 a 30 min; TC incoagulável: > 30 min. 4 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 ** Manifestações locais intensas podem ser o único critério para classificação de gravidade. *** SAB = Soro antibotrópico/SABC = Soro antibotrópico- crotálico/SABL = Soro antibotrópico-laquético Exames complementares Tempo de Coagulação (TC): de fácil execução, sua determinação é importante para elucidação diagnóstica e para o acompanhamento dos casos (vide capítulo XI). Hemograma: geralmente revela leucocitose com neutrofilia e desvio à esquerda (aumento dos bastões), hemossedimentação elevada nas primeiras horas do acidente e plaquetopenia de intensidade variável. Exame sumário de urina: pode haver proteinúria, hematúria e leucocitúria. Outros exames laboratoriais: poderão ser solicitados, dependendo da evolução clínica do paciente, com especial atenção aos eletrólitos, uréia e creatinina, visando à possibilidade de detecção da insuficiência renal aguda. Métodos de imunodiagnóstico: antígenos do veneno botrópico podem ser detectados no sangue ou outros líquidos corporais por meio da técnica de ELISA (vide capitulo XII). Quando se fala que o TAP está diminuído (menor que 1) e o INR (maior que 1) está alargado significa que tem possibilidade de sangramento, paciente está anticoagulado. Pacientes hepatopatas tem o INR alargado também, porque o fígado doente não produz fatores de coagulação suficientes. O INR nada mais é que um cálculo automático, realizado pelos aparelhos a partir do resultado do TAP, o que permite uma comparação interlaboratorial, independentemente da tromboplastina utilizada. O valor de referência do tempo de protrombina para uma pessoa saudável deve variar entre 10 e 14 segundos. Já no caso do INR, o valor de referência para uma pessoa saudável deve variar entre 0,8 e 1. Porém, no caso de se estar utilizando anticoagulantes orais o valor deve estar entre 2 e 3, dependendo da doença que levou à necessidade de fazer tratamento com esse tipo de remédios O acidente ofídico é um acidente tetanogênico. Então nós temos que olhar para a vacinação do paciente. Se, o paciente tomou mais que 3 doses de reforço de vacina contra o tétano e última tenha sido a menos que cinco anos não se faz nada. Se a ultima dose tiver mais que cinco anos, se faz a dose de reforço. Se não tiver mais que três doses se faz o esquema completo, soro antitetânica e as 3 doses de vacina antitetânica (momento zero, trinta dias depois e sessenta dias depois). Primeira abordagem Manter a vítima calma Evitar esforços físicos, como correr, por exemplo; Procurar um hospital o mais rápido possível, procurando tentar saber antes se o mesmo possui soros anti-ofídicos. Se possível levar a serpente causadora do acidente para facilitar o diagnostico Lavar o local da picada Não fazer torniquete ou garrote no membro picado, pois poderá agravar o acidente, aumentando a concentração do veneno no local. Não fazer perfurações ou cortes no local da picada, porque pode aumentar a chance de infecções bacterianas e/ou hemorragias. Evitar curandeiros e benzedores, lembrando que o rápido atendimento em um hospital é fundamental para a reversão do envenenamento. Não ingerir bebidas alcoólicas. Tratamento específico Consiste na administração, o mais precocemente possível, do soro antibotrópico (SAB) por via intravenosa e, na falta deste, das associações antibotrópico-crotálica (SABC) ou antibotrópicolaquética (SABL). Se o tempo de coagulação permanecer alterado 24 horas após a soroterapia, está indicada dose adicional de duas ampolas de antiveneno. Tratamento geral Medidas gerais devem ser tomadas como: 1. Manter elevado e estendido o segmento picado;2. Emprego de analgésicos para alívio da dor; 3. Hidratação: manter o paciente hidratado, com diurese entre 30 a 40 ml/hora no adulto, e 1 a 2 ml/kg/hora na criança; 4. Antibioticoterapia: o uso de antibióticos deverá ser indicado quando houver evidência de infecção. As bactérias isoladas de material proveniente de lesões são principalmente Morganella morganii, Escherichia coli, Providentia sp e Streptococo do grupo D, geralmente sensíveis ao cloranfenicol. Antibiótico que cubra Gram positivo, Gram negativo e anaeróbios, podendo usar amoxacilina com clavulanato. Dependendo da evolução clínica, poderá ser indicada a associação de clindamicina com aminoglicosídeo. Tratamento das complicações locais Desbridamento de áreas necrosadas, drenagem de abscessos e fasciotomia. Sobre a soroterapia... Soro heterólogo: concentrados de imunoglobulinas obtidos por sensibilização de diversos animais, sendo mais utilizados os de origem equina. Instituto Butantan (SP), Fundação Ezequiel Dias (MG) e Instituo Vital Brazil (RJ). Administração via intravenosa → infusão em 20-60 minutos, sob a vigilância estrita da enfermagem. De preferência diluído → menor frequência de reações Reações precoces ao soro Urticária, tremores, tosse, náuseas, dor abdominal, prurido e rubor facial Reação anafilática ou anafilactóides → arritmias cardíacas, hipotensão arterial, choque e/ou obstrução de vias respiratórias → proteínas heterólogas → formação de imunocomplexos → ativação de complemento → anafilotoxinas → liberação de histamina 5 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 Tratamento das reações precoces Suspender a infusão do soro antiofídico Expansão volêmica Anti histamínico → prometazina (Fenergan®) Hidrocortisona Adrenalina Suporte ventilatório Avaliar os riscos e benefícios de continuar o soro nos casos de acidentes leves. Reações tardias ao soro Doença do soro 5-24 dias após a soroterapia Febre, artralgia, Linfadenomegalias, urticária e proteinúria Tratamento com corticosteroides por 5 a 7 dias Acidente Laquético ➢ Ações do veneno Ação proteolítica: os mecanismos que produzem lesão tecidual provavelmente são os mesmos do veneno botrópico, uma vez que a atividade proteolítica pode ser comprovada in vitro pela presença de proteases. Ação coagulante: foi obtida a caracterização parcial de uma fração do veneno com atividade tipo trombina. Ação hemorrágica: Trabalhos experimentais demonstraram intensa atividade hemorrágica do veneno de Lachesis muta muta, relacionada à presença de hemorraginas. Ação neurotóxica: é descrita uma ação do tipo estimulação vagal, porém ainda não foi caracterizada a fração específica responsável por essa atividade. Manifestações locais São semelhantes às descritas no acidente botrópico, predominando a dor e edema, que podem progredir para todo o membro. Podem surgir vesículas e bolhas de conteúdo seroso ou sero-hemorrágico nas primeiras horas após o acidente. As manifestações hemorrágicas limitam-se ao local da picada na maioria dos casos. Manifestações sistêmicas Hipotensão arterial, vertigem, bradicardia, escurecimento visual, cólicas abdominais e diarreia. Tratamento geral O mesmo do acidente botrópico Tratamento específico O soro antilaquético (SAL), ou antibotrópico-laquético (SABL) deve ser utilizado por via intravenosa. Nos casos de acidente laquético comprovado e na falta dos soros específicos, o tratamento deve ser realizado com soro antibotrópico, apesar deste não neutralizar de maneira eficaz a ação coagulante do veneno laquético. Acidente crotálico ➢ Ações do veneno São três as ações principais do veneno crotálico neurotóxica, miotóxica e coagulante. Ação neurotóxica: produzida principalmente pela fração crotoxina, uma neurotoxina de ação pré-sináptica que atua nas terminações nervosas inibindo a liberação de acetilcolina. Esta inibição é o principal fator responsável pelo bloqueio neuromuscular do qual decorrem as paralisias motoras apresentadas pelos pacientes. O grande risco é a apneia por paralização da musculatura respiratória. Ação miotóxica: produz lesões de fibras musculares esqueléticas (rabdomiólise) com liberação de enzimas (CPK, LDH) e mioglobina (mais nefrotóxica) para o soro e que são posteriormente excretadas pela urina. Não está identificada a fração do veneno que produz esse efeito miotóxico sistêmico. Há referências experimentais da ação miotóxica local da crotoxina e da crotamina. A mioglobina, e o veneno como possuindo atividade hemolítica “in vivo”. Estudos mais recentes não demonstram a ocorrência de hemólise nos acidentes humanos. A liberação dessas enzimas musculares e de mioglobina podem levar à insuficiência renal. Ação coagulante: Decorre de atividade do tipo trombina que converte o fibrinogênio diretamente em fibrina. O consumo do fibrinogênio pode levar à incoagulabilidade sanguínea. Geralmente não há redução do número de plaquetas. As manifestações hemorrágicas, quando presentes, são discretas. Manifestações locais Dor ausente ou leve, e discreto edema no local da picada Parestesia local ou regional Manifestações sistêmicas Mal estar, sudorese, náuseas, vômitos e xerostomia Fácies miastênica: ptose palpebral uni ou bilateral, flacidez da musculatura facial, alterações pupilares, oftalmoplegia Dores musculares generalizadas, mioglobinúria (rabdomiólise = necrose da musculatura esquelética) levando a insuficiência renal aguda, que é a principal complicação e causa de óbito. Distúrbios da coagulação → aumento do tempo de coagulação ou incoagulabilidade com gengivorragia ou outros sangramentos de pequena monta. 6 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 Manifestações neurológicas O aparecimento das manifestações neuroparalíticas tem progressão craniocaudal, iniciando-se por ptose palpebral, turvação visual e oftalmoplegia. Fácies miastênica (fácies neurotóxica de Rosenfeld) evidenciadas por ptose palpebral uni ou bilateral, flacidez da musculatura da face, alteração do diâmetro pupilar, incapacidade de movimentação do globo ocular (oftalmoplegia), podendo existir dificuldade de acomodação (visão turva) e/ou visão dupla (diplopia). Distúrbios de olfato e paladar, além de ptose mandibular e sialorreia pode ocorrer com o passar das horas. Dificuldades de deglutição e diminuição do reflexo de vômito. Raramente a musculatura da caixa toráxica é acometida, o que ocasiona insuficiência respiratória As manifestações neurotóxica regridem lentamente, porém são totalmente reversíveis. Exames complementares Aumento de creatinofosfoquinase (CPK), de desidrogenase lática (LDH), aspartato-amino-transferase (AST) e aspartato- alanino-transferase (ALT). O aumento da CK é precoce, com pico de máxima elevação dentro das primeiras 24 horas após o acidente. O aumento da LDH é mais lento e gradual, constituindo-se, pois, em exame laboratorial complementar para diagnóstico tardio do envenenamento crotálico. Tempo de coagulação aumentado Hemograma com leucocitose e neutrofilia EAS com mioglobinúria Uréia, creatinina e eletrólitos Na fase oligúrica da IRA, são observadas elevação dos níveis de uréia, creatinina, ácido úrico, fósforo, potássio e diminuição da calcemia. Tratamento geral Hidratação é fundamental para evitar a insuficiência renal aguda. Tratamento específico Soroterapia Manifestações e Tratamento Classificação Leve Moderada Grave Fácies miastênica/ Visão turva Ausente ou tardia Discreta ou evidente Evidente Urina vermelha ou marrom ausente Pouco evidente ou ausente presente Mialgia Ausentes ou discreta discreta Intensa Oligúria/anúria Ausente Ausente Presente ou ausente Tempo de Coagulação (TC)* normal ou alterado normal ou alterado normal ou alterado Soroterapia (nº ampolas) SAC/SABC*5 10 20 Via de administração intravenosa * SAC = Soro anticrotálico/SABC = Soro antibotrópico- crotálico. Acidente Elapídico Corresponde a 0,4% dos acidentes por serpentes peçonhentas registrados no Brasil. Pode evoluir para insuficiência respiratória aguda, causa de óbito neste tipo de envenenamento. ➢ Ações do veneno Os constituintes tóxicos do veneno são denominados neurotoxinas (NTXs) e atuam da seguinte forma: NTX de ação pós-sináptica: existem em todos os venenos elapídicos até agora estudados. Em razão do seu baixo peso molecular pode ser rapidamente absorvidas para a circulação sistêmica, difundidas para os tecidos, explicando a precocidade dos sintomas de envenenamento. As NTXs competem com a acetilcolina (Ach) pelos receptores colinérgicos da junção neuromuscular, atuando de modo semelhante ao curare. Nos envenenamentos onde predomina essa ação (M. frontalis e M. lemniscatus), o uso de substâncias anticolinesterásticas (edrofônio e neostigmina) pode prolongar a vida média do neurotransmissor (Ach), levando a uma rápida melhora da sintomatologia. NTX de ação pré-sináptica: estão presentes em algumas corais (M. coralliunus) e também em alguns viperídeos, como a cascavel sul-americana. Atuam na junção neuromuscular, bloqueando a liberação de Ach pelos impulsos nervosos, impedindo a deflagração do potencial de ação. Esse mecanismo não é antagonizado pelas substâncias anticolinesterásicas. Manifestações locais 7 AV1 – Infectologia – Prof. Cristiane Lamas – Fernanda Pereira - 5º período – 2021.2 Parestesia local e dor discreta Manifestações sistêmicas Vômitos no início do quadro Fraqueza muscular progressiva Ptose palpebral Oftalmoplegia Dificuldades de sustentar o corpo Complicações Paralisia flácida da musculatura respiratória Tratamento geral Suporte ventilatório (não invasivo ou invasivo) Anti colinesterásicos → neostigmina - Rápida reversão do sintoma respiratório - Somente para veneno com ação pós sináptica Atropina → sempre antes da neostigmina - Prevenção de bradicardia e hipersecreção Tratamento específico O soro antielapídico (SAE) deve ser administrado na dose de 10 ampolas, pela via intravenosa, segundo as especificações incluídas no Capítulo Soroterapia. Todos os casos de acidente por coral com manifestações clínicas devem ser considerados como potencialmente graves. Exames complementares Não há exames específicos para o diagnóstico. Prognóstico Acidentes são leves em 50,7%, moderados em 36,1% e graves em 6,8%. A letalidade geral é relativamente baixa (0,4%). O tempo decorrido entre o acidente e o atendimento e o tipo de envenenamento podem elevar a letalidade em até 8 vezes por exemplo no envenenamento crotálico, quando o atendimento é realizado mais de 6 a 12 horas após o acidente (letalidade é de 4,7%). Sequelas relacionadas a complicações locais ocorrem em 10% nos acidentes botrópicos, associada a fatores de risco, como o uso de torniquete, picada em extremidades (dedos de mãos e pés) retardo na administração da soroterapia. Para evitar o acidente ofídico Sempre que for andar nas florestas, andar calçado. Cerca de 80% das picadas acontecem do joelho para o pé, sendo 50% na região do pé. O uso de botinas ou botas preveniria melhor que um tênis. Evitar acumulo de lenhas, entulhos e lixos próximos a moradias humanas Evitar acumulo de alimentos que atraiam roedores. Usar luvas de couro ao remover lenhas. Não colocar as mãos dentro de buracos do solo ou de arvores. Olhar para o chão quando estar andando em trilhas. Procurar não andar fora das trilhas Ao atravessar troncos caídos, olhar sobre ou atras dele Evitar andar a noite, pois é o horário de maior atividade das serpentes venenosas Ao sentar-se no chão, olhar primeiro em volta Ao encontra uma cobra, avise ao restante do grupo sobre onde ela se encontra e procure desviar-se dela. Permita que ela escape, pois em principio as cobras não confrontam animais maiores como indivíduos humanos.
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