Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Processo Penal II – Nulidades e Recursos Os Princípios da Nulidade a) Princípio do prejuízo (art. 563 do CPP) – em breve síntese, o princípio do prejuízo narra que nenhum ato processual pode ser declarado como nulo nos casos em que este não gerar nenhum tipo de prejuízo para as partes. Dessa forma, a nulidade somente poderá ser alegada diante dos casos em que a nulidade efetivamente tenha causado um prejuízo à pessoa que a alega. Dessa maneira, todos os atos processuais realizados, frente aos casos em que a nulidade do processo é reconhecida, são excluídos. (b) Princípio da instrumentalidade das formas (ou da economia processual) – somente será declarada a nulidade de um ato processual nos casos em que houver a existência de vício fundamental em relação ao seu objeto, de modo que a apuração da verdade substancial da decisão reste-se prejudicada, isto é, que o ato realizado seja caracterizado como totalmente diverso daquele que se encontre formalmente previsto e que, ademais, não tenha encontrado sua finalidade. Diante dos casos em que o ato processual realizado tenha atingido a plena finalidade para o qual fora designado, o princípio da economia processual determina que este não seja anulado. A exemplo de tal afirmação, pode-se citar a realização de citação que, conforme os moldes processuais legais, tenha sido realizada de maneira incorreta. Se tal citação tenha atendido, mesmo assim, à sua principal finalidade – qual seja, a de promover a plena apresentação de defesa do réu – a nulidade será considerada como sanada e, dessa forma, não há que se falar em nulidade do ato. (c) Princípio da causalidade – a nulidade de um ato processual gera, por consequência, a nulidade do ato sequencial que, por sua vez, foi derivado daquele primeiro. A exemplo da utilização deste princípio, pode-se citar os casos em que são utilizados a denominada “escuta telefônica” para obtenção de provas. Por se tratar de ato ilegal, nenhuma das conversas gravadas, decorrentes da escuta ilegal, poderão ser utilizadas como provas no processo, haja vista que o ato que as originou caracteriza-se como ilícito. (d) Princípio do interesse – segundo tal premissa, ninguém poderá valer-se da própria torpeza diante do processo. Desse modo, ninguém poderá alegar nulidades sem as quais tenha dado causa, em seu próprio benefício. As principais Nulidades do Processo Penal (a) Denúncia Inepta - A partir da leitura do art. 41 do CPP, pode-se observar que o códex processual penal brasileiro é explícito e taxativo em relação aos elementos essenciais e necessários à construção da Denúncia. In verbis: Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. Nesse sentindo, frente aos casos em que há a ausência de alguns dos elementos acima narrados, a Denúncia será considera NULA, isto é, restará formalmente INEPTA. OBS! Após ser considerada como inepta, a denúncia será retornada à promotoria, para que esta possua nova chance de ser corrigida. OBS2! Quando o infrator se constituir enquanto menor de idade, o processo não deverá ser tramitado na Justiça comum. Nos casos em que tramitar, será um caso de nulidade absoluta, pois a vara competente deverá ser a Vara da Infância e da Juventude, responsável pela aplicação das medidas socioeducativas. Já nos casos em que o menor Processo Penal II – Nulidades e Recursos figura como vítima, o processo tramitará na justiça comum. (b) Ausência de citação válida – há diversas situações em que poderá haver a ausência de citação válida, entre elas pode-se citar: o não comparecimento do réu, em não atendimento ao mandado de citação. Conforme pode-se observar da leitura do art. 570 do CPP: Art. 570. A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argui-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte. Dessa forma, mesmo sem a devida citação no processo, mas com o comparecimento da pessoa a ser citada, sana a nulidade do ato, uma vez que a pessoa compareceu, mesmo que esta declare que o comparecimento se deveu somente para a não geração da nulidade. Entretanto, nos casos em que o juiz depreende que o ato errôneo realizado poderá ensejar algum tipo de prejuízo às partes e ao processo, este poderá determinar o alargamento do prazo para a realização do ato. (c) Ausência de explicação acerca do direito ao silêncio – é necessário que a autoridade explicite que a parte possui pleno direito ao silêncio frente às perguntas realizadas em audiência pelas autoridades competentes, principalmente quando em relação às pessoas menos esclarecidas. (d) Fundamentação das decisões – conforme o artigo 93, inciso XI, da CF, toda decisão deverá ser fundamentada, sob pena de nulidade. É importante citar que o Despacho que recebe a denúncia também deverá ser devidamente fundamentado, devendo conter os motivos de atendimento para não caraterização da inépcia, os indícios da autoria e prova da materialidade delitiva. Os despachos que deverão ser fundamentados serão: • Despachos decisórios; • Despachos interlocutórios ou de mero expediente (esses são os únicos despachos que podem não ser fundamentados); • Decisões terminativas ou interlocutórias. • Decisões definitivas (sentenças e acórdãos); (e) Ausência de citação pessoal da Defensoria Pública ou do defensor dativo – a intimação pessoal é distinta da remessa dos autos. O MP e a Fazenda Pública possuem a prerrogativa de remessa dos autos em determinados casos. No entanto, frente ao processo penal o que é mais comum é a obrigatoriedade da citação pessoal, isto é, através de oficial de justiça ou de carta registrada pelos correios, ao defensor público ou dativo da comarca. Nesses casos, a ocorrência de intimação por edital, ensejará a nulidade relativa, já que poderá ser suprida pelo comparecimento da parte em juízo. (f) Ausência de intimação da expedição de precatória para inquirição de testemunha – conforme o disposto na Súmula 155 do STF: Súmula 155 - é relativa a nulidade do processo criminal por falta de intimação da expedição de precatória para inquirição de testemunha. Dessa forma, ao expedir carta precatória para a inquirição de testemunhas, deverão ser intimados as partes autoras e ré, bem como seus defensores acerca de tal expedição. Isso será necessário, justamente pelo fato do grande interesse mantido pelas partes que possuem o direito de acompanhar tal inquirição caso desejem. Processo Penal II – Nulidades e Recursos (g) Inversão da ordem legal para a realização das perguntas – a defesa realizar a oratória antes da acusação, irá gerar a nulidade relativa. Assim também, se houver inquisição de testemunhas, pelo juiz, antes que as partes façam as perguntas, isto poderá gerar a nulidade. Conforme o artigo 212 do CPP: Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (h) Provas obtidas por meio da extração de dados e conversas privadas registradas em correio eletrônico e redes sociais, sem prévia autorização judicial; (i) Competência do juízo – nos casos em há incompetência do juízo, poderá haver a incidência de nulidade relativa e absoluta, a depender do caso em questão. Nos casos em que a incompetência for de origemterritorial, a nulidade será relativa, já nos casos em que a incompetência se der em relação à matéria ou da pessoa, a nulidade será absoluta. (j) Nulidade por apresentação de documento ou objeto estranho aos autos, na sessão plenária do júri – conforme observa-se a partir do artigo 479 do CPP: Art. 479. Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. Tal artigo deriva principalmente dos princípios da boa-fé processual, da paridade de armas e princípio da não-surpresa. Diante desses casos, a parte que deseja apresentar novos documento durante a realização do plenário do júri, deverá requisitar a suspensão deste, apresentar a prova ao juiz para que esta seja juntada aos autos, aguardar a manifestação da outra parte, para que, assim, a sessão possa ser retomada. Os jurados não poderão tomar ciência da prova, sem que esta tenha sido anteriormente submetida à ciência da outra parte. (l) nulidade por excesso de linguagem na sentença de pronúncia – de acordo com o que se pode observar do artigo 413, parágrafo 1º do CPP: Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. § 1º A fundamentação da pronúncia limitar- se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. Perguntas 1) Em que hipótese(s) conversas gravadas, e- mails, correspondências, mensagens em redes sociais ou similares, podem ser usadas no Processo Penal sem autorização judicial? Explique de forma fundamentada. Resposta: De acordo com a previsão expressamente contida no dispositivo 5º, inciso XII, da vigente Constituição Federal, os sigilos relativos às correspondências, comunicações telegráficas, de dados e comunicações telefônicas (bem como em relação às informações retiradas de sistemas de informática e telemática) constituem-se como invioláveis, salvo em relação às hipóteses em que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. De maneira análoga ao que preleciona o Processo Penal II – Nulidades e Recursos texto constitucional, o Código de Processo Penal estipula em seu artigo 157 que todas as provas consideradas como ilícitas, sendo estas caracterizadas como aquelas que conferem violação às normas constitucionais e legais sobre os casos em que são extraídas, devem ser desentranhadas dos processos que integram, haja vista configurarem-se como inadmissíveis para o desenvolvimento deste. Em relação às conversas gravadas, diferentemente do que ocorre nos casos de realização das interceptações e escuta telefônicas, um dos interlocutores é quem realiza a gravação referente à conversa mantida através de meio telefônico ou diverso. Nesse sentido, sua realização dispensa a autorização judicial para que seja considerada como prova lícita e, assim, inserida no desenvolvimento processual. Conforme argumentação redigida pelo Ministro Sebastião Reis Júnior, que compõe a sexta turma do STJ, as gravações de conversas telefônicas (ou por outros meios) sempre apresenta a ciência de um dos interlocutores, mesmo quando realizadas com o auxílio de terceiros. Ademais, em relação à utilização de conversas retiradas de mídias sociais ou outros instrumentos similares, o Superior Tribunal de Justiça, reitera a orientação em relação à nulidade das provas obtidas através de acessos a conversas localizadas em aplicativos virtuais em telefones celulares, sem a plena autorização judicial ou consentimento do acusado. Em julgamento ao RHC 86.076/MT, O STJ decidiu, no entanto, que será lícita a hipótese em que as conversas são retiradas de aparelhos de telefone ou demais aparelhos pertencentes às vítimas do crime, principalmente em relação àquelas relacionadas aos crimes de homicídio. 2) Sobre nulidade em relação à competência, responda: a) Mariana, menor de idade, foi processada e condenada pela 1ª Vara criminal de determinada comarca que possuía vara especializada em infância e juventude. Existe nulidade? Qual tipo? Justifique. Resposta: Conforme a grande maioria da doutrina processualista penal brasileira, a classificação das competências relativas aos juízos criminais é permeada, de maneira abstrata, pela consideração de diversos aspectos, tais como: as características dos casos concretos, bem como da lide em análise, a funcionalidade de cada juízo, a relação jurídico-material existente em torno do objeto do processo, entre outros. No caso em questão, por ser menor de idade e, dessa forma, possuir característica essencial à natureza da lide a ser processada, o processo endereçado à Mariana, enquanto infratora, deve observar estritamente à regra contida no artigo 69, inciso III, do Código de Processo Penal, que dispõe acerca da competência ratione materiae. À vista disso, nos casos em que o infrator se constituir enquanto menor de idade, o processo não deverá ser tramitado nas varas da Justiça criminal comum, uma vez que, conforme a dicção do Estatuto da Criança do Adolescente, a Justiça da Infância e da Juventude será competente para impor medidas socioeducativas a adolescentes que incorrem na prática de ato infracional. Nesse sentido, tendo-se em vista que Mariana fora processada pela Vara de justiça criminal comum, haverá a incidência de nulidade absoluta, visto que o vício remetido ao desenvolvimento do processo constitui-se como insanável. É importante citar que, a nulidade por incompetência da autoridade judiciária em processo criminal, por se caracterizar enquanto uma violação aos preceitos contidos nos dispositivos textuais da própria Constituição, constitui-se enquanto absoluta, não se aproveitando qualquer ato processual, seja decisório ou não relativos ao processo. b) Francisco, prefeito municipal, foi processado e condenado por crime comum, Processo Penal II – Nulidades e Recursos praticado durante o seu mandato, pelo juiz de 1º grau. Existe nulidade? Qual? Fundamente. Resposta: Conforme o critério definido pela doutrina processualista penal e pelo próprio CPP (em seu art. 69, inciso VII), a ratione funcionae ou ratione personae ocorre frente aos casos em que a incompetência frente ao julgamento e processamento da ação ocorre devido a certas prerrogativas decorrentes da função desempenhada por determinados agentes políticos ou jurídicos. Tendo-se em consideração tal critério, a Constituição Federal estipula, em seu artigo 29, inciso X, que a competência para o processamento e julgamento dos crimes comuns e de responsabilidade impróprios, cometidos por prefeitos municipais, será do Tribunal de Justiça do Estado, isto é, a Justiça comum será competente. É importante observar, entretanto, que, não somente a competência pelo processamento e julgamento dos crimes cometidos por prefeitos municipais devem ser direcionados à justiça comum, como também devem ser remetidos à 2ª instância do Tribunal. Assim, diante da situação descrita pelo enunciado da questão, ao ser processado pelo juiz de 1º grau, devido ao cometimento de crime comum por prefeito municipal, durante seu mandato, houve o ensejo da nulidade absoluta sobre o processo, haja vista o cenário insanável conferido ao processo pela prática do ato. Ademais, faz-se importante salientar o entendimento postulado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) através da Súmula de nº 702, ao qual expressa que “A competênciado tribunal de justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau.” c) Carlos foi processado por ter subtraído um objeto de Francisco e depois tê-lo matado. O juiz singular proferiu sentença de pronúncia, dizendo que Carlos estaria condenado pelo delito de latrocínio, mas que possuía dúvidas se o caso não se trataria de um crime doloso contra vida e, por essa razão, resolveu submetê-lo ao Tribunal do Júri. Uma decisão nestes termos encontra-se correta? Haveria alguma nulidade? Justifique. Resposta: A sentença de pronúncia é definida enquanto decisão proferida pelo juiz criminal que compõe a justiça comum que não possui o condão de dar fim ao processo. Nesse sentido, a sentença de pronúncia é responsável apenas por apontar os indícios, existentes na lide, à respeito da existência de suposto crime doloso contra a vida. Assim, pela existência de indicativos relativos à uma suposta autoria relativa a um crime doloso contra a vida, o processo é encaminhado para o julgamento pelo Tribunal do Júri. Nesse contexto, o entendimento doutrinário majoritário posiciona-se no sentido de que a sentença de pronúncia não deverá expressar, em nenhuma hipótese, juízo de valor ou elementos de certeza direcionados ao caso concreto, não podendo o juiz afirmar autoria ou materialidade acerca dos fatos, a fim de que se evite qualquer tipo de indução dos jurados. Portanto, a sentença de pronúncia deverá ater-se ao disposto pelo artigo 413, parágrafo 1º, do CPP. Assim, diante do caso narrado na questão, ao relatar a existência de dúvidas em relação à natureza do crime doloso contra a vida, o referido magistrado acaba por evidenciar um juízo de valor em sua sentença de pronúncia, uma vez que esta somente deveria conter os indícios de materialidade e autoria do fato que pudessem levantar a existência de incompetência para processamento da justiça comum. Nesses termos, conforme já decidido pelo STF, no julgamento do RHC 127522, ao reconhecer-se o excesso de Processo Penal II – Nulidades e Recursos linguagem na sentença de pronúncia, haverá a consubstanciação da nulidade absolta do processo, anulando-se a sentença e determinando-se que outra seja prolatada em seu lugar, haja vista que apenas o desentranhamento e envelopamento da citada decisão não seriam suficientes à plena recuperação do curso processual. LIMA, Renato Brasileiro. Manual de processo penal: volume único. 8. ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2020. AVENA, Norberto. Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.
Compartilhar