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Marcela Oliveira – Medicina 2021 Depressão é um estado de humor caracterizado por tristeza e/ou apatia, independente da sua causa e duração. É muito comum que alguns pacientes denominem como depressão, estados de tristeza ou luto. No entanto, para que se configure um transtorno depressivo são necessários características e critérios clínicos para sintomas que vão além da tristeza e desinteresse. A depressão esta associada a altas taxas de cronicidade e recaída tem impacto significativo na evolução das condições clinicas gerais e cursa com grande disfuncionalidade nos ambientes familiares, sociais e profissionais. A OMS aponta a depressão como a principal causa de anos vividos com incapacitação. A depressão é duas vezes mais frequente em mulheres e se instala dos 20 aos 50 anos de idade. FISIOPATOLOGIA A noradrenalina e a serotonina são os dois neurotransmissores mais envolvidos na fisiopatologia dos transtornos de humor. Com o amplo efeito que os Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina – fluoxetina, tiveram sobre o tratamento da depressão, a serotonina tornou-se o neurotransmissor mais associado à depressão. No entanto, além delas, temos a dopamina, GABA e peptídeos neuroativos envolvidos também. Fatores neuroendócrinos podem estar relacionados ao surgimento de sintomas depressivos. Alterações de hormônios tireoidianos podem causar depressão. Além disso, alterações no GH e alterações adrenais, principalmente relacionadas ao cortisol também podem afetar o estado imunológico de pacientes. De forma geral, fatores de estresse são considerados desencadeantes de episódios de humor, apesar disso, na maioria das vezes e impróprio considera-los como único fator causal. Sabe-se também que fatores hormonais influenciam o humor, especialmente em pacientes do sexo feminino. E evidência disso a ocorrência da depressão puerperal e do transtorno disfórico pré-menstrual. Comumente, o hipotireoidismo clinico também cursa com sintomas depressivos. QUADRO CLÍNICO As síndromes depressivas têm como elemento central o humor entristecido. No entanto, outros sintomas podem estar presentes, com gravidade e frequência muito diversas. Sintomas afetivos: tristeza, melancolia, choro fácil e/ou frequente, apatia (indiferença afetiva), sentimento de falta de sentimento, incapacidade de sentir prazer, tédio e aborrecimento crônico, irritabilidade aumentada, angústia ou ansiedade, desespero. Marcela Oliveira – Medicina 2021 Alterações físicas: fadiga, cansaço fácil e constante, distúrbios do sono (insônia terminal ou hipersonia), perda ou aumento do apetite/peso, constipação, indigestão, distúrbios sexuais (diminuição da libido, disfunção erétil), palidez; alterações na menstruação, cefaleia. Distúrbios do pensamento: ideação negativa, pessimismo, ideias de arrependimento e culpa, ideias de abandono e autopunição, ideias de morte, desejo de desaparecer; ideação, planos ou tentativas suicidas. Alterações da autovaloração: sentimento de baixa autoestima e desvalia, sentimento de vergonha, autodepreciação e autoacusação. Alterações da psicomotricidade e volição: aumento da latência entre as perguntas e as respostas, lentificação psicomotora, diminuição do discurso, redução do tom de voz, fala lentificada; mutismo (negativismo verbal), negativismo (recusa alimentar, recusa à interação pessoal), ausência de planos e perspectivas. Alterações cognitivas: dificuldade de concentração e esquecimentos, dificuldade para tomar decisões, pseudodemência depressiva. Sintomas psicóticos: ideias delirantes de conteúdo negativo, delírios de ruína ou miséria, alucinações, geralmente auditivas, com conteúdos depressivos, outros sintomas psicóticos incongruentes com o humor. Ao exame psíquico, o paciente deprimido pode parecer cansado e preocupado, apresentando fraco contato visual. O cuidado com a aparência é reduzido e há tendência ao choro. O humor apresenta-se triste ou irritável. Situações que antes representavam prazer deixam de interessar e perdem a graça. Em depressões menos acentuadas, o humor oscila durante o dia, com piora matutina ou vespertina, e o paciente pode levar horas para retornar à normalidade. A fala é monossilábica, sem espontaneidade, monótona, e com longas pausas. Predominam pensamentos de cunho depressivo, hipocondríacos, menosvalia, inferioridade e culpa. As ideias de suicídio sempre devem ser investigadas e o risco avaliado. O paciente pode apenas desejar a morte, ou pensar e mesmo planejar o suicídio. Pode ocorrer diminuição da atenção (hipotenacidade). Em função disso, associado ao desinteresse, as informações não são fixadas na memória. Uma das alterações principais é a falta de energia, com tendência ao isolamento. A capacidade de exercer crítica fica prejudicada, pois os acontecimentos são interpretados de modo depressivo. DIAGNÓSTICO Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é (1) humor deprimido ou (2) perda de interesse ou prazer. 1) Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias. 2) Interesse ou prazer acentuadamente diminuído. 3) Perda ou ganho significativo de peso sem estar em dieta (por ex. mais de 5% do peso corporal em um mês), ou diminuição ou aumento do apetite. 4) Insônia ou hipersonia. 5) Agitação ou retardo psicomotor. 6) Fadiga ou perda de energia. 7) Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada. 8) Capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se, ou indecisão. Marcela Oliveira – Medicina 2021 9) Pensamentos de morte recorrentes (não apenas medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para cometer suicídio. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. CLASSIFICAÇÃO - Episódio depressivo: também denominado pelo DSM-V de transtorno depressivo maior. Evidentes sintomas depressivos devem estar presentes por pelo menos duas semanas. Os episódios, em geral, duram entre três e doze meses. O episódio depressivo é classificado pela CID-10 em leve, moderado ou grave, de acordo com o número, intensidade e importância clínica dos sintomas. Quando o paciente apresenta, ao longo de sua vida, vários episódios depressivos que nunca são intercalados por episódios maníacos, faz-se então o diagnóstico de transtorno depressivo recorrente. - Depressão endógena ou melancólica: considerada como “vindo de dentro da pessoa” – “consciência infeliz”, mais independente de fatores psicogênicos desencadeantes. Os sintomas típicos são: anedonia, culpa excessiva, piora pela manhã, insônia terminal e lentificação psicomotora. - Depressão atípica: caracterizada por ganho de peso, hiperfagia, aumento do apetite (principalmente para doces e chocolates), hipersonia e sensação de corpo muito pesado. Classicamente, apresenta melhor resposta terapêutica ao uso de antidepressivos Inibidores da Monoaminoxidase (IMAO), se em comparação aos tricíclicos. - Depressão sazonal: depressão que ocorre durante o menor período de luz diurna, no inverno e outono, e desaparece durante a primavera e verão. - Depressão pós-parto: início dentro de quatro semanas após o parto. Os sintomas variam de insônia acentuada, instabilidade e fadiga ao suicídio. Crenças delirantes e homicidas podem ocorrer com relação ao bebê. Com maior frequência, ocorre em mulheres com transtornos de humor ou outros transtornos psiquiátricos subjacentes ou preexistentes. Pode ser uma emergência psiquiátrica com risco para a mãe e o bebê. O mesmo aplica-se a um episódio maníaco ou a um transtorno psicótico breve. - Depressão psicótica: depressão grave, na qual ocorrem, associados aos sintomasdepressivos, um ou mais sintomas psicóticos, como delírio de ruína ou culpa, delírio hipocondríaco, alucinações com conteúdos depressivos. Se os sintomas psicóticos são de conteúdo depressivo, são classificados como humor-congruentes. Caso os sintomas psicóticos não sejam de conteúdo negativo, são denominados incongruentes com o humor, como delírios de perseguição, autorreferentes, paranoides. - Estupor depressivo: prevalece o negativismo, com ausência de respostas às solicitações ambientais, mutismo, recusa alimentar e permanência no leito por dias, muitas vezes imóvel. Também chamado episódio depressivo catatônico. - Pseudodemência: transtorno depressivo maior que se apresenta como disfunção cognitiva semelhante à demência. Ocorre mais frequentemente em idosos com história prévia de transtornos de humor. A depressão é primária e antecede as alterações cognitivas. Algumas características clínicas que sugerem transtorno depressivo: variação diurna (piora pela manhã), Marcela Oliveira – Medicina 2021 aparecimento dos sintomas pode ser precisado, autorreprovação, agitação psicomotora, valorização dos sintomas. - Depressão dupla: pacientes distímicos que desenvolvem transtorno depressivo maior sobreposto. TRATAMENTO É fundamental determinar se o paciente pode ser tratado ambulatorialmente ou se necessita internação psiquiátrica (voluntária ou compulsória). Está indicada quando há risco iminente de suicídio (tentativas anteriores ou planejamento explícito) ou incapacidade do paciente em reconhecer ou seguir as orientações médicas (p. ex., depressão psicótica). Se não houver história prévia, deve-se utilizar como primeira escolha um Inibidor Seletivo da Recaptação da Serotonina (ISRS) ou tricíclico e monitorar por 2-3 semanas. A resposta geralmente aparece dentro de quatro semanas; Efeitos colaterais frequentemente observados com o uso de ISRS: Disfunção sexual (diminuição da libido e anorgasmia), efeitos gastrointestinais, como náuseas e vômitos, Redução do apetite (Fluoxetina e Venlafaxina- ansiedade); Os principais efeitos colaterais dos tricíclicos (amitriptilina – ótimo p insônia) são efeitos anticolinérgicos: tontura, sedação, boca seca, visão turva, constipação intestinal e esforço para urinar. Outros efeitos incluem ganho de peso, hipotensão ortostática e alterações na condução cardíaca; Nos casos de depressão bipolar, o uso de lítio deve ser a primeira escolha; Após quatro semanas, se o antidepressivo não tiver o efeito desejado, uma mudança de classe de antidepressivo e/ou potencialização da terapia podem ser experimentados; Marcela Oliveira – Medicina 2021 L-triiodotironina (T3), carbonato de lítio e l-triptofano podem ser utilizados para potencializar o efeito antidepressivo; Os inibidores da monoaminooxidase são classicamente indicados para o tratamento de depressão atípica.
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